Aberrações de um presidente
Terça-feira, 26 de outubro
“Vamos celebrar a estupidez humana
A estupidez de todas as nações
O meu país e sua corja de assassinos
covardes
Estupradores e ladrões”
(Perfeição – Legião Urbana)
Bolsonaro durante live em 21 de outubro
Ela
chegou devastadora no alvorecer da década de 80. Desconhecida, ganhou
inicialmente o nome de doença de doença dos 5H, pois suas vítimas eram, predominantemente,
hemofílicos, homossexuais, haitianos, heroínômanos (usuários de heroína injetável),
e hookers (nome em inglês para as profissionais do sexo). Depois recebeu o nome
de HIV (Síndrome da Imunodeficiência Adquirida).
Um
vírus poderoso que pode levar ao desenvolvimento da aids, uma doença que ataca
células do sistema imunológico chamadas de os linfócitos T-CD4+, destruindo-as
e deixando o organismo vulnerável a qualquer outra doença. O vírus e a doença
ceifaram a vida de muita gente de grande talento, como por exemplo, Cazuza,
Renato Russo, e Fred Mercury, pois, por ser uma doença nova e com a qual os
médicos ainda estavam aprendendo a lidar, e o tratamento ainda era muito incipiente.
Passados
40 anos, apesar de a ciência não ter ainda descoberto a cura para o HIV, o
tratamento para os pacientes que contraem o vírus evoluiu bastante. Uma das teorias
sobre o surgimento do HIV é a de que ele surgiu de um macaco nas selvas
africanas, tendo sido depois transmitido por esses animais para a raça humana.
Ainda
mais devastador que o HIV ele chegou ao mundo dos humanos no final de 2019, na província
de Wuhan, na China, e igualmente deixou a comunidade científica desnorteada. Os
leigos ainda mais. Batizado de coronavírus, o novo vírus, que causa a doença
chamada de Covid-19, rapidamente se alastrou pelo mundo todo, ceifando milhões
de vidas em todo o planeta.
Dessa
vez, porém, os cientistas tiveram que correr contra o tempo para produzir,
senão a cura, mas pelo menos uma vacina que fizesse os números de casos e mortes
por Covid-19 despencarem. E conseguiram. De um morcego das cavernas de Wuhan
veio o vírus que sacudiu o mundo feito um grande terremoto.
Que
relação há entre o HIV e o coronavírus além de terem surgido em animais, tendo
sido posteriormente transmitidos aos humanos, deixado a comunidade científica
louca, e o mundo amedrontado? Nada mais além disso.
Porém,
as mentes perversas sempre encontrarão um jeito de estabelecer algum tipo de
relação entre os dois vírus mesmo que ela seja fantasiosa, e, nesse caso, além
de fantasiosa, criminosa.
Foi
o que fez o presidente Jair Bolsonaro, não se sabe o porquê. Se foi para jogar
uma nuvem de fumaça sobre o relatório da CPI que o acusa de vários crimes na
condução da pandemia, não se sabe se foi para encobrir o preço de botijão de
gás, da energia elétrica, dos combustíveis, e dos alimentos que estão nas
alturas, enfim, o fato é que na live o presidente, mais uma vez, abriu a boca
para proferir aberrações: “Só vou dar notícia, não vou comentar. Já falei
sobre isso no passado, apanhei muito…vamos lá: relatórios oficiais do governo
do Reino Unido sugerem que os totalmente vacinados… quem são os totalmente
vacinados? Aqueles que depois da segunda dose né… 15 dias depois, 15 dias após
a segunda dose.. totalmente vacinados…estão desenvolvendo Síndrome da
Imunodeficiência Adquirida muito mais rápido do que o previsto. Portanto, leiam
a matéria, não vou ler aqui porque posso ter problema com a minha live”,
disse ele.
A
estapafúrdia declaração foi dada na live de quinta-feira, 21. Mais uma vez
usando dados de estudos sem a menor credibilidade, publicados por um site
inglês bem ao estilo bolsonarista, desses que são especialistas em publicar fake
news e em elaborar teorias da conspiração. O site também já publicou outras
notas, notícias fake sobre a vacina.
É
inimaginável que um presidente da República venha a público, dirigindo-se a
seus seguidores, através das redes sociais para dizer que pessoas totalmente vacinadas
estão desenvolvendo a aids. Reparem, caros leitores e leitoras, que ele, mais
uma vez, joga o veneno no ar. Se pegar, pegou.
E
do jeito que são os bolsonaristas, réplicas de zumbis ou de robôs, que
acreditam em tudo o que o presidente fala, é de apostar que já tem muitos deles
por aí, certos que quem toma vacina contra a Covid pode desenvolver a aids.
Isso é de uma irresponsabilidade sem tamanho.
Por
essas e outras, não tem como chamar o presidente de criminoso. Foi ele quem, no
início da pandemia chamou o vírus letal de “gripezinha”. Foi ele quem
incentivou o povo a desobedecer às regras de distanciamento social. Também foi
ele que disse que grande parte da população brasileira não queria tomar vacina,
e as comprou tardiamente depois de muita pressão. Foi esse mesmo irresponsável que
criticou o uso de máscaras e todos os outros cuidados a serem tomados para
barrar a transmissão do vírus.
Diante
de tal aberração dita pelo presidente a comunidade científica logo se levantou
para desmentí-lo. Políticos de vários partidos também usaram suas redes sociais
para criticá-lo. “É gravíssimo o presidente da República, por qualquer
forma, tentar atrapalhar o processo de vacinação dos brasileiros. Bolsonaro faz
isso há muito tempo. A última delas é um absurdo, um atentado, tentar atribuir
à vacinação a possibilidade de adquirir alguma doença como a Aids. É preciso
que o Judiciário e o próprio Congresso se posicione, porque um presidente da
República não pode ser tratado como uma criança irresponsável”, disse o senador
Alessandro Vieira, do Cidadania.
As
redes socias dessa vez não cruzaram os braços e agiram fortemente contra a fala
do presidente. No domingo, o Facebook tirou do ar a nociva live. No fim da
tarde desta segunda, o Youtube decidiu suspender por uma semana o canal do
presidente. O Instagram também derrubou o vídeo.
A
atitude das redes sociais ainda foi muito tímida, pois Bolsonaro deveria ser
banido das redes sociais, assim como foi banido delas o ex-presidente americano,
Donald Trump. Afinal de contas, Bolsonaro e seus asseclas, usam as redes
sociais como quem usa o campo para plantar joio em vez de trigo, e o joio que
eles plantam é a desinformação e ódio.
Definitivamente,
o Brasil não merece um presidente como Jair Bolsonaro. Chamo para encerrar este
artigo o ator Wagner Moura, que depois de vários adiamentos, finalmente, se
prepara para o lançamento de Marighella, primeiro filme dirigido por
ele, e que tem o cantor e ator, Seu Jorge, no papel principal, vivendo o
guerrilheiro e escritor Marighella.
Em entrevista ao jornal Folha de São Paulo, publicada em 23 de outubro Moura fala do filme e do Brasil atual. O jornalista, Leonardo Sanchez, pergunta como Wagner Moura analisa o governo Bolsonaro para além da cultura, ao que Moura responde: “Eu costumo dizer que a vitória do Bolsonaro nas eleições foi trágica, mas pedagógica. Esse cortejo de mediocridade que vem atrás dele mostra que o Bolsonaro não é um alien, não veio de Marte. Ele é um personagem profundamente conectado ao esgoto da história brasileira, que nos mostra que o Brasil não é só um país de originalidade, de beleza, de potência, de diversidade, de biodiversidade.
O favor que o Bolsonaro nos fez foi revelar esse outro Brasil, que estava camuflado; foi nos mostrar que nós também somos um país autoritário, violento, racista, de uma elite escrota. O Brasil é um país que nem é mais uma piada internacional. Quando os estrangeiros vêm falar com a gente, eles falam com pena. Agora nós temos que enfrentar isso!”
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