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Manaus: Um caos anunciado

Posted by Cottidianos on 22:49

Segunda-feira, 18 de janeiro

Falta de oxigênio em hospitais de Manaus

Dizem que um raio não cai duas vezes. Mentira. Fake news. Caí, sim. É o que estamos vendo acontecer em Manaus, Amazonas. O raio da catástrofe caiu duas vezes no mesmo lugar. Uma faísca terrível e desesperadora. 

No ano passado, o país viu a capital amazonense com superlotação de hospitais e de UTIS, e tendo que fazer covas coletivas para enterrar seus mortos por Covid-19. Uma cena assustadora.

Dessa vez foi ainda pior. Semana passada, o país viu cenas de filme de terror acontecendo em Manaus. O oxigênio acabou e pacientes morreram asfixiados em UTIS, ou mesmo em casa. Médicos tendo que decidir quais pacientes iriam salvar ou deixar morrer. Não por crueldade deles, obviamente, mas sim, por que era uma escolha necessária naquele momento, diante da gravidade da situação.

Agora, imaginem como não deve estar o coração daquele profissional que fez a opção por salvar vidas, e que prestou, solenemente, no ato de formatura, um juramento prometendo salvá-las, tendo que decidir entre a vida e a morte de um paciente.

Porém, todo esse filme de horror em Manaus — e quem dera fosse apenas um filme, uma ficção — foi uma tragédia anunciada, da qual participaram diversos atores que compõem. Dela participaram os governos de todas as esferas, e toda a sociedade amazonense. Todos atuaram nos papéis principais. Não há atores coadjuvantes.

Vejamos uma retrospectiva do que aconteceu para termos uma ideia mais clara do que foi afirmado acima.

Quarta-feira, 23 de dezembro

Véspera de Natal

Já antevendo as aglomerações que estavam por vir em decorrência das festas de Natal e Ano Novo, o governador do Amazonas, Wilson Lima (PSC), anunciou um decreto com um endurecimento das medidas sanitárias para conter o avanço da Covid-19, que aquela altura, já parecia sem controle no estado. Segundo esse decreto, as medidas entrariam em vigor no sábado, dia 26, e durariam até o dia 10 de janeiro. As medidas previam o “fechamento” de serviços não essenciais. 

O termo fechamento foi colocado entre parêntesis neste blog por que, de fato, não era um fechamento dos serviços não essenciais, mas apenas um leve endurecimento das medidas de distanciamento social, um falso lockdown, digamos.

E, em entrevista coletiva, o próprio governador declarou que não pretendia fazer um lockdown, mas apenas um “equilíbrio’ para que houvesse um funcionamento mínimo da economia. “São decisões que nós não queríamos tomar, mas que são necessárias”, disse ele na ocasião.

Por exemplo: Pelo decreto, serviços não essenciais poderiam funcionar pelo sistema de drive thur, até as 21hs. Feiras e mercados também funcionariam até determinado horário. Hotéis continuariam abertos, mas os restaurantes destes atenderiam apenas aos hóspedes. Serviços públicos estariam suspensos. Os serviços de transportes intermunicipais estariam mantidos, mas poderiam funcionar com capacidade reduzida.

Estas foram algumas medidas do decreto assinado pelo governador. Um erro: deveria ter sido decretado um lockdonw de verdade, com medidas rígidas, e não apenas um paliativo.

Ainda durante o anúncio do decreto o governador fez uma leve crítica à administração municipal, dizendo que não estava havendo empenho, por parte dela, no apoio às medidas por ele decretadas. “Nós tivemos um grande problema aqui na por conta da ausência da prefeitura. Todas as capitais brasileiras assumiram suas responsabilidades de estabelecerem medidas restritivas e recomendações, ao contrário da Prefeitura de Manaus, que não fez uma ação efetiva sequer”, disse ele.


Protesto no centro de Manaus contra fechamento do comércio

Sábado, 26 de dezembro

Centro de Manaus

Revoltados com as medidas, leves, diga-se de passagem, adotadas pelo governador, uma multidão se reuniu no centro da capital amazonense em protesto contra o decreto estadual que estabelecia o “fechamento” do comércio não essencial por quinze dias.

Às nove horas da manhã a multidão tomava a avenida Eduardo Ribeiro, uma das principais ruas do centro comercial de Manaus. Diversas ruas precisaram ser bloqueadas por causa do protesto.

A multidão, revoltada contra uma medida que visava frear os casos de Covid-19 no estado, cantava o hino nacional, gritava palavras de ordem, enquanto caminhava pela avenida.

“Os lojistas passam o ano todinho se preparando pra dezembro, pra você fechar agora governador. Isso não existe. Você tem o que comer, mas muita gente não tem o que comer”, gritava um lojista.

Outros seguravam cartazes com os dizeres: “Precisamos trabalhar”.

Enfim, esse foi o tom do protesto. A multidão enlouquecida e furiosa dava ouvidos a políticos e empresários irresponsáveis, e parecia totalmente esquecida de que, entre abril e maio, o estado vivia o pior período da pandemia, quando o sistema público de saúde entrava em colapso, com quase 100% dos leitos de UTI ocupados. Todo esse caos provocou também uma crise no sistema funerário. Centenas de corpos precisaram ser enterrados em vala comum.

Um desses políticos irresponsáveis que incentivou o povo de Manaus foi o deputado federal, Eduardo Bolsonaro. “Búzios e agora Manaus. Todo poder emana do povo”, escreveu o deputado em post no Twiter.

27 de dezembro

Depois dos protestos do dia anterior que provocou bloqueamento de ruas, que teve barricada de fogo, muitos gritos de protesto, e muita, mas muita aglomeração, o governador Wilson Lima cometeu o seu segundo erro: voltou atrás na adoção das medidas que havia anunciado no dia 23. Autorizou a abertura do comércio, sem restrições.

“Houve, durante essas manifestações, aglomerações, havia muitos trabalhadores de fato, havia também muitos oportunistas, ações de vandalismo, e isso acabou fazendo com que a gente sentasse e construísse um caminho de entendimento pra que houvesse esse equilíbrio entre a proteção da vida e o mínimo de funcionamento das atividades econômicas”, disse ele na ocasião.

Os manifestantes, em gesto de ameaça, também cercaram a casa do governador. Sobra essa questão ele disse: “A minha preocupação era com a minha esposa e a minha filha, que tem 5 meses, mas não chegaram a vir aqui na frente. Porém, é lamentável que situações como essa estejam acontecendo. Você pode até não concordar com uma decisão que é tomada pelo governo, que é tomada por uma autoridade, mas vandalismo, incitação à violência, esse tipo de situação não é permitida, e esse é um comportamento e uma atitude que a gente rechaça com muita veemência”.

O governador Wilson Lima deveria ter sido mais firme. Culpa também tem a administração municipal que não deu apoio ao decreto do prefeito.

Culpa do governo federal nem se fala. Desde o início sabemos que a linha adotada pelos manifestantes é mesma linha de raciocínio adotada pelo presidente, desde o início da pandemia: totalmente contrário às medidas  de combate ao coronavírus indicadas pelas autoridades em saúde, e postas em prática pelos governadores e prefeitos. Lockdown para ele é coisa de gente de esquerda, e distanciamento social, máscaras faciais de proteção, e álcool gel, coisa de maricas, de gente fraca.

Porém, para falar sobre a culpa do governo federal, eu trago aqui a fala da Dra. Deisy Ventura, especialista na relação entre pandemias e direito internacional. Deyse falou no sábado, 16, ao programa Revista CBN, na rádio CBN.

“Na verdade, não existe omissão. Existe uma ação clara do governo federal para a disseminação do vírus. Ele faz isso por meio de normas. Ele vetou normas. O presidente da República vetou normas importantíssimas de combate à pandemia, relativas ao uso de máscaras, relativas ao plano de combate à doença entre as comunidades indígenas. Tentou fazer no início da pandemia uma medida provisória que trazia pra ele, exclusivamente, a competência pra dispor sobre atividades que seriam essenciais ou não. Além de tudo obstruiu o trabalho de diversos governadores e prefeitos. Tentou requisitar insumos, declarou guerra aos governadores no ano passado, enfim, faz propaganda contra a saúde pública de uma forma ostensiva, mentindo que existe tratamento precoce contra a Covid-19, tentando empurrar cloroquina e outros medicamentos sem eficácia comprovada pra população e, mais recentemente, tentando desacreditar as vacinas, e, particularmente, a vacina do Instituto Butantã, semeando a confusão, informações falsas falando em jacaré, enfim, tudo isso que a gente sabe. Parece incompetência, parece loucura..., mas não é, infelizmente, não é. Se agente for estudar os atos normativos, os atos de instrução do governo federal e a propaganda contra a saúde pública que é bastante sistemática, bastante organizada…, a gente vê que é uma intensão.”

Depois de o governador ter voltado atrás e revogado o decreto que endurecia as medidas contra a Covid-19, deputados bolsonaristas comemoraram o fato. O ex-ministro da cidadania e deputado federal, Osmar Terra (MDB-RS), escreveu em sua rede social: “Embora noticiário alarmista, Manaus tem queda importante de óbitos desde julho, mostrando a imunidade coletiva (de rebanho) em formação e se manteve assim até o último dia do ano. As escolas reabriram em setembro e não houve alteração da curva de óbitos como mostra o gráfico”.

A deputada Bia Kicis (PSL-DF), também através de redes sociais, elogiou as pessoas que protestaram contra as medidas do governador do Amazonas. “A pressão do povo funcionou em Manaus. O governador voltou atrás em seu decreto de lockdown. Parabéns, povo amazonense, vocês fizeram valer seu poder”, escreveu ela.

Sobre essas comemorações, Eduardo Bolsonaro também fez seu post comemorativo, e já foi citado acima.

Nos últimos dias, após a repercussão das notícias que chegavam de Manaus, a deputada, Bia Kicis voltou as redes sociais para falar sobre o caos em Manaus, cidade com UTIS superlotadas e com falta de oxigênio para oferecer aos pacientes. “Apontando os verdadeiros responsáveis pelo caos e o drama dos doentes e familiares em Manaus. Toda minha solidariedade aos que estão sofrendo e até morrendo por falta de oxigênio. Corrupção mata!”.

Sim, deputada, é verdade que corrupção mata, mas também é verdade que atitudes como a da senhora e de diversos outros políticos bolsonaristas, que incentivam o povo a descumprir medidas sanitárias, também mata. A irresponsabilidade de seu comportamento, junto com a irresponsabilidade de seus companheiros negacionistas, perante uma pandemia também já ajudou a matar milhares de brasileiros, ao fazer com que eles ignorassem o perigo que representa uma doença desconhecida e tão grave como a Covid-19.

Questionada pela CNN sobre o assunto, mesmo depois de ver o número de casos de Covid-19 aumentar no país inteiro, a deputada ainda continua negando a eficácia do lockdown. “O país da América do Sul que adotou por mais tempo o lockdown foi a Argentina, no entanto não resolveu. Outro exemplo é a Alemanha. Em todos os países que medidas de restrição (lockdown) foram aplicadas, não houve qualquer redução do COVID-19. Vidas são salvas com tratamento e sem desvios de recursos que deveriam ir para hospitais e compra de equipamentos. Muitas pessoas estão morrendo por falta de oxigênio. A deputada foi a parlamentar do DF que mais destinou verbas para a saúde conforme matéria pública pelo Correio Braziliense”, disse ela.

No caso de Manaus, errou o prefeito que não apoiou as medidas. Errou o governador que não teve pulso firme para manter o endurecimento das medidas sanitárias. Erraram os empresários e políticos bolsonaristas que incentivaram a população a irem às ruas protestar. Errou a população que atendeu a esse chamado, mesmo já tendo vivido momentos de horror provocados pelo coronavirus no ano passado.

No país como um todo, os casos de coronavírus tem aumentando bastante nos últimos dias. E, da mesma forma que em Manaus os governos de vários níveis tem culpa nisso tudo, e, principalmente, grande parcela da população que resolveu desafiar o coronavírus.

Hoje, temos 209.868 óbitos por causa da Covid-19, e 8.483.105 casos confirmados da doença. Onze estados tem alta no número de mortes pelo coronavírus. As festas e aglomerações do fim de ano, mesmo em meio à pandemia, agora vem cobrar seu preço. Enquanto isso, ainda continuamos vendo comportamentos irresponsáveis se repetirem por aì, muitas vezes, por parte de pessoas que deveriam dar o exemplo.

Uma boa notícia é que, neste domingo, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) aprovou dois pedidos emergenciais : as vacinas Coronavac e a produzida pela Universidade de Oxford.

A primeira brasileira a ser vacinada foi a enfermeira Mônica Calazans, de 54 anos. A vacinação ocorreu no domingo dia 17, logo em seguida aprovação das vacinas pela Anvisa. No momento, o Brasil só dispõe da Coronavac para se aplicada nos seus cidadãos. Logo a Coronavac, tão criticada pelo presidente Jair Bolsonaro, e seus seguidores.


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Brincando com o perigo

Posted by Cottidianos on 00:44

 Quinta-feira, 14 de janeiro

Imagine o leitor, a leitora, que está navegando pelas redes sociais e dá de cara com o post abaixo,

Passo a passo para andar sem máscara no shopping de forma legítima, sem ser admoestado e ainda posar de bondoso:

1- Compre um sorvete.

2- Pendure a máscara no pescoço ou na orelha, para afetar elevação moral;

3- Caminhe naturalmente.

Para completar o post, há logo abaixo do texto, um vídeo para deixar bem claro como fazer isso.

 Como viram o post dá a receita de como andar sem máscara em um shopping sem ser perturbado por ninguém. Imagine ainda que isso acontece em meio à pandemia de coronavírus, no Brasil, onde o número de casos da doença voltou a crescer assustadoramente.

Em outro post, do mesmo perfil do Twitter, por ocasião das festas de fim de ano, você se depara com a hastag:

Feliz Ano Novo!

#AglomeraBrasil

Logo abaixo desses singelos votos de Feliz Ano, um vídeo mostra as imagens feitas no último dia de 2020, e início de 2021, que mostra uma praia lotada, muita comemoração, e fogos coloridos explodindo, como se a pandemia já tivesse ficado bem para trás, ocasião em que todos comemorassem o início do novo ano como se o coronavírus fosse coisa do passado.

Obviamente, se você não se encaixa no grupo dos negacionistas ficaria escandalizado. Pensaria certamente que estas postagens teriam sido feitas por algum iletrado, sem conhecimento algum da realidade de dor e sofrimento que nos cerca no momento presente.

Pasmem, leitoras e leitoras, esses posts são reais e foram feitos por uma juíza.

O nome dela é Ludmila Lins Grillo, e atua na Vara da Infância e da Juventude, na cidade de Buritis, estado de Minas Gerais.

O vídeo do #Aglomera Brasil foi postado em 1 de janeiro deste ano, e a “receita” de como andar no shopping sem máscara, em 04 de janeiro. Ambos os vídeos viralizaram nas redes sociais.

Em outra foto ainda, que mostra a Rua das Pedras, na Praia de Búzio, Rio de Janeiro, cheia de gente, ela escreveu: “A cidade resiste a estupidez”.

Depois das repercussões negativas, a juíza não se intimidou e ainda ironizou o Conselho Nacional de Justiça. Em um post, dessa vez no Facebook, a juíza escreveu: “Vou chamar o CNJ”. Acompanhando este post havia um boneco chorando. Post e ilustração, claramente, ironizando as críticas recebidas.

O advogado José Belga Assis Trad entrou com uma reclamação contra a juíza no CNJ, pedindo que o órgão investigue a conduta da magistrada. Na reclamação o advogado argumenta que, contrariando os esforços das autoridades sanitárias, dos profissionais de saúde, e do próprio CNJ, a juíza defende, abertamente, aglomerações e festas. No documento, Trad cita uma postagem da juíza, feita em vídeo que mostra pessoas aglomeradas em Búzio, Rio de Janeiro. Diz o título da postagem da juíza: “Uma cidade que não se entregou docilmente ao medo, histeria ou depressão”.

No documento, Trad pede ainda que o órgão apure a conduta ética da juíza para ver se ela cometeu infração ético disciplinar, uma vez que o Código de Ética da Magistratura Nacional é repleto de exigências feitas aos magistrados, dentre elas a de que o magistrado ou magistrada se comporte de na vida privada de um modo que dignifique sua função.

O caso está em análise do CNJ, porém o órgão tem sido brando no trato com magistrados que tem esse tipo de comportamento. Um comportamento, que, diga-se de passagem, empurra as pessoas para a morte.

As postagens da juíza, Ludmila Lins Grilo, tornam-se ainda mais irresponsáveis e perigosas, uma vez que ela tem milhares de seguidores em suas redes sociais, atuando, dessa forma, também como influenciadora digital.

Entretanto, é bom a juíza Ludmila olhar ao redor. Se olhar, vai ver que o coronavírus ama gente o que o desafie. Ele gosta de ser desafiado. Ele, geralmente, acaba mostrando quem é que manda.

Vejamos, apenas três exemplos.

O apresentador Stanley Gusman, comandava o programa Alterosa Alerta, na TV Alterosa, uma filial do SBT, em Minas Gerais. Gusman sempre minimizou os efeitos da pandemia em seus programas.

Na véspera do Natal, 24, diante do aumento de casos em BH, o prefeito Alexandre Kallil foi às redes sociais divulgar um vídeo com mensagem de Natal. No vídeo o prefeito diz: “Eu tenho certeza de que no ano que vem vamos estar passando um Natal abraçando, beijando, porque a vacina está batendo na porta. Então, não vamos morrer na praia, estamos chegando na praia. Todo o sacrifício que for feito pela população de Belo Horizonte neste Natal vai ser muito, muito valorizado no Natal do ano que vem. E tomara que no Natal do ano que vem todos falem o seguinte: a Prefeitura de Belo Horizonte avisou, olha a nossa alegria agora em 2021. Eu sei que vai ser um Natal diferente, que para todo mundo vai ser muito difícil, mas nós sabemos que temos que garantir o nosso Natal de 2021, 22, 23, 24... Por isso, vou passar um Natal longe de toda a minha família. Vou passar um Natal feliz, porque a vacina está chegando. Eu não quero que no Natal do ano que vem todos eles estejam chorando a minha presença”.

Imediatamente, o apresentador rebateu a fala do prefeito: “Eu vou visitar meu pai, vou visitar minha mãe, e não vou mata-los. Eu acho um desrespeito o senhor falar isso em público”.

É certo que o apresentador foi visitar os pais e não os matou, mas, por outro lado, se matou. Ou melhor, o Covid-19 o matou.

Logo após suas críticas ao prefeito de Belo Horizonte, no dia 31 de dezembro de 2020, Gusman confirmou a um seguidor nas redes sociais que estava com Covid. O seguidor estranhou sua ausência nas redes sociais e o questionou a esse respeito, ao que Gusman respondeu: “Covid, irmão”.

No domingo, 19 de janeiro deste ano, Stanley Gusman, 49 anos, faleceu em decorrência daquele de quem ele tanto havia desdenhava: o coronavírus.

A segunda vítima da Covid-19 elencada nestes três exemplos trata-se do Superintendente do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), do Rio Grande do Sul, Tarso Teixeira, de 69 anos. Tarso também era diretor vice-presidente da Federação da Agricultura do Rio Grande do Sul (Farsul). O superintendente, que era uma importante liderança ruralista no Rio Grande do Sul, morreu na manhã de segunda-feira, 04 de janeiro.

No ambiente de trabalho — imagina-se que fora dele também — Tarso não estava nem aí para essa coisa toda de respeitar normas sanitárias, muitos menos de usar máscaras de proteção. Distanciamento social? Passava bem longe dele. Além disso, pressionou os funcionários para que retornassem ao trabalho sem os devidos cuidados e segurança necessária contra a Covid-19.

Em várias ocasiões promoveu reuniões com dezenas de pessoas no gabinete dele, sem a preocupação com o uso de máscaras, nem com distanciamento social.

Por causa desse comportamento, foi denunciado ao Ministério Público pela associação de servidores do Incra no RS.

Tarso Teixeira pagou com a vida pelas próprias irresponsabilidades ao desafiar uma doença tão perigosa.

A terceira vítima da lista elencada por este blog refere-se ao pastor evangélico, Thiago Andrade de Souza. Bolsonarista convicto, ele integrava o Movimento São Paulo Conservador. Ela um ferrenho defensor do uso da cloroquina e ivermectina.

No dia 26 de novembro ele escreveu no Facebook: “Se você tomou ivermectina, azitromicina ou hidroxicloroquina, poste no Facebook e, se não precisou tomar e é a favor, poste que é a favor. Vamos forçar as prefeituras a começarem a prevenção urgente. E fazer a distribuição gratuita”.

O pastor, certamente, deve ter tomado muita Cloriquina e Ivermectina, medicamentos sem eficácia comprovada, e tão amplamente defendidos pelo presidente. Mas não adiantou. Mais uma vida ceifada pelo coronavírus. Thiago se foi aos 36 anos.

Isso são apenas três exemplos de negacionistas que foram vitimados pela doença que ignoravam. Zombavam do perigo, sem saber que ele estava em qualquer esquina. E quantos milhares adeptos da seita, que, por ora, ocupa a presidência do Brasil, também não sucumbiram ao darem ouvidos às palavras de um presidente negacionista?

O número de mortos por Covid-19 tem batido nos últimos dias a casa do 1000 mortos em 24 horas. Isso porque nem chegaram ainda os contaminados nas festas do réveillon com Covid realizadas em todas as partes do país. Reivellon de praias lotadas, muita comemoração, beijos, abraços, como se não existisse covid. Os números dessa farra toda se farão conhecer dentro de mais uma ou duas semanas.

Segundo dados levantados pelo consórcio de imprensa junto as Secretarias Estaduais de Saúde, nas últimas 24 horas o Brasil registrou um total de 1.283 mortes. Agora o total de mortos pela doença no Brasil é de 206.009. O país já totaliza 8.257.459 brasileiros contaminados pelo vírus.

Enquanto isso, é triste e lamentável o politização que se formou em torno da vacina. Por questões políticas o governo federal faz de tudo para que a vacina produzida no Brasil pelo Instituto Butantã, em parceria com o laboratório chinês Sinovac, não seja logo aprovada pela Anvisa. São barreiras e mais barreiras para que a vacina demore em ser aprovada em uso emergencial.

Por falta de planejamento, ou má vontade mesmo, ainda não temos uma data nacional definida como certa para que a vacina comece a ser aplicada no país. E mesmo se a vacina começasse a ser aplicada hoje nos brasileiros, o país ainda enfrentaria outro problema: a falta de seringas.

Ou seja, vemos por parte deste governo, e do Ministério da Saúde, uma completa desorganização e falta de logística. É como uma guerra. A batalha contra o coronavírus deve ser encarada como uma guerra. Em um combate tudo deve ser planejado antes. Você não pode ir de encontro às tropas inimigas, tendo planejado a ação um dia antes. Se agir assim, de forma tão irresponsável, é certo que muitos combatentes perderão a vida.

Tolo e irresponsável é o comandante que planeja uma batalha um dia antes de ela acontecer. Toda essa logística da compra da vacina e dos insumos necessários para que ela seja administrada na população deveria ter sido feita meses antes, e não agora, em cima da hora, como o governo está fazendo.

Esse blog falou acima dos negacionistas que desafiaram o coronavírus e foram vítimas dele. Mas, como sabemos, o vírus mortal não escolhe correntes, nem classes, nem sexo, nem idade, nem qualquer outro critério. Aliás, é um vírus que não tem critério nenhum. Ele mata negacionistas e não negacionistas.

Maguito Vilela

Foi com tristeza que o Brasil recebeu, hoje pela manhã, a notícia do falecimento de Maguito Vilela, prefeito licenciado de Goiânia. Maguito foi diagnosticado com Covid-19 em plena campanha eleitoral, em 20 de outubro.

Inicialmente, ele sentiu apenas sintomas leves. “Realizei o exame tipo RT-PCR e testei positivo para a Covid-19. Estou com sintomas leves da doença, como coriza e rouquidão. Em respeito ao próximo e ao protocolo médico ficarei em casa nos próximos dias. Obrigado a todos pelas manifestações de carinho”, escreveu ele no Twitter no dia 20 de outubro, ás 8 e 52 da manhã. .

Sete dias depois a doença se agravou e o candidato foi transferido de Goiânia para o hospital Albert Einstein, em São Paulo com um comprometimento pulmonar que variava de 50 a 75%.

Em São Paulo, Maguito Vilela lutou bravamente contra a doença. Foi entubado duas vezes. No dia 03 de dezembro, finalmente, ele testou negativo para a Covid-19. E foi transferido para um leito de UTI comum do hospital. E também passou por uma cirurgia para estancar o sangue dos pulmões. No dia 11 do mesmo mês, ele apresentou sangramento nos pulmões. Fez uma cirurgia e acabou desestabilizando a pressão.

Maguito escapou da Covid-19, mas não conseguiu escapar das sequelas por ela deixadas. Ele faleceu na manhã deste dia 13 de janeiro. Em agosto deste ano ele já havia sofrido ao perder duas de suas irmãs para a doença.

Mesmo sofrendo no leito do hospital, a candidatura de Maguito não foi retirada. Ele concorreu ao pleito e foi eleito, em segundo turno, com 52,60% dos votos válidos. Na tarde da sexta-feira, 01 de janeiro, Maguito Vilela chegou a tomar posse como prefeito eleito no quarto de UTI do Albert Einstein, onde estava internado. A cerimônia acontecia em um auditório da Universidade Federal de Goiás, e o prefeito tomou posse através de vídeo chamada.  

Estavam todos muito esperançosos de que ele voltasse e ocupasse o seu lugar de direito na condução da prefeitura de Goiânia. Mas, as sequelas deixadas pela Covid-19, o levaram a trilhar outro caminho: o caminho da eternidade.

Maguito Vilela parte aos 71 anos de idade.

À ele e a todas as vítimas da Covid-19, este blog presta homenagem e eleva orações.


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Esperanças e desesperanças

Posted by Cottidianos on 16:01

 Quinta-feira, 07 de janeiro

Joe Biden e Kamala Harris

Parabéns, Joe e Kamala

O sol raiou. A liberdade venceu.

Parabéns Joe Biden. Sorte no governo e na condução do povo americano em direção a uma era de paz, bem diferente da era atribulada em que viveram os americanos, sob uma guerra de fake News de disse-me-disse.

O ato de confirmação de Joe Biden como presidente do Estados Unidos era para ser apenas mais um ato burocrático, como acontece sempre após as eleições americanas. Entretanto, ninguém esperava que fosse tão tumultuada. Nem os mais pessimistas.

A confirmação enfim se deu na madrugada desta quinta-feira, 07, pelo Congresso americano. O novo presidente tomará, posse em 21 de janeiro. Melhor ainda seria se o insano Donald Trump fosse afastado de suas funções até lá . Acho que as coisas seriam menos tensas. Querendo ou não os americanos se sentem sob tensão. Se perguntando se algo pior do que ontem ainda ocorrerá nos próximos dias. Espera-se que não. Afinal, os EUA são espelho para as demais democracias ao redor do globo, e se esse espelho se quebra, se racha ao meio, então como ficará o papel dos americanos nas mediações de conflitos em que constantemente se envolvem?

Mais cedo, na tarde do dia anterior, numa sessão conjunta, Câmara e Senado americano se reuniam para o ato de confirmação de Joe Biden e Kamala Harris como presidente e vice-presidente dos Estados Unidos. Era o último passo para confirmar a vitória da dupla.

Quando os congressistas já estavam reunidos e a sessão já havia sido iniciada, foi então que a barbárie aconteceu.

Centenas de manifestantes apoiadores do presidente Trump conseguiram furar a barreira policial e invadiram o Capitólio. A confusão estava armada. Os bárbaros ocuparam e depredaram o prédio. Os debates que estavam ocorrendo na Câmara e no Senado foram interrompidos e os congressistas tiveram que procurar lugar seguro para se abrigar. O prédio foi evacuado.  A confusão deixou ao menos 4 mortos.

Toda essa confusão teve um articulador: o próprio presidente Donald Trump. O ainda presidente nunca aceitou a derrota nas urnas. Sempre disse que as eleições haviam sido fraudadas. Foram inúmeros os recursos, inúmeras as manobras para reverter o resultado das eleições. Todas elas restaram infrutíferas. Então só restava a Trump fazer os americanos experimentar um fruto amargo que eles nunca haviam experimentado antes: um golpe.

Um golpe que, felizmente, não teve sucesso. Não tem outra palavra para o que populista Trump tentou fazer. Quando ele incentivou os seus manifestantes a marcharem até o Capitólio estava incentivando-os a tomar o poder pela força. Isso é comportamento típico dos ditadores.

Quem, dentre os próprios americanos, diria que, ao apagar as luzes do governo Trump, ele ainda iria fazer os Estados Unidos passarem uma vergonha gigantesca perante o mundo?

Uma coisa dessas não deve, e não pode ficar impune. Mas isso, cabe as altas esferas das autoridades americanas, decidir.

Agora, só nos resta desejar que o Joe Biden faça um bom governo e volte a unir um país que um populista dividiu em ódios e notícias falsas.

Bolsonaro e Trump

A cópia

O que aconteceu nos Estados faz a nós brasileiros ficar com as barbas de molho. Afinal, também temos um presidente populista, que gosta de espalhar fake news, e que adota os mesmos métodos que o Trump.

O presidente brasileiro também é adepto da teoria da conspiração na qual as eleições norte-americanas foram uma fraude. Ao saber do que aconteceu ontem nos Estados Unidos, ele ainda defendeu essa tese. Enquanto líderes mundiais foram a público reprovar a invasão do Congresso norte-americano, o líder brasileiro silenciou.

Hoje, 07, ele ainda insistia nessa tecla da fraude. Ele disse que a falta de confiança nas eleições norte-americanas é que tinha levado a essa confusão.

Sempre a apoiadores no Palácio do Planalto, que são quem engolem com facilidade a conversa fiada do presidente, ele disse: “Se nós não tivermos o voto impresso em 22, uma maneira de auditar o voto, nós vamos ter problema pior que os Estados Unidos”, disse o presidente, e acrescentou: “O pessoal tem que analisar o que aconteceu nas eleições americanas agora. Basicamente, qual foi o problema, a causa dessa crise toda. Falta de confiança no voto. Então, lá, o pessoal votou e potencializaram o voto pelos correios por causa da tal da pandemia e houve gente lá que votou três, quatro vezes, mortos que votaram. Foi uma festa lá. Ninguém pode negar isso daí. Então, a falta desta confiança levou a este problema que está acontecendo lá. E aqui no Brasil, se tivermos o voto eletrônico em 22, vai ser a mesma coisa”.

Ou seja, as sementes da desconfiança no sistema de votação por urnas eletrônicas brasileiro já estão sendo plantadas desde já, pelo próprio presidente e pela indústria de fake news que o sustenta.

Agora, tem algo perigoso, bastante perigoso para nós em relação ao americanos, se nos acontecesse algo semelhante, é que os militares americanos bateram o martelo: Nós estamos do lado da democracia.

Por aqui, com todos esses afagos que o governo faz aos militares, tendo sido, inclusive, o governo invadido pelos militares nos primeiro e segundo escalão, teriam eles a mesma atitude?

Então o que aconteceu nos Estados Unidos também serve de forte lição para nos  fazer refletir, e não só isso, nos impulsiona a uma ação de que é preciso fortalecer a democracia e suas instituições cada vez mais, para que em um futuro, talvez não muito distante, não vejamos por aqui o que vimos por lá.

Mudando de assunto, hoje o Brasil deverá atingir a marca dos 200 mil mortes por coronavírus. O nosso azar foi termos, no meio dessa pandemia, um governo genocida. Sim, genocida, pois se o governo tivesse adotado as medidas sanitárias cabíveis, o coronavírus não teria dizimado tantas vidas no Brasil.

Nesta quinta-feira, 7, falando à apoiadores, sempre a eles — que como já foi dito acima, e é repetido agora, engolem com facilidades as falas do presidente — ele rejeitou esse título de genocida: “Querem me tachar de genocida. Quem que eu matei? Muito pelo contrário. Eu, com as minhas medidas, sugeri tratamento precoce. Evitamos muitas mortes. Nós salvamos vidas com este tratamento precoce”, disse Bolsonaro.

Detalhe, com o tal do tratamento precoce Bolsonaro fala da Cloroquina, remédio sem eficácia comprovada pela ciência no combate ao coronavírus.

A metralhadora de ódio de Bolsonaro não poderia deixar de ser dirigida à imprensa, seu alvo favorito. Se o país vai mal, se o coronavírus mata, se a economia não decola, a culpa é sempre da imprensa e nunca da incompetência do presidente, nem da desorganização que é este governo.

A imprensa não tem o que fazer, daí fica 'falta seringa, incompetência'. Queria que eu comprasse superfaturado para ser tachado agora de corrupto. Agora estão dizendo que vai faltar seringa, como nós estamos segurando para Covid, vai faltar seringa para outras doenças. São canalha”.

O presidente não é só incompetente, ele é perverso. Quando cientistas do mundo todo correm atrás da produção de uma vacina eficaz, tendo, inclusive, em vários países já começado a aplicação das doses. Num momento em que pessoas do mundo todo anseiam por essa dose salvadoras da vacina, ele desestimula os seus apoiadores a tomar a vacina. Já foram várias as declarações do presidente nesse sentido. Nesta quinta-feira, 07, ele falou aos seus apoiadores que apenas uma pequena parte da população brasileira é que pretende tomar vacina. Enquanto a grande maioria não a deseja: “E outra: alguém sabe quantos por cento da população vai tomar vacina? Pelo que eu sei, menos da metade da população, pelo que eu sei. E esta pesquisa que eu faço, faço na praia, faço na rua, faço em tudo quanto é lugar”.

Observem que o pesquisador é o próprio presidente e que a pesquisa que ele citou é feita entre os seus apoiadores. É muito perigoso esse tipo de estímulo. É como se 200 mil pessoas mortas pelo coronavírus no Brasil não bastassem. Como um vampiro, ele precisa de mais sangue. Como um sádico, ele precisa de mais gente morta.

João Dória anuncia Coronavac

Esperança

Em meio a todo esse céu cinzento, vem para nós, brasileiros, uma boa notícia. Estudos finais mostraram que a Coronavac obteve uma eficácia de 78 a 100%.  Sendo que 78% refere ao índice de prevenção dos casos leves da doença, e 100% aos casos moderados e graves que foram completamente eliminados com a aplicação da vacina. O estudo não mostrou nenhuma morte ou internação de voluntários infectados.

A vacina Coronavac é um trunfo do governador de São Paulo na guerra política que mantém com o presidente Jair Bolsonaro, mas neste caso, não é uma vitória do Dória, mas uma vitória da ciência. Óbvio que ele fará uso político dessa situação. Mas que diferença isso faz, quando na outra extremidade tem um presidente dizendo para as pessoas não tomarem a vacina. Como diz o ditado: “Dos males, o menor”.

Os resultados do estudo foram apresentados a Anvisa hoje pela manhã. Já foram iniciadas as negociações para o pedido de uso emergencial do imunizante. A Anvisa tem 10 dias para aprovar a vacina. Mas a expectativa do governo paulista é a de que a agência faça isso em menos tempo.

Já em alguns momentos dessa discussão a Anvisa pareceu adotar uma linha política para atender aos interessas nada republicanos de Bolsonaro. Claro, os dirigentes da agência negam o fato. Mas isso pareceu bem claro em alguns momentos. Talvez por isso, Dória tenha feito um alerta: “Que a Anvisa em nenhum momento atenda a pressões de ordem ideológica”.

A Coronavac está sendo produzida em parceria com o laboratório chinês, Sinovac. Um exército de cientistas se debruçam sobre suas laminas e microscópio para produzir o imunizante. A contribuição do exército de voluntários que aceitou participar dos testes também foi de grande importância. 12.476 voluntários de 16 centros clínicos em 8 estados brasileiros receberam duas doses da vacina, em um intervalo de 14 dias entre cada dose.

Desde início de dezembro, João Dória vem sustentando a afirmação de que pretende iniciar a vacinação no estado de São Paulo em 25 de janeiro. Por que essa data? Porque é uma data marcante: aniversário da cidade de São Paulo. E pelo visto vai conseguir cumprir a promessa. O que será um grande presente para os paulistas, paulistanos, e para todos aqueles que moram no estado.

Certamente, a atitude do governador João Dória irá provocar também os governadores de outros estados, pois estes olham para São Paulo e veem a campanha de vacinação prestes a ser iniciada. E de outro lado, olham para o governo federal e veem inércia e planos vagos e inconsistentes. Até agora, o governo não estipulou uma data concreta para iniciar a imunização dos brasileiros.

Ontem, o ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, fez um pronunciamento em rede nacional de rádio e TV. O pronunciamento foi breve, e não explicou muita coisa. Só sabemos de fato que o plano de vacinação do governo federal será gratuito e não obrigatório. Nem data precisa foi anunciada.


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O ano do coronavírus e seu legado

Posted by Cottidianos on 23:39

Terça-feira, 05 de janeiro

Praia de Copacabana, manhã de quarta-feira, 1 de janeiro de 2020


Escandalosas!

Não tem outra palavra para classificar a aglomeração que se formou nas praias brasileiras neste fim de ano. Parecia que vivíamos ainda em um tempo em que não havia pandemia, em que o coronavirus não existia.

A maioria sem máscaras, zero de distanciamento social, estavam abertamente flertando com o perigo. Realmente, espantoso.

Claro, que tudo isso tem um preço e ele pode ser muito alto para os brasileiros, e a fatura poderá ser cobrada já a partir desse mês de janeiro.

Também o aprendiz de presidente foi à praia, e imagina o que ele fez? Provocou aglomeração, como sempre faz. Ele é um dos seres para os quais, o vírus não existe. Segundo ele, isso é invenção da mídia. Opiniões como essa também são de arrepiar. É inacreditável que alguém acredite numa insanidade dessas. E pior de tudo é que tem muita gente que acredita. É de se perguntar, e até mesmo de se fazer um estudo sobre onde foi parar a inteligência e o bom senso dessas pessoas. Fica a dica para os acadêmicos.

Já bem perto de o Brasil atingir a triste marca dos 200 mil mortos pela doença, o aprendiz de presidente ainda se dá ao luxo de fazer piada sobre um dos itens de proteção essencial indicado pelas autoridades da saúde: a máscara.

Quando questionado sobre o não uso da máscara durante sua estada na praia, Bolsonaro fez piada. “Sabia que o tio estava na praia nadando de máscara? Mergulhei de máscara também para não pegar Covid nos peixinhos”.

Nesta terça-feira pela manhã, Bolsonaro, respondendo a um apoiador, disse que o Brasil estava quebrado, e que ele não conseguia fazer nada. E, de quebra, atacou a imprensa, dizendo que o vírus foi potencializado pela mídia sem caráter que há no Brasil.

Uma boa resposta a mais essa asneira dita presidente foi dada por William Bonner, apresentador do Jornal Nacional, ao mostrar a notícia o apresentador comentou ao final: “Os números oficiais das secretarias estaduais de Saúde mostram que o vírus a que se refere o presidente Jair Bolsonaro está se espalhando a taxas maiores desde dezembro. Esse vírus contaminou quase 8 milhões de pessoas no país todo e levou luto às famílias e aos amigos de mais de 197 mil cidadãos brasileiros”.

O presidente da Câmara, Rodrigo Maia, criticou a declaração de presidente: “É grave e desalentador porque você olha para os próximos dois anos sem entender o projeto de país que ele [Bolsonaro] tem. Desde o fim de 2019 e durante a pandemia, a mensagem do presidente se pareceu mais com a do deputado que representa corporações do que com a do presidente que representa o estado”, disse ele ao blog da jornalista Natuza Nery. E acrescentou: “Primeiro, o Brasil não está quebrado. Segundo, um governo que não tem projeto de país não tem condição de apontar os caminhos para solucionar os nossos problemas”.

Economistas também criticaram a declaração do presidente.

O fato é que o ano da pandemia nos causou, e continua causando a todos nós, de todas as partes do mundo, inúmeros problemas. Porém alguma lição você deve ter tirado de tudo isso. Não é possível que alguém tenha passado incólume por este ano da peste, sem alguma reflexão, sem mudanças de hábitos e atitudes.

O coranavírus chegou em 2020 e deixou um legado trágico. E não falo do número de contagiados e mortos pela doença, nem do sobrecarrego que provocou no sistema de saúde. Isso é óbvio. Fala-se disso a todo instante na mídia.

Falo do triste legado econômico que a peste deixará nessa área. Um legado que pode jogar bilhões de pessoas na mais extrema pobreza. Obviamente, as nações mais ricas se recuperarão mais rápido desse golpe. Já as nações mais pobres e com menos recursos, sofrerão mais os efeitos de todo esse caos.

Para complementar esse texto, deixo, até como forma de reflexão, um excelente análise sobre o ano do coronavírus e o legado que ele deixa. O texto foi traduzido de um artigo da revista VOA (Voice of America), uma publicação destinada a estudantes da língua inglesa.

O texto, cujo título é O ano do coronavíruse seu legado,  foi escrito pelo jornalista Jamie Dettmer, e publicado no último dia do ano de 2020. 

Que o leitor viaje com ele nos questionamentos que faz no texto e tire suas próprias conclusões sobre o momento atual tão conturbado em que vivemos.

 

***



 O ano do coronavírus e seu legado

 

Jamie Dettmer

31 de dezembro, 2020

 

Retornaremos ao normal?

É a pergunta que está feita em todo o mundo enquanto o triste ano de 2020 se transforma em 2021.

E há várias perguntas adicionais.

As vacinas contra o coronavírus são eficazes? Quanto tempo durará a imunidade? Um número suficiente será vacinado para permitir a eliminação do vírus? O vírus sofrerá mutação mudando sua forma genética, forçando os cientistas a lutar para recuperar o atraso?

E mesmo que o vírus seja eliminado, as repercussões políticas, sociais, e econômicas de longo prazo da pandemia significam que a vida nunca voltará ao normal? Por outro lado, deveríamos apenas querer uma retomada do status quo?

O mundo estava fora de si mesmo antes do coronavírus virar tudo de cabeça para baixo.

Com a crise financeira de 2008/2009, as ordens políticas estabelecidas já estavam já estavam sendo perturbadas pelo aumento do populismo.

Escrevendo em seu livro pré-coronavírus, Age or Anger: A history of the Present (Tempo de Raiva Uma história do presente), o ensaísta indiano, Pankaj Mishra, argumentou que muitas pessoas se sentiam impotentes perdendo a fé nas autoridades políticas tradicionais para protegê-las ou em sua capacidade de restaurar a previsibilidade tranquilizadora.

O ressentimento crescia com as distribuições cada vez mais desiguais de riqueza e poder. Os “esquecidos” queriam um novo acordo. E a ascensão de novos poderes também estava começando a abalar o status quo, reacendendo velhos ressentimentos e desencadeando novos conflitos.

Tudo isso veio antes do mortal vírus para testar os governos, adicionando ainda mais imprevisibilidade e suspeita. E agora, a crise de saúde pública transformou-se em uma hidra multifacetada de perturbações interligadas.

Dezenas de milhões de pessoas perderam seus empregos. E quando o completo tsunami de repercussões econômicas chegar, dizem os economistas, as fileiras dos desempregados vai aumentar. “Embora a vacinação em massa indique o fim da pandemia de Covid-19 no próximo ano, ela não fornece imunidade contra danos econômicos de longo prazo”, diz Stephen Roach, um membro sênior da universidade de Yale e ex-economista chefe do Morgan Stanley, banco de investimento com sede em Nova Iorque. Covid 19 é a doença causada pelo coronavírus.

“Pesquisas recentes sobre o impacto das 19 grandes pandemias que datam do século 14 — cada uma delas com contagem de mortos superiores a 100.000 — destaca a longa sombra da carnificina econômica”, acrescenta ele.

Os governos estão fazendo empréstimos enormes ou escavando as reservas para tentar resistir à pandemia, na esperança de que o crescimento econômico pós pandemia vai se acelerar rapidamente e restaurar o equilíbrio.

No livro clássico do autor italiano Giovanni Boccaccio, O Decamerão, concluído logo após a peste negra do século 14, sete jovens mulheres e três jovens homens, escapam da peste bubônica e se retiram para uma vila fora de Florença. Lá eles narram 100 contos para se ocuparem. O livro termina com o grupo voltando para Florença a fim de retomar a vida que levavam antes da peste.

Mas pandemias e doenças deixam suas marcas, e a história das pandemias sugere que muitos não conseguirão retomar suas vidas pré-contagiosas. Pragas e pestes já reformularam países antes. Elas também podem condenar impérios. De acordo com o historiador americano Timothy Winegard, autor de The Mosquito: A Human History of Our Deadliest Predator (O mosquito: Uma História Humana de Nosso Predador Mais Mortal), publicado no ano passado, uma nova cepa virulenta de malária pode ter contribuído para o declínio da Roma antiga.

Na Inglaterra, os efeitos de longo prazo da Peste Negra medieval foram de longo alcance, de acordo com o historiador Tom James, com “agricultura, religião, economia, e até mesmo classes sociais afetadas. A Grã-Bretanha medieval foi irreversivelmente mudada”, escreveu ele um documentário para a BBC. O mesmo aconteceu com o norte da Itália de Boccaccio.

Analistas e historiadores alertam que a pandemia lançará uma longa sombra econômica. “Mudanças duradouras na maneira como fazemos compras e nos socializamos provavelmente afetarão de modo significativo certos setores”, diz Stephen Machin, diretor do Centro de Desempenho Econômico da London School of Economics. “A incerteza sobre o curso da pandemia significa que a recuperação pode até ser mais lenta. Consequentemente, as cicatrizes econômicas tem um potencial considerável de corte ainda mais profundo”, acrescenta.

A produção econômica mundial será cerca de 7% menor do que seria devido a pandemia, de acordo com as projeções.

As Nações Unidas alertaram que mais de 207 milhões de pessoas podem ser empurradas para a extrema pobreza até 2030, devido ao severo impacto de longo prazo da pandemia, elevando o número para mais de um bilhão.

Outros economistas preveem uma aceleração da tendência pré-coronavírus em direção a uma desglobalização, que por sua vez corre o risco de retardar o crescimento econômico, reduzindo a renda per capita. Mohamed El-Erian, o principal consultor econômico da Allianz, empresa multinacional europeia de serviços financeiros, previu “um impulso geral para  a desglobalização”.

Alguns indivíduos serão mais afetados que outros”, diz Brian Bell, economista do King’s College London. “Os que tem maior probabilidade de ficar desempregados são o jovens, os que tem menos qualificações, os trabalhadores negros e os de baixa remuneração. Semelhantes às recessões anteriores, a crise do Covid-19 tem potencial para marcar um grande número de pessoas, a maioria delas já em situação precária”, acrescenta.

Da mesma forma, são as economias mais vulneráveis e mais pobres que sofrerão mais. Oxford Economics, uma consultoria, diz: “As cicatrizes econômicas gerais de longo prazo serão ligeiramente maiores nos mercados emergentes do que nas economias avançadas”, em parte devido à rigidez do mercado de trabalho, desequilíbrios financeiros e aos limites rígidos que os governos podem oferecer em termos de apoio fiscal aos seus cidadãos e às empresas em dificuldades. Em seus cartões de pontuação, Filipinas, Peru, Colômbia, Malásia, Índia e Argentina estão entre os países que provavelmente sofrerão o pior impacto econômico.

A pandemia levará a alguma melhora?

Otimistas dizem que algo de bom pode resultar do ano da peste, assim como algo de bom também emergiu das pandemias anteriores. Os historiadores dizem que a Peste Negra acelerou o fim do feudalismo, devido ao empobrecimento de muitos aristocratas e proprietários de terras.

Enquanto alguns temes uma polarização política ainda mais profunda, os otimistas observam que a pandemia do coronavírus também viu sinais de maior solidariedade social. Nos Estados Unidos, tem havido uma proliferação de redes de ajuda mútua com pedidos de ajuda e ofertas de assistência através do Facebook e em outros sites de mídia social. Vizinhos e membros das redes de ajuda mútua ajudaram a alimentar famintos, a quem não usa máscaras, e a fazerem compras para idosos e enfermos. Isso pode deixar para trás um apetite mais agudo por ativismo social de base, unindo mais os bairros, dizem os ativistas.

Da mesma forma, os italianos demonstraram um forte senso de solidariedade cívica durante grande parte de 2020. De vilarejos italianos no topo das colinas a cidades grandes, muitos italianos tem se esforçado para ajudar as autoridades municipais a garantir que os idosos e vulneráveis recebam alimentos e atenção. Foram os italianos que lideraram o caminho, enquanto o mundo fechava nos primeiros dias da pandemia, para mostrar seu apoio aos profissionais de saúde, de linha de frente cantando em suas varandas. A performance noturna espontânea e coral inspirou outros europeus a fazer o mesmo.

Legados restantes?

Para muitos funcionários de colarinho branco, a pandemia provocou uma mudança do trabalho de escritório para o trabalho em casa, especialmente em economias avançadas e bem estruturadas. Alguns observadores preveem que a mudança pode ser duradoura e ter benefícios. Os trabalhadores domiciliares tem mais controle sobre seu tempo, permitindo-lhes maior liberdade de decidir quando fazer as tarefas, dando-lhes mais opções de como conciliar trabalho, vida familiar e lazer.

Eles não perdem tempo se deslocando e alguns estudos sugerem que há ganho de produtividade também; embora outros se preocupem com a perda de interação social e digam que os funcionários que trabalham em casa correm o risco de ficarem isolados

A redução do tráfego de passageiros também traz benefícios ambientais e climáticos, reduzindo a pressão sobre a infraestrutura de transporte e os custos, e diminuindo as emissões de gases de efeito estufa, de acordo com a Capital GES, uma consultoria de empregos com sede na Suíça que trabalha em 25 países. Alguns estudos alertaram que os benefícios climáticos podem ser atenuados, no entanto, pelo aumento do aquecimento e  resfriamento das casas.

Os ativistas da ação climática esperam que a pandemia atue como um grande incentivo para repensar a relação entre os humanos e a natureza, dizendo que o coronavírus é um lembrete dramático de que o mundo natural não deve ser dado como certo. Alguns governos afirmam que os planos de recuperação econômica são uma oportunidade única em cada geração de iniciar uma recuperação verde.

Se 2020 nos ensinou alguma coisa, é que não podemos ter pessoas saudáveis sem um planeta saudável”, disse Inger Andersen, diretor executivo do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente.


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