Instabilidades
Quinta-feira, 21 de julho
Encontro de Bolsonaro com embaixadores
Não é o objetivo nesse artigo fazer uma
biografia do presidente Jair Bolsonaro — mas vamos dar aqui algumas pinceladas
antes de prosseguirmos antes de abordar o assunto do encontro do presidente com
os embaixadores na segunda-feira, 18, em Brasília.
Bolsonaro começou sua carreira no
serviço militar na Escola de Cadetes de Campinas, São Paulo. Aqui chegou — digo
aqui, pois é de Campinas que escrevo este blog — em 08 de março de 1973, apenas
duas semanas antes de completar 18 anos.
A Escola de Cadetes foi a porta de entrada do jovem Jair Bolsonaro para
o serviço militar.
A partir daí seguiu seu caminho nas
Forças Armadas. Colegas de Jair no serviço militar o descrevem como alguém com
grande aptidão física e disposto ao serviço, porém não foi por isso que ficou
“famoso” por lá.
Naquele ambiente ele já demostrava sua
capacidade de provocar instabilidade. Em 1986, ele escreveu um artigo publicado
na revista Veja, na qual fazia críticas aos baixos salários pagos aos soldados
e oficiais de baixa patente pelo alto comando das Forças Armadas.
No artigo, intitulado, “O salário está
baixo”, ele escreve: “Como capitão do
Exército brasileiro, da ativa, sou obrigado pela minha consciência a confessar
que a tropa vive uma situação crítica no que se refere a vencimentos”. Por
causa disso, ficou 15 dias preso num quartel.
No ano seguinte, a Veja publicou uma
reportagem que revelava os supostos planos de Jair Bolsonaro e o amigo Fábio
Passos, de explodir bombas em instalações militares a fim de pressionar o alto
comando dos militares a aumentar os salários.
Foi instalada uma investigação. Os dois
negaram os fatos. No primeiro julgamento foram condenados. Recorreram então ao
Superior Tribunal Militar (STM). Ali foram absolvidos por falta de provas por 9
votos a 4.
Por levantar a bandeira de melhores
salários para os oficiais e soldados de baixa patente, Bolsonaro era admirado
por eles nessa época. Amado pelos soldados e odiado pela alta cúpula.
Talvez tenha sido por essa razão: ser
admirado pelos colegas de farda, é que Jair Bolsonaro tenha sido absolvido
naquele julgamento. Talvez os juízes tenham tido receio de aplicar a ele uma
pena severa a ele, e causar indignação e revolta nos baixos oficiais, talvez
até um motim. E assim, Bolsonaro saiu livre e solto das acusações.
Após esses fatos, Jair Bolsonaro deixou
o serviço militar e foi tentar a carreira política. Se deu bem. Já na primeira
tentativa foi eleito vereador na cidade do Rio de Janeiro, em 1989, tendo como
plataforma de campanha a defesa dos interesses corporativistas.
Em seguida, tentou uma vaga na Câmara
dos Deputados, e conseguiu. O primeiro mandato dele como deputado deu-se entre
1991 e 1995. O ex-campeão do exército passou 27 anos na Câmara dos Deputados na
qualidade de deputado medíocre, baixo clero, sem conseguir aprovar nenhum
projeto de grande relevância.
Chamava a atenção por lá, não pela sua
capacidade, inteligência, e disposição para elaborar projetos de grande
relevância, nem para o povo do Rio, nem para a nação brasileira.
Naquela casa legislativa ele chamava a
atenção por suas falas homofóbicas, preconceituosas contra mulheres, negros,
indígenas, homossexuais. A uma coisa Bolsonaro foi fiel: ao corporativismo
militar. Dessa base, ele sempre atendeu os interesses. Daí se explica o apoio
que os militares deram a sua campanha.
O jornal O Estado de Minas, fez uma
compilação de 10 frases ditas por Bolsonaro quando ele era deputado, se o
leitor quiser lê-las basta clicar no link, reproduzirei aqui apenas uma: “O erro da ditadura foi torturar e não matar”.
Disse Bolsonaro em entrevista a uma rádio, em junho de 2016.
Pois bem, o tempo foi passando e
Bolsonaro resolveu se candidatar a presidente. Quando lançou sua candidatura à
presidência da República, em agosto de 2018, ninguém o levou muito a sério.
Mas, para espanto de todos, e surfando na onda do antipetismo, ele conseguiu.
Veio o governo de Jair Bolsonaro e a
história toda vocês acompanharam. Uma tragédia para o Brasil. Época de
retrocessos em TODAS as áreas.
Em 2018, havia o sentimento antipetista
como já disse acima. E Bolsonaro se anunciou como aquele que iria combater a
corrupção. Deixar a “velha política” fora do jogo. Logo as máscaras caíram e a
corrupção também apareceu no governo dele. A Lava Jato foi assassinada, morta e
enterrada.
A velha política voltou ainda com mais
força, tendo o Centrão como grande destaque. Como recompensa por tanta
dedicação, o Centrão ganhou a chave do cofre do orçamento na Câmara dos
Deputados, e o poder de indicar quem quiser e puder para cargos em todos os
escalões do governo. Tornou-se íntimo dos habitantes do Palácio do Planalto.
Passou da sala para a cozinha com muita desenvoltura.
Uma prova da grande influência dos
abutres do Centrão nesse governo foi a aprovação da PEC 1/2022, apelidada de
PEC-Kamikaze. Uma PEC que cria benefícios em ano eleitoral, o que é proibido
pela Lei Eleitoral. Porém, o governo
armou as coisas de um jeito tão bem amarrado que oposição e situação votaram
pela sua aprovação mesmo assim. Na Câmara dos Deputados, Arthur Lira fez
verdadeiros malabarismo para que a PEC fosse aprovada a todo custo.
E assim o capitão vai prosseguindo:
governando pouco ou quase nada, e cometendo muitos crimes. Por muito menos, a
ex-presidente Dilma Rousseff sofreu impeachment.
Em 2018, o inimigo era o PT. Mas agora o
presidente Jair Bolsonaro não tem a mesma moral para se autoproclamar um governante
que luta pelo combate à corrupção, pois ela está entranhada no seu governo, e
na sua família.
Mas é preciso haver um inimigo. Criar
narrativas. E quem foi o escolhido dessa vez? Adivinhem! Ela a urna eletrônica.
Essa, sim, segundo ele, é a grande vilã das eleições brasileiras. Ela que foi
lançada nas eleições de 1996 e desde então se tornou a principal protagonista
da maior eleição informatizada do mundo, se tornou para Jair Bolsonaro, a
inimiga.
Vejam, notem o detalhe: A urna
eletrônica foi usada pela primeira vez nas eleições de 1996. E Jair Bolsonaro,
contando o tempo de sua eleição como vereador, em 1989, foi eleito, na grande
maioria das vezes através desse instrumento. E o mais impressionante ainda:
três de seus filhos entraram na vida pública e também foram eleitos pelo
sistema de votação eletrônica. E nunca, nenhum deles, falou qualquer coisa a
respeito da confiabilidade das urnas eletrônicas.
Bastou o ex-presidente Lula voltar a
disputa para que as urnas eletrônicas se tornassem a grande vilã, sendo que,
desde que elas começaram a ser usadas, não houve nenhum episódio comprovado de
que elas tenham sido fraudadas. Houve acusações é verdade, mas todas elas já
foram desmentidas pelo Tribunal Superior Eleitoral.
Já faz tempo Jair Bolsonaro faz esses
ataques. Ora ele ataca os ministros do TSE, ora ele ataca os ministros do STF,
ora ele ataca as urnas eletrônicas. Tudo isso numa tentativa de desqualificar,
não apenas o processo eleitoral brasileiro, mas o Judiciário como um todo. É
isso que as instituições brasileiras não podem e não devem permitir.
Bolsonaro já fez live, deu entrevistas,
falou no cercadinho contra as urnas eletrônicas, mas a último ato dele nesse sentido
foi inacreditável e, simplesmente, ridículo.
Na segunda-feira, 18, o presidente usou
a máquina governamental e a estrutura do Palácio do Planalto e ali reuniu
embaixadores de diversos países. Ancorado numa apresentação em power point —
com erros de inglês — o presidente repetiu a mesma ladainha que nós já estamos
acostumados a ouvir.
Também sem apresentar provas, o
presidente lançou dúvidas sobre a confiabilidade das urnas eletrônicas, e sobre
o processo eleitoral brasileiro. Jair Bolsonaro também aproveitou a ocasião
para atacar o ex-presidente, Lula, que concorre ás eleições deste ano e está em
primeiro lugar nas pesquisas.
Sobrou veneno para Edson Fachin,
presidente do Tribunal Superior Eleitoral, e também para Luís Roberto Barroso e
Alexandre de Moraes, ambos do Supremo Tribunal Federal STF.
Auxiliando Bolsonaro nessa tragicomédia
estavam os ministros Carlos França (Relações Exteriores), Ciro Nogueira (Casa
Civil), Paulo Sérgio Nogueira (Defesa), Luiz Eduardo Ramos (Secretaria-Geral),
e Augusto Heleno (Gabinete de Segurança Institucional).
Acho que nunca houve algo parecido em
outro lugar no mundo, essa coisa de um presidente da República chamar os
embaixadores para um evento para falar mal das instituições de seu próprio país,
e o que é ainda pior, fazer a elas acusações sem provas.
Várias autoridades e partidos de
oposição deram declarações contra as falas de Bolsonaro. Só quem silenciou
foram Arthur Lira, presidente da Câmara dos Deputados, e Augusto Aras,
Procurador-Geral da República. O primeiro, como já disse, tem a chave do cofre
na mão, e faz parte do Centrão, que, hoje, é quem, de fato, governa o país. O
segundo, está de olho em uma vaga no STF. Como diz o ditado, “para bom
entendedor, meia palavra basta.
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