0

Carta aos Brasileiros

Posted by Cottidianos on 23:33

Sexta-feira, 29 de julho de 2022




 Há tempos temos visto o presidente Jair Bolsonaro, diuturnamente, atacar a urnas eletrônicas, o processo eleitoral brasileiro, os ministros do Supremo Tribunal Federal, do Tribunal Superior Eleitoral, a democracia. Tudo isso era assistido e ouvido passivamente pelos brasileiros e, mais ainda, pelo demais Poderes que constituem a República.

E aqui nem falo da Câmara dos Deputados, e nem da Procuradoria Geral da República, por que os que comandam esses órgãos Arthur Lira e Augusto Aras, respectivamente, tornaram-se, por puro interesse e conveniência, vassalos de Bolsonaro. O primeiro de olho na fortuna do Orçamento Secreto e nos cargos que o governo pode distribuir para o Centrão, e o segundo, de olho, talvez, numa sonhada vaga no STF.

Diante das investidas de Bolsonaro contra a democracia, o que se via desses órgãos, inclusive do STF, eram tímidas notas de repúdio que nem chegava citar, diretamente, o nome do responsável por esses ataques.

Mas enfim, sempre há uma gota d’água a fazer transbordar o copo. E penso que essa gota d’água foi a convocação dos embaixadores para reunião no Palácio do Planalto, no qual, mais uma vez, ele fez ataques infundados à democracia, às urnas eletrônicas, e até mesmo, ameaçou não haver eleições, marcadas para outubro deste ano.

E essa forte reação, por incrível que pareça, não veio do STF, nem do TSE, nem da Câmara dos Deputados, nem do Senado Federal, mas sim, da sociedade civil.

Dois dias após inusitado encontro do presidente os embaixadores — na qual eles próprios ficaram estupefatos com tal reunião na qual foram chamados para ouvir fake news relativas às urnas eletrônicas ditas pelo governante da nação — a Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), lançou o documento “Carta aos Brasileiros em defesa do Estado Democrático de Direito”.

O documento foi divulgado na terça-feira, 26, no site da universidade, site no qual também é possível assinar o documento. Com apenas três dias de lançamento a carta já conseguiu reunir mais de 400 assinaturas. Também deve ser lançada uma versão em inglês do documento, uma vez que, depois do Brasil, os Estados Unidos são o país que tem mais acessos à página. No ranking de acesso, após Brasil e EUA, estão Portugal, Reino Unido e Alemanha.

Mas nem todo mundo quer democracia. Há aqueles que preferem viver sob o julgo das ditaduras. Prova disso é que desde que foi lançada a página já sofreu mais de 2.300 tentativas de ataque hacker. “Tentam invadir o sistema e tentam principalmente derrubar o site. Pelo que soubemos, colocaram nosso site na deep web e estão incentivando as pessoas a derrubar o site por lá. Eles estão usando palavras de baixo calão, xingamentos, agressões, e tentam se inscrever por outras pessoas, para depois deslegitimar a lista”, disse o procurador-geral do Ministério Público de Contas do Estado de São Paulo, Thiago Pinheiro Lima, um dos idealizadores do evento, em entrevista ao portal G1.

Porém, ainda segundo Thiago, esses ataques já eram esperados e para a página também foi pensado forte esquema de segurança. Tanto é que nenhum desses ataques, muitos feitos por especialista em ataques hacker, conseguiu derrubar a página.

Entre os que assinam a carta estão nomes de peso nas mais diversas áreas de atuação da sociedade. Assinando o documento estão banqueiros, juristas, políticos, artistas, empresários.

E adivinhem quem anda bastante irritado com um movimento em favor da democracia. Se você pensou no presidente Jair Bolsonaro, acertou. Na quinta-feira, 27, em uma convenção do partido Progressitas, em Brasília ele ironizou a Carta aos Brasileiros, dizendo que não precisava de nenhuma “cartinha” para demonstrar seu apoio às instituições.

Aprovietando a onda iniciada pela USP, a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), também prepara manifesto em defesa da democracia, e que deverá ser lido separadamente, mas durante o evento no Largo de São Francisco, no mesmo evento que lançará a Carta aos Brasileiros, da Faculdade de Direito da USP. A carta da Fiesp será assinada por entidades.

Na live desta quinta-feira, 28, Bolsonaro disse que o manifesto a favor da democracia organizado pela Fiesp é uma para beneficiar o também candidato à presidência, Luís Inácio Lula da Silva.

Bolsonaro também lançou na live a Carta de Manifesto em Favor da Democracia. Obviamente sem o peso, a seriedade, e a importância da iniciativa feita pela Faculdade de Direito da USP. Para assinar o manifesto da universidade, a pessoa tem que entrar na página, assinar nome, colocar CPF, no manifesto lançado pelo presidente na rede social, basta uma curtida.



A “Carta aos Brasileiros”, tem um quê de histórica. Em 08 de agosto de 1977, um Pátio das Arcadas da Faculdade de Direito da USP, no Largo de São Francisco repleto de estudantes, gente do povo, artistas, políticos, empresários, juristas, professores, o professor Godoffredo da Silva Telles Junior lia a Carta aos Brasileiros.

Naquela época, o Brasil viva sob a cortina do ferro da ditadura e o manifesto lido pelo professor a toda a sociedade brasileira era também um ato de repúdio a ditadura. A gota d’água naquela época havia sido uma alteração da constituição permitindo que se criasse os senadores biônicos e adotava outras medidas de restrição da liberdade.

No próximo dia 11 de agosto, no mesmo cenário, a Faculdade de Direito, no Largo de São Francisco, será lida uma nova versão da Carta aos Brasileiros. No passado estávamos vivendo em plena ditadura e queríamos uma democracia. Hoje, vivemos numa democracia e estamos dizendo que queremos permanecer nela, diante dos ataques à democracia e ameaça de golpe feitas constantemente pelo presidente Jair Bolsonaro.

Nessa luta contra o voto eletrônico Bolsonaro tem tentado puxar para o lado deles os militares, categoria que não faz o menor sentido estar querendo dar palpites em eleições. O papel deles é cuidar da defesa do país. Também não se pode dispensar a participação dos militares nesse processo, porém, eles devem colaborar, e colaboram muito na parte logística.  

Falando em militares, o Brasil sedia entre 25 a 29 de julho, a 15ª Conferência de Ministros de Defesa das Américas (CMDA). 34 países enviaram representantes para a reunião. O evento foi criado em 1995 e se destina a promover o conhecimento recíproco, a análise, o debate e troca de ideias e experiências na área de Defesa. A CMDA acontece a cada dois anos.

Na terça-feira, 26, no discurso de abertura, o ministro da Defesa brasileiro, Paulo Sérgio Nogueira, disse que respeita a Carta Democrática Interamericana, aprovada em 1º de Setembro de 2001, durante sessão especial da Assembleia da Organização dos Estados Interamericanos (OEA), Lima, Peru. A carta tem como objetivo principal a luta pelo fortalecimento da democracia e o repúdio às rupturas da ordem democrática.

Nesta quinta-feira, 28, o ministro assinou a Declaração de Brasília, documento elaborado durante a Conferência. O documento defende a defesa dos valores democráticos e a promoção da paz. A Declaração de Brasília também foi assinada por ministros de Defesa de outros 20 países.

Alguns pontos aqui. O primeiro é que o ministro da Defesa de um país democrático dizer que é a favor da democracia nem deveria ser notícia, deveria ser algo tão normal que não merecesse manchete. Só por aí a gente vê que há algo que não se encaixa. Um ponto fora da curva.

Segundo é sobre que conceito de democracia tem o ministro da Defesa. Democracia para ele pode não ser a mesma coisa que para nós que acreditamos nos valores democráticos. Por exemplo, Bolsonaro diz que é democrata, que respeita a democracia, mas age de forma a desdizer isso. Ontem mesmo, como falei, lançou na rede social dele um manifesto em defesa da democracia. Mas com certeza o conceito que o presidente tem democracia, não é o mesmo que o nosso.

Por esse motivo ponho  pé atrás com Paulo Sérgio Nogueira, ministro da Defesa, pois ele tem ajudado a colocar lenha nessa fogueira da desconfiança em relação às urnas eletrônicas armada pelo presidente Jair Bolsonaro.

O jornalista Guilherme Amada relata em sua coluna no site do Metrópole, que Paulo Sérgio Nogueira, no dia 06 de julho, se recusou a responder a uma pergunta sobre a possibilidade de um golpe militar.

O fato se deu após uma reunião da Comissão de Relações Internacionais e Defesa Nacional, realizada na Câmara dos Deputados. O jornalista perguntou ao ministro se havia alguma chance de um golpe militar no Brasil. Ao que o ministro respondeu: “Ah, pô, tu vai me perguntar isso aqui agora? Dá licença aí”. Antes da reunião, enquanto discursava, Nogueira cometeu um ato falho ao chamar Bolsonaro de general, e logo em seguida, corrigiu a falha.

Em junho, o ministro da Defesa havia enviado um ofício ao Tribunal Superior Eleitoral no qual dizia que as forças Armadas estavam se sentindo desprestigiadas no grupo de transparência das eleições criada pelo Tribunal. No ofício, Paulo Sérgio também diz que “não interessa concluir o processo eleitoral sob a sombra da desconfiança dos eleitores”.

Para mim, essa frase do ministro soa como uma ameaça. Também quando ele fala em “desconfiança dos eleitores”, ele deve estar se referindo não à totalidade dos eleitores, mas dos eleitores de Bolsonaro.

Não poderia terminar esse texto sem falar da varíola dos macacos.

O Brasil registrou nessa sexta-feira, 29, a primeira morte pela doença. A vítima é um homem, 41 anos, morador da cidade de Uberlândia, Minas Gerais. Segundo o Ministério da Saúde, a vítima tinha imunidade baixa, sofria de câncer, e outras comorbidades, o que contribuiu para o agravamento da doença que o levou à morte. Essa foi a primeira morte provocada pela doença registrada fora da África.

A varíola dos macacos, até agora, foi diagnosticada em 16 mil pacientes, espalhados em 74 países. No dia 23 de julho a OMS classificou a doença como emergência de saúde global. Aqui no Brasil já foram detectados 900 casos da doença.

Para terminar, de fato, esse texto, convido o leitor a assinar a Carta aos Brasileiros, manifesto iniciado pela Faculdade de Direito da USP, e fazer parte dessa história.

Segue o link para a página.

https://direito.usp.br/noticia/3f8d6ff58f38-carta-as-brasileiras-e-aos-brasileiros-em-defesa-do-estado-democratico-de-direito


0 Comments

Postar um comentário

Copyright © 2009 Cottidianos All rights reserved. Theme by Laptop Geek. | Bloggerized by FalconHive. Distribuído por Templates