Quarta-feira,
24 de junho
“Ai, Xangô, Xangô menino
Da
fogueira de São João
Quero
ser sempre o menino, Xangô
Da
fogueira de São João
Céu
de estrela sem destino
De
beleza sem razão
Tome
conta do destino, Xangô
Da
beleza e da razão
Viva
São João / Viva o milho verde
Viva
São João / Viva o brilho verde
Viva
São João / Das matas de Oxossi
Viva
São João”
(São João, Xangô Menino – Caetano Veloso)
Hoje,
24 de junho, é dia São João Batista. Acho que, dentre todos os dias do ano,
hoje é o dia em que mais sinto saudades de meu querido nordeste. Para os
nordestinos, especialmente, hoje é dia festa e alegria. Mesmo distante, sinto o
calor das fogueiras, o som de um animado forró — ritmo característico da
região nordeste. Dia de São João também me lembra de partilha, amor,
fraternidade e união.
Quando
criança e adolescente, nesse dia, passava em varias casas de familiares e
amigos e, em cada uma delas, provava umas das deliciosas comidas típicas:
pamonha, canjica, milho verde cozido ou assado, bolo de milho, arroz doce, e
tantas outras delícias. Também, especialmente, nesse dia, me vem forte a
lembrança de minha mãe, à beira do fogão de lenha, preparando as tão aguardadas
guloseimas.
Ao
povo nordestino, meu carinho especial, e meu abraço.
No
misticismo afro-brasileiro, São João Batista é sincretizado com Xangô menino.
Inspirado
na forte espiritualidade que emana das religiões afro-brasileiras,
escrevi o texto abaixo. Se pudesse defini-lo em duas palavras chaves, eu usaria
PAZ e JUSTIÇA, sentimentos tão ausentes e tão necessários aos homens de
qualquer tempo, especialmente aos homens de mulheres de nosso tempo.
Apenas
o texto em parágrafo recuado, e em itálico, não é de minha autoria. Encontrei-o,
bastante reproduzido, e de autor desconhecido, na Internet.
Mais
uma vez, meu grande e carinhoso abraço ao povo nordestino.
Salve
São Batista! Saravá Xangô menino!
***
O
poder do machado que transforma pedras em flor
Um
deslumbrante sol de raios multicoloridos passeava em sua carruagem de fogo
pelos céus de Aruanda, cidade de luz, ao norte da Ionosfera da terra. Plano
espiritual de transição, em Aruanda residem muitos espíritos de luz que se
dividem entre a ajuda aos irmãos que ainda se encontra em desenvolvimento nessa
dolorosa via de expiação que é a Terra, e outros que preparam os irmãos que já
desencarnaram para seguir seu caminho espiritual e eterno, se já se encontram
com suas auras limpas. Caso contrário, se ainda estão sob o peso do ódio, da
vingança, do egoísmo e da maldade, são levados a casas de recuperação, onde
seus sofridos espíritos passam por um processo de desobsessão.
Nesse
elevado plano incorpóreo, habitam seres empenhados em praticar o bem e a
caridade. Na terra, eles se manifestam na roupagem fluídica de caboclos,
preto-velhos e crianças. Na morada celeste, entretanto, podem assumir a
verdadeira essência luminosa de seus espíritos. Em resumo, podem ser eles
mesmos, sem disfarces. No comando dessa grandiosa colônia espiritual estão os
Orixás, palavra que significa “a luz que se revela”. Essas forças invisíveis, indivisíveis,
e transcendentes estão em atividade constante, influenciando e ajudando a todos
no plano material e imaterial. Os orixás são espíritos elevados que estão muito
além da compreensão humana, e talvez, por isso mesmo, tão incompreendidos.
Cada
um desses seres divinos representa uma das forças da natureza. Não é de admirar
que em Aruanda, tudo funcione com perfeição de fazer inveja ao mais ardoroso
ambientalista da Terra. O desencarnado
que pisa pela primeira vez na cidade de luz, surpreende-se com a incomensurável
beleza do lugar. A cidade — localizada em um profundo vale cercado de montanhas,
ao longo das quais se encontram florestas vicejantes de um verde extraordinário
— é repleta de flores perfumadas em seus canteiros e praças. Com os sentidos
ainda mais desenvolvidos do que quando habitavam a antiga via de expiação, são
claramente perceptíveis novos perfumes e novas cores, que antes passavam
ignorados. O perfume exalado pelas rosas é tão forte e tão especial que se
espalha por toda a cidade. Em Aruanda pode-se abrir o peito e respirar o
perfume trazido pelas rosas, lírios, cravos, tulipas, alfazema, e uma grande
variedade de outras espécies. Das matas vem o cheiro agradável e forte dos
eucaliptos tornando o ambiente ainda mas cheio de magia.
Um
permanente arco-íris de intensas sete cores adorna o céu, repleto de nuvens de
um branco sem igual correspondência na terra. As construções são de material
semelhante ao cristal, e quem anda por aquelas paragens sentem grande energia e
vibração, que caem na alma como bálsamo. Um passeio pelas arborizadas e
floridas praças de Aruanda revela cenas impensadas para quem passou antes pela
vida terrena. Nelas é possível ver crianças brincando com dóceis leões, da
mesma forma com que brincariam com gatinhos.
Em
Aruanda, se pode passear a qualquer hora que se queira, sem ter que se
preocupar com assaltos e todo tipo de violência. Estando naquelas terras de paz é que
se percebe com clareza que, violência, guerras, e intolerância são coisas de
espíritos que ainda se encontram na infância do desenvolvimento espiritual, por
mais cheios de medalhas, honras e glórias que tenham no mundo visível.
Na
cidade de luz também há um grande mar azul, do qual partem todos os dias,
barcos repletos de bálsamos, banhos e incensos levados por espíritos, cuja
missão é levar consolo, esperança e alento aos que ainda se encontram em meio às
provações da vida terrena. Durante todo o trajeto em direção à crosta terrestre
são entoados belos cânticos que ajudam a energizar o ambiente. O branco
luminoso das vestes se mescla ao azul do mar, dando um ar surreal à belíssima
cena.
Na
geografia da cidade da colônia espiritual também se pode observar uma extensa
cordilheira — grande sistema de montanhas reunidas. As cordilheiras de Aruanda
estão sempre em constante roupagem diversa. Uma hora, estão cobertas de neve e
refletem o brilho dos cristais. Outra hora, estão chuvosas e os pingos da chuva
lembram o brilhos dos diamantes. Outra hora, sobre elas incide sol intenso que
as deixa com o brilho dourado do ouro. Em todas essas situações há um tipo de
energia que é muito bem aproveitada por Xangô, orixá de justiça, e dono das
cordilheiras.
É
do alto de uma de suas pedreiras que está o Rei da justiça, sentado no alto de
uma pedreira rodeada de perfumados lírios. Ele traz na cabeça uma brilhante
coroa, nas mãos um machado de lâmina dupla. Deitado aos seus pés, um atento
leão o serve de guarda. De lá, ele observa a humanidade inteira. Para quem já
atravessou tantas eras, os homens na terra são como crianças em um jardim de
infância. As coisas são tão fáceis de resolver, e eles complicam tanto. Ah,
quanto trabalho os homens dão para os seres das altas esferas dos planos
espirituais... Mas é para isso que existem as forças espirituais, para
ajudá-los a atravessar, com segurança as intempéries da vida. Os orixás ensinam
o caminho, mostram sinais, mas a dureza do coração humano não compreende as lições,
nem muito menos percebe os sinais, e os homens acabam caindo no vale da
perdição, no qual se enredam em suas próprias inconsequências, tornando-se
presas fáceis de espíritos malignos.
Ainda
assim é possível recuperar suas almas aflitas. Para isso é realizado um
trabalho bastante intenso e cansativo até que as auras desses frágeis seres
estejam limpas. E quando isso acontece quão música suave soa pelos céus da
iluminada cidade...
Dentre
as cenas que se passam no planeta Terra, uma delas chama a atenção de Xangô. É
um diálogo entre um pai zeloso e seu filho, Zeca: Um menino de oito anos, que
volta da escola, irritado. Acompanhemos a cena.
O pequeno Zeca entra em casa, após a
aula, batendo forte os seus pés no assoalho da casa. Seu pai, que estava indo
para o quintal fazer alguns serviços na horta, ao ver aquilo chama o menino
para uma conversa.
Zeca, de oito anos de idade, o acompanha
desconfiado. Antes que seu pai dissesse alguma coisa, fala irritado:
- Pai, estou com muita raiva. O Juca não
deveria ter feito àquilo comigo. Desejo tudo de ruim para ele.
Seu pai, um homem simples, mas cheio de
sabedoria, escuta, calmamente, o filho que continua a reclamar:
- O Juca me humilhou na frente dos meus
amigos. Não aceito. Gostaria que ele ficasse doente sem poder ir à escola.
O pai escuta tudo calado enquanto
caminha até um abrigo onde guardava um saco cheio de carvão. Levou o saco até o
fundo do quintal e o menino o acompanhou, calado. Zeca vê o saco ser aberto e
antes mesmo que ele pudesse fazer uma pergunta, o pai lhe propõe algo:
- Filho, faz de conta que aquela camisa
branquinha que está secando no varal é o seu amiguinho Juca, e cada pedaço de
carvão é um mau pensamento seu endereçado a ele. Quero que você jogue todo o
carvão que há neste saco naquela camisa, até o último pedaço e para cada pedaço
de carvão grite com muita força. Depois eu volto para ver como ficou.
O menino achou que seria uma brincadeira
divertida e pôs mãos à obra. O varal com a camisa estava longe do menino e
poucos pedaços acertavam o alvo.
Uma hora se passou e o menino terminou a
tarefa. O pai, que espiava tudo de longe, se aproxima do menino e lhe pergunta:
- Filho, como está se sentindo agora?
- Estou cansado e com dor de garganta,
mas estou alegre porque acertei muitos pedaços de carvão na camisa.
O pai olha para o menino, que fica sem
entender a razão daquela brincadeira, e carinhosamente lhe fala:
- Venha comigo até o meu quarto, quero
lhe mostrar uma coisa. O filho acompanha o pai até o quarto e é colocado na
frente de um grande espelho onde pode ver seu corpo todo. Que susto! Só se
conseguia enxergar seus dentes e os olhinhos, de tão sujo que estava de carvão.
O pai, então, lhe diz ternamente:
- Filho, você viu que a camisa quase não
se sujou; mas, olhe só para você. O mau que desejamos aos outros é como o que
lhe aconteceu. Por mais que possamos atrapalhar a vida de alguém com nossos
pensamentos, os resíduos e a fuligem ficam sempre em nós mesmos.
Pobre
menino, sábio pai, correspondentes, respectivamente, a humanos e orixás. O
menino com o coração cheio de ódio contra o amigo, por motivo banal, — aliás, o
ódio não se justifica, nem é saudável, mesmo em grandes questões — não percebia
que estava enchendo a si mesmo de veneno mortal. O sábio pai, atento a tudo,
corrige o filho, usando ensinamento simples, porém eficiente. Ora, não é esse
mesmo o papel dos orixás, corrigindo? Para haver uma defesa não é preciso que
haja um ataque? Se quem ataca está emitindo energias negativas, quem se defende
também o faz do mesmo modo. Conclui-se deste raciocínio que ambos os lados
envolvidos em uma demanda saem prejudicados. O bom mesmo seria que não fosse
preciso enfrentar demandas, mas é preciso que elas existam, para que o homem
treine sua vontade, sua capacidade de enfrentar situações difíceis e superá-las,
sem que para isso tenha que sujar aquilo que ele tem de mais precioso: sua alma
eterna.
Vejam
o machado de Xangô, por exemplo, ele tem um apenas um cabo, mas este cabo
segura duas laminas, significando que ação e reação partem sempre da mesma
pessoa. Para cada ação, há sempre uma reação, que provocará consequências
agradáveis ou desagradáveis, conforme for a natureza da ação. Essa é chamada
lei da ação e reação.
Portanto,
não se preocupe com os pensamentos que os outros estão emitindo em sua direção.
Ao contrário, preocupe-se com os pensamentos que você está emitindo na direção
das outras pessoas. É isso que você receberá de volta. Se emitir pensamentos
benéficos de paz, amor e perdão é isso que receberá de volta, e sua aura ficara
iluminada. Se alguém emite, em sua direção, pensamentos raivosos, ignore-os, e
eles voltarão ao seu agressor, em dobro, sem sequer lhe provocar um arranhão.
A
justiça de Xangô, e fundamentada na lei da ação e reação, e por isso mesmo,
eficiente. É uma pena que muitos homens queiram fazer justiça com as próprias
mãos. Agindo assim, eles interferem de modo negativo na eficiente e infalível,
e ainda se enredam em suas próprias armadilhas, tornando-se, na maioria das
vezes, tão ou mais impuros que seus próprios opressores. A verdadeira justiça
está além das mãos humanas, e só o plano divino pode executá-la com eficiência
e sabedoria.
Percebam
o detalhe na cena que Xangô acaba de ver se desenrolar, no plano terreno, entre
pai e filho. Quando o menino joga os pedaços de carvão, nem todos acertam a
camisa que estava no varal, aliás, muito poucos acertaram o alvo. Aí é que está
a armadilha: Nem todos os pedaços acertam o alvo, mas todos passam pelas mãos
do menino, deixando em sua pele grossa fuligem.
Procure
não causar a si mesmo desequilíbrios energéticos, pois quando faz isso, quem se
enfraquece é você mesmo. Seja forte! Seja firme! Cuide para que pensamentos e
ações vindos de outra pessoa, não lhe cause desequilíbrio. Por outro lado,
cuide de sua mente para que não envie pensamentos negativos a outros, pois o
pão que você oferece é o mesmo que lhe será destinado como alimento. E a
estrada para quem age assim será sempre de frustrações e fracassos.
Pedras,
no vosso caminho, eu sei que há muitas, alias, a vida de modo geral pode ser
comparada a uma grande pedreira e, por ela, caminhamos descalços. Para os
fracos, as pedras na sola dos pés são um empecilho na caminhada, um atraso.
Para os fortes, elas representam sinais de crescimento e oportunidades de
vitória, pois, ao caminharmos, nossos pés doem no início, mas depois vão se
acostumando. As dificuldades tornam-se mais fortes e, por consequência, vamos
sendo capazes de enfrentar maiores desafios, sem prejuízo de sujarmos de
fuligem nosso campo energético. Nesse sentido, toda pedra no caminho pode se
tornar uma flor. Se acreditares nesses preceitos, toda pedra que atirarem no
teu caminho, Xangô, as transformará em lírios. É como diz um ponto, um hino, muito cantado nos terreiros de umbanda:
Estava olhando a
pedreira, uma pedra rolou,
Ela veio
rolando, bateu em meus pés e se fez uma flor.
Quem foi que
disse que eu não sou filho de Xangô,
Ele mostra a
verdade, se atira uma pedra ela vira uma flor.
Ai quantos
lírios já plantei no meu jardim,
Cada pedra
atirada é um lírio pra mim.
Desse
modo, firmes na fé de Oxalá, chefe de Aruanda, sereis vencedor em um mundo de
duras batalhas. Assim, junto com os santos, anjos e orixás, e todas as falanges
do bem, podereis gozar das maravilhas do mundo invisível quando atravessares a
fronteira da vida e mergulhares no mares da eternidade. Vigia a ti mesmo, vigia
a tuas ações e pensamentos para que teu viver terreno seja abençoado e
tranquilo, apesar das batalhas que enfrentares, e tua pós-vida, será brilhante
e multicolorida como os céus eternos. Esse é o segredo dos corações pacíficos.
Transformai cada pedra jogada em tua direção, em perfumado lírio, e ao final,
tereis o mais belo jardim de inebriante perfume, que alguém jamais cultivou...
E será grande a tua alegria.