Brincando com o perigo
Quinta-feira, 14 de janeiro
Imagine
o leitor, a leitora, que está navegando pelas redes sociais e dá de cara com o
post abaixo,
Passo
a passo para andar sem máscara no shopping de forma legítima, sem ser
admoestado e ainda posar de bondoso:
1-
Compre um sorvete.
2-
Pendure a máscara no pescoço ou na orelha, para afetar elevação moral;
3-
Caminhe naturalmente.
Para
completar o post, há logo abaixo do texto, um vídeo para deixar bem claro como
fazer isso.
Como viram o post dá a receita de como andar
sem máscara em um shopping sem ser perturbado por ninguém. Imagine ainda que
isso acontece em meio à pandemia de coronavírus, no Brasil, onde o número de
casos da doença voltou a crescer assustadoramente.
Em
outro post, do mesmo perfil do Twitter, por ocasião das festas de fim de ano,
você se depara com a hastag:
Feliz
Ano Novo!
#AglomeraBrasil
Logo
abaixo desses singelos votos de Feliz Ano, um vídeo mostra as imagens feitas no
último dia de 2020, e início de 2021, que mostra uma praia lotada, muita
comemoração, e fogos coloridos explodindo, como se a pandemia já tivesse ficado
bem para trás, ocasião em que todos comemorassem o início do novo ano como se o
coronavírus fosse coisa do passado.
Obviamente,
se você não se encaixa no grupo dos negacionistas ficaria escandalizado.
Pensaria certamente que estas postagens teriam sido feitas por algum iletrado,
sem conhecimento algum da realidade de dor e sofrimento que nos cerca no
momento presente.
Pasmem,
leitoras e leitoras, esses posts são reais e foram feitos por uma juíza.
O
nome dela é Ludmila Lins Grillo, e atua na Vara da Infância e da Juventude, na
cidade de Buritis, estado de Minas Gerais.
O
vídeo do #Aglomera Brasil foi postado em 1 de janeiro deste ano, e a “receita”
de como andar no shopping sem máscara, em 04 de janeiro. Ambos os vídeos
viralizaram nas redes sociais.
Em
outra foto ainda, que mostra a Rua das Pedras, na Praia de Búzio, Rio de
Janeiro, cheia de gente, ela escreveu: “A
cidade resiste a estupidez”.
Depois
das repercussões negativas, a juíza não se intimidou e ainda ironizou o
Conselho Nacional de Justiça. Em um post, dessa vez no Facebook, a juíza
escreveu: “Vou chamar o CNJ”.
Acompanhando este post havia um boneco chorando. Post e ilustração, claramente,
ironizando as críticas recebidas.
O
advogado José Belga Assis Trad entrou com uma reclamação contra a juíza no CNJ,
pedindo que o órgão investigue a conduta da magistrada. Na reclamação o
advogado argumenta que, contrariando os esforços das autoridades sanitárias,
dos profissionais de saúde, e do próprio CNJ, a juíza defende, abertamente,
aglomerações e festas. No documento, Trad cita uma postagem da juíza, feita em
vídeo que mostra pessoas aglomeradas em Búzio, Rio de Janeiro. Diz o título da
postagem da juíza: “Uma cidade que não se
entregou docilmente ao medo, histeria ou depressão”.
No
documento, Trad pede ainda que o órgão apure a conduta ética da juíza para ver
se ela cometeu infração ético disciplinar, uma vez que o Código de Ética da Magistratura
Nacional é repleto de exigências feitas aos magistrados, dentre elas a de que o
magistrado ou magistrada se comporte de na vida privada de um modo que
dignifique sua função.
O
caso está em análise do CNJ, porém o órgão tem sido brando no trato com
magistrados que tem esse tipo de comportamento. Um comportamento, que, diga-se
de passagem, empurra as pessoas para a morte.
As
postagens da juíza, Ludmila Lins Grilo, tornam-se ainda mais irresponsáveis e
perigosas, uma vez que ela tem milhares de seguidores em suas redes sociais,
atuando, dessa forma, também como influenciadora digital.
Entretanto,
é bom a juíza Ludmila olhar ao redor. Se olhar, vai ver que o coronavírus ama
gente o que o desafie. Ele gosta de ser desafiado. Ele, geralmente, acaba mostrando
quem é que manda.
Vejamos,
apenas três exemplos.
O
apresentador Stanley Gusman, comandava o programa Alterosa Alerta, na TV Alterosa, uma filial do SBT, em Minas
Gerais. Gusman sempre minimizou os efeitos da pandemia em seus programas.
Na
véspera do Natal, 24, diante do aumento de casos em BH, o prefeito Alexandre
Kallil foi às redes sociais divulgar um vídeo com mensagem de Natal. No vídeo o
prefeito diz: “Eu tenho certeza de que no
ano que vem vamos estar passando um Natal abraçando, beijando, porque a vacina
está batendo na porta. Então, não vamos morrer na praia, estamos chegando na
praia. Todo o sacrifício que for feito pela população de Belo Horizonte neste
Natal vai ser muito, muito valorizado no Natal do ano que vem. E tomara que no
Natal do ano que vem todos falem o seguinte: a Prefeitura de Belo Horizonte
avisou, olha a nossa alegria agora em 2021. Eu sei que vai ser um Natal
diferente, que para todo mundo vai ser muito difícil, mas nós sabemos que temos
que garantir o nosso Natal de 2021, 22, 23, 24... Por isso, vou passar um Natal
longe de toda a minha família. Vou passar um Natal feliz, porque a vacina está
chegando. Eu não quero que no Natal do ano que vem todos eles estejam chorando
a minha presença”.
Imediatamente,
o apresentador rebateu a fala do prefeito: “Eu
vou visitar meu pai, vou visitar minha mãe, e não vou mata-los. Eu acho um
desrespeito o senhor falar isso em público”.
É
certo que o apresentador foi visitar os pais e não os matou, mas, por outro
lado, se matou. Ou melhor, o Covid-19 o matou.
Logo
após suas críticas ao prefeito de Belo Horizonte, no dia 31 de dezembro de
2020, Gusman confirmou a um seguidor nas redes sociais que estava com Covid. O
seguidor estranhou sua ausência nas redes sociais e o questionou a esse respeito,
ao que Gusman respondeu: “Covid, irmão”.
No
domingo, 19 de janeiro deste ano, Stanley Gusman, 49 anos, faleceu em
decorrência daquele de quem ele tanto havia desdenhava: o coronavírus.
A
segunda vítima da Covid-19 elencada nestes três exemplos trata-se do
Superintendente do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra),
do Rio Grande do Sul, Tarso Teixeira, de 69 anos. Tarso também era diretor
vice-presidente da Federação da Agricultura do Rio Grande do Sul (Farsul). O superintendente,
que era uma importante liderança ruralista no Rio Grande do Sul, morreu na
manhã de segunda-feira, 04 de janeiro.
No
ambiente de trabalho — imagina-se que fora dele também — Tarso não estava nem
aí para essa coisa toda de respeitar normas sanitárias, muitos menos de usar
máscaras de proteção. Distanciamento social? Passava bem longe dele. Além
disso, pressionou os funcionários para que retornassem ao trabalho sem os
devidos cuidados e segurança necessária contra a Covid-19.
Em
várias ocasiões promoveu reuniões com dezenas de pessoas no gabinete dele, sem
a preocupação com o uso de máscaras, nem com distanciamento social.
Por
causa desse comportamento, foi denunciado ao Ministério Público pela associação
de servidores do Incra no RS.
Tarso
Teixeira pagou com a vida pelas próprias irresponsabilidades ao desafiar uma
doença tão perigosa.
A
terceira vítima da lista elencada por este blog refere-se ao pastor evangélico,
Thiago Andrade de Souza. Bolsonarista convicto, ele integrava o Movimento São Paulo
Conservador. Ela um ferrenho defensor do uso da cloroquina e ivermectina.
No
dia 26 de novembro ele escreveu no Facebook: “Se você tomou ivermectina, azitromicina ou hidroxicloroquina, poste no
Facebook e, se não precisou tomar e é a favor, poste que é a favor. Vamos
forçar as prefeituras a começarem a prevenção urgente. E fazer a distribuição
gratuita”.
O
pastor, certamente, deve ter tomado muita Cloriquina e Ivermectina,
medicamentos sem eficácia comprovada, e tão amplamente defendidos pelo
presidente. Mas não adiantou. Mais uma vida ceifada pelo coronavírus. Thiago se
foi aos 36 anos.
Isso
são apenas três exemplos de negacionistas que foram vitimados pela doença que
ignoravam. Zombavam do perigo, sem saber que ele estava em qualquer esquina. E quantos
milhares adeptos da seita, que, por ora, ocupa a presidência do Brasil, também não
sucumbiram ao darem ouvidos às palavras de um presidente negacionista?
O
número de mortos por Covid-19 tem batido nos últimos dias a casa do 1000 mortos
em 24 horas. Isso porque nem chegaram ainda os contaminados nas festas do réveillon
com Covid realizadas em todas as partes do país. Reivellon de praias lotadas,
muita comemoração, beijos, abraços, como se não existisse covid. Os números
dessa farra toda se farão conhecer dentro de mais uma ou duas semanas.
Segundo
dados levantados pelo consórcio de imprensa junto as Secretarias Estaduais de
Saúde, nas últimas 24 horas o Brasil registrou um total de 1.283 mortes. Agora
o total de mortos pela doença no Brasil é de 206.009. O país já totaliza
8.257.459 brasileiros contaminados pelo vírus.
Enquanto
isso, é triste e lamentável o politização que se formou em torno da vacina. Por
questões políticas o governo federal faz de tudo para que a vacina produzida no
Brasil pelo Instituto Butantã, em parceria com o laboratório chinês Sinovac,
não seja logo aprovada pela Anvisa. São barreiras e mais barreiras para que a
vacina demore em ser aprovada em uso emergencial.
Por
falta de planejamento, ou má vontade mesmo, ainda não temos uma data nacional
definida como certa para que a vacina comece a ser aplicada no país. E mesmo se
a vacina começasse a ser aplicada hoje nos brasileiros, o país ainda
enfrentaria outro problema: a falta de seringas.
Ou
seja, vemos por parte deste governo, e do Ministério da Saúde, uma completa
desorganização e falta de logística. É como uma guerra. A batalha contra o
coronavírus deve ser encarada como uma guerra. Em um combate tudo deve ser
planejado antes. Você não pode ir de encontro às tropas inimigas, tendo
planejado a ação um dia antes. Se agir assim, de forma tão irresponsável, é
certo que muitos combatentes perderão a vida.
Tolo
e irresponsável é o comandante que planeja uma batalha um dia antes de ela
acontecer. Toda essa logística da compra da vacina e dos insumos necessários
para que ela seja administrada na população deveria ter sido feita meses antes,
e não agora, em cima da hora, como o governo está fazendo.
Esse
blog falou acima dos negacionistas que desafiaram o coronavírus e foram vítimas
dele. Mas, como sabemos, o vírus mortal não escolhe correntes, nem classes, nem
sexo, nem idade, nem qualquer outro critério. Aliás, é um vírus que não tem
critério nenhum. Ele mata negacionistas e não negacionistas.
Foi
com tristeza que o Brasil recebeu, hoje pela manhã, a notícia do falecimento de
Maguito Vilela, prefeito licenciado de Goiânia. Maguito foi diagnosticado com
Covid-19 em plena campanha eleitoral, em 20 de outubro.
Inicialmente,
ele sentiu apenas sintomas leves. “Realizei
o exame tipo RT-PCR e testei positivo para a Covid-19. Estou com sintomas leves
da doença, como coriza e rouquidão. Em respeito ao próximo e ao protocolo
médico ficarei em casa nos próximos dias. Obrigado a todos pelas manifestações
de carinho”, escreveu ele no Twitter no dia 20 de outubro, ás 8 e 52 da
manhã. .
Sete
dias depois a doença se agravou e o candidato foi transferido de Goiânia para o
hospital Albert Einstein, em São Paulo com um comprometimento pulmonar que
variava de 50 a 75%.
Em
São Paulo, Maguito Vilela lutou bravamente contra a doença. Foi entubado duas
vezes. No dia 03 de dezembro, finalmente, ele testou negativo para a Covid-19. E
foi transferido para um leito de UTI comum do hospital. E também passou por uma
cirurgia para estancar o sangue dos pulmões. No dia 11 do mesmo mês, ele
apresentou sangramento nos pulmões. Fez uma cirurgia e acabou desestabilizando a
pressão.
Maguito
escapou da Covid-19, mas não conseguiu escapar das sequelas por ela deixadas. Ele
faleceu na manhã deste dia 13 de janeiro. Em agosto deste ano ele já havia
sofrido ao perder duas de suas irmãs para a doença.
Mesmo
sofrendo no leito do hospital, a candidatura de Maguito não foi retirada. Ele concorreu
ao pleito e foi eleito, em segundo turno, com 52,60% dos votos válidos. Na tarde
da sexta-feira, 01 de janeiro, Maguito Vilela chegou a tomar posse como
prefeito eleito no quarto de UTI do Albert Einstein, onde estava internado. A cerimônia
acontecia em um auditório da Universidade Federal de Goiás, e o prefeito tomou
posse através de vídeo chamada.
Estavam
todos muito esperançosos de que ele voltasse e ocupasse o seu lugar de direito
na condução da prefeitura de Goiânia. Mas, as sequelas deixadas pela Covid-19,
o levaram a trilhar outro caminho: o caminho da eternidade.
Maguito
Vilela parte aos 71 anos de idade.
À
ele e a todas as vítimas da Covid-19, este blog presta homenagem e eleva
orações.
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