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Descaminhos do governo brasileiro
Posted by Cottidianos
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12:33
Sexta-feira,
01 de maio
Em
postagens anteriores este blog tratou da questão da demissão do ex-ministro da
Justiça e da Segurança Pública, Sérgio Moro, e das acusações que ele fez ao
presidente Jair Bolsonaro de querer interferir na Policia Federal. Moro disse
que Bolsonaro queria um delegado de PF com quem ele tivesse contato, a qualquer
hora do dia ou da noite, e que lhe repassasse relatórios, principalmente, das
investigações que ele considerasse importante.
Ora,
como todos sabemos, a Polícia Federal de qualquer país democrático, deve ser
uma polícia que serve ao Estado, e não ao presidente, e à família dele em
especial. Não apenas um delegado federal Bolsonaro queira para chamar de seu,
mas também um ministro da Justiça e da Segurança Pública.
E
para estes dois cargos ele fazia questão de que fossem ocupados por pessoas bem
próximas à família dele, e amigo de seus filhos. Assim, ficaria mais fácil, bem
mais fácil, interferir na PF a hora em que ele bem quisesse e entendesse,
comportamento típico dos governos autoritários e dos ditadores. Os nomes
preferidos por ele eram os de Alexandre Ramagem para o comando da PF. Ramagem
se tornou próximo família do presidente ao coordenar a segurança do presidente
na campanha de 2018, e se tornou amigo pessoal de Carlos Bolsonaro.
Para
a pasta da Justiça, o preferido de Bolsonaro, era Jorge de Oliveira. O pai de
Jorginho — como Bolsonaro o chama —Jorge de Oliveira Francisco, havia sido
chefe de gabinete de Bolsonaro na Câmara por vinte anos. Além disso, Jorge de
Oliveira também exerceu as funções de chefe de gabinete e assessor jurídico no
gabinete de Eduardo Bolsonaro, do qual também foi padrinho de casamento.
Depois
de muitos aconselhamentos, o presidente desistiu da indicação de Jorge de
Oliveira, mas não de Alexandre Ramagem. Foi escolhido então, André Mendonça, em
vez de Jorge Oliveira para a pasta da Justiça e da Segurança Pública.
De
fato, na edição do Diário Oficial da União de terça-feira, 28, no Diário
Oficial da União, foram publicadas as nomeações de André Luiz Mendonça para o
Ministério da Justiça e da Segurança Pública, e Alexandre Ramagem para o
comando geral da PF. Na mesma edição foi publicada também a nomeação de José
Levi Mello do Amaral Júnior como o novo advogado-geral da União. José Levi
ocupava o cargo de chefe da Procuradoria da Fazenda Nacional, órgão vinculado
ao Ministério da Economia.
A
cerimônia oficial para receber os novos nomeados pelo governo já estava pronta.
A posse estava marcada para a quinta-feira, 29, às 3 horas da tarde. Mas uma
decisão do ministro do STF, Alexandre de Moraes, mudou o curso da situação.
O
ministro, através de uma liminar, suspendeu a nomeação de Alexandre Ramagem. A ação
que motivou a liminar de Moraes foi protocolada pelo PDT, e baseou-se nas
acusações feitas pelo ex-ministro Sérgio Moro quando do anúncio de sua saída do
governo.
De
acordo com Alexandre de Moraes, a tentativa de interferência na Polícia
Federal, as mensagens trocadas entre Moro e Bolsonaro, e a própria abertura de inquérito
no Supremo para apurar o caso, justificam o pedido protocolado para impedir a
nomeação de Ramagem. “Verifico a
probabilidade do direito alegado, pois, em tese, apresenta-se viável a
ocorrência de desvio de finalidade do ato presidencial de nomeação do diretor
da Polícia Federal, em inobservância aos princípios constitucionais da
impessoalidade, da moralidade e do interesse público”, argumentou ele.
Antes
da cerimônia de posse acima citada, a Advocacia Geral da União (AGU) havia
divulgado nota dizendo que não pretendia recorrer ao STF contra a liminar de
Alexandre de Moraes suspendendo a posse de Ramagem.
Mas,
com Bolsonaro, nada parece seguir um protocolo lógico. As coisas são assim num
instante e depois já não são mais. Diz algo em um momento para desdizê-lo em
outro. Igual a uma “metamorfose ambulante”, como diria Raul Seixas.
Segue
o curso. Veio a cerimônia de posse — com direito a tudo o que não é
recomendado, neste momento pelas autoridades em saúde: aglomeração, apertos de
mãos, abraços. Nela, Bolsonaro, sério, usou palavras bonitas e fortes em seu discurso:
“Não posso admitir que ninguém ouse
desrespeitar ou tentar desbotar a nossa Constituição. Esse é o meu papel, esse
é o papel não só dos demais poderes, como de qualquer cidadão desse Brasil:
harmonia, independência e respeito entre si”. O presidente disse também: “Respeito o poder Judiciário, respeito as
suas decisões, mas nós, antes de tudo, respeitamos a Constituição”.
Depois
da cerimônia, o presidente abandonou a capa de homem respeitador da
Constituição e vestiu a que lhe é caraterística: a do autoritarismo. E já
começou desautorizando a AGU que já houvera dito que não recorreria da decisão
do ministro Alexandre de Moraes.
Apenas
duas horas depois de o órgão ter dito que não recorreria, Bolsonaro, em frente
a apoiadores no Palácio do Planalto, afirmou que o governo iria tentar reverter
a decisão dada por Moraes. “Quem manda
sou eu”, disse ele. “Eu quero o
Ramagem lá. É uma ingerência, né? Mas vamos fazer tudo para o Ramagem. Se não
for, vai chegar a hora dele e eu vou botar outra pessoa”, foi outra frase
dita pelo presidente aos seus apoiadores. Isso foi dito na quarta-feira, 29.
No
do dia seguinte, quinta-feira, 30, Bolsonaro voltou ao assunto com carga total.
O presidente atacou o ministro Alexandre de Moraes e disse que a decisão dele
tinha sido uma decisão política. “Ontem
quase tivemos uma crise institucional. Quase. Faltou pouco. Eu apelo a todos que
respeitem a Constituição […] Eu não engoli ainda essa decisão do senhor
Alexandre de Moraes. Não engoli. Não é essa a forma de tratar um chefe do
Executivo, que não tem uma acusação de corrupção”.
Diz
o ditado que para meio entendedor meia palavra basta. Talvez por isso, a ameaça
velada feita ao Supremo na fala de Bolsonaro tenha feito com que os ministros
tenham se unido em torno de Moraes, defendendo-o e exaltando suas qualidades
como jurista e membro do STF. Outras entidades jurídicas também criticaram a
fala de Bolsonaro.
O
fato é que Bolsonaro está vendo o cerco se apertar em torno de seus filhos com
as investigações em andamento no STF, e, muito provavelmente devido a isso, e ao
fantasma impeachment — fantasma que, bem aos poucos, começa assustar os
corredores do Planalto— esteja apresentando o descontrole e o desespero que
temos visto nos últimos dias.
Desespero
que o tem levado a abandonar suas plataformas de campanha — nas quais afirmava
que rechaçava a velha política e se dizia arauto da nova política — e procurar
políticos que foram condenados ou são réus em escândalos de corrupção que
chocaram o país, como o mensalão e a Lava Jato. Desde meados de abril tem sido
constantes os encontros de Bolsonaro com essas raposas, negociando cargos e
todos os outros atos antes condenados por ele durante a campanha. Estiveram com
Bolsonaro, representantes do PL e do PTB, partidos de Valdemar Costa Neto, e
Roberto Jefferson, respectivamente.
Talvez
por isso, e muito mais, Sérgio Moro tenha dito, em entrevista na última edição
da revista Veja, que governo atual não tem compromisso com o combate à
corrupção. “Sinais de que o combate à
corrupção não é prioridade do governo foram surgindo no decorrer da gestão.
Começou com a transferência do Coaf para o Ministério da Economia. O governo
não se movimentou para impedir a mudança. Depois, veio o projeto anticrime. O
Ministério da Justiça trabalhou muito para que essa lei fosse aprovada, mas ela
sofreu algumas modificações no Congresso que impactavam a capacidade das
instituições de enfrentar a corrupção”. Disse Moro.
Em
outro trecho da entrevista ele afirma: “Recordo
que praticamente implorei ao presidente que vetasse a figura do juiz de
garantias, mas não fui atendido. É bom ressaltar que o Executivo nunca negociou
cargos em troca de apoio, porém mais recentemente observei uma aproximação do
governo com alguns políticos com histórico não tão positivo. E, por último,
teve esse episódio da demissão do diretor da Polícia Federal sem o meu
conhecimento. Foi a gota d’água”.
Em
meio a tudo isso a gente fica se perguntando qual seria o cenário ideal em meio
à pandemia. Então nos vem a imagem de um presidente centrado na questão. Sentado
à mesa discutindo, junto com os governadores de um lado, e do outro com o
ministro da Saúde, elaborando planos e estratégias para conter o avanço da
doença. Enviando as famílias das vítimas do Covid-19 mensagens de conforto e de
apoio, e ao restante dos brasileiros para que façam a sua parte e façam aquilo
que é recomendado a todos os países pela Organização Mundial da Saúde: Fiquem
em casa. Enfim, ações coordenadoras que se espera de um líder em tempos de
crise.
Ah,
mas isso é uma quimera, eu sei.
O
que vemos é justamente o contrário de tudo isso. Um presidente que briga com os
governadores, que debocha do número de mortos, que faz aglomerações, e que
desdiz tudo o que a ciência afirma.
Até
existem ações do governo. Por exemplo, O ministro da Justiça, Paulo Guedes, e o
presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), fecharam um pacote de R$ 120
bilhões de apoio aos estados e municípios. Mas isso era coisa que deveria ter
sido decidido com mais rapidez. E também o auxílio de R$ 600, 00 reais que o
governo está distribuindo aos trabalhadores informais, e cujo recebimento tem
gerado filas numerosas nas agências da Caixas Econômicas Federais de todo o
país. Mais uma coisa que o coronavírus deve adorar: aglomerações. O que se quer
dizer é que o governo faz todas essas frentes, o presidente Bolsonaro que, às
vezes, parece dissociado do seu próprio governo, está em outra frente, atacando
ora um, ora outro, e em outras desdizendo o que pregam as autoridades em saúde
e incitando o povo às aglomerações.
Nesta
quinta-feira, 30, contrariando tudo o que dizem os médicos, cientistas, a OMS e
todos os especialistas nessa área, o presidente afirmou que o isolamento social
feto pelos governadores de todo o país não teve nenhum impacto no achatamento
da curva dos números de infectados pelo novo coronavírus
“Até
porque, repetindo: 70% da população vai ser infectada. E, pelo que parece, pelo
que estamos vendo agora, todo empenho pra achatar a curva praticamente foi
inútil. Agora, a consequência disso? O efeito colateral disso? O desemprego”.
Detalhe,
tudo isso é dito é dito em momento que o país caminha para o caos em relação ao
aumento no número de mortes pela doença, no número de infectados, situações que
inevitavelmente levam a outra tragédia dentro da tragédia do coronavírus: o
colapso do sistema de saúde, que já é realidade em algumas capitais do país.
A
verdade é que o Brasil, muito em função das atitudes do mandatário da nação,
está pegando um caminho estranho em relação ao combate à Covid-19. Caminho esse
que pode afetar mais a economia e as finanças do país do que o desemprego, que,
depois de salvar os próprios filhos das encrencas em que se meteram, parece ser
a única preocupação do presidente.
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