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Máfia das próteses: A quebra de um belo juramento

Posted by Cottidianos on 00:30
Segunda-feira, 05 de janeiro



Juramento de Hipócrates

"Eu juro, por Apolo médico, por Esculápio, Hígia e Panacea, e tomo por testemunhas todos os deuses e todas as deusas, cumprir, segundo meu poder e minha razão, a promessa que se segue:
Estimar, tanto quanto a meus pais, aquele que me ensinou esta arte; fazer vida comum e, se necessário for, com ele partilhar meus bens; ter seus filhos por meus próprios irmãos; ensinar-lhes esta arte, se eles tiverem necessidade de aprendê-la, sem remuneração e nem compromisso escrito; fazer participar dos preceitos, das lições e de todo o resto do ensino, meus filhos, os de meu mestre e os discípulos inscritos segundo os regulamentos da profissão, porém, só a estes.
Aplicarei os regimes para o bem do doente segundo o meu poder e entendimento, nunca para causar dano ou mal a alguém.
A ninguém darei por comprazer, nem remédio mortal nem um conselho que induza a perda. Do mesmo modo não darei a nenhuma mulher uma substancia abortiva. 
Conservarei imaculada minha vida e minha arte.
Não praticarei a talha, mesmo sobre um calculoso confirmado; deixarei essa operação aos práticos que disso cuidam.
Em toda casa, aí entrarei para o bem dos doentes, mantendo-me longe de todo o dano voluntário e de toda a sedução, sobretudo dos prazeres do amor, com as mulheres ou com os homens livres ou escravizados.
Àquilo que no exercício ou fora do exercício da profissão e no convívio da sociedade, eu tiver visto ou ouvido, que não seja preciso divulgar, eu conservarei inteiramente secreto.
Se eu cumprir este juramento com fidelidade, que me seja dado gozar felizmente da vida e da minha profissão, honrado para sempre entre os homens; se eu dele me afastar ou infringir, o contrário aconteça."
Mais que um juramento — essas palavras pronunciadas na Grécia Antiga há mais de 2.500 anos, e que encontram eco no mundo atual — é um código de ética.

Todos os anos, milhares de formandos do curso de graduação em Medicina, preparam suas festas de formatura, que vem coroar uma fatigante jornada de estudos. Um dos momentos mais fortes e emocionantes dessas cerimônias é o juramento de Hipócrates. È com grande emoção que os formandos o fazem.

Entretanto, eis que chega a sedução de um mundo de vantagens materiais conseguidas de forma desonesta e desonrosa, e fazem aqueles que eram jovens idealistas, aspirantes a bons médicos, queimarem seus idealismos, preceitos éticos e o famoso juramento, na fogueira das vaidades e da corrupção. Tristemente, vemos esses profissionais, que merecem o nome de mercenários, muito mais que o título de médicos, jogarem no lixo um rico legado deixado pela civilização grega para toda a posteridade.

Abordo esse assunto pois temos visto os tentáculos do terrível monstro da corrupção se estenderem também ao sistema público de saúde, sugando suas forças e enfraquecendo-o. É o que apurou uma investigação da Polícia Federal do Rio de Janeiro. De acordo com a investigação, um escandaloso esquema de corrupção envolve dezenas de médicos. Nas teias dessa rede de corrupção também estão enredados diretores e donos de hospitais. A ponta do iceberg para descobrir a fraude, foi uma estranha movimentação no plano de saúde dos correios, na qual, uma cirurgia de coluna que, pelo procedimento normal sairia ao custo de R$ 120.000, foi realizada ao custo de 1 milhão de reais. O pior é que isto não acontece apenas no estado do Rio, mas também em outros estados brasileiros.

O esquema funciona da seguinte forma: Fornecedores oferecem propinas aos profissionais citados para que eles comprem seus produtos e, para isso, pagam aos profissionais da saúde uma propina que varia entre 10, 20 e 25% sobre o valor das compras, que obviamente se encontram com valor muito acima do que, normalmente, é oferecido ao mercado. Também são oferecidos aos médicos carros novos e viagens, além disso, os médicos da elite desse vergonhoso esquema, gozam da facilidade de terem o dinheiro entregue em seus próprios escritórios, contando, inclusive, com o serviço de carro forte. Essa operação fraudulenta causou um prejuízo de cerca de 120 milhões a grandes hospitais do Rio.

Os profissionais ganham dinheiro ilícito com a compra de vários produtos, porém, o faturamento é maior com a compra de próteses e órteses, por serem estes os de maior valor. Há, no SUS, uma tabela que define o preço desses produtos, porém, os fraudadores descobriram um meio de burlar esse processo legal e criaram a chamada “licitação por adesão” que funciona da seguinte forma: O fornecedor do produto convence hospitais federais, afastados dos grandes centros, a abrir licitação para o produto, com um preço muito acima do valor de mercado. Segundo a revista Veja, através desse processo de “licitação por adesão”, uma prótese que, pela tabela do SUS, custava 14.000 mil reais, foi vendida pela quantia de 100 mil reais. Ao todo, o esquema de corrupção pode provocado um prejuízo de, pelo menos, 7 milhões de reais ao plano de saúde dos Correios no Rio de Janeiro.

Os médicos também compram produtos de qualidade inferior em troca de viagens turísticas, é o que afirma a revista Veja, em reportagem publicada na edição de 12 de dezembro do ano passado: “O caso dos stents — tubos inseridos nas artérias para prevenir entupimentos — é exemplar. Nos hospitais federais do Rio, eles vêm, em grande parte, de um lote comprado há quatro anos de fabricantes chineses sem histórico no mercado nem certificação internacional de qualidade. O preço é o mesmo das próteses americanas, que possuem a certificação e são consideradas as melhores do mercado. "Como a chinesa não tem histórico conhecido, não se sabe como os pacientes que a receberam reagirão no futuro", alerta o médico. Seus colegas sabem do risco, mas optam por esses stents em troca de viagens à China, com escalas na Europa e todas as despesas pagas. A cada três stents do modelo mais caro colocados — meta estabelecida pelo fabricante chinês — o médico ganha uma viagem. Segundo o médico, que aderiu à delação premiada, há quatro anos um grupo do Hospital dos Servidores dedica-se a explorar vários pontos turísticos da Ásia e da Europa graças ao bom desempenho nessa disputa sórdida. Os delatores ouvidos pela PF relatam ainda casos escabrosos de cirurgias desnecessárias. "Sei de pelo menos um cirurgião que encheu a coluna de uma pessoa de molas e parafusos à toa. Esse procedimento custa, em média. 250.000 reais só de material. O fabricante comemora e o médico ganha sua recompensa", relata o dono de um hospital que realiza 25 cirurgias ortopédicas por mês.


Como destruir os tentáculos desse monstro chamado corrupção. Será preciso chamar algum super-herói? A Polícia Federal está fazendo a sua parte, investigando. Esperamos que a justiça mergulhe nessa luta, punindo os responsáveis por tais práticas criminosas.

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