Quinta-feira, 26 de
dezembro
Entrevista Sarah de
Oliveira Passarella
"Eu fico fascinada com o natal"
No dia 14 de dezembro
às 15hs, a escritora Sarah de Oliveira Passarella, lançou o livro “Poemas de
Cantar Natal”, o evento aconteceu nas dependências do CIS-Guanabara, à Rua
Mário Siqueira, 829, no bairro Botafogo, em Campinas. A festa de lançamento
ocorreu durante uma cantata de natal da qual participaram diversos corais de
Campinas e região. Foi uma bela festa. Entre um autografo e outro, perguntei a
Sarah se ela poderia me conceder uma entrevista. Ela respondeu que sim e
ficamos de combinar data e hora por e-mail. Quando perguntei a Sarah em que
bairro ela morava, ela respondeu: “Eu não moro, me escondo na Vila Nogueira”.
Enfim, marcamos a entrevista para o final da tarde/início da noite de sexta-feira,
dia 20. No dia combinado, cheguei à casa da escritora, por volta das 8h30 da
noite. Enquanto caminhava até lá, compreendi por que ela falou que não morava,
se escondia. O bairro é de fácil acesso, mas a rua em que ela mora forma um
circulo, e não é muito fácil de ser encontrada, porém vencido esse pequeno
obstáculo, toquei a campanhinha. Enquanto esperava que Sarah viesse abrir o
portão, fiquei apreciando a quietude da noite e a tranqüilidade da rua. No céu,
ainda se conseguia ver os últimos raios de sol desaparecendo no horizonte. Ouvi
o barulho da fechadura do portão se abrindo, e Sarah me recebeu com sua
gentileza costumeira. Encaminhamo-nos para dentro de casa. Já na porta de
entrada, me chamou à atenção uma exuberante guirlanda natalina, com enormes
bolas vermelhas. Ao adentrar a residência da escritora fiquei encantado com a
bela e caprichada decoração natalina. Senti-me entrando nas páginas de um livro
de contos de natal. Eram árvores de natal, guirlandas, trenós, Papais-Noéis,
anjos e presépios em profusão.
__ Onde você quer
sentar: aqui no sofá da sala ou na mesa de jantar? Perguntou ela.
__ No lugar em que você
se sentir melhor, respondi eu.
__ O lugar que eu acho
melhor é em frente ao computador. Uma vez não sendo possível a entrevista lá. Podemos
sentar aqui no sofá mesmo. Depois da entrevista, vou te mostrar minha coleção
de presépios.
__ Podemos começar
justamente por aí, pela sua coleção de presépios? - Havia lido no livro da
Sarah, que ela é colecionadora desse gênero de arte e tem, atualmente,
quinhentos e trinta e três exemplares. Fiquei impressionado com esse fato e
queria satisfazer a curiosidade em ver tantos presépios juntos.
__ Claro! Respondeu
Sarah, prontamente.
__ A escritora foi me mostrando os presépios.
Primeiros os que estavam expostos na sala. Depois descemos uma escada e, em
outra sala, havia mais presépios, cada um mais belo que o outro. Fiquei
admirando tudo aquilo enquanto ela me falava, com entusiasmo, de como havia
adquirido alguns e de sua paixão por essa coleção. Através desse gênero de
arte, a escritora trouxe o mundo para dento de casa. Há presépios trazidos de
vários Estados brasileiros; do Nordeste ao Rio Grande do Sul, e de vários
países; Estados Unidos, Alemanha, Itália, Egito, Portugal, Bolívia, México,
Nigéria, dentre outros. Trouxe também a natureza junto: há presépios feitos de
casa de milho, de casca de romã, de casca de nozes, de arame, tecido, louça,
velas. Também os recicláveis estão presentes nas latinhas de refrigerante e em
garrafas pet. Depois de me contar as histórias curiosas envolvendo os presépios,
e me mostrar o restante da decoração, voltamos ao sofá da sala, onde
conversamos por quase uma hora.
Sarah de Oliveira
Passarella é paulista, nascida na cidade de Limeira, porém toda a sua infância
e juventude foram vividas na cidade de Americana, da qual guarda as melhores
lembranças. Vinda de uma família de seis irmãos, é filha de Fernando de
Oliveira e Deldina Martins (dona Dina). É viúva do Ítalo brasileiro, Antonio
Passarela, com quem teve a filha Tessa. A filha de Sarah, Tessa Virginia de
Oliveira Passarela Madeira, é casada com Wander Marcelo Brugnola Madeira. Desse
casamento, nasceu Pietra Aurora, hoje, com três anos de idade, neta de Sarah. O poder publico da cidade de Campinas,
outorgou a escritora, a medalha “Carlos Gomes” honra máxima da cidade, pelos
serviços prestados junto à cultura de Campinas.
O livro, Poemas de
Cantar Natal, é prefaciado pelo maestro Oswaldo Antonio Urban, e o texto que
acompanha a orelha do livro foi escrita por Fernanda Beatriz de Oliveira de
Faria Bernardi, advogada especialista em Direito Tributário.
Na entrevista, Sarah
fala de seu fascínio pelo Natal, da família, do seu trabalho como escritora e
do novo livro “Poemas de cantar Natal”.
José
Flávio - Como surgiu essa paixão pelos
presépios? Esse desejo de querer colecioná-los?
Sarah
Passarela – O primeiro que eu vi foi numa igreja... Meu pai
era adventista. Minha mãe era católica, mas era do tempo em que a mulher tinha
que seguir o marido. Então, ela não podia ter outra religião, ou trabalhar
fora. Trabalhar fora, ela não podia nem quando era solteira, pois o pai dela
não permitia. Ela era do tempo em que mulher não trabalhava fora. O primeiro
presépio que eu vi e, que hoje faz parte de minha coleção e tem mais de cem
anos...
José
Flávio - Isso foi em Americana?
Em Americana. Eu achei
aquilo muito interessante. Achei bonito, retratar a história de Jesus através
das imagens. Mas na minha casa não tinha, porque no conceito de meu pai, não se
cultua imagens. Depois quando eu me casei, dois anos depois, meu marido me deu
um presépio, que até está lá embaixo. Nós fomos à igreja, tinha uma lojinha lá,
eu achei tão bonitinho. Então ele falou: “Leva para você, já que você gostou”.
Então ele me deu aquele. Depois eu fui comprando outros. Quando eu vi, eu
estava com mais de cem presépios. Quando eu viajo, qual a minha meta principal?
Buscar presépio! (risos). Foi meio sem querer. Eu falei: “Gostaria de
colecionar alguma coisa: passei a colecionar presépio. Eu acho interessante,
passei a estudar bastante o que era realmente o presépio, o que representa essa
palavra. As pessoas dizem “Ah, tal cidade é uma maravilha, parece um
presépio". Ora, o presépio é uma cocheira, onde Jesus nasceu. Não dá para
associar as coisas. Não era bonito, tem a simbologia bonita. Mas uma cidade
bonita não parece um presépio. Mas é assim, eu comecei a gostar do assunto. Por
isso que eu consigo colecionar presépio.
José
Flávio – Esse primeiro presépio que você viu e que
hoje está montado em sua casa, como você o adquiriu?
Sarah
Passarela – Passados muitos anos, eu me mudei de Americana. Eu
me casei em 1970, vim morar aqui, e o meu cunhado, ele mora em Americana, mas
trabalhava na Bosch, trabalhou trinta anos na Bosch, depois se aposentou. Ele
foi convidado para trabalhar numa igreja. Ser comprador da igreja, naquela
igreja na qual eu tinha visto o presépio. Eles compraram outro presépio grande
para colocar no gramado, na frente da igreja. Aí eles perguntaram o que fazer
em relação ao outro. O padre que tomava conta da igreja falou: “Amarreta ele e
joga fora”. Então meu cunhado falou: “Não, se for assim, vou dar para minha
cunhada. Ela gosta de presépio. Então ele me trouxe o presépio.
José
Flávio – É bem interessante, aquele primeiro presépio
que você viu, veio parar em suas mãos. Não é muita coincidência?
Sarah
Passarela – Vou te contar outra história. Eu gosto muito de
viajar, meu marido gostava também. Mas a gente não viajou muito porque não
tínhamos muita oportunidade. Ele trabalhava, não chegou nem a se aposentar, ele
morreu antes, morreu muito novo, mas viajamos algumas vezes. Depois que ele
morreu, eu continuei trabalhando, me aposentei, mas continuei trabalhando, mas
aí surgiu outras oportunidades de viajar. Por que aí é mais fácil, você tem uma
amiga que também é solteira, viúva ou separada que tem vontade de viajar... Aí
nós fomos para o Egito e para Israel. Fomos à Jordânia e, chegando à Jordânia, você
desce assim por uma estrada, é tudo pedras, eles fizeram uma estrada e,
naquelas pedras, o vento foi formando desenhos. Depois que nós chegamos lá
embaixo, havia um lugar sagrado, um portal que estava fechado, a gente não pode
visitar, tinha duas barraquinhas de artesanato, de bugingangas, eram duas
barraquinhas, tudo cheio de terra. Daí eu falei: “Preciso comprar alguma coisa,
daqui. Tenho que levar algo da Jordânia”. Eu comprei três colheres de ferro.
Aquelas colherzinhas tudo encardidas, sujas, mas mesmo assim eu trouxe, quando
cheguei aqui eu lavei, lavei, e nada. Fique pensando: “Será que não sai essa
terra dessas colheres”? Então, o que fiz? Comprei uma lata de querosene e mergulhei
as colheres dentro dela. Quando elas ficaram limpinhas, sabe o que tinha no
fundo das colherinhas? A Sagrada Família! Quando eu tirei do querosene e vi aquelas
imagens no fundo das três colheres, fiquei sem acreditar no que estava vendo:
era o presépio. O presépio, realmente, está ligado à minha vida.
José
Flávio – O que representa o presépio para
você?
Sarah
Passarela – Eu acho que é um sinal da vida. A vida dá sinais,
e dá sinais de vida. Cada vez que chega o natal, é uma vida que se renova. É
algo que se renova. Por mais que você seja ateu, e não digo ateu no sentido de
que não acredita. Não acredita porque não conhece. O natal mexe com a pessoa. É
uma renovação para ela. Ela não acredita em nada, mas no natal ela fica mais
sensível. Ela não costuma dar nada, mas quando chega o natal ela presenteia
alguém. Ela passa o ano inteiro sem ver um irmão, mas quando chega o natal ela
vai visitá-lo. Então, o natal, para mim, é sinal de nova vida. Um sinal de
renascer. Eu acho isso fantástico! Eu fico fascinada com o natal, eu queria ter
o triplo dos presépios que tenho, para festejar mesmo, essa nova vida, esse
renascer. Eu penso assim, que... Não no cunho religioso, mas no poder dessa
pessoa, chamada Jesus, o poder que ele tem... As pessoas morrem, daí a um mês,
ninguém lembra mais. Ele (Jesus) morreu há dois mil anos e até hoje é lembrado.
Ele mudou um calendário. Todo ano, as pessoas querem comemorar e ficam mais
sensíveis e alegres com o nascimento dele. É uma coisa que independente de
religião. Eu posso falar bem disso porque eu nasci num lar que não era
católico. Tornei-me católica porque fui estudar em colégio de freira e elas eram
muito boas para a gente. Isso fez com que a gente gostasse da religião
católica. A vida dos santos, eu acho uma coisa maravilhosa. Convivo com amigos
que são Espíritas, Batistas, Testemunhas de Jeová. Eu recebo Testemunhas de
Jeová em minha casa toda vez que eles passam. Eles aprendem lá no culto, que só
vão ganhar o céu, se eles levarem a mensagem. Se ninguém atender, como é que
eles vão... Então, independente de religião, Cristo mexe com todas as pessoas.
Em toda religião, pode ser ela qual for, Jesus está em primeiro plano. Então a
força desse ser, é uma coisa maravilhosa. Então acho que eu escolhi o melhor
caminho. Tem gente que coleciona borracha, canivete...
José
Flávio – Selos.
Sarah
Passarela – Selos. Não desfazendo de quem coleciona essas
coisas, nada disso. Eu acho que eu escolhi o melhor caminho...
José
Flávio – O que acha que falta para as
pessoas levarem o espírito do natal pelo resto do ano?
Sarah
Passarela – É conseqüência do mundo moderno que nós vivemos.
As pessoas precisam trabalhar. Há as divergências, a pessoa acaba, às vezes,
ficando revoltada com coisas que acontecem. Então você acaba até esquecendo
aquele espírito de natal que você teve em dezembro, quando você um seqüestro de
criança. Um pai de família que morre num acidente de trabalho. Então, sem
querer, a pessoa dispersa daquele sentimento. Não dá para ela ficar com aquele
espírito o ano todo. É o bem e o mal, não é? Deus colocou esse Filho no mundo,
para que a gente tenha esse sentimento, mas tem o lado ruim que está aí, lhe
cutucando e a gente precisa ser muito forte para não partir para o lado do mal.
Eu não acredito em céu e inferno, em pecado, em Deus e demônio. Eu acredito em
poderes... O poder da mente.
José
Flávio – Como era o natal junto com a sua família, em
Americana?
Sarah
Passarela – Comemorávamos o natal assim, na minha casa não
tinha presépio. Meu pai não acreditava em... Acontece que meu pai era um
evangélico de mente muito aberta. Ele não era inimigo do padre, meu pai era um
homem culto. Ele estudava a Bíblia como quem estuda um livro. Preconceito,
essas coisas ele não tinha. A árvore de natal era imprescindível em casa. Meu
pai era agricultor. O forte dele era cítricos, mas ele plantava também
pinheirinhos de natal, e a árvore mais bonita ia para minha casa. Então, pelo
menos na minha visão de criança, a árvore mais bonita que existia, era a árvore
de minha casa. Nós tínhamos a árvore de natal e comidas saborosas. Nesse dia,
até vinho meu pai tomava. Ele lia um trecho de Lucas (o Evangelho de Jesus Cristo, segundo Lucas), que falava do
nascimento de Jesus. Eu já nasci com isso.
José
Flávio – Por isso que eu percebo, nos
objetos que decoram sua casa, uma religiosidade muito forte...
Sarah
Passarela – Sim. Nas historias que tem. E, quando
não é época de natal, eu tenho objetos que possuem histórias belíssimas. Eu
tenho um prato que a minha sogra usou na barriga, quando os alemães invadiram a
casa deles. Eles moravam na Itália, ela estava em casa, de avental, então ela
pegou aquele prato e colocou na barriga, então eles pensaram que ela estava
grávida e deixaram-na ir embora, ela e os filhos pequenos, e na realidade o que
ela tinha era um prato que havia colocado na barriga. Ela deu para mim, esse
prato, porque ela sabe que eu amo, que eu gosto das histórias. Então, os
objetos em minha casa sempre têm uma história. Nunca eles estão ali por estar.
José
Flávio – É muito bonita sua relação com a
vida, com os objetos. A Sra. busca colocar um significado em tudo aquilo que
faz... Acho que nada na vida da gente é por acaso. Não estamos aqui por acaso.
Sarah
Passarela – A gente está no mundo porque tem essa
missão de estar no mundo. As pessoas que cruzam o caminho da gente. Pessoas
que, às vezes, vem para enriquecer nossa vida, às vezes até para nos perturbar,
mas isso também pode ser um enriquecimento. Tem tudo isso. A minha história de
natal é essa. Eu escrevia muito sobre natal. Sempre escrevi uns versos, umas
poesias. Até que um dia eu pensei: “Poxa, porque eu não lanço um livro de
natal, já que eu gosto tanto de natal.