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Histórias assustadoras de fantasmas

Posted by Cottidianos on 20:30
Quarta-feira, 09 de julho


Tente
Levante sua mão sedenta e recomece a andar
Não pense que a cabeça agüenta se você parar,
não não não não
Há uma voz que canta,
uma voz que dança,
uma voz que gira
Bailando no ar”.


(da música,Tente outra vez –  Autor: Raul Seixas)



Pensei que após uma boa noite de sono, tudo voltaria ao normal e que a dor passaria, ou pelo menos, suavizasse. Quanto engano! As coisas se deram como se dão os efeitos anestésicos: levamos uma pancada forte, passamos um produto anestésico que, de certa forma, disfarça a dor que sentimos.

Após acordar hoje pela manhã, senti que o efeito anestésico tinha passado e a dor era mais intensa. Liguei a TV e as lembranças da tarde triste de ontem vieram em profusão: a torcida brasileira entrando entusiasmada no estádio, os churrascos sendo preparados e os amigos ávidos por devorá-los após o final de uma partida vitoriosa, as praças lotadas à espera do apito final para a festa começar. Não demorou muito para o que era sonho virar pesadelo. Um... Dois... Três... Quatro... Cinco... Meu Deus! Onde tudo aquilo iria acabar? Será que acabaria? Não acabou. Veio o segundo tempo e, com ele, o sexto e o sétimo gols.

Uma seleção brasileira movimentava-se pateticamente em campo. Uma seleção alemã brincando de Olé. Nas arquibancadas do estádio, lágrimas escorriam copiosamente, manchando de tristeza, rostos pintados em verde e amarelo. Olhos arregalados não acreditavam no que viam. A mesma cena de tristeza e desolação acontecia dentro das casas, nas quais a TV estava sintonizada no jogo... E acho que todas estavam. Homens, mulheres, crianças, idosos todos desolados como quem se depara, de forma inesperada, com um monstro terrível à sua frente. E o monstro não era a Alemanha. O monstro era um futebol horroroso e irreconhecível jogado pela seleção mais vitoriosa de todas as Copas. O monstro era a falta de garra e responsabilidade com que os craques brasileiros se entregavam a partida. Não! Não era possível que estivéssemos assistindo a espetáculo tão deprimente. Nossa vergonha não foi ainda maior, porque os alemães foram cavalheiros.

No segundo tempo, eles voltaram impondo um ritmo menor de jogo, não porque estivessem cansados ou tivessem perdido o entusiasmo. Acho tiveram para conosco um sentimento de misericórdia. Afinal, nós brasileiros, os havíamos recebido muito bem. Mesmo assim, ainda fizeram mais dois gols... E poderiam ter feito mais. Ainda bem que eles puseram o pé no freio e não esmagaram a seleção brasileira, como, de fato, poderiam ter feito. Apenas deram uma surra, vergonhosa, mas de surra, a gente se recupera. Convenhamos, é melhor se recuperar um futebol ferido do que de um futebol esmagado, não concordam? 

Hoje a sensação no país é de luto, de tristeza, de vergonha. Ninguém morreu, graças a Deus! Entretanto, morreu nosso futebol. Para aqueles que acreditam, depois da morte vem a ressurreição gloriosa. No caso do futebol brasileiro, que essa ressurreição venha acompanhada de um maior comprometimento de nossos craques, de um maior incentivo aos nossos atletas, afinal, nosso futebol morreu, mas as Olimpíadas estão bem próximas. O esporte vive em terras brasileiras. Perdemos no futebol, mas não queremos perder em todos os esportes. E ainda dá tempo de revivermos os tempos gloriosos.

Histórias de fantasmas



No meio de toda essa decepção, fiquei pensando em histórias de fantasmas. Esses seres temidos que nos perseguem nas sombras. Tem gente que não acredita na existência deles, porém, fantasma que se preze, não precisa do crédito de ninguém para existir. Eles simplesmente existem, queiramos ou não. Sempre ouvia falar da Copa de 50. Já ouvi falar daquela tragédia milhares de vezes. Ouvia contar da tristeza que se abateu sobre o país ao seu termino. Porém, uma coisa é a realidade da dor, outra sensação que ela provoca e outra mais diferente ainda é o imaginá-la. Só tem a verdadeira dimensão da dor quem sente dor. Quem sabe exatamente a sensação de ter um espinho entrando debaixo do pé. O outro apenas imagina o sofrimento que experimentamos. Agora compreendi exatamente, a verdadeira dimensão entre o sentir a dor e imaginar a dor.

A primeira vez que o fantasma nos apareceu foi no dia 16 de julho de 1950, em pleno Maracanã lotado. Duas equipes, Brasil e Uruguai, entravam em campo buscando um sonho. O Brasil era, de longe, a seleção favorita. Em jogo estava o título de campeão da Copa do Mundo de 1950. A seleção brasileira entrava em campo com Barbosa; Augusto e Juvenal; Bauer, Danilo e Bigode; Friaça, Zizinho, Ademir, Jair e Chico. O técnico era Flávio Costa. Do lado uruguaio estavam: Máspoli; Matías Gonzalez e Tejera; Gambetta, Varela e Rodríguez Andrade; Ghiggia, Julio Perez, Miguez, Schiaffino e Morán, sob o comando do técnico, Juan Lopez.

O clima antes do jogo era a de certeza absoluta de vitória: naquela esplendida tarde de domingo, 16 de julho de 1950, a seleção brasileira receberia a coroa de melhor do mundo do futebol e seus craques sairiam do Maracanã nos braços do povo, em exultante alegria. Os jornais, na manhã daquele dia, antes do jogo, já estampavam a manchete: CAMPÕES DO MUNDO! Nas gavetas dos políticos os belos e emocionantes discursos já estavam prontos para serem lidos após a partida. As carnes já estavam compradas e o carvão já estava na churrasqueira, pronto para ser aceso tão logo o juiz desse o apito final. Nas ruas bandeiras brasileiras tremulavam por todos os lados, em cima e embaixo. Sem a menor dúvida, o Brasil sagrar-se-ia campeão daquele Mundial. Todo um script com final feliz já estava montado muito antes do jogo... Só esqueceram de combinar as cenas mais marcantes e o grã finale com o Uruguai.

A expectativa não era sem fundamento. A seleção brasileira vinha fazendo, no decorrer do campeonato, boas atuações e apresentando um belo futebol. Foram quatro vitórias:

Brasil 4 x 0 México,

Brasil 2 x 0 Iugoslávia

Brasil 7 x 1 Suécia

Brasil 6 x 1 Espanha

E um empate:

Brasil 2 x 2 Suíça

Para a consagração total faltava o fatídico jogo contra o Uruguai. Confiantes, os craques brasileiros precisavam de apenas um empate para levantar a taça. A situação do Uruguai era um pouco mais complicada. Para eles, só a vitória era necessária se quisessem realizar o sonho de erguer o troféu. O treinador uruguaio usou o clima de “Já ganhou”, para motivar sua equipe. Ele queria colocar o time em campo numa posição defensiva. Entrou em cena a coragem do capitão da equipe, Obdulio Varela. Ele foi radicalmente contra essa ideia. Segundo o capitão, diante de um adversário difícil como o Brasil e de um ataque rápido e eficiente como Ademir, Zizinho e Jair, era preciso muito sangue frio e inteligência.

A equipe uruguaia encheu-se de confiança e foi para o campo, para a batalha final. Ainda no túnel, antes de entrar em cena por completo, o capitão da equipe, Obdulio Varela, conhecido como El negro jefe, motivou ainda mais os seus companheiros de equipe. Disse ele uma frase que foi uma boa motivação para a equipe uruguaia e pode servir a qualquer um de nós, em momentos de ventos adversos, como também acredito que possa ter servido para os alemães na tarde de ontem. Antes de entrar em campo, ele virou-se para a equipe e disse:

Não pensem nessa gente. Não olhem para cima

El jefe, referia-se aos duzentos mil torcedores brasileiros que lotavam o Maracanã e seguravam, antecipadamente, a taça de campeões. A bruxa estava solta antes mesmo de o jogo começar. Os jogadores brasileiros estavam muito tensos. Na grande expectativa e ansiedade com que esperavam o início do jogo, não conseguiram almoçar, nem descansar direito. Além disso, ficaram horas dentro do vestiário do Maracanã numa terrível guerra de nervos. Enquanto isso, os uruguaios mostravam-se tranquilos e relaxados. A bandeira do Brasil foi hasteada de ponta cabeça e assim permaneceu. Quando os capitães jogaram a moedinha para a escolha do lado do campo, o Brasil não deu sorte e foi jogar do lado oposto ao que estava acostumado.

Enfim, o juiz apitou o início da partida. O barulho das arquibancadas era ensurdecedor. A torcida jogava junto com o time. O Brasil chegou motivado, e foi o responsáveis pelos primeiros chutes a gol da partida. Os uruguaios procuravam não se impressionar, nem com o desempenho do Brasil, nem com o barulho que vinha das torcidas. As jogadas dos meio campistas do Brasil: Jair, Ademir e Zizinho era automaticamente anuladas pela seleção Uruguai. Sob forte marcação, o Brasil não conseguiu fazer nenhum gol e a partida chegou ao final do primeiro tempo empatada. A torcida continuava em festa, afinal de contas, o empate dava o título ao Brasil.

As equipes voltaram a campo para o reinício da partida. Dois minutos de jogo foi o suficiente para fazer o Maracanã explodir de felicidade com um gol brasileiro. Ademir recebeu a bola de Zizinho e, pela direita, percebeu a aproximação de Friaça. Não teve dúvidas tocou direito para Friaça, que, num chute rasteiro, mandou a bola para o fundo do gol, num chute que tirou qualquer possibilidade de defesa do goleiro Máspoli.

A partir desse gol, começaram os erros de estratégia do Brasil. ao invés de partir para o ataque, a seleção brasileira quis congelar o jogo, “fazendo cera”, como dizemos popularmente. Diminuiu o ritmo de jogo e os ataques e, apenas 11 minutos após, é que houve nova tentativa de gol por parte do Brasil. Antenada, a seleção Uruguai logo percebeu que podia tirar proveito da situação e partiu para o ataque pelo seu lado mais perigoso: as jogadas pela direita. Apostando na velocidade de Ghiggia, as bolas passaram a ser lançadas para ele. A estratégia mostrou-se bem sucedida e, aos 21 minutos, El negro jefe, lançou a bola para Ghiggia, ainda na intermediária, porém, próximo a lateral. O ponta direita escapou da marcação de Bigode, correu veloz e fez um lançamento rasteiro para  Schiaffino. Schiaffino, sem piedade, chutou alto, sem chance de defesa para o goleiro Barbosa que apenas ficou observando a rede balançar. Jogando pela direita, a Celeste havia descoberto o caminho do ouro.

O Maracanã lotado e barulhento silenciou de repente, mas logo a torcida, continuou a incentivar o time, afinal o empate nos garantia a vitória. Aí veio o golpe fatal, aos 34 minutos. Novamente pela direita, Julio Perez, lançou a bola para Ghiggia, que novamente devolveu a jogada ao Perez. Em seguida correu para receber a bola livre da marcação de Bigode. Ghiggia usou uma estratégia diferente e, ao invés de cruzar a bola, como havia feito durante a jogada do primeiro gol uruguaio, chutou forte, deslocou o goleiro — que pensou que haveria uma repetição da primeira jogada e tinha ido para o lado direito da trave — e chutou a bola, rasteira, forte e impiedosamente para o fundo do gol.

Faltando apenas 11 minutos para o fim do jogo, um silêncio geral tomou conta do Maracanã. A taça, naquele momento, havia escapado de nossas mãos. Aquilo era uma coisa totalmente improvável antes do início do jogo. O Brasil bem que tentou, mas não conseguiu reverter o resultado da partida. Quando o arbitro, finalmente, apitou o fim do jogo. Uma frustração enorme tomou conta da torcida, no estádio e em todo o país. As bandeiras que antes haviam embalado o sonho de campeão, agora serviam de lenços para enxugar as muitas lágrimas que caiam dos olhos de milhões de brasileiros. Vinte anos após a primeira conquista, o uruguais igualava-se a Itália e se tornava bicampeão mundial, deixando os favoritos ao título, jogando em casa, com o título de vice-campeões... E os olhos marejados de lágrimas.

Durante a entrega da taça, os uruguaios estavam visivelmente constrangidos com a tragédia brasileira, da qual saiam como protagonistas. Os últimos parágrafos do texto, Jogos Eternos – Brasil 1 x 2 Uruguai 1950, publicado no site Imortais do Futebol, resume bem esse momento: “O Maracanã, que já estava silenciado, virava um poço de choro, lágrimas e tristeza. Os uruguaios não acreditavam no que viam e se sentiam até mesmo sem jeito pela tragédia que haviam acabado de protagonizar. O presidente da FIFA, Jules Rimet, que tinha preparado até um discurso próprio para o Brasil, nem cerimônia fez ao entregar a taça para Varela de tão perplexo que ficou. Estava sacramentado o Maracanazo, como ficou conhecida a maior derrota da história do futebol brasileiro. E, sem dúvida alguma, a maior vitória da história do futebol uruguaio, eterna e que até hoje não foi vingada pelos brasileiros. Ghiggia, Schiaffino e Varela viravam, de vez, monstros sagrados do esporte uruguaio e mundial. Dezenas de rojões foram esquecidos no estádio. Churrascos programados por amigos e familiares de jogadores jamais foram saboreados e curtidos. Ruas inteiras decoradas viraram corredores que celebravam o vazio, o nada. Naquele 16 de julho, nenhum brasileiro podia sorrir ou contar piada. Era dia de chorar. De rever conceitos. De lamentar”(1).

Percebem alguma semelhança com a tarde de 08 de julho de 2014? Até ontem, essa era a história mais chorada, mais sentida, dentro do futebol brasileiro. Até ontem eu disse, pois 64 anos depois, a seleção brasileira, jogando em casa, protagonizou uma história ainda mais triste e vergonhosa. Uma desonra para o futebol brasileiro, sem querer exagera: uma tragédia. Olha que em 1950, perdemos apenas de 2 x 1. Aprendemos com a derrota de 1950. Aquele tapa na cara, nos fez ser um país de forte tradição no futebol. Evoluímos, repensamos nossos conceitos em matéria de futebol, tornamos-nos cinco vezes campeões. Que esse tapa na cara de ontem, sirva também para que o futebol brasileiro seja repensado. Que novas diretrizes sejam seguidas. Que novos caminhos apareçam e novos horizontes se abram.

Hoje compreendo perfeitamente a dor e a tristeza que tomaram conta do Brasil naquele 16 de julho de 1950. Sentimos na pele a mesma dor, porém de forma mais intensa, na tarde deste 08 de julho de 2014. Uma data que gostaríamos de esquecer, mas que ficará marcada para sempre em nossos corações e na história do futebol mundial. O engraçado é que, quando o Uruguai de Suárez, começou a ganhar jogos neste Mundial, ouvi comentaristas esportivos dizerem: “O fantasma de 1950 está vivo”. Não sabiam eles que o fantasma estava vivo... Porém, reencarnado na Alemanha.


Mudando de assunto e, ao mesmo tempo, permanecendo no mesmo...

A grande festa da final da Copa do Mundo, domingo (13), no Maracanã terá duas grandes estrelas do planeta futebol. Uma representando a América do Sul e outra a Europa. Nossos arquirrivais no futebol, os argentino, enfrentarão os alemães na briga pelo título de campeões mundiais de 2014.

 O jogo entre as seleções holandesa e argentina não foi um jogo eletrizante como era de se esperar. Porém, foi um jogo de muito equilíbrio entre as duas equipes . Apesar da pouca adrenalina, pode se dizer que foi um jogo de semifinal de verdade, diferentemente do outro ao qual assistimos ontem.

O técnico holandês, Louis van Gaal,  não pode contar com a estrela do goleiro reserva Krul, pois já havia gastado a sua cota de substituição no começo da prorrogação. O goleiro reserva da Holanda foi quem garantiu a classificação nos pênaltis no jogo contra a Costa Rica. A responsabilidade ficou por conta de Cilessen. Entretanto, nessa guerra de goleiros, foi melhor Sergio Romero, goleiro argentino.

Ron Vlaar foi o primeiro a bater o pênalti pela Holanda. O goleiro argentino defendeu indicando que estrela brilharia mais na cobrança de pênaltis. Sergio Romero ainda defendeu, de forma brilhante, a cobrança de pênalti do holandês Sneijder. O goleiro Cilessen não pegou nenhuma das penalidades e a cobrança terminou em 4 a 2 para os argentinos. Os argentinos fizeram a festa. Com a vitória da Argentina sobre a Holanda, a Alemanha, com certeza, vai ganhar milhões de torcedores brasileiros. Domingo, esse será o cenário do palco principal, em mais um show de bola, que ocorrerá em um ícone do futebol brasileiro: o Estádio Maracanã, no Rio de Janeiro, sob a benção e proteção do Cristo Redentor.

A melancólica disputa pelo terceiro lugar acontecerá no sábado (12), em Brasília, entre Brasil e Holanda. Para a nossa humilhação ficar completa, só falta a Argentina vencer o Mundial jogando no Brasil. Será que merecemos mais essa? De qualquer modo, a sorte está lançada. Faço votos de que tudo seja apenas festa e que as seleções nos presenteiem com um show de futebol e talento.



(1)     Citação extraída do site Imortais do Futebol:  http://imortaisdofutebol.com/2013/04/30/jogos-eternos-brasil-1x2-uruguai-1950





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