Pega na mentira
Quarta-feira,
22 de setembro
“Você vive de mentira, ha-ha
A mentira te alimenta, ha-ha
As aparências enganam
E você só aparenta
Se você queria paz veio ao lugar errado
O futuro nunca chega e nem se volta ao
passado”
(De Mentira – Zeca Baleiro)
Desde
que a comitiva brasileira chegou a Nova Iorque para Assembleia Geral da ONU,
liderada pelo presidente, Jair Bolsonaro, não há nada do que nós, brasileiros,
que não pertencemos ao chiqueirinho, digo do cercadinho do presidente, possamos
nos orgulhar. A comitiva tem dado um vexame atrás do outro, e sofrido um vexame
atrás do outro.
Primeiro
que a legislação da cidade de Nova Iorque não permite a entrada de não vacinados
em lojas, bares e restaurantes. E o presidente Bolsonaro não tomou vacina, e
nem pretende tomar agora.
O
presidente já teve que comer pizza, de pé, em frente a um restaurante, por esse
motivo. Em uma churrascaria, para driblar a exigência da vacinação, foi
improvisado um “puxadinho” na calçada, em frente à churrascaria, com mesas ao
ar livre e cercadas por um pano preto. Junto com o presidente nesse puxadinho
estavam os ministros da Saúde Marcelo Queiroga, do Meio Ambiente, Joaquim
Leite, o chanceler Carlos França e o chefe do GSI Augusto Heleno.
No
domingo, 19, alguns manifestantes contrários ao governo Bolsonaro se reuniram
em frente ao hotel Intercontinental New York Barclay. O presidente resolveu fugir
deles entrando no hotel pela porta dos fundos. Na noite de segunda-feira, 20, o
presidente e alguns membros da comitiva foram jantar na casa do representante
da missão brasileira nas Nações Unidas. Alguns manifestantes se aproximaram da
van em que estava o presidente com gritos de protestos. O ministro da Saúde,
Marcelo Queiroga, exaltado se levanta do banco da van e faz gestos obscenos
para os manifestantes.
Outro
que não se comportou de acordo com o que manda a boa educação, nem com a
liturgia do cargo, foi o ministro das Relações Exteriores, Carlos França. Para
os manifestantes ele fez gesto de armas com os dedos. Gesto tão apreciado pela
família Bolsonaro.
Certamente,
esses foram situações bastante constrangedoras, porém a coroação do
constrangimento foi o discurso feito pelo presidente, Jair Bolsonaro, nesta
terça-feira, 21, no discurso de abertura da Assembleia Geral da Nações Unidas.
O
presidente não foi nada diferente da sua essência: vazio e mentiroso. E o
discurso dele, idem. Para começar, deve ter sido chocante, no mínimo estranho,
que o mandatário que faz o discurso de abertura seja um não vacinado. Na
verdade, Bolsonaro aproveitou o palco da ONU para fazer uma live de luxo. Quem
acompanha as lives do presidente às quintas-feiras logo reconheceu o estilo. As
lives do presidente são cheias de mentiras, bobagens, e brincadeiras sem graça
e de mal gosto. E um detalhe: Nela o presidente fala à sua base, aos seus apoiadores.
Pois, para esses Bolsonaro pode até falar que a Terra é redonda que eles prontamente
acreditarão. O mesmo acontecerá se ele disser que Papai Noel existe.
Mas,
vamos ao discurso.
Após
as saudações iniciais, Bolsonaro já dá uma de direita na imprensa, dizendo que
vai “mostrar o Brasil diferente daquilo publicado em jornais ou visto em
televisões”. E nesse caso, não apenas a imprensa brasileira é a vilã, mas a
imprensa mundial, uma vez que a imprensa mundial também publica muitas críticas
verdadeiras a respeito do governo, e do presidente. É a imprensa como inimiga.
Aquela que deveria mostrar apenas as coisas boas que o governo faz. O problema
é que jornalismo e literatura estão no mesmo plano, mas não a mesma coisa. Na
literatura se pode inventar um mundo de coisas e sentimentos. O jornalismo, o
bom jornalismo, deve se prender aos fatos e a realidade. Não dá para falar de
coisas quando elas inexistem.
Vamos
a segunda grande mentira, e olhem que, tirando as saudações iniciais ainda
estamos bem no início do discurso.
“O
Brasil mudou, e muito, depois que assumimos o governo em janeiro de 2019. Estamos
há 2 anos e 8 meses sem qualquer caso concreto de corrupção”
O
Brasil mudou muito é verdade, desde que Bolsonaro assumiu a presidência, e não
foi para melhor. Instabilidade, confusão, ataques a democracia, desmonte do
meio ambiente. Desmonte da Lava Jato. O presidente deveria ter falado dos escândalos
de corrupção que a CPI trouxe à tona que são os contratos tenebrosos para a aquisição
de vacinas. Ele também não falou dos escândalos de corrupção que envolvem seus
filhos, e dos processos que tramitam contra ele no STF e no TSE.
E
quanto a Amazônia? Vejamos o que disse o presidente.
Nenhum
país do mundo possui uma legislação ambiental tão completa.
Nosso
Código Florestal deve servir de exemplo para outros países.
O
Brasil é um país com dimensões continentais, com grandes desafios ambientais.
São
8,5 milhões de quilômetros quadrados, dos quais 66% são vegetação nativa, a
mesma desde o seu descobrimento, em 1500.
Somente
no bioma amazônico, 84% da floresta está intacta, abrigando a maior
biodiversidade do planeta. Lembro que a região amazônica equivale à área de
toda a Europa Ocidental.
Antecipamos,
de 2060 para 2050, o objetivo de alcançar a neutralidade climática. Os recursos
humanos e financeiros, destinados ao fortalecimento dos órgãos ambientais,
foram dobrados, com vistas a zerar o desmatamento ilegal.
E
os resultados desta importante ação já começaram a aparecer!
Na
Amazônia, tivemos uma redução de 32% do desmatamento no mês de agosto, quando
comparado a agosto do ano anterior.
QUAL
PAÍS DO MUNDO TEM UMA POLÍTICA DE PRESERVAÇÃO AMBIENTAL COMO A NOSSA?
Acho
que sobre isso o presidente disse apenas duas verdades: Quando ele exalta a
nossa legislação ambiental e o nosso código florestal. A partir daí, já não há
mais verdades. Todos temos conhecimento do como o presidente Jair Bolsonaro
encara essa questão do meio ambiente. Para ele, o meio ambiente só tem uma
finalidade: dar lucro a madeireiros, mineiros, e grileiros ilegais. É preciso
destruir a natureza para que ela nos dê lucros, e não proteger para que ela nos
traga segurança.
Também
era preciso dedicar, pelo menos um curtíssimo parágrafo para as questões
internacionais.
O
futuro do Afeganistão também nos causa profunda apreensão. Concederemos visto
humanitário para cristãos, mulheres, crianças e jovens afegãos.
Os
refugiados afegãos são bem-vindos, se forem cristãos. Se não forem cristãos, se
forem mulçumanos, procurem outro país para se refugiarem.
Obviamente,
como nas lives de quinta-feira, não poderia deixar de ter as críticas aos
prefeitos e governadores que promoveram lockdowns, e ajudaram a salvar muitas
vidas.
Sempre
defendi combater o vírus e o desemprego de forma simultânea e com a mesma
responsabilidade. As medidas de isolamento e lockdown deixaram um legado de
inflação, em especial, nos gêneros alimentícios no mundo todo.
No
Brasil, para atender aqueles mais humildes, obrigados a ficar em casa por
decisão de governadores e prefeitos e que perderam sua renda, concedemos um
auxílio emergencial de US$ 800 para 68 milhões de pessoas em 2020.
Lembro
que terminamos 2020, ano da pandemia, com mais empregos formais do que em
dezembro de 2019, graças às ações do nosso governo com programas de manutenção
de emprego e renda que nos custaram cerca de US$ 40 bilhões.
Assim
como quando se trata da vida do meio ambiente, para a qual o que interessa é o
lucro e não a preservação, para a vida humana o raciocínio não é diferente. É
preciso fazer a economia girar, mesmo que para isso tenha que enviar milhares
de brasileiros para a morte. Todos nós nos lembramos do descaso com o qual o
presidente tratou da questão da pandemia. Minimizando a letalidade do vírus,
desprezando as vacinas, ignorando o uso de máscaras, e incentivando aglomerações.
Se o presidente tivesse incentivado o lockdown, e a vacina, não estaríamos na
situação que estamos hoje, nem na saúde, com milhares de mortes, nem na
economia, com uma inflação absurda que comeu o poder de compra do brasileiro. Milhões
de brasileiros desempregados.
O
governo só se preocupou em comprar vacinas quando os brasileiros viram vários
países começando a se vacinar e nós sem sair do lugar. Vieram as críticas e o
presidente foi obrigado a comprar vacinas. Tardiamente.
E,
essa é para cair de costas. O presidente usou a tribuna da ONU para fazer
defesa do tratamento precoce, que já está mais do que provado que não tem
eficácia nenhuma contra a Covid-19. Ele também condena a obrigatoriedade da
vacina.
Apoiamos
a vacinação, contudo o nosso governo tem se posicionado contrário ao passaporte
sanitário ou a qualquer obrigação relacionada a vacina.
Desde
o início da pandemia, apoiamos a autonomia do médico na busca do tratamento
precoce, seguindo recomendação do nosso Conselho Federal de Medicina.
Eu
mesmo fui um desses que fez tratamento inicial. Respeitamos a relação
médico-paciente na decisão da medicação a ser utilizada e no seu uso off-label.
Não
entendemos por que muitos países, juntamente com grande parte da mídia, se
colocaram contra o tratamento inicial.
A
história e a ciência saberão responsabilizar a todos.
Não
poderia faltar nesse rosário de mentiras o tal 7 de setembro. O presidente
disse que milhões de brasileiros foram às ruas. Grande mentira. Talvez essas
milhões de pessoas estivessem apenas na cabeça dele. O problema é que essas
mentiras circulam fortemente nas redes sociais, com fotos adulteradas e muitas fake
news. E o bolsonarista radical acredita. Se confrontado com a realidade, ele dá
as costas para a realidade e fica com a ilusão.
Se
fosse comentar todo o discurso do presidente Jair Bolsonaro, esta postagem
certamente ficaria muito longa. Por isso, resolvi escolher apenas alguns
trechos. Mas, gostaria de compartilhar com os leitores uma das análises mais
completas que vi sobre o assunto. E foi no Jornal Nacional, edição desta terça-feira,
21. Está disponível no Globo Play.
https://globoplay.globo.com/v/9880266/programa/?s=13m48s
Ou
na página do Jornal Nacional.
https://g1.globo.com/jornal-nacional/