500 mil mortes pela Covid... E uma tristeza enorme
Domingo, 20 de junho
“E por falar em saudade
Onde anda você?
Onde
anda os seus olhos
Que
a gente não vê
Onde
anda esse corpo?
Que
me deixou morto
De
tanto prazer
E
por falar em beleza
Onde
anda a canção?
Que
se ouvia na noite
Dos
bares de então
Onde
a gente ficava
Onde
a gente se amava
Em
total solidão”
(Onde
Anda Você – Vinícius de Moraes /Toquinho)
Infelizmente
não apenas chegamos, como também ultrapassamos a triste marca de 500 mil mortes
por Covid-19.
E
assim caminhamos para a liderança no número de mortes pela doença no mundo que,
atualmente é exercida pelos Estados Unidos. Naquele país já são 601 mil
vítimas.
Ocorre
que os Estados Unidos estão muito bem na campanha de vacinação de seus
concidadãos. Tão bem que até estão doando vacinas para outros países do globo
que não dispõem de tanto dinheiro assim para a aquisição das vacinas para
imunizar toda a sua população em período desejável.
No
Brasil, ao contrário, além de não termos entrado na guerra contra o vírus com a
arma certa, a vacina, temos até agora, apenas 11,45% da população vacinada com
as duas doses exigidas dos imunizantes que circulam por aqui.
Tivemos
também o azar de ter no comando de um dos piores momentos da história do país
um homem sádico e egoísta que, ao invés de se unir à ciência para combater o
vírus, desdenhou tanto da pandemia quanto da ciência.
De
tudo ele já falou um pouco. Disse que o vírus era apenas uma “gripezinha”, que
a imprensa estava superdimensionando a doença, que a sociedade estava fazendo
uma “histeria” em relação ao assunto. Ele também disse: “E daí? Lamento.
Quer que eu faça o quê? Eu sou Messias, mas não faço milagre”.
O
presidente também desdenhou daqueles que procuravam seguir os conselhos da OMS,
dizendo que vivíamos em um país de “maricas” por causa das pessoas ficavam em
casa durante o lockdown. Deu risada e fez festa, enquanto o país chorava seus
mortos. Agora, no momento presente, enquanto vários políticos, entidades
sociais, e outros diversos setores da sociedade divulgaram nota de pesar por
essa quantidade imensa de brasileiros mortos, o presidente preferiu silenciar.
No
dia em que o Brasil atingiu a triste marca, ao invés de uma nota de pesar e de
solidariedade ao povo brasileiro, o presidente divulgou um vídeo em que elogia
o trabalho dos policiais que trabalham na captura do maníaco Lázaro Barbosa,
que há mais de 10 dias está sendo intensamente procurado.
O
bandido movimenta em grande efetivo de força policial na sua captura. Quase 300
policiais estão envolvidos na busca dele. Eles também usam helicópteros e cães
farejadores. Como Lázaro está numa área de fazendas e chácaras, em Cocalzinho,
distante cerca de 131 km de Goiânia, Goiás, é fácil para ele se disfarçar entre
as árvores, como um camaleão. Enfim, no dia em que o Brasil atinge a marca de
meio milhão de mortos pela Covid, o presidente faz elogios aos policiais que
atuam nessa operação, e silencia sobre os números da pandemia no Brasil.
Se
fosse apenas esse sentimento glacial do presidente, ainda assim seria
assustador. Mas os depoimentos da CPI têm mostrado — ainda que as testemunhas
ligadas ao governo que já prestaram depoimento tenham mentido mais que Pinóquio
— que houve uma intenção de deixar que as pessoas se contaminassem com o vírus.
O
plano macabro consistia em pôr em prática no país a tal da imunidade de rebanho,
também conhecida como imunidade coletiva. A prática consiste em em fazer com
que a população adquira imunidade ao vírus, seja pela vacinação, ou por infecção
natural, ou seja, deixar que a população se contamine propositalmente.
Entre
as duas opções: a vacinação e a imunidade de rebanho, Bolsonaro resolveu seguir
o caminho obscuro e perigoso da imunidade de rebanho. O resultado? Uma tragédia
brasileira. O coronavírus, como se sabe, é um vírus totalmente desconhecido. E que
consegue rapidamente se reinventar, originado várias mutações.
Dessa
raiz equivocada brotaram outras decisões também equivocadas. Os caminhos
apontados pela CPI mostram que foi criado, dentro do governo e com aprovação
deste, um gabinete paralelo ao ministério da Saúde, que orientava o governo a defender
o uso do kit covid, conjunto de
medicamentos sem eficácia comprovada contra a Covid.
Era
preciso tudo parecer natural, então o presidente estimulava as aglomerações, causando,
ele próprio, essas aglomerações, e criticar as medidas de isolamento social, e o
uso de máscaras. Era preciso deixar a população brasileira à mercê do vírus. É como
se um líder guiasse seu povo para o precipício.
O
governo conseguiu ser ainda mais cruel. Enquanto o mundo corria atrás de
vacinas, o governo do presidente, Jair Bolsonaro, as esnobava. Foram dezenas de
vezes que as farmacêuticas procuraram o governo para oferecer as vacinas. Praticamente
imploraram para que o governo as adquirisse, e muitas vezes, até baixaram os
preços. Mas nem assim o governo se convenceu da importância dos imunizantes.
Só
foi adquiri-las quando o governo de São Paulo, João Dória, arregaçou as mangas
e foi buscar, na China, a Coronovac. E quando as críticas pela falta de vacinas
no Brasil ficaram mais fortes.
Fica
fácil deduzir que o tal do gabinete das sombras era mais forte que o órgão máximo
da saúde no país, o ministério da Saúde, quando percebemos que nenhum dos
quatro ministros da Saúde durante a pandemia —
número absurdo de ocupantes do cargo, visto que estamos em meio a uma situação sanitária
gravíssima no Brasil e no mundo — teve autonomia para realizar o trabalho.
Como
sabemos o primeiro-ministro a ocupar o cargo, Luiz Henrique Mandetta, deixou o
cargo por discordâncias com o governo. O seguinte, Nelson Teich, também fez a
mesma coisa. Pazuello, como sabemos, dizendo de um modo bem popularesco, era um
“pau mandado” de Bolsonaro. Fazia todas as vontades do chefe. Tanto é que a
primeira coisa que fez foi algo que Mandetta e Teich haviam se recusado a
fazer: mudar o protocolo de cloroquina e autorizar o medicamento para casos
leves de Covid-19.
Pazuello
saiu por pressão, principalmente, depois na crise de oxigênio em Manaus,
Amazonas. Entrou, Marcelo Queiroga. Queiroga também não tem autonomia para desenvolver
seu trabalho. Uma prova de que o gabinete paralelo ainda é muito forte, e que,
num assunto tão sério que é a questão da saúde da população brasileira, e principalmente
em meio a pandemia, o mais importante para o governo, não é a especialidade do
profissional que ocupa um cargo no ministério da Saúde — digo ministério da Saúde,
porque estamos falando aqui de saúde, mas isso parece ser uma regra geral em
todos os ministérios e níveis de governo — é seu posicionamento político, e não
o quão preparado ele seja. Precisa apenas concordar com o que o governo quer. Ao
contrário, se o profissional for totalmente despreparado para assumir a função,
mas se ele for afinado com as ideias tortas do Bolsonaro, então ele já se
capacitou para o cargo.
E
aí chegamos a um ponto interessante. A CPI foi formada para investigar os atos e
responsabilidades do governo federal na pandemia. E está ficando claro que o
governo não teve responsabilidade nenhuma na pandemia. Ao contrário, o governo
agiu com enorme irresponsabilidade.
Então,
depois que tiveram início os trabalhos da pandemia, parece que Bolsonaro
resolveu cometer os crimes de forma explicita. Foram várias as vezes nos
últimos dias que ele voltou a carga na defesa de cloroquina, contra o
distanciamento social, o uso de máscaras, e até a favor da imunidade de rebanho.
E fez isso em lives, discursos em palanques, igrejas evangélicas, entrevistas.
Incrivelmente,
depois de todos os relatos da ciência, depois de todas as mortes e sofrimento
que a doença provocou no país, na quinta-feira passada, 17, em um live, Bolsonaro
produziu prova contra si mesmo. Ele disse: “Todos que já contraíram o vírus
estão vacinados. Até de forma mais eficaz que a própria vacina, porque você
pegou o vírus para valer. Então, quem pegou o vírus, não se discute, está
imunizado”.
Aproveitou
a ocasião também para zombar da Coronavac, vacina que foi a nossa tábua de
salvação, sem ela o Brasil não teria começado a vacinar em meados de janeiro, e
olhem que já começamos atrasados em relação a outros países que saíram na
frente. Consequentemente, se não fosse o esforço do governo de São Paulo, em
trazer o imunizante para o Brasil, o número de brasileiros mortos pela doença
poderia ser bem maior.
Por
tudo isso, mesmo estando em uma situação ainda grave em relação à pandemia, o
povo voltou às ruas do Brasil neste sábado, 21. E, porque sentiram a responsabilidade
na questão das medidas sanitárias, como uso de máscara, com que foi realizado o
protesto contra o governo no dia 29 de maio, os protestos deste sábado tiveram
maior adesão que o anterior.
O
bom disso tudo, é que desta vez, não houve incidentes graves em nenhum lugar do
país. Ao contrário do protesto anterior no qual a polícia de Pernambuco agiu
com truculência contra manifestantes que protestavam pacificamente.
Se
considerarmos que muita gente não vai às ruas por medo do coronavírus, então
nos aproximaremos do tamanho do número de brasileiros insatisfeitos com o governo
de Jair Bolsonaro.
Semana
que passou, Nova York realizou uma queima de fogos de artifícios. Foi lindo
ver, ainda que de longe, pelas ondas da TV ou da Internet, os fogos coloridos explodindo,
brilhando e fazendo desenhos nos céus nova iorquinos. Explodindo de alegria
também estava mesmo era o coração dos nova iorquinos. Não. Não era uma antecipação
do Ano Novo. Era, sim, a comemoração de uma vida nova, de uma vitória. Era o
anúncio do fim das restrições contra a Covid-19. A medida foi anunciada pelo
governador Andrew Cuomo depois que o estado atingiu a marca de 70% de
vacinados.
E
assim, veremos, gradativamente, essas cenas ocorrerem em outros países mais adiantados
na vacinação de seus concidadãos.
Enquanto
no Brasil, isso ainda vai demorar a acontecer. Talvez, no final do ano, consigamos
atingir um total de 70% de brasileiras e brasileiros vacinados.
A
diferença entre os países que comemorarão a vitória sobre o vírus antes de nós,
é que eles não navegaram no mar da mediocridade em busca de cloroquina, ivermectina,
e semelhantes. Eles correram atrás de vacinas. Outra diferença é que eles não
têm líderes sádicos, frios e insensíveis. Os Estados Unidos até tiveram, mas se
livraram dele, e a luz voltou a brilhar por lá.
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