Pacto de silêncio quebrado
Terça-feira, 25 de julho
1º |
PSC |
106657 |
3,64% |
||
2º |
PSOL |
90473 |
3,09% |
||
3º |
DEM |
71468 |
2,44% |
||
4º |
PMDB |
57868 |
1,98% |
||
5º |
PSOL |
46502 |
1,59% |
Marielle Franco estava radiante. Naquele
2016, a realização da campanha eleitoral no Rio disputara espaço com a
realização dos Jogos Olímpicos, que ocorreram entre os dias 5 e 21 de agosto, e
dos jogos Paraolímpicos, entre os dias 7 e 18 de setembro. Além disso, os
cariocas tiveram como pano de fundo, uma crise financeira que atrasou o
pagamento de salários dos servidores estaduais de todo o estado do Rio de
Janeiro.
Assim, como as Olímpiadas e Paraolimpíadas
haviam coroado muitos atletas, através de muito esforço e treino, haviam
chegado ao alto do pódio, e colocado no pescoço suas medalhas de ouro, prata e
bronze, aquele terminava para Marielle com grande vitória.
Aos 37 anos, fora eleita a 5ª vereadora
mais votada do Rio de Janeiro. Agora, sim, ela podia dar vazão ao sonho de
ajudar os menos favorecidos. Ela conhecia bem os anseios dessa gente. Afinal de
contas não estava apenas do lado da multidão de gente marginalizada, estava no
meio dela, entre ela, e era, ela própria, marginalizada.
A vida nos joga nos braços missão que aqui
viemos realizar por dois modos: pelo amor, ou pela dor. E Marielle enveredou
pelas trilhas dos Direitos pela dor. Na época em que fazia pré-vestibular
comunitário houve um tiroteio entre polícia e traficantes na favela do Complexo
da Maré. Nesse confronto, uma amiga muito querida de Marielle acabou morrendo,
vítima de bala perdida.
Ela prosseguiu o caminho sem amiga.
Formou-se pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), e
depois fez mestrado em Administração Pública, na Universidade Federal
Fluminense (UFF). Escolheu como tema de dissertação de mestrado, “UPP: A
redução da favela a três letras”.
Aos 19 anos, ela se tornou mãe de uma
menina, o que a fez experimentar os desafios de ser mulher, negra, mãe, e
moradora de favela. E assim, a vida foi guiando Marielle para os caminhos dos
Humanos Direitos.
E foi essa luta que fez Marielle Franco
segurar a bandeira dos Direitos Humanos com unhas e dentes, como faz uma leoa
com sua cria.
Foi com esse espírito que, ela militante
do PSOL, ingressou, como vereadora, na Câmara Municipal do Rio de Janeiro. E
todas as bandeiras e pautas que defendeu durante sua atividade política
apontavam sempre na direção de um mundo mais justo.
E as pautas defendidas por ela eram;
Justiça Racial e Segurança Pública, Gênero e Sexualidade, Direito à Favela e à
Periferia, Justiça Econômica, Social e Ambiental. Saúde Pública Gratuita, de
Qualidade e Integral, Educação Pública, Gratuita, de Qualidade e
Transformadora, Cultura, Esporte e Lazer.
Marielle não era uma vereadora de
gabinete. Ela estava sempre junta às suas bases, trabalhando, colocando a mão
na massa.
Porém, os seres das trevas não gostam dos
filhos da luz. E enquanto ela olhava para o sol e irradiava para seus irmãos
cariocas a luz que vem dele, os seres trevosos, desde o ano de 2017, tramavam uma
forma de tirar a vida dela. Naquele ano, tentaram, mas não conseguiram, devido
a uma falha mecânica no carro que seria usado na execução dela.
E um dia, finalmente, eles conseguiram
silenciar a voz de Marielle Franco.
Era noite de quarta-feira, 14 de março de
2018. Um grupo de mulheres na Casa das Pretas – espaço coletivo destinado a
mulheres negras, localizada na Lapa, centro do Rio. Eram quase 19 horas, e elas
estavam ansiosas, à espera da vereadora do PSOL, Marielle Franco.
No local seria realizado o debate Jovens
Negras Movendo Estrutura, cuja mediadora seria, justamente, a vereadora. O
debate estava marcado para começar as 18hs, mas por causa de alguns
contratempos na Câmara, a vereadora não conseguiu chegar a tempo. Por fim,
conseguiu se juntar as mulheres pouco depois das 19hs. O evento também seria
transmitido pela página de Marielle no Facebook.
O debate transcorreu de modo tranquilo. Sem
incidentes. Para finalizar sua participação, a vereadora escolheu uma frase da
escritora americana, negra, feminista, e gay, Audre Lorde. Diz a frase: “Não
sou livre enquanto outra mulher for prisioneira, mesmo que as correntes dela
sejam diferentes das minhas”.
Maria explicou ao público presente e a
quem assistia ao evento pela rede social que havia escolhido essa frase em um
curso de inglês. Fora pedido a ela no curso que ela citasse alguma mulher que
tivesse como referência. E ela escolheu a escritora americana. Havia,
claramente, nessa escolha uma auto identificação, sendo ela mesma, Marielle,
mulher, negra, e gay.
“O lugar de mulher, mulher negra,
bissexual, agora estou casada com uma mulher, mas tenho uma filha. Dessas
muitas representações a gente vai aprendendo, conhecendo e estudando mais”,
disse Marielle, finalmente, encerrando o debate.
Ao final do encontro, foi o momento de
posar para as fotos, para aquela conversinha animada, enfim, celebrar mais um
encontro bem-sucedido. Aline Lorena, cineasta, amiga de Marielle, e que também
estava participando do debate, sugeriu que o grupo fosse comemorar em algum bar
no bairro boêmio da Lapa.
Marielle não quis. Tivera um dia muito
cansativo na Câmara de vereadores. E por esse motivo, preferia ir para casa
descansar. Além do mais, foram duas horas de debate intenso. Era quase nove da
noite, e ela teria que estar na Câmara cedo no dia seguinte. Lá fora, os inimigos já a aguardavam. E a
intenção deles não era das melhores.
Algumas das mulheres não desistiram de
fechar a noite tomando cerveja. Pouco depois da nove e meia da noite, quando já
estavam desfrutando de uma gostosa cerveja gelada, chegou a notícia pelo
WhatsApp: Marielle havia assassinada. Impossível, pensaram elas. Só pode ser
fake news. Afinal, não faz nem meia hora que nos despedimos dela, do motorista,
Anderson Gomes, e da jornalista e assessora, Fernanda Chaves, e estava tudo
bem.
Apreensivas elas ligaram para pessoas do
PSOL, partido de Marielle, e eles confirmaram a tragédia. Enquanto se dirigiam
para casa, um carro emparelhou com o veículo onde os três estavam, disparando
uma saraivada de metralhadora. Marielle e Anderson, morreram na hora, Fernanda
Chaves, milagrosamente, escapou com ferimentos leves provocados pelos
estilhaços.
Desde então, duas perguntas ainda não
foram respondidas: Quem mandou matar Marielle, e porquê? Após o assassinato, a
extrema direita tentou de todas as formas, desqualificar a figura daquela que
havia, como uma brava guerreira, tombado em combate. Enxurrada de notícias
falsas invadiram as redes bolsonaristas, algumas delas ligando Marielle ao
tráfico.
O pacto de silêncio entre os criminosos foi quebrado essa semana, e depois de cinco anos, podemos estar mais perto dessas duas perguntas que, há tempos, o Brasil se faz.
Um dos envolvidos no crime, o ex-policial
militar Élcio Queiroz, resolveu, através de uma delação premiada, quebrar o
pacto de silêncio. E deu detalhes importantes sobre o crime. Trechos da delação
premiada feito pelo ex-policial foram divulgadas nesta segunda-feira, 24.
Ele contou que dia 14 de março de 2018,
estava prestando serviços de segurança particular para as Casas Bahia. Por volta
do meio dia, teria recebido uma mensagem de Ronnie Lessa. Ronnie pedia que, às
16hs, fosse encontra-lo em sua casa, na Barra da Tijuca, e que evitasse o
horário de pico. As mensagens foram recebidas através do aplicativo Confide,
que apaga as mensagens depois que elas são lidas.
Élcio só conseguiu chegar à casa de Ronnie
às 17hs. E o encontrou com uma mala preta contendo a arma do crime. Ele sabia
que seria uma execução, mas não sabia ainda quem seria o alvo. A seguir, entram
no carro de Ronnie e vão até uma rua sem saída, e entram num Cobalt branco, que
seria usado no crime. A pedido de Ronnie os celulares não levados, ficando no
carro dele.
Os dois saem pelas ruas do Rio, apenas
durante o trajeto é que Élcio fica sabendo que o alvo é Marielle Franco, e que
ela estará na Casa das Pretas. Estacionam o Cobalto, e Ronnie diz par Élcio.
Agora você ter que me ajudar. Ele dobra o banco e se arrasta para o banco
traseiro. Ronnie começa então a se equipar: coloca um casaco preto, tira a
submetralhadora da bolsa, instala o silenciador, coloca uma toca na cabeça, e
pega um binóculo. Pacientemente, esperam que a vereadora saia do evento.
Finalmente, Marielle sai da Casa das
Pretas, acompanhada da assessora. Ronnie quer executá-la ali mesmo. Élcio diz
que é loucura por causa do movimento de pessoas que acompanham Marielle.
Marielle se despede do grupo de mulheres e
entra no carro, junto com o Anderson, e Fernanda Chaves. O Cobalt passa então a
seguir o carro de Marielle. Em um momento do trajeto, o carro da vereadora
diminui a velocidade. Ronnie sente que chegou a hora. Pede que Élcio emparelhe
o carro com o deles, e efetua os disparos. O crime que eles achavam perfeito
estava consumado. Élcio sente as capsulas caírem sobre ele.
Depois do assassinato, às 21h48, os dois
seguem para a casa da mãe de Ronnie, no Méier, onde haviam deixado o carro. De lá,
chamam um táxi e vão para um bar, na Barra da Tijuca. Lá se encontram com
Maxwell. Os três ficam bebendo até as 3h da manhã. Foi ainda no bar, pela TV,
que ficaram sabendo que não haviam matado apenas Marielle, mas também o
motorista.
No dia seguinte, dia 15, foram retirar as
capsulas que haviam caído do carro, trocar a placa, e levar o carro para Rocha
Miranda, local onde seria feita a desova do automóvel por Edmilson Barbosa dos
Santos, mais conhecido como orelha.
Apoiada na delação de Élcio, a PF e o Ministério
Público do Rio de Janeiro realizaram, na manhã de segunda-feira, 24, a operação
Élpis. A operação prendeu o ex-sargento do Corpo de Bombeiros, Maxwel Simões
Correia, também conhecido como Suel. O ex-bombeiro já havia sido preso em 2020.
As investigações mostraram que ele ajudou a descartar armas escondidas por
Ronnie Lessa. Após a delação de Élcio a PF chegou à conclusão de que a
participação dele no crime vai além de ajudar a destruir provas. Ele participou
do planejamento do crime. Por isso, responderá por duplo homicídio, junto com
Élcio Queiroz e Ronnie Lessa.
As investigações mostraram também que os
suspeitos de executarem Marielle e Anderson movimentaram milhões de reais após
o cometimento do crime. Apresentando renda incompatível coma as atividades que
desenvolviam.
Ainda não sabemos quem mandou matar Mariele e Anderson, nem porquê? O fato é que famoso ou não, essa pessoa é muito poderosa. Também é certo que só houve avanços importantes nessa investigação devido a mudança de governo. Agora vemos uma luz no fim do túnel, pois se tivesse permanecido do poder o presidente Jair Bolsonaro, essa luz no fim do túnel ficaria cada vez mais distante, mais opaca, e, por fim, se apagaria.
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