O brilho da cobiça
Segunda-feira, 06 de março
O
brilho das joias tem encantado homens e mulheres há milênios. Elas representam
status, poder, realeza, dinheiro. Por elas homens e mulheres se matam, se
morrem, se presenteiam. O brilho e o fascínio das joias têm despertado
interesse no passado, e continuam despertando no presente.
No
momento, o ex-presidente Jair Bolsonaro e ex-primeira dama, Michele foram pegos
por um redemoinho inesperado com potencial de se tornar furacão. Um escando de
milhões de dólares em joias revelado pelo jornal O Estado de São Paulo.
Era
o ano de 2021 e estávamos no segundo ano da pandemia. Foi um ano marcado pela
chegada de uma segunda onda forte do coronavírus. Mas foi o tempo no qual a
ciência começou a reagir ao vírus com a chegada das vacinas. No final daquele
ano o país atingia a sonhada marca de 80% da população vacinada.
Também
em 30 de dezembro daquele ano, a Petrobras concluía a venda da Refinaria
Landulpho Alves (RLAM), em São Francisco do Conde, na Bahia. A refinaria foi
vendida para o grupo árabe Mubadala Capital, dos Emirados Árabes. A Petrobras
divulgou na ocasião que o negócio havia sido fechado em R$ 10,1 bilhões, após o
cumprimento de todas as condições precedente. O acordo previa ainda um ajuste
final no preço que deveria ocorrer nos meses seguintes.
A
Landulpho Alves foi a primeira das oitos refinarias a serem vendidas pela
Petrobras, o presidente do grupo Mubadala Capital no Brasil, Oscar Fahlgren,
disse que a empresa se comprometeria com as pessoas e meio ambiente: “A nossa
prioridade é garantir excelência na produção e operação da refinaria, além de
uma transição estruturada, serena e sem ruptura. É criar valor com atenção
especial às pessoas e ao meio ambiente. Enfatizamos sempre o compromisso de
longo prazo que temos com o país e as regiões onde atuamos. Este é certamente
um dos objetivos da Acelen”, disse ele na ocasião.
Foi
nesse contexto de segundo ano da pandemia, avanço da vacina contra a Covid, e
negociações entre a Petrobras e o grupo árabe tratando da venda da refinaria na
Bahia, que, em 22 de outubro de 2021, o ministro das Minas e Energia, Bento
Albuquerque e sua comitiva, iniciava uma agenda de eventos oficiais em Riad,
capital da Arabia Saudita.
Foram
quatro dias de reuniões bilaterais, conferências sobre meio-ambiente, e
reuniões com membros da realeza saudita. O presidente Jair Bolsonaro, não
esteve presente nessa viagem.
Não
se sabe em que momento da viagem, nem em quais circunstâncias, a comitiva
brasileira recebeu da realeza saudita um presente destinado a então primeira
dama Michele Bolsonaro. Também não se sabe exatamente quem recebeu as joias, se
foi o próprio Bento Albuquerque, ou algum subordinado. Mas, pelo quilate,
presume-se que foi o próprio ministro quem recebeu as joias, que eram joias
caríssimas.
O
presente consistia de uma escultura de um cavalo, e um conjunto com colar,
anel, relógio, e um par de brincos de diamante. Junto com itens foi entregue um
certificado da marca Chopard — empresa suíça que produz algumas das joias mais
caras do mundo. O conjunto de joias foi avaliado em R$ 16,5 milhões.
Até
aí, tudo bem. Vários outros presidentes brasileiros receberam presentes de
outros chefes de nações. Mas eles ficaram como patrimônio do Estado brasileiro.
Mas, ao que parece, a intenção do presidente brasileiro não era seguir esse
caminho legal, e, sim, abocanhar essa fortuna.
Todos
sabem, até quem não viaja ao exterior, que se trouxer um anel na bagagem na
volta de uma viagem internacional, esse item tem que ser declarado à Receita
Federal. Isso se a pessoa tem a intenção de fazer as coisas de forma legal.
Terminada a viagem oficial a comitiva
brasileira retornou da Arábia Saudita em 26 de outubro de 2021. Desembarcaram
no aeroporto de Guarulhos. Quando os funcionários da receita realizavam
fiscalização dos passageiros que vinha da Arábia Saudita, encontraram, na
bagagem de Marcos André dos Santos Soeiro, que era assessor de Bento
Albuquerque, então ministro de Minas e Energia, a caixa contendo a escultura de
um cavalo dourado, com as patas quebradas, e dentro dela, a caixa com as joias,
e certificado de autenticidade da empresa suíça.
As
peças não haviam sido declaradas. E nem tampouco haviam sido registradas como
presente oficial da realeza árabe para o presidente da República, nem para a
primeira dama.
Como
procedimento de praxe, a Receita reteve as joias. De acordo com procedimento da
Receita, qualquer objeto com valor superior a US$ 1 mil, deve pagar o imposto
de importação referente a 50% do valor estimado do item, e ainda uma multa de
25% por tentar entrar de forma ilegal no país. Então, os interessados nas joias
teriam de pagar ao todo 75% do valor somando-se valor do bem e multa.
No
dia 25 de outubro de 2021, mesmo dia que o ministro Bento Albuquerque se
preparava par voltar ao Brasil, o presidente Jair Bolsonaro se encontrou com o
embaixador da Arábia Saudita em Brasília. Presentes ao encontro estiveram o
senador Flávio Bolsonaro, e o ministro das Relações Exteriores, Carlos França.
O encontro não constou da agenda pública de Bolsonaro, nem do Itamaraty.
É
muita coincidência de o ministro das Minas e Energia ter viajado a Arabia
Saudita, quando a Petrobras fechava a venda de uma refinaria de petróleo a um
grupo daquele país. Da mesma forma que é coincidência que o presidente Jair
Bolsonaro tenha estado com o embaixador daquele país logo após a comitiva
brasileira ter recebido valiosos presentes dados à primeira dama, Michele
Bolsonaro. Tem coisas que parecem coincidência, mas talvez não sejam.
O
presidente Jair Bolsonaro tentou — creio eu, desesperadamente — reaver as joias
em pelo menos quatro ocasiões, sendo a última delas, no apagar das luzes de seu
governo, ou seja, um dia antes de viajar para os Estados Unidos.
No
dia 29 de dezembro de 2022, Jairo Moreira da Silva, sargento da Marinha, na
ocasião, chefe de Ajudância de Ordens da Presidência da República, chegava ao
Aeroporto de Guarulhos. Ele vinha com uma missão: reaver as joias apreendidas.
Vinha a mando de Bolsonaro.
Ele
mostrou aos funcionários e mostrou um documento no celular e disse a eles que
estava ali para retirar o material que estava retido na alfandega, e que a própria
chefia da Receita já deveria ter comunicado o fato a alfandega de Guarulhos.
O
funcionário Marco Antônio Lopes disse ao sargento que não estava sabendo de
nada, e que não entregaria os produtos retidos. Jairo então ligou para alguém a
quem se referiu como coronel, e tentou fazer com que o funcionário da receita
falasse com ele. O funcionário disse então que não resolveria nada por
telefone.
Foi
então que o sargento disse: “Não pode ter nada do (governo) antigo para o
próximo, tem que tirar tudo e levar”.
Nem
mesmo a ligação de Júlio Cesar Vieira Gomes, secretário que comandava a Receita
naquela ocasião, pedindo para liberar as joias, adiantou. Marco Antônio Lopes,
foi firme e não entregou as joias apreendidas de modo algum.
Um
dia antes da ida de Jairo ao aeroporto, Bolsonaro havia enviado um ofício a
Receita no qual comunicava a viagem do subordinado e pedia a devolução das
joias.
Essa
foi a última das oito tentativas de Bolsonaro de liberar as joias. Nem usando
toda a força do Planalto, do Itamaraty, da Receita e do ministério das Minas e
Energia as joias apreendidas foram liberadas.
As
reações do ex-casal presidencial foram bem parecidas.
Bolsonaro
continuar nos Estados Unidos. Perguntado sobre as joias, ele disse: “Estou
sendo acusado de um presente que eu não pedi, nem recebi. Não existe qualquer
ilegalidade da minha parte. Nunca pratiquei ilegalidade. Veja o meu cartão
corporativo pessoal. Nunca saquei, nem paguei nenhum centavo nesse cartão”. Ele
também afirmou que não tentou trazer as joias ilegalmente ao país. Quanto ao
cartão corporativo, a divulgação dos dados dos gastos mostram que Bolsonaro
usou e abusou do cartão corporativo.
Michele
Bolsonaro tratou do assunto com deboche, e ainda culpou a imprensa. “Quer dizer
que, 'eu tenho tudo isso' e não estava sabendo? Meu Deus! Vocês vão longe mesmo
hein?! Estou rindo da falta de cabimento dessa impressa (sic) vexatória”.
Na
esteira dessa primeira entrega de joias do governo saudita ao presidente
brasileiro, surgiu a denúncia de que mais um caixa de joias teria sido enviada
a Bolsonaro. Dessa vez, a caixa não passou pelo crivo da Receita Federal, e os
itens contidos nela incluem itens masculinos; relógio, caneta, abotoadura,
anel, e um tipo de rosário da marca suíça de diamantes Chopard. Essa segunda
caixa de joias também foi trazida na bagagem de um integrante da comitiva.
Essa
segunda caixa de joias também foi trazida em outubro de 2021, por ocasião da
visita oficial do ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque. o fato
estranho, além das joias terem vindo na bagagem de um assessor, é que elas
ficaram no ministério de Minas e Energia por um ano, e só foram entregues ao Palácio
do Planalto em 29 de novembro do ano passado.
Foi
entregue [ao Planalto em novembro de 2022] porque demorou-se muito nesse
processo para dizer quem vai receber quem não vai receber, onde vai ficar onde
não vai ficar. Só não podia ficar no ministério nem ninguém utilizar”, disse
Bento Albuquerque. Como diz o ditado, “desculpa esfarrapada”.
A
Polícia Federal, que já havia aberto inquérito para apurar as joias apreendidas
pela receita, agora também abriu um inquérito para apurar essa segunda caixa de
joias que também não havia sido declarada a receita.
Para
Michele Bolsonaro o caso das joias foi um balde de água fria no seu
envolvimento no PL. No dia 15 de fevereiro, o nome de Michele foi confirmado
como presidente nacional do PL Mulher. O anúncio foi feito durante encontro
realizado em Brasília, na sede do partido, com a participação de deputadas da
sigla.
Para
este mês estavam sendo organizados uma série de eventos com a participação
dela. Agora, tudo o que partido mais quer é achar um buraco onde ela possa se
esconder depois da divulgação dos caríssimos mimos dados a ela e a Bolsonaro
pelo governo saudita.
Enfim,
caros leitores e leitoras, é mais uma máscara retirada da face de pessoas que
se autoproclamavam honestas e donas da verdade. É um fato gravíssimo e tem
mesmo de ser apurado. Reproduzo aqui o versículo bíblico que Bolsonaro
costumava usar: “Conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”. É bom eles tomarem
cuidado pois a mesma verdade que liberta também condena.
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