O primeiro duelo presidencial
Terça-feira, 30 de agosto
“E Santo Cristo não sabia o que fazer
Quando viu o repórter da televisão
Que a notícia do duelo na TV
Dizendo a hora o local e a razão”.
(Faroeste Caboclo - Legião Urbana)
Se
observamos o velho oeste americano da perspectiva do cinema e seus épicos
filmes de faroeste teremos a visão de uma terra árida, de homens brutos,
xerifes, bandidos roubando gado e caravanas. A lei era a lei das armas e a
maneira mais fácil de resolver conflitos difíceis era o duelo. Todo filme de
faroeste que se preze tem que ter um bom duelo no final.
Aqui
no Brasil atual podemos também dizer que vivemos um faroeste. O clima selvagem
aflorou de uns tempos para cá. Antes ainda se podia discutir política em
qualquer ambiente e no meio de qualquer círculo de pessoas.
Hoje
é meio complicado fazer isso. Por exemplo, se você discorda de um candidato de
extrema direita, pode apanhar, sofrer violência física. Antes, era possível
gostar de um artista e votar nesse ou naquele partido. Não havia problema
nenhum nisso. Hoje, não. Se um artista apoia esse ou aquele candidato e assume
isso publicamente é um perigo, pois as metralhadoras do ódio se voltam contra
ele. Aquelas pessoas que, momentos atrás o aclamavam, passam a jogar pedras
nele. É algo meio doentio.
As
armas usadas são as armas da desinformação, das fake news. Até mesmo os homens
que se dizem de Deus, concordam em usá-la para derrotar um adversário. Para mim
é incompreensível que alguém a pregar os versos bíblicos “Conhecereis a
verdade e a verdade vos libertará”, não tenha escrúpulos em fazer
justamente o contrário do que diz a sabedoria escondida nas palavras do mestre
Jesus.
Entretanto,
é isso que temos visto: evangélicos usando desta artilharia suja e pesada para
defender seus pontos de vista e seus protegidos no poder. Quando digo,
“evangélicos” não quero generalizar pois há muitos que não comungam desse tipo
de comportamento.
No
velho oeste americano havia a corrida do ouro. Nos faroestes do novo Brasil que
sente falta do velho Brasil temos uma corrida eleitoral. Que, de fato e de
direito, começou recentemente, mas na realidade começou faz tempo, pois,
Bolsonaro, como sabemos, desde que sentou na cadeira presidencial só pensa em
reeleição. Esse é objetivo e o projeto principal de seu governo. Lula, por sua
vez, depois que saiu da cadeia, não admitiu primeiramente que seria candidato,
mas esteve ali sempre estendendo seus tentáculos.
Houve
muito burburinho, muito disse me disse em torno de uma terceira via, uma ampla
coalisão para derrotar Lula e Bolsonaro. Ao longo do caminho dessa terceira
via, tal qual flores muito nomes foram desabrochando e murchando, nascendo e
morrendo logo em seguida.
E
isso me lembra a parábola do semeador citada no evangelho de Mateus (13; 1 -9)
que fala de um semeador que saiu a semear. Enquanto semeava algumas sementes
caíram ao longo do caminho, e vieram os pássaros do céu e as comeram. Outras,
caíram em terreno pedregoso, onde não havia pouca terra. Nasceram, porém, o sol
escaldante as fez morrer. Outras ainda, caíram entre espinheiros, e nasceram,
mas os espinhos as sufocaram. Algumas
sementes tiveram mais sorte e caíram em terra boa, e cresceram e frutificaram.
Luciano
Huck, Eduardo leite, João Dória, Sérgio Moro, Rodrigo Pacheco, Luiz Henrique
Mandetta, foram alguns dos nomes que surgiram no meio desse burburinho da
terceira via. Mas não prosperaram, ou porque caíram ao longo do caminho, ou
entre pedregulhos, ou entre espinheiros.
No
fim, quem vigorou mesmo foram duas sementes que, de novas, não tem nada. Já são
bem conhecidas dos brasileiros; Jair Messias Bolsonaro e Luís Inácio Lula da
Silva. E depois deles, Ciro Gomes, e Simone Tebet. Mas do jeito que as coisas
estão polarizadas, é bem pouco provável que os dois últimos sejam alguma ameaça
para Lula ou Bolsonaro.
Enfim,
nesse faroeste eleitoral também não poderia faltar o grande duelo: o duelo dos
debates, e o primeiro deles aconteceu nesse domingo, 29, em evento organizado
por um pool de veículos de comunicação formado por Folha, Uol, e pelas
emissoras de TV Bandeirantes e Cultura. Além de Lula e Bolsonaro também
estiveram apresentando suas ideias e propostas os candidatos; Ciro Gomes, (PDT),
Luiz Felipe D’Ávila (Novo), e as candidatas Simone Tebet, (MDB), e Soraya
Thronicke (União Brasil).
Havia
muita indefinição quanto as presenças de Lula e Jair Bolsonaro. Eles mantiveram
suspense em relação à suas participações até 48 horas antes do debate. Creio
que para os organizadores apenas relaxaram quando estavam todos presentes em
suas bancadas.
Enfim,
às 9hs horas da noite, o estúdio da TV Bandeirantes se iluminou e começou a
transmissão do tão aguardo primeiro debate dos candidatos nas eleições
presidenciais desse ano. O debate, de modo geral, foi muito bom. Os candidatos
e candidatas, durante todo o debate, respeitaram o tempo que lhes era destinada
a fala.
Durante
a realização do debate o instituto Datafolha fez, em tempo real, uma pesquisa
qualitativa com 60 pessoas. A pesquisa tinha como objetivo avaliar a percepção
dos eleitores indecisos sobre o voto em algum dos candidatos, ou se preferem
votar em branco ou nulo nas eleições de outubro.
Divididos
em três salas virtuais os participantes responderam questões através de um
aplicativo. Essas questões visavam analisar os candidatos na escala de péssimo,
ruim, regular, bom e ótimo.
Segundo
essa pesquisa do Datafolha, quem se saiu melhor no debate foi a candidata
Simone Tebet, com 45%, seguida de Ciro Gomes com 23%. Empatados na terceira
posição ficaram Lula e Jair Bolsonaro com 10%. Felipe D’Ávila, ficou com 8%, e
Soraya Thronicke com 2%.
Na
pesquisa qualitativa que perguntava qual candidato se saiu pior no debate
votaram 57 pessoas. Para esse grupo, quem se saiu pior nas pesquisas foi o
presidente, Jair Bolsonaro com 51% dos votos. Lula ficou com 21%. Soraya
Thronicke, 14%, Felipe d’Ávila, 7%, Simone Tebet, 5%, e Ciro Gomes 2%.
Lula,
que havia ido muito bem na entrevista ao Jornal Nacional, na semana passada,
não foi tão bem desta vez. Pelo menos, foi esta a análise que fez a cúpula do
Partido dos Trabalhadores. O candidato ficou em posição de neutralidade em
relação ao seu principal adversário, Jair Bolsonaro, mesmo quando questionado
por esse em assuntos espinhosos como a corrupção. Talvez, tenha sido uma
estratégia, afinal, Lula lidera as pesquisas de intenção de voto, e não quis
provocar embates calorosos. Um Lula pacificador em meio a radicalização pode
ter sido a estratégia. E se foi estratégia, com certeza, não foi das melhores.
Bolsonaro,
esse, como já disse tantas vezes aqui nesse blog, não é da natureza dele ser
pacífico. Os seus marqueteiros, e as pessoas do seu entorno, bem que tentam,
mas como fazer água se transformar vinho? Somente Jesus Cristo conseguiu tal
façanha, diz o livro santo dos cristãos.
É
sabido que o presidente é rude com mulheres e não aceita ser questionado por
elas. O presidente, realmente, perde o controle diante de situações como essa.
E Bolsonaro é rude com mulheres em diversos momentos, principalmente, se essas
mulheres são jornalistas e o questionam.
Ontem,
em pleno debate, aconteceu de novo. Vera Magalhães, apresentadora do Roda Vida,
na TV Cultura, colunista do jornal O Globo, e comentarista da rádio CBN,
questionou o presidente sobre as vacinas.
Era
o segundo bloco do debate, e Vera fez uma pergunta para Ciro Gomes, para ser
comentada por Jair Bolsonaro.
Vera Magalhães: A cobertura vacinal está despencando nos
últimos anos. A cobertura para a vacina tríplice viral que protege contra o
sarampo e outras doenças, foi de 71% em 2021, e ainda não chegou a 50% nesse
ano. A da poliomielite que já chegou a ser de 96% em 2012, caiu a índices um
pouco superiores a 67%. Queria saber do Sr. Em que medida o Sr. acha que a
desinformação sobre vacinas difundida, inclusive pelo presidente da República
pode ter contribuído, além de agravar a pandemia de covid-19, e causar mortes
que poderiam ter sido evitadas também para desacreditar a população quanto a
eficácia das vacinas em geral, e qual é a sua proposta para recuperar o Plano
Nacional de Imunização, que já foi um orgulho nacional e uma referência para o
mundo?
Ciro
então responde dizendo que tudo no Brasil está fora de lugar, e diz que fica
chocado ao ouvir o presidente Bolsonaro dizer que a economia está “bombando”. Ele
fala da questão do desemprego, e de questões econômicas. Fala da saúde mental
do brasileiro que está se deteriorando, em parte por causa desse clima de
polarização e mentiras. Então Ciro fala que a questão da vacina é uma questão
trivial. Fala então de sua experiência como governador do Ceará, e também como
prefeito de Fortaleza, e que cumpriu tão bem as metas de vacinação que chegou a
ganhar prêmios internacionais.
Então
é a vez de Bolsonaro. Ele então desconsidera totalmente a pergunta da
jornalista sobre vacinas e parte para o ataque.
Bolsonaro: Vera, não podia esperar outra coisa de você.
Acho que você dorme pensando em mim. Você tem alguma paixão por mim. Você não
pode tomar partido num debate como esse, fazer acusações mentirosas a meu
respeito. Você é uma vergonha para o jornalismo, mas tudo bem.
Vera
Magalhães, apenas para citar, é uma das jornalistas mais respeitadas do país
por pessoas de várias correntes políticas e pelos seus colegas de jornalismo.
Se Bolsonaro está tentando conquistar o voto das mulheres, então a ofensa a
Vera foi um tiro no pé.
Outro
momento controverso de Bolsonaro foi no fim do debate, durante as considerações
finais, quando ele fez acusações contra líderes latino-americanos de esquerda.
“Lula apoiou o presidente do Chile também, o
mesmo que praticava atos de tacar fogo em metrôs lá no Chile. Para onde está
indo nosso Chile?”, disse Bolsonaro a respeito de Gabriel Boric, presidente
do Chile. Boric, evidentemente, não gostou nenhum pouco dessas declarações, e
mandou chamar o embaixador brasileiro no Chile, Paulo Roberto Soares Pacheco,
para que preste esclarecimentos.
Simone
Tebet foi uma das mais equilibradas e com respostas sensatas durante o debate.
Tebet integrou a CPI da Covid, e estava, portanto, muito segura quando falou
desse assunto. Ela também foi muito bem articulada quando falou do tema
educação área na qual ela domina, pois já lecionou no curso de Direito de uma
faculdade.
Ciro
Gomes também foi muito bem articulado, em suas colocações e críticas, tanto ao
presidente Jair Bolsonaro quando ao ex-presidente Lula. Sempre defendendo a não
polarização. O desempenho do candidato Ciro Gomes está bem aquém daquele
registrado na campanha de 2018, quando também foi candidato. Acho que ele
esperava mais nessas eleições.
Ciro Gomes pode estar colhendo o que plantou nas eleições daquele ano quando, durante a campanha do segundo turno, ele, em vez de decretar apoio a Fernando Haddad, candidato de Lula em 2018, e fazer aliança com o PT, ele viajou à Paris.