República dos bananas de Bolsonaro
Domingo,
15 de agosto
“O mundo é bom comigo até demais
Pois vendendo bananas
Eu pretendo ter o meu cartaz
Pois ninguém diz prá mim
Que eu sou um palha no mundo
Ninguém diz prá mim
Vai trabalhar vagabundo”
(Vendedor de Bananas – Jorge Bem Jor)
Se
você plantar sementes de feijão, o que espera colher? Feijões, não é verdade? E
se plantar mudas de ervas daninhas em seu pomar? Acha que vai colher um belo pé
de alface? Obviamente que não.
Da
mesma forma, se, em seu jardim plantar flores perfumadas, atraíra as operárias
abelhas que, voando de flor, contribuem e muito para a polinização, que é o
processo de fecundação das flores. De quebra, essas operárias ainda carregam
para a colmeia elementos que as possibilitarão a produção do doce mel.
Ao
contrário, se for colocado um boi morto na caatinga, ele apenas exalará o odor
fétido que invadirá o ar e atraíra urubus, que dali não sairão enquanto não comerem
o último pedaço de carne, deixando apenas os ossos daquele que outrora foi um
pujante animal.
Esses
são apenas aspectos físicos, aqueles que podemos ver e comprovar. Mas há também
nos dois casos, tanto nas abelhas das flores do jardim, quanto no boi na caatinga
sendo devorado pelos urubus, uma questão de energia. No primeiro há uma energia
leve e bela circulando pelo ar. No segundo, uma energia densa invadindo o
ambiente.
Infelizmente,
no Brasil temos visto menos flores no jardim e mais bois mortos no solo seco e árido
da caatinga.
Desde
que o atual presidente ocupou a cadeira presidencial, em 1o de janeiro
de 2019, a pátria brasileira não sabe o que é ter um dia de paz. O Palácio do
Planalto tornou-se como uma hospedaria no qual o novo hospede causa tumulto todos
os dias, provoca ódio, confusão, angústia, sentimentos esses que se derramam
sobre toda a nação.
Mas
o comportamento do presidente não surgiu de uma hora para outra, assim, como
num passe de mágica. Bolsonaro sempre foi assim e sempre será. O que é
incompreensível mesmo é que ainda exista tanta gente disposta a defender um
presidente como esse, com um governo que é tão vazio de bons projetos para o
país, como são vazios os balões coloridos que decoram festas de aniversário.
Como
diz a colunista do Estadão, Eliane Cantanhede, em seu artigo deste domingo, 15,
no Estadão, intitulado, Bolsonaro e as fakes news: mortes, urnas, cloroquina, vacina, máscara,isolamento... “Bolsonaro a gente já sabe quem é, o
incompreensível é como tantos caem nessa esparrela”.
O
presidente, há algumas semanas, vinha gritando e esperneando contra o voto eletrônico,
insinuava, mentirosa e erroneamente, que o voto eletrônico não é auditável e
que, portanto, era preciso o voto impresso, ou voto auditável. Disparou ofensas
e impropérios contra os ministros do STF e do TSE. Disse que, se o Congresso
decidisse pelo voto impresso o assunto estaria encerrado. Fez promessas a
Arthur Lira, presidente da Câmara, e a Ciro Nogueira, ministro da Casa Civil,
ambos do Centrão, de que, pararia com os ataques caso a PEC do voto impresso
fosse derrubada na Câmara.
Esse
blog já disse aqui que Bolsonaro não é uma pessoa confiável, e repete isso. Ele
é daquelas pessoas que não honra a palavra que empenham. Pode afirmar uma coisa
agora, e o contrário do que disse no minuto seguinte.
Na
noite de terça-feira, 10, a tal PEC do voto impresso foi levada a plenário pelo
presidente da Câmara, Arthur Lira. Para ser aprovada, o projeto, elaborado pela
deputada bolsonarista, Bia Kicis, precisava de, no mínimo, 308 votos. 229
deputados votaram a favor do projeto, e 218 votaram contra. 64 deputados se
ausentaram da votação. Houve 1 abstenção.
Numericamente,
o governo obteve uma vitória. O que não deixa de ser impressionante que 229
deputados de diferentes partidos tenham votado a favor de um retrocesso.
Baseado nisso, o presidente, que havia prometido que daria o assunto por
encerrado, voltou a cena com novas ameaças, fake news, e desconfianças lançadas
sobre o sistema eleitoral brasileiro. Em conversa com apoiadores o presidente
disse: “Números redondos: 450 deputados votaram ontem [terça-feira]. Foi
dividido, 229 [a favor], 218 [contra], dividido. É sinal que metade não
acredita 100% na lisura dos trabalhos do TSE. Não acreditam que o resultado ali
no final seja confiável”, disse ele.
O
que Bolsonaro não disse aos seus apoiadores é que a ausência de 64 deputados na
votação, indica que aqueles deputados também não concordam com o retrocesso,
apenas não tiveram a coragem de assumir isso, como coragem teve os 218 que, efetivamente,
votaram contra.
Para
completar o quadro, ainda na manhã da terça-feira em que foi votado a PEC do
voto impresso, houve o deprimente desfile dos blindados militares na Esplanada
dos Ministérios, com uns tanques velhos e soltando tanta fumaça, que gerou uma
onda de memes na Internet. Alguns deputados e senadores viram no gesto mais uma
tentativa de ameaçar o Congresso. Militares disseram que o ato tinha sido uma
infeliz coincidência de datas. Dos jeitos que as coisas andam em nosso país, é
melhor ficar sempre “com a pulga atrás da orelha”, como diz o ditado popular.
Na
verdade, Bolsonaro faz esse circo todo, não porque esteja preocupado com o voto
eletrônico, nem com a segurança das urnas. Ele não está nem aí para essas coisas.
Ele arma um teatro — e isso ele faz com maestria — para inflamar sua
militância, seu gado. Mesmo que a PEC voto impresso fosse aprovada, Bolsonaro
continuaria a provocar tumulto. Ele não tem vocação para a paz e o diálogo, mas,
sim, para a confusão e o caos.
Bolsonaro
tem um grande inimigo em seu caminho, uma pedra no seu sapato, da qual ele
tenta se livrar, e esse inimigo se chama Estado Democrático de Direito. Se ele
pudesse se livrar dessa entidade já teria feito isso faz tempo.
Em
seu egocentrismo do tamanho universo não há espaço para manifestações democráticas,
para críticas e críticos do governo, não há espaço para instituições que
regulem o poder Executivo. Como diz o apresentador do programa CBN em Foco, e
colunista do jornal O Globo, Carlos Andreazza, em artigo intitulado, O tanque de Bolsonaro, publicado em O Globo, no dia 11 de agosto, o que Bolsonaro realmente
quer é “palanque para tumultuar, para difundir descrença contra a República,
para plantar – artificialmente – dúvidas, contra os sistemas da democracia
liberal, na sociedade”.
Uma
coisa não se pode negar: Ele é bastante eficiente quando se trata de inflamar de
ódio sua marionete militância. Isso já surtiu efeito. O cantor sertanejo,
Sérgio Reis está organizando um ato pró Bolsonaro, nos dias que antecedem o 7
de setembro, Dia da Independência do Brasil.
Duas
reivindicações prometem marcar este ato, segundo o cantor. A primeira é o morto
vivo do voto impresso. Eles querem que as eleições de 2021 sejam através desse
sistema de voto impresso. A outra reinvindicação é que o senado vote o impeachment
dos ministros do STF Luiz Roberto Barroso e Alexandre de Moraes, que, segundo
eles, tem prejudicado a nação brasileira. Essa semana, Bolsonaro embarcou em
mais um de seus delírios e disse que vai pedir ao Senador Federal que abra um
processo para investigar os ministros. Isso cai sobre a militância como
gasolina cai sobre folhas secas.
Os
manifestantes pretendem acampar em Brasília, e prometem uma paralisação dos
caminhoneiros em nível nacional. Sérgio Reis disse que os manifestantes são de
paz. Mas disse também que “Ai daquele caminhoneiro que não aderir à paralisação”.
É isso, às vezes uma pessoa diz uma coisa, para se desdizer na frase seguinte. Como
diz o ditado: “Para bom entendedor, meia palavra basta”.
Ministros
do STF podem ser investigados? Podem, claro. Eles não são intocáveis. O
problema no caso citado é que não há elementos que embasem um pedido de investigação
contra Moares e Barroso, nem muito menos o impeachment dos dois, ou de qualquer
outro. Para Bolsonaro, o único erro dos dois ministros é tentar conter os arroubos
autoritários dele próprio e de sua militância.
Bolsonaro
e os bolsonaristas estão muito irritados com Alexandre de Moraes, também por
causa da prisão de Roberto Jefferson. Jefferson é ex-deputado e presidente
nacional do PTB. Além de ser um ferrenho defensor de Bolsonaro. Além da prisão,
Moraes também determinou o bloqueio de conteúdos postados por ele nas redes socais,
bem como apreensão de armas e acesso a mídias de armazenamento.
A
ordem de prisão expedida pelo ministro se fundamenta no inquérito da milícia
digital que, por sua vez, é uma continuidade do inquérito que apura os atos
antidemocráticos. O ex-deputado e atual presidente do PTB não foi preso por
causa das suas ideias, mas por causa das reiteradas ameaças aos ministros do
STF. Críticas que, inclusive, envolviam o uso de armas em postagens feitas em
vídeos nas redes sociais.
O
que vemos, em meio a toda essa bravata, é um presidente acuado e com medo. E
quando os covardes estão acuados e com medo, eles agem assim. Esbraveja,
gritam, ofendem, espalham fake news.
Lula
Inácio Lula da Silva foi colocado de novo em cena, e com grandes chances de derrotar
Bolsonaro. Pesquisas tem mostrado isso. Bolsonaro então tenta armar um cenário
para ter uma eleição da qual ele só aceita um resultado: ser vencedor. Qualquer
outro resultado, mas sendo isento de fraudes, vai ser para ele falso. Então por
isso desde já, arma o cenário para uma possível revolta por parte de seus
seguidores.
Bolsonaro
também tem medo. Medo de ser preso. Medo de Alexandre de Moraes. Por isso, não
são à toa os ataques ao ministro. Moraes incluiu Bolsonaro no inquérito das
fake news, atendendo um pedido do Tribunal Superior Eleitoral, no caso da divulgação
de notícias falsas sobre as urnas eletrônicas.
Além
disso, Flávio, Eduardo, e Carlos Bolsonaro, estão às voltas com investigações.
Flávio está envolvido com o caso das rachadinhas, juntamente com seu
ex-assessor, Fabrício Queiroz. Eduardo e Carlos são citados no inquérito que
apura a realização de atos antidemocráticos. Enfim, é uma família de gente
perigosa e corrupta que se faz passar por bonzinhos para os seus seguidores. E
dominam tão bem a técnica de influenciar e manipular mentes que os seguidores
acreditam, piamente, que estão diante de heróis injustiçados.
No
Congresso Nacional, houve avanços e retrocessos. O avanço veio na terça-feira,
10, mesmo dia em que a Câmara barrou a PEC do voto impresso, e que os tanques
desfilaram por Brasília, o Senado revogou o Projeto de Lei que revoga a Lei de
Segurança Nacional, criada em 1983, e herança da ditadura militar. Essa lei previa
penas de até quatro anos de prisão para quem difamar o chefe do Executivo. Essa
lei foi usada diversas vezes para perseguir opositores do governo, e até mesmo,
para espioná-los. É inacreditável, mas é verdade. A Lei também foi usada por
integrantes do STF. Foi com base nela que o ministro Alexandre de Moraes prendeu
o deputado bolsonarista, Daniel Oliveira por ameaças aos ministros do STF.
A
nova proposta aprovada pelos congressistas tipifica dez crimes contra a
democracia. “A proposta protege a integridade e a soberania nacionais
e acrescenta ao Código Penal uma seção para tipificar dez crimes contra a
democracia. Entre eles, atentado à soberania do país, espionagem, golpe de
estado, interrupção do processo eleitoral, comunicação enganosa em massa,
sabotagem e atentado ao direito de manifestação”, diz texto postado no site
da Agência Senado. O projeto ainda deve passar pela sanção do presidente, Jair
Bolsonaro, porém, mesmo que haja vetos por parte do presidente, a palavra final
sobre o assunto é do Congresso.
O
retrocesso coube a Câmara dos Deputados. Na quarta-feira, 11, a Câmara votou em
primeiro turno a reforma eleitoral. Havia sido incluído na proposta o voto distrital,
o chamado “distritão”, e as coligações partidárias. Pelo sistema do voto distrital apenas os candidatos
mais votados seriam eleitos. Não haveria a proporcionalidade dos votos
recebidos pelas legendas. O voto distrital foi muito criticado pois ele
dificultaria a renovação do Congresso, uma vez que poderia possibilitar a
eleição apenas dos caciques da política, e de celebridades, e também por
enfraquecer os partidos.
Já
as coligações partidárias, proibidas em 2017, permitem a coligação de partidos
em um único bloco para a disputa das eleições proporcionais. Elas permitem a
formação dos chamados “partidos de aluguel”, que não defendem nenhuma causa,
nenhuma ideologia, e se juntam aos blocos de partidos apenas com a finalidade
de negociar apoios.
O
distritão, na verdade, era o chamado “bode na sala”. O que é isso? Por exemplo,
o dono de uma casa não quer mudar nada na decoração. Então ele coloca o bode na
sala. É uma coisa estranha. Ele sabe que as pessoas vão reclamar. E, de fato, reclamam.
Então ele tira o bode, e finge que mudou alguma coisa.
E
foi o que fizeram os deputados. Na verdade, o que importava mesmo para eles,
era a volta das coligações partidárias. Houve muita reclamação com inclusão do “distritão”
na proposta, então os deputados retiram o bode da sala e aprovaram a volta das
coligações. Tanto o voto distrital, como a volta das coligações partidárias são
consideradas retrocessos no processo eleitoral.
E
olhem como age o presidente Arthur Lira. Essa votação da minirreforma
eleitoral, que não é avanço, mas retrocesso, estava pautada para ser realizada
na quinta-feira, 12. Para a quarta-feira, estavam previstas outras pautas. Lira
resolve, de surpresa, votar a reforma eleitoral, e deixar para outra
oportunidade as pautas que seriam votadas naquele dia.
Na
terça-feira, 17, o Plenário votará matéria em segundo turno. Caso seja aprovada,
ela segue para o Senado, onde também será votada em primeiro e segundo turno.
Porém, no Senado, a proposta parece não encontrar muito apoio por parte dos
senadores. Como a política é um jogo de xadrez, a gente nunca sabe o que vai
acontecer, então é melhor esperar para ver como os senadores receberão a
proposta.
E
assim seguimos nós, brasileiros e brasileiros. Liderados por um presidente que
não tem o menor apreço pela democracia, que odeia a imprensa livre, e que se
acha o todo poderoso. Governados por um presidente que tenta aparelhar as instituições.
Já fez isso com a Polícia Federal, com o Ministério da Justiça, com a Advocacia
Geral da União. A Procuradoria Geral da República nem parece aquela que atuava
nos governos anteriores. Hoje, sob o comando de Augusto, ela parece mais um bibelô
no armário da democracia, do que uma instituição à serviço da nação. Na Câmara
dos Deputados tem o Arthur Lira para barrar qualquer pedido de impeachment. Também
tinha o Rodrigo Pacheco, presidente do senador, que hoje, ao que parece, está
tentando, ainda de forma tímida, se dissociar do presidente.
O
único que ainda está dando trabalho em não querer se curvar à sua Excelência, o
imperador, é o Supremo Tribunal Federal e o Tribunal Superior Eleitoral. Esses
se mantém firmes na difícil missão de botar rédeas no cavalo insensato, impedindo
que ele jogue a todos nós no abismo profundo.
O
Brasil, sem dúvida, é uma nação com grande potencial econômico, mas o presidente,
Jair Bolsonaro tem transformado, o nosso país já tão sofrido e abalado pela
corrupção, numa república das bananas, em grande parte, devido aos 20% a 25%
dos bananas que ainda o apoiam.
É preciso, a quem se recusa a embarcar nessa canoa furada comandada por um capitão emocionalmente desequilibrado, em primeiro lugar que procure estar bem-informado, pois a principal arma usada por ele e por sua milícia digital, são as fakes news, a desinformação. Segundo é preciso pedir ao infinito que nos governa, seja qual for o nome que você o atribua; Deus, Alá, Oxalá, Buda, Jesus Cristo, ou outro, que nos dê muita paciência e serenidade para enfrentar os dias de turbulência, pois eles, certamente, passarão.