Bolsonaro e sua moto
Segunda-feira,
09 de agosto
“Vital andava a pé e achava que assim
estava mal
De um ônibus pra outro aquilo para ele era
o fim
Conselho de seu pai: "Motocicleta é
perigoso, Vital.
É duro de negar, filho, mas isto dói bem
mais em mim."
Mas vital comprou a moto e passou a se
sentir total
Vital e sua moto mas que união feliz
Corria e viajava era sensacional
A vida em duas rodas era tudo que ele
sempre quis
Vital passou a se sentir total
Com seu sonho de metal”
(Vital e sua moto – Paralamas do
Sucesso)
Era
noite de sexta-feira, 12 de agosto de 2016. No Estádio Aquático Olímpico, no
Rio de Janeiro, era disputada a final da natação nos Jogos Olímpicos daquele
ano. O nadador brasileiro, Bruno Fratus, estava numa das raias da piscina
olímpica e, apesar de todo o esforço, conseguiu chegar apenas em sexto lugar,
ficando longe do pódio.
Logo
após o término da prova, a repórter Karin Duarte, do canal Sportv, pergunta ao
nadador:
̶ Sai chateado?
Fratus
responde de modo irônico:
̶ Não. Não, estou felizão, né. Fiquei em
sexto. Desculpa, né, mas...tô, bastante.
Na
época, a atitude do atleta foi bastante criticada nos meios jornalístico e
esportivo, além de render muitos memes nas redes sociais. Depois da entrevista,
ainda naquela mesma noite, ele concedeu outra entrevista à repórter, pedindo
desculpas.
O
fato é que o sexto lugar obtido pelo nadador nas Olímpiadas do Rio, aliado à
decepção de também não ter não ter subido ao pódio nas Olímpiadas de Londres,
em 2102, gerou uma frustração muito grande no atleta. Ele entrou em depressão.
E passou a treinar ainda com mais afinco. Porém, com adicional de uma química
perigosa para o seu o corpo e para o seu mental: o ódio.
O
ódio, por melhor intenção que se coloque no objetivo a que se quer atingir,
nunca é benéfico. Ele sempre trará consigo uma carga negativa, que, ao final,
turbará o brilho da vitória.
Com
a ajuda de Michelle Lenhardt, ex-atleta olímpica na natação, Bruno Fratus superou
a depressão, e mudou o estilo de vida. Tornou-se adepto da meditação,
incorporou novas dietas, novos sistemas de treino, e reencontrou-se com seu
amor pelo esporte.
A
mudança de foco, de vida, e de pensamento do atleta deu resultado. Na noite de
31 de julho passado, no Centro Aquático de Tóquio, ele conquistou a tão sonhada
medalha: medalha olímpica no Jogos Olímpicos de Tóquio. Não de ouro. Não de
prata. De bronze. Mas, certamente, uma grande conquista para ele. O ouro foi
para o americano Caeleb Dressel, e a prata para o Francês Florent Manadou.
Mais
uma vez a âncora que lhe fez parar quando necessário e que lhe deu asas quando
era preciso foi a esposam treinadora, nutricionista, Michelle. O amor e as
serenidade o fizeram vencer, não o ódio.
Muito
bom falar de Olímpiadas, mas elas merecem um capítulo à parte, tantas são as
histórias de frustação e superação, de derrotas e vitórias. Os Jogos Olímpicos
representam a arte de levar o corpo extremo. Porém, esse blog segue falando do
terreno pantanoso da política brasileira.
Era
noite de domingo, 28 de outubro de 2018. Às 19h18 min, horário de Brasília, com
94,44% das urnas apuradas, era confirmada a vitória do candidato do PSL à
presidência da República, Jair Messias Bolsonaro. Naquele momento, o candidato
petista Fernando Haddad não poderia mais ultrapassar Bolsonaro.
A
presidência da República de qualquer país democrático está para o político como
a medalha de ouro olímpica está para o atleta, que, para conquista-la treina
horas e horas todos os dias. E Bolsonaro naquele 28 de outubro ganhou o ouro
olímpico.
Naquele
domingo, numa eleição apurada em tempo recorde ̶ a
votação foi encerrada às 17 horas ̶ e sem evidências de fraude, como aliás todas
as outras desde que foi instaurado o sistema de urnas eletrônicas, em 1996. Desde
então já são vinte e cinco anos de um dos sistemas eleitorais mais confiáveis
do mundo.
Nem
todo o Brasil foi inundado, ou melhor beneficiado, pela grande novidade, pela experiência
que se tornaria a regra no Brasil. Nas eleições municipais de 1996, apenas 57
cidades brasileiras receberam urnas eletrônicas. Os votos de 32 milhões de
brasileiros foram coletados por esse meio, o que correspondeu a um terço do
eleitorado na época.
Segundo
informação do site do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o desejo de um sistema
de votação moderno já era bem antigo: “A criação de um aparelho mecanizado
para coletar votos era um desejo antigo no país. O primeiro Código Eleitoral,
de 1932, previa em seu artigo 57 o “uso das máquinas de votar, regulado
oportunamente pelo Tribunal Superior [Eleitoral]”, devendo ser
assegurado o sigilo do voto”, diz o texto do site.
A
ideia, porém, só ganhou vida em 1995. Naquele ano, o Tribunal Superior Eleitoral
reuniu uma comissão técnica liderada por pesquisadores do Instituto Nacional de
Pesquisas Espaciais (INPE), e do Centro Técnico Aeroespacial, para dar forma a
sonhada “máquina de votar”, mencionada no primeiro Código Eleitoral. A “máquina
de votar” ganhou inicialmente o nome de Coletor Eletrônico de Votos.
O
novo sistema de votação teria que ser, além de moderno, muito seguro. “O
dispositivo teria de ser capaz de eliminar a intervenção humana dos
procedimentos de apuração e totalização dos resultados, bem como de garantir
maior segurança e transparência ao processo eleitoral. Além disso, deveria ser
leve e compacto (para facilitar seu transporte) e prático de usar. O resultado
foi um sucesso. A urna eletrônica combinou tela, teclado e CPU numa só máquina,
com teclado similar ao de um telefone justamente para possibilitar que o
analfabeto e o deficiente visual pudessem interagir com o novo dispositivo sem
dificuldade.”, diz informação fornecida pelo site do TSE.
Além
de ser um sucesso operacional, a urna eletrônica também foi um sucesso em logística:
as urnas eletrônicas eram distribuídas em tempo recorde pelos aviões da Força Aérea
Brasileira.
A
urna eletrônica representou um grande avanço no sistema eleitoral brasileiro, e
veio atender uma falha no sistema de votação em papel: a fraude. Havia muitas
fraudes no antigo sistema. Além disso, esse modo de votação tornava o processo
de apuração dos votos muito lenta.
Por
exemplo, nas últimas eleições em 2018, o vencedor foi conhecido pouco mais de
duas horas, após o início da votação, coisa impensável se o processo fosse pela
votação em papel. Antes da votação eletrônica, o processo de apuração levava
dias, ou até semanas.
Desde
então, não se teve mais notícias de fraudes nas votações e o processo de
votação no Brasil ficou bem mais ágil e mais prático.
Esse
texto falava do resultado da eleição presidencial em 2018 e da vitória de Jair
Bolsonaro quando foi aberto esse parágrafo para falar das urnas eletrônicas. Retomemos
desse ponto então: das eleições de 2018 e da vitória do presidente.
Então
veio o ano de 2019 e Jair Bolsonaro, finalmente, tomou posse no dia 01 de
janeiro. Á exemplo do nadador Bruno Fratus, ele deve ter passado por alguma frustação
na vida, talvez alguma prova não ganha, alguma medalha não conquistada, pois
passou a vida política dele destilando ódio, veneno, confusão e
desestabilização.
O
bom mesmo, que são os projetos que transformam vida e impulsionam o país,
Bolsonaro não teve nenhum aprovado. Talvez nem mesmo tenha apresentado algum realmente
relevante. Nos vinte e sete anos que passou no Congresso Nacional como
deputado, ele só teve dois projetos aprovados. O primeiro deles foi uma
proposta que estende o benefício da isenção de Imposto sobre Produto Industrializado
(IPI) destinado a produtos de informática. O segundo foi um que autoriza o uso
da fosfoetanolamina sintética, a chamada pílula do câncer.
Bolsonaro
até chegou a apresentar 170 projetos de lei, mas a qualidade desses projetos
era muito ruim, como por exemplo, o de inscrever o nome do ex-deputado federal
Enéias Carneiro no livro de heróis da pátria pelo seu “valoroso nacionalismo
e sua oposição ao comunismo”, e um projeto de lei que tentava revogar a Lei
12.845, que foi sancionada em agosto de 2013, e que obriga o SUS a oferecer um
atendimento emergencial, integral e multidisciplinar às vítimas de violência
sexual.
Se
o deputado Jair Bolsonaro era assim na apresentação de projetos de Lei, imagina
então nas votações no plenário e no trato com seus pares, principalmente, com
as mulheres. Enfim, o mandato do deputado Jair Bolsonaro, foi muito ruim sob todos
os aspectos.
Ainda
a exemplo do Bruno Fratus, em vez de Bolsonaro ter feito umas sessões de meditação,
novas dietas, novos posicionamentos em relação à vida e os seres humanos, adquirido
novos meios do fazer e de como se fazer política, ele fez, justamente, o
contrário.
Trouxe
para o exercício da Presidência todo o ódio e rancor que semeou na vida, não
apenas na vida pública, mas também nos tempos de Exército. Não se passa um dia
sem que ele provoque confusão, que incite sua louca militância, que não ataque
os demais poderes da República, em especial o Supremo Tribunal Federal. Arranjando
inimigos imaginários. Mas ele é assim. Bolsonaro não existe sem a confusão e
sem o caos.
Às
vezes ̶ e isso é uma opinião absolutamente pessoal ̶ me
pego pensando e tendo pena de Bolsonaro. Pois penso que ele nunca na vida tenha
sabido o que é ter paz, o que é viver em paz. Talvez, nunca tenha sabido o
significado da palavra amor, como tão bem nos lembrou o filho do falecido Bruno
Covas, ex-prefeito de São Paulo que morreu de câncer em 16 de maio de 2021.
Essa
semana, Bolsonaro tratou de modo desrespeitoso à memória do falecido. Foi na segunda-feira,
02. Bolsonaro falava aos seus apoiadores em frente ao Palácio da Alvorada,
quando criticou pela enésima vez as medidas sanitárias contra a Covid-19. Fez
referência ao governador de São Paulo, João Dória, e a Bruno Covas, referindo-se
a este como “aquele que morreu”. “Um fecha São Paulo e vai para
Miami. O outro, que morreu, fecha São Paulo e vai ver Palmeiras e Santos no
Maracanã. Esse é o exemplo…”.
Dória
foi tirar umas férias em Miami, no auge da pandemia, mas não chegou a passar
nem um dia por lá, as críticas a ele foram pesadas, e ele, pediu desculpas e
resolveu voltar imediatamente. Bruno Covas, provavelmente, já sabendo que não lhe
restava mais muito tempo de vida, quis desfrutar de um momento, assistindo uma
partida do time do coração, o Santos, com o filho. Na época, as críticas também
vieram pesadas sobre ele, e ele rebateu dizendo: “Depois de tantas
incertezas sobre a vida, a felicidade de levar o filho ao estádio tomou uma
proporção diferente para mim. Ir ao jogo é direito meu. É usufruir de um
pequeno prazer da vida”.
Autoridades
criticaram a fala do presidente, mas a melhor resposta veio mesmo foi do filho
de Bruno Covas, Tomás. “Lamento a fala dita hoje pelo incompetente e
negacionista presidente Bolsonaro. Em uma fala covarde hoje durante a tarde,
ele atacou quem não está mais aqui conosco, não dando o direito de resposta ao
meu pai. Além disso, cumprimos com todos os protocolos no estádio do Maracanã,
utilizando a máscara e sentando apenas nas cadeiras permitidas. Meu pai sempre
foi um homem sério e fez questão de me levar ao Maracanã no fim da sua vida
para curtirmos seus últimos momentos juntos. Isso é amor! Bolsonaro nunca
entenderá esse sentimento”, escreveu Tomás em uma mensagem enviada à coluna
da jornalista Mônica Bergamo, na Folha de São Paulo.
Bolsonaro
já sentiu que as coisas não andam nada bem para ele, então resolveu tumultuar
de vez o cenário, provocando uma crise institucional entre os poderes com a
guerra que declarou às urnas eletrônicas e na defesa do voto impresso. Elegendo
como inimigo número um, dessa vez, o ministro do STF, e presidente do TSE, Luís
Roberto Barroso.
De
outras vezes, os poderes soltavam apenas notas de repúdio às falas golpistas de
Bolsonaro. E ele prometia se endireitar. Tornar-se o Bolsonaro paz e amor que
pararia de atacar a democracia. Esse blog nunca acreditou nisso nem sequer por um
segundo. E continua não acreditando que o presidente da República Federativa do
Brasil seja capaz de um gesto de nobreza. “Pelo fruto se conhece a árvore”,
diz Jesus Cristo no evangelho, e “Cada um dá apenas aquilo que tem”, diz
o ditado popular. Como o presidente não tem nobreza no seu mercado interior, consequentemente,
ele não pode distribuir essa qualidade para ninguém.
Semana
passada, na quinta-feira, 05, a comissão especial da Câmara dos Deputados que analisa
a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) do voto impresso, rejeitou a proposta
por 23 votos a 11.
O
assunto poderia ter parado por aí, mas o presidente da Câmara dos Deputados,
Arthur Lira, resolveu levar a questão à plenário. Lira é aliado de Bolsonaro e,
em uma primeira análise, a insistência de Lira poderia soar como um apoio ao
presidente, ou um conchavo como ele. Mas, na opinião desse blog, Lira deu mesmo
foi uma jogada de mestre no xadrez da política. Levando a questão em plenário é
improvável que essa proposta seja aprovada. Se assim ocorrer, Lira terá dado um
xeque-mate no presidente, e sepultado de vez a incomoda questão.
Resta
saber o que fará então o presidente se a proposta do voto impresso for mesmo
sepultada. Ele que diz que não haverá eleições no ano que vem se não for
através do voto impresso.
Desde
a live patética na qual disse que apresentaria provas de fraude nas urnas
eletrônicas e apresentou apenas fake News a reação tem sido dura, desde o STF,
TSE, até setores da sociedade civil.
Na
semana passada, empresários e intelectuais se uniram num manifesto que visa
coletar assinaturas a favor do sistema eleitoral brasileiro. Centenas de
empresários, economistas, diplomatas, intelectuais de centro, de direita, e de
esquerda saíram em defesa da democracia. O manifesto não cita o nome de Jair
Bolsonaro, mas diz em um de seus trechos que “O princípio chave de uma
democracia saudável é a realização de eleições e a aceitação de seus resultados
por todos os envolvidos. A Justiça Eleitoral brasileira é uma das mais modernas
e respeitadas do mundo. Confiamos nela e no atual sistema de votação
eletrônico. A sociedade brasileira é garantidora da Constituição e não aceitará
aventuras autoritárias”
Os
ex-presidentes da República, e todos os ex-presidentes do Tribunal Superior
Eleitoral saíram em defesa da democracia e afirmaram a lisura do processo
eleitoral brasileiro.
Enquanto
isso, o presidente, tal qual um adolescente inconsequente, está a passear de moto
por diversas cidades brasileiras. Esse fim de semana foram duas motociatas. No sábado,
07, foi a vez de Florianópolis, Santa Catarina.
Em
Florianópolis, o presidente se posicionou mais uma vez a favor do voto
impresso: “Faremos tudo pela nossa liberdade, por eleições limpas,
democráticas. Eleição fora disso que eu falei não é eleição. Há mais de um ano
tenho advertido que temos que ter eleições limpas no Brasil. Não continuem nos
provocando, não queiram nos ameaçar. Quem está com Deus e o povo tem o poder”.
Neste
domingo, 08, o passeio de moto foi em Brasília. Além de Brasília e Florianópolis
o presidente já passeou de moto, em campanha eleitoral antecipada, pelas
cidades do Rio de Janeiro (RJ), São Paulo (SP), Chapecó (SC) e Porto Alegre
(RS). Em todas elas, é dinheiro público que escorre pelo ralo. Pois cada um
desses passeios de moto do presidente exige uma forte estrutura de segurança. Apenas
em São Paulo, os gastos com a segurança do evento foram de R$ 1,2 milhão. Juntando
o dinheiro gasto com segurança nas demais cidades, é possível concluir que
alguns milhões já saíram dos cofres públicos para bancar um capricho do presidente.
Enquanto
isso em país, que, já dá inícios de superação da crise da Covid-19, no qual milhões
de brasileiros precisarão de atendimento no SUS para curar as sequelas da
doença, que tem quase 15 milhões de desempregados, pessoas passando fome, vê o
presidente passeando de moto como se nada estivesse acontecendo.
Está
mais do que na hora do presidente deixar de brincar de adolescente
inconsequente que passeia de moto com sua turma, e sentar-se na mesa e começar
a planejar uma reabertura econômica, curar os feridos na guerra da Covid, e
fazer o país retomar, pelo menos um terço, o prestígio que tinha antes dele
assumir a presidência.
Não querendo ser pessimista, apenas realista, esse blog sabe que isso que não vai acontecer. Uma pessoa não amadurece do dia para a noite. O processo de amadurecimento, e de crescimento emocional e pessoal de um indivíduo é um processo que se desenvolve ao longo da vida. Processo esse que o presidente desconhece.
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