O Brasil nas mãos de um aventureiro
Domingo,
29 de agosto
“Quando chegar o momento / Esse meu
sentimento
vou cobrar com juros, juro
...
Você vai pagar e é dobrado
Cada lágrima rolada / Nesse meu penar
Apesar de você, amanhã há de ser outro dia
Onde vai se esconder da enorme euforia
Como vai proibir/ Quando o galo insistir
Em cantar”
(Apesar de Você – Chico Buarque)
Tem
alguém sensato nesse governo?
A
julgar pelos atos e atitudes vemos que esse é um governo de lunáticos, a
começar pelo mandatário da nação, aquele que, como ele mesmo diz, tem o poder
da caneta. Obviamente, há vários tipos de amalucados. Há aqueles que ficam
quietos no seu canto, e aqueles que fazem barulho. Há os que rasgam dinheiro e
os que jogam pedras na lua.
Entretanto,
a espécie de lunáticos encontradas nesse governo é uma espécie perigosa. Eles
querem fazer pensar que é problema de somenos importância uma pandemia
gravíssima. Pegam uma perigosa estrada de desvio quando o assunto se trata de
proteger o meio ambiente. O mundo todo caminha numa direção, a direção correta,
e eles percorrem o caminho inverso, o que leva ao atraso e a destruição do meio
ambiente.
Querem
jogar para debaixo a fome e o desemprego que assolam o país, dizendo que tudo
isso são problemas de menor importância com os quais não devemos nos preocupar,
pois o país está decolando. Decolando para onde Sr. Paulo Guedes? Para o abismo?
E desde quando decolar para o abismo é uma aventura prazerosa?
E
há os que, como o ministro da Educação, Milton Ribeiro, por exemplo, que acham
que as crianças com deficiência atrapalham o processo normal de educação e
querem excluí-los do convívio social com as outras crianças, criando para elas
salas especiais. Como verniz da hipocrisia dão um outro nome para a palavra
segregação.
Tudo
isso faz parte do conjunto de um espetáculo tétrico que está em cartaz no
teatro político brasileiro, no qual os atores desenvolvem cenas de uma
estupidez sem tamanho e sem precedentes na história política brasileira. Porém,
a cena mais ameaçadora e que também integra esse macabro espetáculo é a cena da
ameaça à democracia.
Essa
não é uma cena passageira. É ela o fio condutor da peça inteira. O ator
principal, usando sempre sua grotesca e tosca fantasia de ditador ̶ a
qual ele sonha tirar do armário qualquer dia desses e fazer dela sua veste real
̶ com frequência, dentro do próprio ato,
ou entre um ato e outro, conclama os demais atores da peça teatral a exaltá-la.
Numa
subversão de valores, interpretando uma versão tresloucada de Jesus Cristo, ele
prega aos seus súditos, e os ensina que a democracia é um regime que oprime,
que tolhe as liberdades do indivíduo, que censura, que mata, e que, por isso,
deve ser morta em um 7 de setembro qualquer.
De
acordo com o enredo dessa peça, escrita por algum tirano de plantão, após a
morte da democracia, surgiria, glorioso, o regime opressor que traria a
liberdade, o progresso, e a prosperidade aos habitantes do país. Nesse mundo
ideal, a imprensa livre, tombada em combate ao lado da democracia, também já
não mais existe para atrapalhar os planos dos governantes, já não mais apontaria
os erros, e se desdobraria para apurar, averiguar, investigar, publicar, e trazer
à tona os malfeitos dos governantes.
Agora,
a única imprensa que existe seria a oficial e que se tornaria ainda mais
brilhante em um governo negacionista. Todas as dificuldades e problemas do país
desapareceriam como num passe de mágica, a nação seria transformada num conto
de fadas, no qual tudo é belo e perfeito. Não pode faltar também o final clichê
“E foram felizes para sempre”.
Tudo
isso está posto na mesa. As cartas estão espalhadas sobre ela. O jogo está
dado. Só não vê quem não quer, ou em quem foi colocado uma viseira ̶
instrumento que se coloca ao lado dos olhos dos cavalos para que eles
olhem apenas para a frente.
Há
também aqueles que fazem parte do rebanho nos quais foram colocados freios, do
tipo daqueles que se amarram na boca dos cavalos para que, ao ser acionados, façam-no
parar abruptamente.
Pela
quantidade de pessoas que temos visto no Brasil usando freios e viseiras,
facilmente podemos concluir que é bem fácil usar os meios de criação de
rebanhos sejam eles bovinos, caprinos, ou equinos, e adaptá-los para os
humanos.
Esse
processo todo é muito complicado, e muito sútil. Há os que embarcam nessa
aventura golpista por interesses econômicos, e os que embarcam porque são
manipulados pelo primeiro grupo.
Para
defender o indefensável, para justificar o injustificável estão sendo usados
vários setores da sociedade que, à princípio, deveriam estar ali para defendê-la,
para esclarecê-la, e para torna-la mais pacífica.
As
igrejas, principalmente as evangélicas, estão sendo usadas. O governo federal
tem concedido muitas benesses a esse setor, então os pastores do rebanho, passam
a defender, com unhas e dentes, quem prega o negacionismo, um negacionismo que,
ao defender remédios sem eficácia, e a imunidade de rebanho ceifou a vida de
milhões de brasileiros.
Por
esses dias, vários pastores evangélicos, inflados pelo presidente, tem atacado
e criticado os ministros do STF, principalmente, o ministro Alexandre de
Moraes, que é quem conduz o inquérito das fakes news, atividade na qual estão
envolvidos grandes aliados do presidente, os filhos do presidente, e até mesmo
o próprio presidente.
E
o que são fake news em bom português caros leitores e leitoras? Não são
notícias falsas? E qual o melhor sinônimo para notícias falsas? Mentiras, não é
mesmo? Então pergunto eu a vocês: Onde está a lógica de se defender alguém que
defenda ferrenhamente a produção de notícias falsas?
O
fato se torna ainda mais fundamentado na hipocrisia quando parte de pessoas
que, por princípio, deveriam defender a verdade. Qual é mesmo o versículo
bíblico mais citado pelo presidente? Não é João 8:32 que diz “Conhecereis a
verdade, e a verdade vos libertará?” E como pode a verdade habitar na
mentira?
O
presidente Jair Bolsonaro, na base do toma lá da cá, conquista o apoio dos
pastores, e o pastores, por sua vez, inflam nos fiéis a ideia de que o certo é
errado e o errado é certo, subvertendo os valores cristãos. Incitam seus fiéis
ao crime conforme o inciso XLIV, artigo V da Constituição Federal que diz: “constitui
crime inafiançável e imprescritível a ação de grupos armados, civis ou
militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático”.
Obviamente,
caros leitores e leitoras, nem todos os pastores evangélicos embarcam nessa
aventura golpista, e nem navegam nesse mar de hipocrisia. Porém, os que
embarcam e navegam, já por si só, fazem um grande estrago, e causa tristeza em
quem, verdadeiramente, pratica o bom senso e a justiça.
O
que foi dito acima em relação aos evangélicos também servem para grupos como
agronegócio, os caminhoneiros, e os policiais militares. E mais, uma vez,
repito, não são todos dentre esses grupos que estão cegos pelo ódio e dominados
pela ignorância. E isso nos dá um pouco de esperança.
Um
exemplo de como alguns setores da polícia estão dominadas pelo vírus que quer
trazer de volta retrocessos ao nosso país.
O
coronel Aleksander Lacerda, comandava 7 batalhões da PM paulista. 5 mil homens,
espalhados por 78 municípios da região de Sorocaba, sede do CPI-7 )Comando de Policiamento do Interior-7),
estavam sob seu comando. Em postagens em redes sociais, o coronel convidou seus
amigos para participar do ato de 7 de setembro, em Brasília, momento em que os
bolsonaristas atacariam o Congresso e o STF, em defesa do voto impresso. Nas
postagens, Lacerda chegou a dizer que sentia “nojo” do STF e que o
governador, João Dória, é uma “cepa indiana”.
O
caso, revelado pelo jornal O Estado de São Paulo, em reportagem de 23 de
agosto, mostra como a contaminação das PMs pelo bolsonarismo é perigosa.
Sabemos que o sonho de Bolsonaro é que haja uma ruptura, como ele parece não
encontrar apoio para isso entre o alto comando das Forças Armadas, então as polícias
seriam um caminho. Uma ameaça para tentar tumultuar, e até mesmo, impedir as
eleições de 2022.
No
dia, 16 de agosto, o coronel postou: “Liberdade não se ganha, se toma. Dia
07/09 eu vou”. São as palavras dele para um ato que a Procuradoria-geral da
República classificou como “tentativa de levante”, e que está
preocupando a sociedade brasileira.
Depois
da revelação e grande repercussão do caso, o governo de São Paulo determinou o
afastamento do chefe do CPI-7 coronel Aleksander Lacerda. No dia 25, o comando
da Polícia Militar do Estado de São Paulo, designou o coronel Aleksander Lacerda
para o Estado-Maior-Especial. O órgão, entre os policiais, é conhecido como
“Nasa”. Um lugar para onde são enviados os policiais apenas para não os
deixarem sem função.
O
coronel não ofendeu apenas o STF e seus ministros. Ofendeu também o presidente
do Senado, Rodrigo Pacheco, os integrantes da CPI da Covid, o deputado federal,
e ex-presidente da Câmara, Rodrigo Maia, e quem mais se colocasse como
obstáculo aos arroubos autoritários de Bolsonaro.
A
“Nasa” ada foi uma punição branda para um inimigo da democracia, para um
inimigo do Brasil, como o coronel Aleksander Lacerda. A expulsão dele dos
quadros da PM teria sido a mais adequada. Afinal, não foram uma ou duas
mensagens ofensivas. Apenas entre os dias 1 e 22 de agosto foram postadas nas
redes sociais dele cerca de 400 mensagens do mesmo teor que as reveladas pelo
jornal O Estado de São Paulo. Ou seja, havia um ativismo grande por parte do
coronel.
O
presidente Jair Bolsonaro, desde que botou assento na cadeira presidencial, em
1 de janeiro de 2019, tem sido uma verdadeira indústria de fabricação de
crises. Uma por dia. Às vezes mais de uma por dia. Assim, como as omissões no
enfrentamento da Covid não foram omissões, foram ações deliberadas de deixar o
povo brasileiro se contaminar com o vírus, a fim de provocar a tal imunidade de
rebanho, e assim poder voltar mais rápido às atividades econômicas ̶
caminho que levou muitos brasileiros e brasileiras à sepultura ̶
assim também sabemos que as bravatas de Jair Bolsonaro não são apenas
loucura, coisas ditas por dizer: a intenção dele é provocar o caos, e com o
caos instalado, decretar um estado de sítio, daí então, para que ele concentre
o poder nas próprias mãos, é apenas um passo. Porém, a democracia brasileira
resistirá a esse traidor. Traidor, sim, pois um homem que foi eleito pelo
processo democrático, e depois dispara suas balas de canhão contra esse
processo, não merece outro nome.
Na
sexta-feira, 27, no cercadinho, conversando com apoiadores o presidente chamou
de idiota que preferia comprar feijão ao invés de fuzil. “Tem que todo mundo
comprar fuzil, pô. O povo armado jamais será escravizado. Eu sei que custa
caro. daí tem um idiota que diz ‘ah, tem que comprar feijão’. Cara, se não quer
comprar fuzil, não enche o saco de quem quer comprar”.
No
sábado, 28, ele voltou à carga tóxica de suas palavras. Ele participou do 1
Encontro Fraternal de Líderes Evangélicos de Goiás, em Goiana, DF. Na porta da
Igreja Assembleia de Deus, os fiéis o receberam com gritos de “mito”. O
presidente fez um discurso de cerca de 20 minutos no qual disse: “Temos um
presidente que não deseja e nem provoca rupturas, mas tudo tem um limite em
nossas vidas. Não podemos continuar convivendo com isso. Sei que a grande
maioria dos líderes evangélicos vai participar desse movimento de 7 de setembro
e assim tem que fazê-lo. Está garantido em nossa Constituição. Espero que não
queiram tomar medidas para conter esse movimento. A liberdade de se manifestar,
vedado o anonimato, está garantida na nossa Constituição, não depende de
regulamentação”.
Em
certo ponto do discurso ele insinuou que, nas eleições de 2022, não aceitará
outro resultado que não seja a vitória. “Tenho três alternativas para o meu
futuro: estar preso, ser morto ou a vitória. Pode ter certeza, a primeira
alternativa, preso, não existe. Nenhum homem aqui na Terra vai me amedrontar.
Tenho a consciência de que estou fazendo a coisa certa. Tem algo mais importante
do que nossa vida, é a nossa liberdade”.
Na
segunda-feira, 16, o ministro Luis Felipe Salomão, corregedor-geral da Justiça
Eleitoral, determinou que as plataformas digitais YouTube, Twitch.TV, Twitter,
Instagram e Facebook suspendam repasses de valores publicitários a canais
bolsonaristas que são investigados na divulgação de fake news. A decisão
atendeu a um pedido da Polícia Federal.
Em
seu discurso aos evangélicos de Goiânia, Bolsonaro criticou essa decisão do
TSE. Também comentou com ironia aqueles que o acusam de querer dar um golpe de
Estado. “Eu já sou presidente. Vou dar um golpe em mim mesmo? Não pensem que
muitos querem me tirar daqui em nome da volta da normalidade e da democracia.
Querem me tirar daqui pelo poder. A abstinência do dinheiro fácil os torna
belicosos. Os fazem reunir, os fazem conspirar. Digo uma coisa a eles: Deus me
colocou aqui e somente Deus me tira daqui”.
Assim
é o mandatário de nossa nação. Essa semana recebi um desses memes que circulam
pelo WhatsApp. Ele mostrava a figura de Bolsonaro em cima de um cavalo. Abaixo
a legenda: “O Castigo vem a cavalo”. E eu pergunto: Senhor Deus, que fizemos
para merecer esse castigo?
Repito
agora, a pergunta que fiz no início deste texto:
Tem
alguém sensato nesse governo?
Tem
sim.
Quem?
Pergunta você.
O
general Hamilton Mourão. As coisas poderiam estar bem piores se não fosse ele.
Você pode até não concordar com as posições dele, mas não pode dizer que ele,
ao contrário do presidente, não é digno do cargo que ocupa.
Perto
de Bolsonaro, Mourão deve estar, como diz o ditado popular, “comendo o pão que
o diabo amassou”. Pois, como temos visto, para o presidente Jair Bolsonaro,
aliado bom é aquele que, como escravo, faz todas as suas vontades. Basta um
posicionamento contrário ao seu e o aliado já se torna inimigo. E se for
ministro ou de outro escalão do governo, o presidente faz a troca
imediatamente, como se trocasse a peça de uma engrenagem.
Porém,
não pode fazer isso com o vice-presidente, que foi alçado à Presidência da
República pelo voto popular, juntamente com o presidente. Como não pode demitir
o vice-presidente Bolsonaro o humilha, maltrata. Faz tempo que Bolsonaro não o convida
para as reuniões ministeriais. Bolsonaro queria um vice-presidente que não
falasse, e Mourão fala. Desde o início já mostrou que não aceitaria ser um
vice-presidente em silêncio.
Mourão,
apesar de afirmar lealdade total ao presidente, manifesta suas opiniões, mesmo quando
elas vão em sentido contrário ao pensamento de Bolsonaro. Ele também não
comunga com ele quando o assunto se trata de falas golpista. Sempre deixa bem
claro que a democracia é o melhor caminho e que não aceita a ideia de ruptura.
Mourão
tem um projeto e que é não um projeto golpista. Ele pretende disputar o cargo
de governador do Rio de Janeiro nas próximas eleições, e está bem cotado entre
os favoritos.
No
final de julho, em entrevista à rádio Arapuan FM, da Paraíba, Bolsonaro disse:
“No meu (caso), (a escolha do vice) foi feita a toque de caixa, mas o Mourão
faz o seu trabalho, ele tem uma independência muito grande. Por vezes atrapalha
um pouco a gente, mas o vice é igual a cunhado: Você casa e tem que aturar o
cunhado do teu lado, não pode mandar o cunhado embora”, disse o presidente.
Essa
é a realidade, caros leitores e eleitoras. Se Mourão tem uma paciência de Jó
para aguentar Bolsonaro, nós brasileiros que não fazemos parte do cercadinho,
nem do rebanho, já perdemos a paciência faz tempo. Resta-nos serenidade para,
no momento certo tirá-lo de lá. Precisam as instituições frear, e reagir
duramente os arroubos golpistas de Jair Bolsonaro... Antes que o pior aconteça.