Justiça feita e promessas vãs
Segunda-feira,
26 de abril
Mais
uma semana começando, muita coisa aconteceu na semana passada e já é passado, e
assim gira o moinho da vida. A existência é movimento. Igual ao astro rei. O
sol não para descansar. Está sempre a girar interminavelmente. Ele nunca descansa.
Nunca tira férias. A vida é exatamente assim: puro movimento. Segundos,
minutos, horas, dias, meses, anos, séculos, milênios, tudo também se sucede num
girar interminável, de carona na carruagem de fogo que rodeia nosso — diante da
grandeza e beleza estonteante do universo —pequeno e humilde planeta.
Nós,
os humanos, é que precisamos de férias, descansos, e todas essas coisas que
apenas nos lembram nossa condição de seres limitados, e que, como diria Raul
Seixas, “só usa dez por cento de sua cabeça animal”. Mas, mesmo assim, somos
diretamente afetados pelo movimento da vida, giramos junto com ela, querendo
nós ou não. Não podemos estagnar. Prosseguir sempre em frente é o objetivo de
todo ser vivente. A maioria das vezes não estamos conscientes de que o viver é
uma constante evolução. Claro, tem gente que parece fazer o caminho inverso, em
vez de evoluir, involue. Quem age assim, age na inocência, sem saber que serão cobrados
por suas atitudes mesquinhas, e triturados pela implacável roda do moinho da
vida.
Na
onda do movimento da vida, dos fatos, e dos acontecimentos, este blog não
poderia deixar de falar do julgamento histórico que ocorreu nos Estados Unidos
semana passada.
Na
terça-feira, 20 de abril, finalmente, e para alívio de todos, o policial
branco, americano, Derek Chauvin, tirou o joelho do pescoço dos americanos que
não aguentam mais anos e anos de preconceito, racismo e injustiça. E de quebra,
Derek tirou também o joelho do pescoço de todas as pessoas do mundo inteiro que
estão sufocando, que não conseguem respirar por causa de tanta opressão.
Pessoas essas que, por intermináveis minutos, durante anos, tem gritado que não
conseguem respirar, mas, raramente, são ouvidas. Os negros são sufocados, mortos,
humilhados, não apenas nos Estados Unidos, mas no mundo inteiro. Aqui no Brasil
são frequentes os casos de abusos da polícia para com os negros.
Quase
um ano depois da fatídica segunda-feira de 25 de maio de 2020, em Minneapolis, dia
em que Derek Chauvin, policial branco, 40 anos, apoiou o joelho sobre o pescoço
de George Floyd, negro, 48 anos, por longos e intermináveis 9 minutos e 29
segundos. Após a morte, uma onda de protestos varreu os Estados Unidos como
tsunami.
Na
última terça-feira, 20 de abril, em um julgamento que durou três semanas, envolveu
a audição de 45 testemunhas, e muitas horas de vídeos exibidos no tribunal, um
grupo de jurados, formados por sete mulheres e cinco homens, por unanimidade,
decidiu que Chauvin é culpado pela morte de Floyd. Desses jurados, seis pessoas
são brancas, quatro negras, e duas multirraciais. Os jurados levaram cerca de
10 horas para chegar a essa decisão.
A
pena de Derek Chauvin será conhecida dentro de dois meses. Espera-se que o
ex-policial seja punido de forma exemplar, até para que outros casos, como o de
Floyd, não se repitam. Isso é difícil, pois após a morte de George Floyd outros
casos já aconteceram nos Estados Unidos. Mas, certamente, a condenação do
assassino de Floyd já é um marco na justiça americana e, espera-se, sirva de
parâmetro para outros julgamentos. Dias após a morte de Floyd, durante os
protestos, e nos ombros do tio, a filha dele disse: “Meu pai mudou o mundo”.
Com certeza, a pequena garota não estava errada. O nome do pai dela já entrou
para as páginas de história da luta contra o preconceito.
Outro
fato muito importante para a toda a comunidade internacional, acontecido na
quinta-feira, 22, e sexta, 23, apesar de ser um evento online, também teve como
foco de atenção, os Estados Unidos. Foi a Cúpula de Líderes sobre o Clima. Mais
cedo do que imaginavam os americanos estão descobrindo que a vida sem Donald
Trump como presidente, e com Joe Biden na casa branca, vai ser muito melhor.
A
questão do clima é uma é tão delicada como um cristal. Afinal, estamos tratando
de nossa casa comum: o planeta Terra. O mundo já sente os efeitos das mudanças
climáticas. Elas já não fazem mais parte de estudos ou conjecturas sobre o que
acontecerá. Já são reais as elevações constantes de temperatura a cada ano, o
que, por sua vez, eleva o número de queimadas, secas, e derretimento das
geleiras. Apenas para citar algumas mudanças que percebemos e que podem ter
consequências graves para o planeta como um todo.
Na
verdade, os países ricos não conseguirão atingir a meta para diminuir a emissão
de gás carbônico na atmosfera, até 2030, se atitudes enérgicas não forem
adotadas agora. Isso de acordo com relatório divulgado em dezembro pela ONU. No
evento recente, o presidente Joe Biden reconheceu que o país não está fazendo o
suficiente para cumprir a meta estabelecida para diminuir a emissão de carbono
na atmosfera, porém, fez o anúncio de metas ambiciosas de reduzir tais emissões
em 50% a 52% dessas emissões até 2030.
O caminho é por aí, pois de nada adiantará termos um progresso estrondoso, se não tivermos um planeta para habitar, não é verdade? Lembrem-se que o mundo já foi habitado por seres enormes, gigantes, poderosos. E onde estão eles agora? Nós, sem a Terra não existimos. A Terra sem nós continua linda, bela, soberana, talvez até mais ainda que com a nossa presença. Então, é preciso nos esmerar em cuidados com esse nosso santuário chamado planeta Terra.
Um
dos discursos mais aguardados nesse evento era o do presidente Jair Bolsonaro.
E ele até que fez um discurso bem mais moderado que outras ocasiões onde se
falou sobre o clima. Pelo menos, dessa vez não passamos vergonha.
O
site da Agência Brasil publicou o discurso de Jair Bolsonaro, na íntegra, o
qual esse blog agora reproduz:
Agradeço
o convite para participar desta Cúpula de Líderes.
Historicamente,
o Brasil é voz ativa na construção da agenda ambiental global. Renovo, hoje,
essa credencial, respaldada tanto por nossas conquistas até aqui quanto pelos
compromissos que estamos prontos a assumir perante as gerações futuras.
Como
detentor da maior biodiversidade do planeta e potência agroambiental, o Brasil
está na vanguarda do enfrentamento ao aquecimento global.
Ao discutirmos mudanças no clima, não podemos
esquecer a causa maior do problema: a queima de combustíveis fósseis ao longo
dos últimos dois séculos.
O Brasil participou com menos de 1% das
emissões históricas de gases de efeito estufa, mesmo sendo uma das maiores
economias do mundo. No presente, respondemos por menos de 3% das emissões
globais anuais.
Contamos com uma das matrizes energéticas mais
limpas, com renovados investimentos em energia solar, eólica, hidráulica e
biomassa.
Somos pioneiros na difusão de biocombustíveis
renováveis, como o etanol, fundamentais para a despoluição de nossos centros
urbanos.
No campo, promovemos uma revolução verde a
partir da ciência e inovação. Produzimos mais utilizando menos recursos, o que
faz da nossa agricultura uma das mais sustentáveis do planeta.
Temos orgulho de conservar 84% de nosso bioma
amazônico e 12% da água doce da Terra.
Como resultado, somente nos últimos 15 anos
evitamos a emissão de mais de 7,8 bilhões de toneladas de carbono na atmosfera.
À
luz de nossas responsabilidades comuns, porém, diferenciadas, continuamos a
colaborar com os esforços mundiais contra a mudança do clima.
Somos
um dos poucos países em desenvolvimento a adotar, e reafirmar, uma NDC
transversal e abrangente, com metas absolutas de redução de emissões inclusive
para 2025, de 37%, e de 43% até 2030.
Coincidimos, Senhor Presidente, com o seu
chamado ao estabelecimento de compromissos ambiciosos.
Nesse sentido, determinei que nossa
neutralidade climática seja alcançada até 2050, antecipando em 10 anos a
sinalização anterior.
Entre as medidas necessárias para tanto,
destaco aqui o compromisso de eliminar o desmatamento ilegal até 2030, com a
plena e pronta aplicação do nosso Código Florestal. Com isso, reduziremos em
quase 50% nossas emissões até essa data.
Há que se reconhecer que será uma tarefa
complexa.
Medidas de comando e controle são parte da
resposta. Apesar das limitações orçamentárias do Governo, determinei o
fortalecimento dos órgãos ambientais, duplicando os recursos destinados às
ações de fiscalização.
Mas é preciso fazer mais. Devemos enfrentar o
desafio de melhorar a vida dos mais de 23 milhões de brasileiros que vivem na
Amazônia, região mais rica do país em recursos naturais, mas que apresenta os
piores índices de desenvolvimento humano.
A solução desse “paradoxo amazônico” é
condição essencial para o desenvolvimento sustentável da região.
Devemos aprimorar a governança da terra, bem
como tornar realidade a bioeconomia, valorizando efetivamente a floresta e a
biodiversidade. Esse deve ser um esforço, que contemple os interesses de todos
os brasileiros, inclusive indígenas e comunidades tradicionais.
Diante da magnitude dos obstáculos, inclusive
financeiros, é fundamental poder contar com a contribuição de países, empresas,
entidades e pessoas dispostos a atuar de maneira imediata, real e construtiva
na solução desses problemas.
Neste ano, a comunidade internacional terá
oportunidade singular de cooperar com a construção de nosso futuro comum.
A COP26 terá como uma de suas principais
missões a plena adoção dos mecanismos previstos nos Artigos 5º e 6º do Acordo
de Paris.
Os mercados de carbono são cruciais como fonte
de recursos e investimentos para impulsionar a ação climática, tanto na área
florestal quanto em outros relevantes setores da economia, como indústria,
geração de energia e manejo de resíduos.
Da mesma forma, é preciso haver justa
remuneração pelos serviços ambientais prestados por nossos biomas ao planeta,
como forma de reconhecer o caráter econômico das atividades de conservação.
Estamos, reitero, abertos à cooperação
internacional.
Senhoras
e senhores, como todos, reafirmamos em 92, no Rio de Janeiro, na conferência
presidida pelo Brasil, o direito ao desenvolvimento deve ser exercido de tal
forma que a resposta equitativamente e de forma sustentável às necessidades
ambientais e de desenvolvimento das gerações presentes e futuras.
Com
esse espírito de responsabilidade coletiva e destino comum, convido-os
novamente a apoiar-nos nessa missão.
Contem
com o Brasil".
Basta
ver as ações de Bolsonaro e de seu ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles,
para ver que algo não bate bem, não combinam palavras, discursos e realidade.
Os líderes mundiais já viam com descrédito a posição e as ações do Brasil em
relação a questão climática, e, com certeza não sentiram verdade nas palavras
do presidente brasileiro. Joe Biden disse que os discursos do Brasil, da
Argentina, da África do Sul, e da Coreia do Sul foram animadores, mas também
afirmou que os compromissos precisam se tornar realidade.
A
impressão é que algum assessor de Bolsonaro, sabe-se lá qual, chegou para ele e
falou, “Presidente, não vale a pena partir para o enfrentamento com os líderes
mundiais. Faça um discurso moderado” e foi o que ele fez, embora citando conquistas
adquiridas em governos anteriores.
Mas,
aqueles que não estão cegos pelo fanatismo, sabem que o Bolsonaro não é uma
pessoa confiável, não é um homem de palavra. Ao contrário, as palavras e os atos
do presidente mudam ao sabor do vento e das circunstâncias... E os ventos mudam
muito rápido.
Para
começar, nas vésperas da realização da Cúpula do Clima, tivemos o episódio do
ministro Ricardo Salles demitindo o superintende da Polícia Federal no Amazonas,
Alexandre Saraiva, e se colocando, abertamente, ao lado dos madeireiros
ilegais. Salles também adotou medidas que dificultam ainda mais o trabalho de
fiscalização dos funcionários do Ibama.
Um
dia após Bolsonaro fazer promessas de se alinhar aos demais líderes mundiais, na
cruzada contra a emissão de carbono, anunciando que aumentaria os recursos para a fiscalização ambiental, eis
que o presidente, no dia seguinte o presidente sanciona o Plano Orçamentário
para 2021, e nele constava um corte de R$ 240 milhões para o ministério do Meio
Ambiente.
Depois de tudo isso, o presidente ainda esperar receber uma ajuda de 1 bilhão de dólares para ações de combate ao desmatamento ilegal. Se esse dinheiro chegar ao Brasil no governo Bolsonaro, certamente, não irá para a finalidade para o qual foi solicitado. Provavelmente irá beneficiar não a floresta, mas os inimigos dela.