Que constrangimento! Que vergonha!
Quarta-feira 14 de outubro
Um
sorriso de felicidade no rosto. Uma roupa de marca de qualidade. Festa à beira
de uma piscina numa luxuosa mansão, regada pelas melhores bebidas e iguarias.
Em outras palavras: rindo à toa. Assim deve estar o André. Ah, não esqueçamos
de dizer que, para ser o homenageado da festa deve ter sido escolhido o
ministro Marco Aurélio de Melo, do STF.
André
de Oliveira Macedo, 43 anos, esse é nome verdadeiro dele, porém, é mais
conhecido no mundo crime como André do Rap. Mas quem é esse cara que, ganhou as
manchetes dos jornais neste fim-de-semana, e delas não saiu ainda?
O
personagem em questão é apontado pelas autoridades policiais como sendo um dos
chefes do PCC (Primeiro Comando da Capital). O PCC é uma poderosa facção
criminosa que atua dentro e fora dos presídios no estado de São Paulo. A facção
já fez e continua fazendo grandes estragos na sociedade, roubando, matando, e
traficando.
Além
disso, André ocupa posição importante na quadrilha, não apenas por ser um dos
maiores traficantes de cocaína do Brasil, mas também por desempenhar papel
importante no envio da droga para países europeus.
Para
isso, o Porto de Santos, no litoral paulista, exercia papel primordial no tráfico
de droga para a Europa. A droga era enviada escondida em conteiners. Como o
mercado de drogas é altamente lucrativo, apesar de completamente, ilegal, não é
de estranhar que André tenha levado, nos últimos tempos, uma vida de luxo e
conforto. Em Angra dos Reis, onde morava, o traficante levava vida de rei:
helicopteros particulares e alugados, mansões, e iates. Além de quantias
milionárias em dinheiro.
André
funciona como uma ponte entre os produtores brasileiros e os compradores de
outras nações. Em liberdade, o traficante se tornar uma ponte ainda mais forte
e atraente, além de lucrativa.
Foi
numa manhã de domingo de setembro de 2019 que a polícia do Rio de Janeiro
invadiu um condomínio de luxo, em Angra dos Reis, e prendeu André do Rap. Em companhia
dele estavam outros três suspeitos que também foram presos.
Na
mansão onde André morava os policiais apreenderam um carro de luxo, uma lancha
avaliada em R$ 6 milhões, e um helicóptero no valor de R$ 7 milhões. O imóvel não era próprio e o traficante pagava
pelo aluguel dele o valor de R$ 20 mil mensais.
Não
foi fácil prender o André naquela época. A polícia chegou até ele após ele
trocar a lancha antiga que possuía, no valor de R$ 3,5 milhões por uma nova que
valia R$ 6 milhões. Os policiais descobriram que quem comprara a lancha não
tinha capacidade fiscal para isso. Aprofundaram as investigações e chegaram ao
verdadeiro dono: André do Rap.
Foram três meses de investigação. Nela
estiveram envolvidos agentes policiais italianos e norte-americanos. Então, uns
quatro dias antes da prisão, os policiais receberam informações de que ele estaria
em Angra, e foram para lá com uma equipe de 23 policiais. Antes da prisão em
2019, o traficante já havia passado sete anos na prisão, mas estava foragido
desde 2014.
Agora
todo esse trabalho de inteligência que envolveu a força policial brasileira, italiana,
e norte-americana foi jogado fora pelo ministro do Supremo Tribunal Federal,
Marco Aurélio de Melo.
No
sábado, 9, o governo de São Paulo, estado onde o traficante estava preso,
recebeu com perplexidade, a ordem de soltura de André do Rap. Os integrantes da
cúpula da segurança paulista deve ter lido várias vezes o pedido até se dar
conta de que era real: um ministro do STF havia dado a ordem de soltura de um
traficantes de drogas mais perigosos do mundo. Revoltados, viram nisso, um
desrespeito ao brilhante serviço que a polícia fez ao prendê-lo em 2019.
O
ministro baseou sua decisão no artigo 316 da Lei 13. 964, mais conhecida como
pacote anticrime, aprovada em dezembro do ano passado pelo Congresso. A lei diz
que a cada 90 dias as prisões preventivas sejam revisadas sob pena de tornar a
prisão ilegal.
Diz
o texto:
Art. 316. O juiz
poderá, de ofício ou a pedido das partes, revogar a prisão preventiva se, no
correr da investigação ou do processo, verificar a falta de motivo para que ela
subsista, bem como novamente decretá-la, se sobrevierem razões que a
justifiquem.
Parágrafo único.
Decretada a prisão preventiva, deverá o órgão emissor da decisão revisar a
necessidade de sua manutenção a cada 90 (noventa) dias, mediante decisão
fundamentada, de ofício, sob pena de tornar a prisão ilegal.
É
certo que o ministro Marco Aurélio de Melo não cometeu nenhuma ilegalidade ao
restituir a liberdade a André do Rap, ele apenas cumpriu a lei. Mas também é
mais do que certo que ele cometeu um grande erro ao interpretar a lei de modo
tão frio. “O juiz não renovou, o MP não
cobrou, a polícia não representou para ele renovar, eu não respondo pelo ato
alheio, vamos ver quem foi que claudicou”, disse ele em entrevista ao
jornal Folha de São Paulo.
Em
seu despacho dado em 02 de outubro, o ministro escreveu: “Advirtam-no da necessidade de permanecer em residência indicada ao
Juízo, atendendo aos chamados judiciais, de informar possível transferência e
de adotar a postura que se aguarda do cidadão integrado à sociedade”.
Será
que ele achava um traficante perigoso como André do Rap iria, realmente, seguir
uma ordem tão simplória?
De
fato, logo após ser solto, o traficante desapareceu como desaparece a fumaça no
ar. Para onde ele teria ido? Muitos defendem que ele tenha ido para o Paraguai.
Estaria ele por lá? Vai saber. Agora ele pode estar escondido em qualquer
lugar. Recapturá-lo novamente é coisa possível, mas muito pouco provável.
Algo
curioso nessa história que subverte a lógica é que a advogada que assina o
pedido de habeas corpus que libertaria André chama-se Ana Luísa Rocha Gonçalves
faz parte do escritório de advocacia Ubaldo Barbosa Advogados. O dono desse escritório é Eduardo Ubaldo
Barbosa. Eduardo, até recentemente, assessorava Marco Aurélio no STF. Essa
informação foi divulgada pelo revista Crusóe.
O
mais intrigante ainda é que, de acordo com conversas grampeadas entre detentos,
feitas pelo serviço de inteligência da polícia paulista, André dizia a seus
companheiros de cela que seria solto ainda este ano, e que não passaria o Natal
ali no presídio de segurança máxima de Presidente Venceslau, onde estava preso.
Certamente, acompanhava, junto com seus advogados, a movimentação no tabuleiro.
Devia conhecer o artigo 316 da nova lei penal. Ao final, nenhuma pedido de
revisão da prisão, era hora de dar o bote. Era preciso também que o habeas
corpus fosse assinado pelo ministro certo. Então tudo saiu como manda o
figurino.
Ainda
no sábado, o novo ministro do STF, Luiz Fux, suspendeu a liminar que havia sido
dada por Marco Aurélio, e determinou que o traficante André do Rap fosse
novamente preso. Mas aí, caro leitor, leitora, o estrago já havia sido feito. O
traficante já havia fugido.
Ainda
no dia de hoje, 14, por decisão do novo presidente do STF, Luiz Fux, e
atendendo a pedido da Ministério Público Federal que solicita a suspensão da
liminar concedida por Marco Aurélio.
Agora
os ministros da Suprema Corte deverão decidir quem tem razão: se Marco Aurélio
ao mandar soltar André do Rap, ou se Luiz Fux, ao determinar que o traficante
fosse preso novamente.
Quem
ganhará a queda de braço, mais tarde se saberá. O que se sabe de fato são apenas
duas coisas: que a Justiça brasileira está diante de uma situação super constrangedora,
e que André do Rap, fugiu, como uma serpente se esgueira pela mata escura.
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