Constrangimentos diplomáticos
Quarta-feira, 23 de setembro
Vamos
falar um pouco no texto de hoje sobre relações internacionais e diplomacia
brasileira.
Porém,
antes, falemos um pouco das placas tectônicas. O que tem a ver uma coisa com
outra? Perguntam vocês. Sigamos, e vocês perceberão que sim, pelo menos quando
isso é aplicado ao contexto brasileiro.
Segundo
reportagem da revista Super Interessante, placas tectônicas:
“São os gigantescos blocos que compõem a camada sólida externa do nosso planeta, sustentando os continentes e os oceanos. Impulsionadas pelo movimento do magma incandescente no interior da Terra, as dez principais placas se empurram, afastam-se umas das outras e afundam alguns milímetros por ano, alterando suas dimensões e modificando o contorno do relevo terrestre. Esses gigantescos fragmentos atuam como artistas que recriam a paisagem da Terra. Aliás, a palavra tectônica vem de tektoniké, expressão grega que significa “a arte de construir”.
Pois
bem, de acordo com a teoria das placas tectônicas, há centenas de milhões de
anos todos os continentes formavam um só bloco. Com o decorrer dos anos, milhões
deles, o movimento lento dessas placas dividiu o mundo em dois continentes. Sem
pressa nenhuma, as placas tectônicas foram dando ao mundo a forma continental
que ele tem hoje.
Pois
bem, desde o início do governo de Jair Messias Bolsonaro, o Brasil tem estado
para as relações exteriores e para diplomacia internacional como as placas
tectônicas estão para o planeta Terra.
A
cada vez vamos nos distanciando mais dos outros países formando um mundo isolado.
E isso não é nada bom tendo em vista o mundo globalizado em que vivemos.
Bolsonaro
e seu governo não tem a menor competência para tratar de assuntos delicados e
temas complexos. Isso não é uma suposição, não é uma fofoca, não é um desabafo.
É um fato advindo da observação das ações desse governo desde que ele começou
em janeiro de 2019. Uma coisa eles sabem fazer muito bem: jogar questões
ideológicas vazias e sem sentido para os seus seguidores como quem joga capim
para o gado.
Tomemos
como exemplo a viagem recente de Bolsonaro a Rússia. Em meio a escalada da
tensão entre Rússia e Ucrânia, tensão essa que pode, de uma hora para outra,
passar de conflito para guerra, eis que Bolsonaro resolve viajar. E para onde
senhoras e senhores? Para a Rússia. Com todas as potências mundiais condenando
o conflito, pedindo que seus concidadões saiam de território urcraniano, e
impondo sanções ao país comandado por Vladmir Putin, eis que o presidente
brasileiro vai lá e diz prestar solidariedade aos russos. O objetivo da viagem
de Bolsonaro era discutir questões relativas ao agronegócio e outras questões
comerciais.
Ele
viajou para a Rússia na segunda-feira, 14 de fevereiro. Tudo bem que a viagem
já estava marcada desde o final de 2021 quando ainda as coisas ainda não tinham
esquentado naquela região do planeta. Mas dava para dar uma desculpa qualquer.
Segundo fonte da chancelaria ouvidas pelo portal Uol notícias, houve receio de
uma possível retaliação da Rússia que poderia evocar motivos sanitários e não
comprar mais a carne de frango brasileiro. Mas, o Itamaraty resolveu abraçar
Putin e virar as costas para o restante do mundo.
Na
terça-feira, 22, o ministro do STF Luis Edson Fachin, foi empossado como
ministro do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). O ministro Alexandre de Moraes
foi empossado como vice-presidente desse mesmo órgão. Bolsonaro foi rápido em
arranjar uma desculpa para não ir à posse dos ministros. E olhem que que a
cerimonia nem foi presencial, foi online. O presidente brasileiro tem trocado
muitas farpas com os ministros e tem posto em dúvida a segurança das urnas
eletrônicas e do processo eleitoral brasileiro.
A
reunião com Putin recebeu duras críticas do governo americano. Líderes europeus
também estavam de olhos no encontro. “Não há um problema com líderes visitar
Putin, mas sim com o objetivo [da viagem]. Emmanuel Macron, Olaf Scholz e
vários outros viajaram até Moscou para tentar tratar da questão da Ucrânia. O
que foi estranho foi Bolsonaro aparecer e não lidar com o assunto que fervia. Parecia
mais um encontro do fã clube de autocratas que um encontro para tratar de
direitos humanos. Nesse sentido, foi desapontador”. Disse Keneth Roth,
diretor-executivo da Human RightsWatch.
E
como cereja do bolo desse encontro, Bolsonaro ainda abriu a boca para dizer que
era solidário à Rússia nesse momento. Depois tentou desdizer, justificar a
fala, mas palavras uma vez ditas não podem ser recolhidas.
E,
como adolescentes irresponsáveis, membros do governo ainda postaram nas redes
sociais que a visita de Bolsonaro a Putin teria sido a responsável pela
retirada das tropas russas da fronteira com a Ucrânia. Fazendo-os queimar a
língua, pois, logo em seguida a essas tolas postagens e memes, as coisas
pioraram ainda mais.
Na
verdade, a visita de Bolsonaro deixou o governo brasileiro numa saia justa, se
o Brasil já vinha se separando do resto do mundo, a situação agora ficou pior,
pois os líderes mundiais evitarão ainda mais encontros com o governo
brasileiro.
Para
acabar de acertar, Bolsonaro não assinou nenhum acordo signficativo com o
governo russo. O único acordo que ele conseguiu é irrelevante e trata do
protocolo de emenda a um acordo de proteção mútua de informações classificadas
entre os dois países, firmado em 2008.
O
objetivo desse acordo é apenas atualizar as informações de documentos nas
categorias de reservado, secretos, e ultrasecretos, de acordo com a Lei de
Acesso à Informação, publicada em 2012.
Após
a visita a Putin, Bolsonaro aproveitou e fez uma visita rápida ao primeiro-ministro
húngaro, Viktor Orban, ícone da ultradireita na Hungria. Bolsonaro o chamou de
irmão. E, de fato, os ideais dos dois são bem parecidos.
Em
pouco mais de uma década Orbán fez por lá o que Bolsonaro intenta fazer por
aqui. O primeiro-ministro húngaro trocou centenas de juízes por aliados. Alterou a lei eleitoral para beneficiar o
partido a que ele pertence. E a imprensa? Para os ditadores, ela é sempre a
inimiga número um. Na Hungria também não é diferente. Orbán “sequestrou”
centenas de jornais independentes e os colocou a serviço da máquina
governamental. Coisas que Bolsonaro deve achar o máximo, e que também gostaria
de fazer por aqui.
O
encontro de Bolsonaro com Orbán também não trouxe nenhum acordo expressivo e
vantajoso para o Brasil. Bolsonaro declarou suas afinidades com o
primeiro-ministro húngaro, apenas isso.
Ele
também mentiu para Orbán sobre o desmatamento da Amazônia. “Muitas vezes, as
informações sobre essa região chegam para fora do Brasil de forma bastante
distorcida, como se nós fôssemos os grandes vilões no que se leva em conta a
preservação da floresta e sua destruição, coisa que não existe”, afirmou. “Nós
nos preocupamos inclusive com o reflorestamento, coisa que não vejo nos países
da Europa como um todo. Essa informação passa para um lado de um ataque a nossa
economia que vem em grande parte do agronegócio.”
Se
Viktor Orbán for uma autoridade bem-informada ele deve saber que Bolsonaro lhe
contou uma grande mentira. Dados oficiais do Inpe ((Instituto Nacional de
Pesquisas Espaciais) mostram que, em janeiro deste ano, o desmatamento na
Amazônia bateu recorde. Apenas no período entre 1o e 21 de janeiro
foram destruídos cerca de 360 quilômetros quadrados.
O
registo do Inpe parou em 21 de janeiro. O que não impede, entretanto, que este
se torne o janeiro mais devastador para a floresta desde 2015. A continuar
assim, 2022 será um ano sombrio e triste para a floresta, para os povos que
nela habitam e para a fauna e a flora exuberante que embelezam a região.
Voltando
à política externa brasileira, que no momento atual atravessa uma das piores
fases da história, ela sempre teve um papel proativo no cenário internacional. Desde
a política externa liderado pelo Visconde do Rio Branco (1902 a 1912), passando
pelos governos de Getúlio Vargas, Juscelino Kubistchek, Jânio Quadro, João
Goulart, mesmo os governos do período da ditadura, indo depois para Fernando
Henrique Cardoso, Lula, Dilma Rousseff — durante o governo de Dilma Rousseff
não foi ativa quando no governo de Lula, mesmo assim, não foi tão ruim quanto
no governo de Bolsonaro — em todos esses governos, o Brasil sempre teve papel
preponderante no cenário internacional.
A
história segue seu curso e eis que o Bolsonaro ascende ao poder... E começa seu
projeto destrutivo do meio ambiente, cultura, educação, economia, e nesse pacote
entra também a política externa.
Na
campanha de eleitoral, em 2018, as bandeiras levantadas em campanha para a política
externa já anunciavam uma mudança de rumo... e para pior. Para comandar esta
pasta foi escolhido Ernesto Araújo, e a mudança de rumo para pior se confirmou.
Bolsonaro
fez tudo que um estadista que mereça esse nome não faz. Aproximou-se de Donald
Trump, e não dos Estados Unidos. É tanto que foi o último governante a
reconhecer a vitória de Biden, defendendo sempre que as eleições americanas
haviam sido fraudadas.
Muitas
vezes, Ernesto Araújo, Bolsonaro, e filhos, pareciam despir-se da roupagem de
homens públicos e vestir a roupa de meninos, moleques, irresponsáveis. Como por
exemplo quando acusaram a China de ter “fabricado” o coronavírus, e dito que as
vacinas produzidas naquele país não eram eficazes. Até mesmo atitudes xenófobas
tiveram para com um dos principais parceiros comerciais do Brasil na
atualidade.
Quando
Emmanuel Macron criticou as queimadas na Amazônia Bolsonaro revidou sendo
extremamente deselegante e ofendendo de forma mais deselegante ainda a
primeira-dama francesa.
Por
tudo isso, e muito mais, essas reações ridículas do governo foram criando
rachaduras nas camadas de nossa política externa, e a política externa
brasileira que sempre formou um bloco uno com os outros países, foi aos poucos
sendo separada, afastada deste bloco, isolando-nos no cenário internacional,
assim com as placas tectônicas separaram continentes, pacientemente, ao longo dos
séculos.
Ainda
com relação a política externa e relações internacionais, este blogueiro está
com o coração apertado, junto com milhões de pessoas em todo o planeta, pelas
coisas que ocorrem na fronteira da Rússia com a Ucrânia.
Que
as coisas se resolvam na diplomacia, sem precisar que haja guerra, pois, ela
representa a solução mais radical, a mais cruel. Com ela vem a carestia, as dificuldades
financeiras que já foram tão agravadas por causa da pandemia, e o que é pior, a
perda de milhares de vidas inocentes, tanto de civis quanto de soldados. Com a
guerra, todo mundo perde.
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