Confissões de Andrea
Segunda-feira,
05 de julho
A
semana passada terminou com grandes manifestações contra o presidente Jair
Bolsonaro. Milhares de brasileiros foram as ruas de todo o país. A palavra de
ordem era: Impeachment já! Fora Bolsonaro! Mas também houve reinvindicações por
uma parcela maior do auxílio emergencial, e por mais vacinas. Arthur Lira, presidente
da Câmara dos Deputados, e Rodrigo Pacheco, presidente do Senado Federal,
também foram lembrados pelos manifestantes.
Os
protestos foram pacíficos em todos o país, à exceção de São Paulo, onde uma
agência bancária foi apedrejada e manifestantes colocaram fogo dentro da agência.
Os vândalos não chegaram a incendiar a agência. Na rua, eles fizeram uma
espécie de barricada de fogo, queimando papelão e madeira.
Desde
a primeira manifestação contra o governo Bolsonaro, ocorrida em 29 de maio
deste ano, a adesão às manifestações vem crescendo, e tendo a participação de
mais setores da sociedade, e não apenas partidos de esquerda, embora estes ainda
sejam maioria.
Levemos
em conta também que muita gente ainda não se arrisca a ir para a rua por a
Covid-19 ainda representar um grande perigo. Entretanto, quando um povo vai às
ruas protestar contra um presidente, em meio a uma pandemia, é porque ele é
pior que o vírus. “O governo Bolsonaro é mais perigoso que o vírus, está
insustentável e não conseguimos mais suportar nem um dia a mais desse governo
que é genocida de fato”, disse Samara Martins, vice-presidente da Unidade
Popular pelo Socialismo, em relação às manifestações.
Os
protestos ocorridos no sábado passado iriam ocorrer no dia 24 de julho, mas
foram antecipados depois do surgimento das denúncias de corrupção envolvendo a
corrupção na compra de vacinas, que vieram à tona na CPI que apura os atos e
omissões do governo federal em meio à pandemia, e o repasse de verbas federais
aos estados e munícipios.
Se
a semana passada terminou com manifestações, essa semana começou com novas
denúncias contra o presidente.
Reportagem
publicada pelo portal UOL, de autoria da jornalista Juliana Dal Piva, mostra
fatos tirados da lata de lixo da história política de Bolsonaro. Coisas da
época em que ele era deputado, e que desmontam a tese do político honesto que
ele tenta construir. E que enganou muita gente.
Gravações
obtidas com exclusividade pela colunista mostram a fisiculturista Andrea Siqueira
Valle, ex-cunhada do presidente Jair Bolsonaro, participou do esquema das rachadinhas
quando ele era deputado federal. Ela diz nas gravações que Bolsonaro chegou a
demitir André Siqueira Valle, irmão dela, porque ele não queria devolver parte
do dinheiro conforme combinado com Bolsonaro. O mandato de Bolsonaro como
deputado federal ocorreu entre os anos de 1991 e 2018.
“O
André sempre deu problema porque o André nunca devolveu o dinheiro certo que
tinha que ser devolvido, entendeu? Tinha que devolver R$ 6 mil, o André
devolvia R$ 2 mil, R$ 3 mil. Foi um tempão assim, até que o Jair pegou e falou:
‘Chega, pode tirar ele porque ele nunca devolve o dinheiro certo’”, diz ela
na gravação obtida pelo UOL.
André
foi assessor de Bolsonaro entre 2006 e 2007.
“É
muita coisa que eu posso ferrar a vida do Flávio, posso ferrar a vida do Jair,
posso ferrar a vida da Cristina. Entendeu? É por isso que tem medo, aí manda eu
ficar quietinha, não sei o que tal. Entendeu? É esse negócio aí”, continua
ela.
O
esquema da rachadinha, que nada mais é que outra forma de desvio de dinheiro
público, funciona da seguinte forma. O parlamenta coloca o nome do funcionário
na folha de serviço como assessor, combina um bom salário em folha. O funcionário
recebe a quantia estipulada conforme a lei, mas depois, grande parte desse dinheiro
vai para o bolso do político que o contratou, ficando ele próprio o funcionário
com uma pequena quantia. Muitos desses funcionários são fantasmas. Ou seja, apenas
recebem o dinheiro. Muitos deles nunca aparecem nos locais e trabalho. Outros não.
Porém todos sujeitos as mesmas condições.
No
caso da Andrea e do André, irmão dela, eles ficavam com apenas 10% do salário. Os
outros 90% iam para o bolso de Bolsonaro, ou dos filhos. Diz a reportagem do
UOL que Andrea foi a primeira dos 18 parentes da segunda mulher de Bolsonaro
que foram nomeados para trabalhar nos gabinetes de Jair Bolsonaro, e dos filhos
Carlos e Flávio, entre os anos de 1998 a 2018.
Entre
2018 e 2019, Andrea falou do esquema com a fonte que entregou as gravações a
colunista do UOL algumas vezes. Uma dela foi durante o casamento de André, na véspera
do primeiro turno da eleição presidencial, em 06 de outubro de 2018.
Na
ocasião ela estava preocupada com a própria situação, pois fora exonerada do
gabinete de Flávio Bolsonaro, do qual era funcionária fantasma. Ela queixava de
que não sabia como iria ficar a situação dela depois da eleição.
Ainda
com essas preocupações ela procurou o gabinete de Flávio Bolsonaro, porém não
foi atendida. Então conversou com a irmã Ana Cristina, e procurou o tio Hudson.
O tio Hudson, é o coronel do Exército Guilherme dos Santos Hudson, um ex-colega
de Bolsonaro na Academia Militar das Agulhas Negras (Aman). “O tio Hudson
também já tirou o corpo fora, porque quem pegava a bolada era ele. Quem me
levava e buscava no banco era ele”. Hoje, o tio Hudson é coronel da reserva
do Exército. Assim ficamos sabendo que, além do Fabrício Queiroz, havia o tio
Hudson, responsável por receber o dinheiro para a quadrilha.
O
coronel Hudson é investigado pelo Ministério Público do Rio de Janeiro, no
esquema que apura o desvio de dinheiro público quando Flávio era deputado
estadual naquele estado. Pelas quebras de sigilo do militar foi possível ao MP comprovar
que ele fez 16 saques no valor de R$ 260 mil. Os saques foram feitos no período
entre 2009 e 2016, sendo que a maioria deles ocorreu de abril a outubro de
2016.
O
que chama a atenção é que esses saques eram feitos sempre em dinheiro vivo e
ultrapassavam a quantia de R$ 10 mil.
De
acordo com o MP-RJ, esses saques ocorreram, justamente, no período em que a
mulher de Hudson, um filho, e duas noras dele, eram assessores no gabinete de
Flávio e Carlos Bolsonaro.
Andrea
foi uma funcionária fantasma que rondou os gabinetes da família Bolsonaro por vinte
anos. Segundo a reportagem do UOL, primeiro ela trabalhou com o deputado Jair
Bolsonaro, na Câmara dos Deputados. Ali ela “trabalhou” de 30 de setembro de
1998 a 7 de novembro de 2006.
Saiu
dali e foi para o gabinete de Carlos Bolsonaro, na Câmara Municipal do Rio. E ali
ficou de 8 de novembro de 2006 até setembro de 2008. Do gabinete de Carlos
Bolsonaro, foi para o gabinete de Flávio, onde ficou até agosto de 2018. Quando
deixou o gabinete de Flávio Bolsonaro na Alerj, o salário dela era de 7.326,44.
Lembrando que o combinado era de o funcionário ficar com 10% do salário e devolver
para o político 90% do valor.
Quanto
a André, irmão de Andrea, ele foi assessor do vereador Carlos Bolsonaro, na
Câmara Municipal do Rio de Janeiro, em dois períodos, entre agosto de 2001 e
fevereiro de 2005. Depois novamente em fevereiro de 2006 até novembro daquele
mesmo ano. Logo após a saída do gabinete de Carlos Bolsonaro, ele foi trabalhar
no gabinete de Jair Bolsonaro, na Câmara dos Deputados. E ficou com o deputado
Jair Bolsonaro até outubro de 2007. Na Câmara dos Deputados o salário bruto
dele era de R$ 6.010.
Rachadinha
é um nome simpático para um crime grave chamado peculato, no qual está envolvida
a apropriação indébita de salários de funcionários, sejam eles fantasmas ou
não. Pense o caro leitor, leitora, em quanto dinheiro foi desviado pela família
Bolsonaro, incluindo o atual presidente, Jair Bolsonaro, que, com certeza, foi
o primeiro a praticar esse crime, e depois ensinou os filhos a fazer o mesmo. Se
considerarmos que foram vários os familiares, amigos, e amigos dos amigos, que
eles empregaram em seus gabinetes então veremos que a família Bolsonaro desviou
milhões dos cofres públicos.
“Sobre
essa questão de parecer que uma coisa é pequena, é uma percepção muito
equivocada. Quando você pega 30 anos, 10, 12 assessores fizessem isso em cada
um dos gabinetes, sendo que no geral eles têm de 15 a 20. Uma vez fizemos um
cálculo na revista Época, não vou dizer que todos eram funcionários fantasmas,
mas todos que tinha algum laço de parentesco, no período que eles estiveram
nomeados, dava R$ 65 milhões ao longo do tempo. É muito dinheiro”, disse a
jornalista Juliana Dal Piva, durante o UOL Debate.
Esse
fantasma do passado que voltou para assombrar Bolsonaro não pode trazer efeitos
em relação ao mandato de presidente, uma vez que foi cometido fora do mandato,
pode sim, se for aberta uma investigação em relação a esse assunto, ter consequências
para ele depois que terminar o mandato presidencial.
De
um lado Bolsonaro não pode ser responsabilizado por esse crime enquanto for
presidente, mas por outro fica com a imagem bastante arranhada. Primeiro vieram
as suspeitas de que ele sabia que havia algo de muito podre nos contratos para aquisição
de vacinas no ministério da Saúde e nada fez, cometendo dessa forma, o crime de
prevaricação, e agora o fato de que, também ele, foi protagonista no esquema
das rachadinhas em seu mandato como deputado federal. Assim cai por terra o
título de homem honesto que ele fazia questão de ostentar.
Na
CPI está cada vez mais claro que além de omissão do governo no combate à pandemia,
houve também intenção, escondida por trás de lucros e propinas nos contratos
com a vacina indiana Covaxin.
É
tudo muito estranho. Primeiro o governo ignora as ofertas de vacina da Pfizer. Farmacêutica
essa que, praticamente, implorou ao governo que comprasse as vacinas por ela
produzidas... Um governo que desdenhou da Coronavac, vacinas essas que já
haviam passado pelas fases 1, 2, e 3 de testes, que esse mesmo governo tenha
sido tão rápido em assinar um contrato fraudulento com uma vacina que nem ainda
nem havia começado a fase de testes.
Um
governo que ao invés de ir direto na fonte, ou seja, comprar direto das farmacêuticas,
preferiu comprar as vacinas através de atravessadores e empresas suspeitas, e
por um preço mais alto que o das vacinas mais seguras e disponíveis no mercado.
E os personagens?
Um
policial militar que, nas horas de folga, vendia vacinas. Um reverendo de uma
ONG que negociava vacinas superfaturadas. Uma empresa, a Davati Medical Supply,
que antes da Covid-19 nunca havia trabalhado com produtos farmacêuticos. A Davati,
atuou com a MV Trading, uma empresa de Santo André, que atua no ramo de
importações e importações no ramo do agronegócio. Entre os produtos comercializados
estão: carne bovina, suína, e frangos, além de milho, café, soja, fertilizantes,
ouro e pedras preciosas, dentre outros.
Eis
que, em março, por força das circunstâncias da Covid, o Congresso permite que
estados e prefeituras negociem vacinas sem passar pelo crivo do governo
federal, e eis que, de repente, a Davati se torna especialista em imunizantes,
e MV Trading resolver fazer contatos com prefeituras desesperadas por vacinas,
e intermediar reuniões desses órgãos com o representante comercial da Davati,
Luís Paulo Dominguetti, o tal policial que nas horas de folga trabalhava como
representante de uma empresa que, de repente, ficou especialista em
imunizantes.
E
o Pazuello, ministro da Saúde na ocasião, o que fazia ele? Papel de bobo da
corte? Se fazia, então continua fazendo, pois faz de tudo para livrar a cara das
pessoas que praticavam todas essas falcatruas.
É tudo muito nebuloso... E criminoso.
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