Sexta-feira,
27 de março
“No balanço de
perdas e danos
Já tivemos
muitos desenganos
Já tivemos muito
que chorar
Mas agora, acho
que chegou a hora
De fazer valer o
dito popular
Desesperar
jamais”
(Desesperar
Jamais - Autores: Ivan Lins / Vitor Martins)
Salve,
Raul Seixas, grande maluco. Maluco beleza. Grande louco, poeta, místico.
Grande
Raul.
Como
estão as coisas por aí, nesse imenso espaço sideral onde habitas? Sinto
saudades das tuas canções de letras tão profundas e místicas. Era bem legal
quando sentavas com outro místico, Paulo Coelho, para aquelas viagens bem
loucas e que nos trouxeram músicas maravilhosas do tipo “Ouro de Tolo”, “Metamorfose
Ambulante”, “Meu amigo Pedro” “Maluco Beleza” e “O Dia em que a Terra Parou”, e
tantos outros sucessos.
Paulo
hoje é um escritor famoso. Tú deves saber disso. Afinal, em tua condição atual
podes ir onde quiseres e desejares, uma vez que habitas um corpo etéreo, tão etéreo
quanto é a imensidão de mundos do qual fazes parte agora.
Cara,
por aqui tá a maior zona, a maior bagunça. Lembra do verso da canção, Alô, Alô,
Marciano, interpretada na adorável voz de Elis Regina, especialmente aquele
verso que diz:
“Alô,
alô, marciano
Aqui
quem fala é da Terra
Pra
variar estamos em guerra
Você
não imagina a loucura
O
ser humano tá na maior fissura porque
Tá
cada vez mais down the high society”
Maior
loucura. Estamos mesmo em guerra. Daí você poderia perguntar com curiosidade
natural: “Guerra contra quem? Qual o inimigo?”. Meu irmão, o terrível inimigo
não é nenhum exército de nenhuma nação. Ele é invisível. Aposto que você que
está pensando em seres espirituais, e essas coisas todas. Nada disso. O tal
adversário é um vírus. Isso mesmo. Um maldito de um vírus que se alastrou por
todo o planeta.
O
pior é que essa peste, essa ameaça não envolve apenas à saúde da população, mas
também envolve uma série de questões, inclusive a econômica. Muitas pessoas tem
tombado diante dessa ameaça. O grupo de risco são os mais idosos, mas eu é que
não confio. Uma vez que ele está por aí, bravo e feroz feito um monstro ele
pode pegar e matar qualquer um: jovens, velhos e crianças.
Quem
tem juízo, se previne. Acho que ainda lembras daquele ditado: seguro morreu de
velho. E não deve ter sido por causa do coronavírus. Esse é o nome da fera. O caso
é tão grave que, no dia 11 deste corrente mês, em um dia de quarta-feira, a
Organização Mundial da Saúde (OMS), declarou estado de pandemia no mundo por
causa do novo coronavírus (Sars-Cov-2), que foi batizado pelos cientistas de
Covid-19.
Pandemia
é aquele estado em quem uma doença domina o mundo todo com transmissão
sustentada entre as pessoas. Se as
pessoas tivessem se prevenido logo, com isolamento social, nada disso estava
acontecendo. E se tivesse acontecendo seria em menor escala. Acontece que o
problema estava justamente aí. Quem
poderia imaginar que a coisa fosse tomar proporções tão gigantescas?
Esses
dias, de quarentena, como todo mundo, no mundo todo, aliás, aproveitei para
ouvir a canção que interpretavas, chamada, O
Dia em quem Terra Parou. Fiquei prestando atenção na letra como nunca havia
feito antes.
Rapaz,
aquilo é uma profecia? Acho que os bons espíritos te revelaram esses
acontecimentos pelos quais estamos passando agora quando te inspiraram essa
canção lançada em 1977. Por falar nela, amo essa letra e melodia. Um
ritmo pop envolvente. Vamos relembra-la juntos? Melhor seria
se você estivesse aqui, perto, tocando seu violão e cantando, você mesmo, essa
obra de arte. Mas enfim, a distância que nos separa impede esse que seria um
prazeroso momento de lazer. Logo de início, tú já traças um panorama, um quadro
atual do que se passa hoje nesse mundo físico.
“Essa
noite eu tive um sonho
de
sonhador
Maluco
que sou, eu sonhei
Com
o dia em que a Terra parou
com
o dia em que a Terra parou”.
Assim
começa a letra da canção. Uma parte falada. Depois vem o restante da letra
acompanhada dos instrumentos. Vamos rever ela na integra. Assim mataremos a
saudade daqueles velhos e bons tempos.
O
empregado não saiu pro seu trabalho
Pois
sabia que o patrão também não tava lá
Dona
de casa não saiu pra comprar pão
Pois
sabia que o padeiro também não tava lá
E
o guarda não saiu para prender
Pois
sabia que o ladrão, também não tava lá
e
o ladrão não saiu para roubar
Pois
sabia que não ia ter onde gastar
No
dia em que a Terra parou (Êêê)
No
dia em que a Terra parou (Ôôô)
No
dia em que a Terra parou (Ôôô)
No
dia em que a Terra parou
E
nas Igrejas nem um sino a badalar
Pois
sabiam que os fiéis também não tavam lá
E
os fiéis não saíram pra rezar
Pois
sabiam que o padre também não tava lá
E
o aluno não saiu para estudar
Pois
sabia o professor também não tava lá
E
o professor não saiu pra lecionar
Pois
sabia que não tinha mais nada pra ensinar
No
dia em que a Terra parou (Ôôôô)
No
dia em que a Terra parou (Ôôô)
No
dia em que a Terra parou (Uuu)
No
dia em que a Terra parou
O
comandante não saiu para o quartel
Pois
sabia que o soldado também não tava lá
E
o soldado não saiu pra ir pra guerra
Pois
sabia que o inimigo também não tava lá
E
o paciente não saiu pra se tratar
Pois
sabia que o doutor também não tava lá
E
o doutor não saiu pra medicar
Pois
sabia que não tinha mais doença pra curar
No
dia em que a Terra parou (Oh Yeeeah)
No
dia em que a Terra parou (Foi tudo)
No
dia em que a Terra parou (Ôôôô)
No
dia em que a Terra parou
Essa
noite eu tive um sonho de sonhador
Maluco
que sou, acordei
No
dia em que a Terra parou (Oh Yeeeah)
No
dia em que a Terra parou (Ôôô)
No
dia em que a Terra parou (Eu acordei)
No
dia em que a Terra parou (Acordei)
No
dia em que a Terra parou (Justamente)
No
dia em que a Terra parou (Eu não sonhei acordado)
No
dia em que a Terra parou (Êêêêêêêêê…)
No
dia em que a Terra parou (No dia em que a terra parou)
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FLORIAN PLANCHEUR / AF - Foto do site do El País Brasil
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Meu
amigo, a situação por aqui tá desse mesmo jeito que a canção descreve: os
empregados estão em casa, os patrões também. Igrejas fechadas. Os fieis nem vão aos cultos porque sabem que o
padre ou pastor não estarão lá. Escolas e Universidades de
portas fechadas. Importantes campeonatos suspenso. Até os Jogos Olímpicos e Paraolímpicos,
edição de 2020, e cujo país anfitrião seria o Japão, foi cancelado, e jogado
para 2021. Pra você ver a gravidade da situação.
Dizem
que essa coisa toda começou na China, em uma cidade chamada Wuhan. Mais de
3.000 pessoas morreram naquele país por causa da doença. Na Itália, a doença já
vitimou mais de 8.000 pessoas. Na Espanha, 4.000 é o número de vítimas fatais.
Os
Estados Unidos da América, país onde foste exilado no início de 1974, por causa
da ditadura militar, já desponta como o novo epicentro mundial da crise. Em
número de infectados, o país já ultrapassou a China, Itália, e Espanha. Até a
data de ontem, 26, eram 82.404 casos de covid-19, com 1.128 mortos.
Também até a data de ontem, segundo a OMS, no
mundo inteiro, já são quase meio milhão de pessoas infectadas pelo vírus, e
19.000 mil mortes.E esses números só crescem. O pior
é que ainda não há uma vacina, para essa epidemia, nem qualquer outro tipo de
remédio. Foi uma praga que pegou a todos de surpresa. A comunidade médica
internacional foi pega, como diz o ditado popular, “de calças curtas”, ou seja, sem nenhuma condição efetiva de reação além de recomendar cuidados com a saúde,
higienização, e também com a recomendação de isolamento social.
Em
nosso país, já são 2.915 casos confirmados da doença, e 77 mortes. Isso também
até a data de ontem, 26, pois a experiência em outros países nos mostram que os
números de infectados e mortos aumenta em escala geométrica e em velocidade
vertiginosa. É bem provável que esses números sejam bem maiores que os dados
divulgados oficialmente.
O
engraçado, ou melhor, o trágico, é que temos um presidente que, em meio a todo
esse drama, ao invés de olhar para a situação atual, parece estar mirando
apenas a sua reeleição. Ele tem sido muito irresponsável, indo na contramão de
tudo o que recomenda a ciência — aliás, não é a primeira, nem será a última vez
que ele desconsidera a ciência e os dados por ela divulgados.
Já
no começo da chegada dessa doença ao Brasil, o presidente estava em isolamento
por causa de uma viagem que havia feito aos Estados Unidos e voltou de lá com
membros de sua comitiva infectados pelo vírus. Os médicos recomendaram para ele
o isolamento.
Por
essas dias em que aconteceram esses fatos, houve, precisamente em um domingo,
15 de março, houve uma manifestação pró-Bolsonaro — esse é nome dele, Jair
Messias Bolsonaro — e contra o Congresso e o Supremo.
Você
acredita que ele desrespeitou todas as recomendações médicas, da OMS, e do
próprio ministério da Saúde, e foi aos protestos? Achei inacreditável e surreal
tudo aquilo. Na
minha humilde opinião só uma pessoa sem juízo faz uma coisa dessas.
E
o pior é que mesmo com o avanço do coronavírus ele ainda insiste em dizer que o
vírus não passa de uma “gripezinha”, um “resfriadinho”, e que as escolas devem
ser liberadas para os alunos, as igrejas para os fiéis, e que os trabalhadores
voltem imediatamente aos seus trabalhos como se nada estivesse acontecendo.
Ainda
bem que a população não está seguindo as orientações dele. Os brasileiros, ao
que parece, até agora, estão se colocando ao lado da ciência.Claro,
há alguns poucos simpatizantes que ainda defendem estes posicionamentos errôneos
do presidente. Mas temos que compreender que algumas pessoas são mais lentas
para compreender as coisas do que as outras, não é verdade?
É verdade que há, por parte de todos nós, uma
preocupação com a economia. Quanto
ao nosso Produto Interno Bruto (PIB) — cujo crescimento foi pífio — os
economistas estão dizendo que esse ano vai a zero. O Banco Central divulgou um
relatório nesta quinta-feira, 26, que projeta esse cenário sombrio para nossa
economia. Ou seja, nenhuma perspectiva de crescimento.
E,
realmente, com as empresas fechadas, é provável que muitas não aguentem o
tranco e quebrem. Isso significa mais gente desempregada, mais sofrimento. Mas o
que é melhor? Contar os mortos ou contar os desempregados? Considerar que se
deve privilegiar a contagem dos desempregados, é, no meu entender, uma atitude
desumana, pois, a economia se recupera, com força de vontade um pequeno
empresário pode reerguer sua empresa. Mais os mortos? Ah, os mortos, só o Deus
Altíssimo para ressuscitá-los, e quando ele faz isso, quando o espírito sai da
carne, ele não o traz de volta a este planeta de expiação e de provas, mas
leva-os para as moradas eternas.
Porém,
esse quadro econômico que se prevê sombrio não é privilégio do nosso país. Todas as nações estão enfrentando o mesmo
problema. É hora de os líderes mundiais pensarem primeiro na vida de seus
concidadãos, e depois entrar na economia, apoiando as empresas para que não
quebrem, e aos trabalhadores para que tenham ao menos o necessário para
sobreviver, uma vez que as pessoas precisam estar saudáveis, mas elas também
precisam se alimentar. Sem a alimentação básica elas estarão sujeitas não
apenas ao coronavírus, mas também a qualquer vírus inoportuno.
Mas
a palavra de ordem, segundo as autoridades da área médica é: FIQUEM EM CASA.
RESPEITEM O ISOLAMENTO SOCIAL. Em primeiro lugar, a vida, depois a gente corre atrás
do prejuízo.
Bom
acho que falei demais. Espero que estejas bem aí onde estás. Com certeza os
vírus e todas essas doenças que atingem a humanidade já não atingem a ti, pois tens
agora um novo corpo. Vives uma nova vida: a vida eterna. Se te conheço bem, deves
continuar por aí fazendo o que gostas, cantar, e espalhar alegria por onde
passas, assim como fazias quando estavas aqui entre nós.
Quem
dera que essa coisa toda, como na letra da canção, fosse apenas um sonho. Que de
repente, a gente acordasse e descobrisse que tudo não passou apenas de um
pesadelo. Entretanto, o que estamos vivendo hoje não é um sonho, é uma dura
realidade. Claro, tudo isso vai passar. Mas até lá, e também depois, vai ser
preciso muita força, fé, e paciência.
Eu
só te faço um pedido antes de terminar — dois, na verdade: Reza por nós! Pois
como te falei meu amigo, as coisas por aqui estão bem complicadas. Também te
peço que o teu canto e tua alegria aí nas moradas celestes chegue até nós em
forma de oração, e nos traga a calma e a serenidade que precisamos.
É
desnecessário dizer que a saudade que sinto de ti é imensa. Um dia nos
reencontraremos... Porém, tudo no tempo dele, do chefe, do Pai eterno.
Grande
abraço Raul Seixas, meu amigo maluco beleza.