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Fogo amigo no PSL

Posted by Cottidianos on 00:58
Sábado, 19 de outubro
Deputado delegado Waldir, líder do PSL na Câmara

Eu vou implodir o presidente. Aí eu mostro a gravação dele, eu tenho a gravação. Não tem conversa, não tem conversa. Eu implodo o presidente. [trecho inaudível] Acabou, acabou. Acabou, cara. Eu sou o cara mais fiel a esse vagabundo. Eu votei nessa porra, eu andei no sol 246 cidades, no sol, gritando o nome desse vagabundo”.
A fala acima é do deputado delegado Waldir, e foi extraída de um áudio que circulou nesta quinta-feira (17), e foi gravado em uma reunião do PSL. O deputado é líder do governo na Câmara dos Deputados. O vagabundo a quem o deputado se refere é o presidente da República, Jair Bolsonaro.
O nível das expressões usadas pelo deputado é bem rasteiro, assim como é rasteira essa briga que, há mais de uma semana, tem dominado o cenário político nacional, expondo uma enorme divergência entre o presidente e o partido ao qual ele pertence, o PSL. Mais tarde, de cabeça mais fria, o deputado mudou de ideia. Não implodiu o presidente, talvez tenha guardado a carta na manga para usar no momento… ou não a usar em momento nenhum. Tudo depende de como as peças se movem pelo tabuleiro.
À revista Crusoé, fontes ligadas ao PSL, revelaram que as informações que o deputado delegado Waldir dispõe referem-se ao senador Flavio Bolsonaro e os esquemas que envolvem a prática de rachadinha na Assembleia Legislativa no Rio de Janeiro.
Na noite de quarta-feira (16), o clima em uma reunião entre deputados do PSL, já anunciava o clímax que se desenrolaria na quinta-feira. Na referida reunião, o presidente da Comissão de Constituição e Justiça da Câmara (CCJ), Felipe Francischini, também reclamava do presidente Jair Bolsonaro: “Ele que começou a fazer a putaria toda, falando que todo mundo é corrupto… Ele quer tomar a liderança do partido… A gente foi tratado que nem cachorro desde que ele ganhou a eleição. Nunca atendeu a gente em porra nenhuma. (…) Só liga na hora que precisa para foder com alguém”.

A ira do deputado delegado Waldir, expressada no diálogo que abre esse texto, foi motivada por um áudio no qual o presidente Jair Bolsonaro, articula para tirar Waldir da liderança do PSL na Câmara para colocar no lugar dele, o filho, Eduardo Bolsonaro. Em conversa com deputados do partido, ele pede que assinem uma lista para destituir o deputado e apoiem Eduardo Bolsonaro para conduzir o partido na Câmara.
Estamos com 26, falta uma assinatura para a gente tirar o líder, e colocar o outro. A gente acerta. Entrando o outro agora, dezembro tem eleições para o futuro líder. A maneira como tá, que poder tem na mão atualmente o presidente, o líder aí? O poder de indicar pessoas, de arranjar cargos no partido, promessa para fundo eleitoral por ocasião das eleições, é isso que os caras têm. Mas você sabe que o humor desses caras de uma hora para a outra muda”. Numa boa, porque é uma medida legal... Eu nunca fui favorável à lista não, sou favorável a eleição direta, mas no momento você não tem outra alternativa, só tem a lista. Aqui tem 25 (assinaturas), já falei com o (deputado General) Peternelli, vou ligar para outras pessoas. Até quem sabe que passe aí de uns números... Se fechar agora, já tem o suficiente”, diz o presidente na conversa divulgada pela revista Época, na noite de quarta-feira (16).
O áudio foi editado propositadamente por quem passou as informações à revista para que fosse impossível saber quem era o interlocutor com quem Bolsonaro falava. Eduardo Bolsonaro chegou a divulgar, ainda na noite de quarta-feira, um vídeo no qual se anunciava como novo líder do PSL na Câmara.
Ao final do embate, saiu vencedor o delegado Waldir. No início da tarde da quinta-feira, a Secretaria-Geral da Mesa da Câmara dos Deputados confirmou o nome do deputado na liderança do PSL.
Nessa queda de braço entre governo e PSL, ainda na quinta-feira, Jair Bolsonaro destitui a deputada federal Joice Hasselmann (PSL-SP) da liderança do governo na Câmara, e a substituiu pelo senador Eduardo Gomes (MDB-TO). Bolsonaro ficou irritado com Joyce depois que ela assinou a lista em apoio a permanência do delegado Waldir na liderança do PSL na Câmara. Ela estava na liderança do governo na Câmara desde fevereiro.
Joyce nem foi comunicada do ato pelo presidente ou por seu gabinete. Ela diz que esperava um pouco mais de respeito e gratidão por parte do chefe do Executivo. “Claro que não falou comigo, é o estilo Bolsonaro de ser, fiquei sabendo pela imprensa. Todos os líderes de partidos da Câmara e Senado estão me ligando, prestando solidariedade, mas meu couro é duro, nada me magoa ou me chateia. Eu já esperava isso porque não concordei com o modus operandi que aquela lista para colocar o Eduardo como líder estava sendo construída”, disse ela em entrevista à Veja. “Eu esperava um pouco mais de respeito e gratidão. Não é uma questão de lado do presidente. As pessoas que fizeram esse motim [contra Waldir] romperam a palavra empenhada para colocar o Eduardo. Eu não sou criança, tenho palavra e mantenho minha palavra. Quem não tem palavra não é digno das calças que veste. Quem não tem realmente palavra firme não se cria muito na política”, continua ela.
À Folha de São Paulo, a deputada diz, em relação a saída da liderança do governo no Congresso que ganhou uma carta de alforria e que está feliz da vida. “Passei esse tempo todo servindo ao governo de forma leal. Inclusive deixando de cuidar do meu mandato para gerir crises e apagar incêndios. Abri mão da minha família”, diz. “Em alguns momentos, tive que engolir sapo para defender coisas com que eu não concordo”, diz ela na mesma matéria da Folha.
Toda essa crise inédita na política brasileira, em que um presidente entra em rota de coalizão com o próprio partido teve início na terça-feira (8). Bolsonaro saia do Palácio da Alvorada e parou para dar atenção a alguns eleitores que o aguardavam. Um dos apoiadores do presidente gravou um vídeo junto com o presidente no qual dizia: “Eu, Bolsonaro e Bivar, juntos por um novo Recife”.
Para surpresa do fã, o presidente respondeu: “Oh, cara, não divulga isso não. O cara (Bivar) está queimado pra caramba lá. Vai queimar o meu filme também. Esquece esse cara, esquece o partido”. A declaração do presidente só veio a público porque foi gravada por outro dos apoiadores que por lá estavam de plantão e divulgada no canal do Youtube, Cafezinho com Pimenta. A fala do presidente foi como um fosforo que acende e se coloca em palha seca. Se já havia algumas rusgas acontecendo nos bastidores, elas foram potencializadas.
Essa é uma crise inédita na política brasileira. Essa de um presidente entrar em rota de coalizão com o próprio partido é coisa que só existe na corte dos Bolsonaro. Antes havia divergências entre líderes, partidos, e seus integrantes, mas elas ficavam nos bastidores, aqui e acolá, se viam alguns vestígios do fogo, mas nada muito explicito como agora.
Na verdade, o que está em jogo é uma disputa pelo dinheiro do fundo eleitoral. R$ 737 milhões. É o valor que sigla deverá receber dos cofres púbicos até 2022. E esse montante pode crescer ainda mais caso o congresso aprove aumento no fundo eleitoral.
É muito dinheiro para um partido que até o ano passado era uma gotinha d’água em meio ao oceano das grandes siglas partidárias que sempre dominaram a política brasileira.
Para o PSL sobravam apenas algumas sobras do fundo eleitoral e de alguns míseros segundos na propaganda eleitoral gratuita. Aí veio o furacão Bolsonaro e o partido que era uma formiga virou um elefante. Bolsonaro precisa de um partido para disputar a eleição e foi acolhido pelo PSL.
O partido nadou de braçada na onda Bolsonaro e elegeu 52 deputados e 4 senadores. Isso o tirou da condição de nanico e o transformou num grande partido capaz de dar as cartas no Congresso… e arrecadar quantias milionárias dos cofres públicos.
Para um partido que na eleição anterior só havia conquistado uma cadeira na Câmara, foi um salto gigantesco. Com a proximidade das eleições municipais, e com o presidente Jair Bolsonaro que não perde uma oportunidade anunciar que será candidato a reeleição, o dinheiro do fundo partidário é uma mina de ouro.
Vale destacar que, por debaixo dessa lama que temos visto escorrer no PSL há ainda um esgoto passando por baixo da rua que é o escândalo das candidaturas laranjas do PSL no qual estão envolvidos alguns membros do partido. Luciano Bivar, e o ministro do Turismo do governo de Bolsonaro, Marcelo Álvaro Antônio (MG) estão entre eles. O ministro foi indiciado no início deste mês pela Polícia Federal pelos crimes de falsidade ideológica, apropriação indébita eleitoral, que é quando o candidato se apropria dos recursos destinados ao financiamento eleitoral para proveito próprio, e associação criminosa.
O problema, ou melhor, a pulga atrás da orelha, no comportamento do presidente Jair Bolsonaro e que, em relação, as questões e as pessoas, há, para ele, dois pesos e duas medidas.
Por exemplo, no caso em questão, ele não quis que o apoiador divulgasse o vídeo por que o Bivar estava “queimada pra caramba”. E o ministro do Turismo, que até indiciado foi, e ele insiste em mantê-lo no governo? E o filho do presidente que é investigado pelo esquema na Alerj, e ele fez de tudo para abafar as investigações que a PF faz sobre o caso?
Ainda com relação ao ministro do Turismo, Marcelo Álvaro Antônio, lembremos que, por muito menos, o ministro da Secretaria-Geral da presidência, foi exonerado em fevereiro deste ano, logo que surgiu a denúncia das candidaturas laranjas no PSL, através de reportagem publicada pela Folha de São Paulo.
Pelo modus operandi, já vimos, por diversas vezes, que o presidente é cruel e sádico. Para ele, não existem amigos nem aliados, existem conveniências. Se interessa proximidade com este ou aquele o presidente beija e abraça, quando não convém, ele empurra o sujeito ladeira abaixo, à exceção dos próprios filhos: a estes a honra, a glória, os afagos, e as proteções.
E aí entramos noutra questão pitoresca: pode um presidente governar em família? Funciona esta nova forma de governo instaurada pela família Bolsonaro? Como pode ser eficaz um filho que usa as redes sociais do pai para fazer posts provocativos e causadores de confusão e intriga?
Essa proteção dos pais políticos aos filhos não é novidade na política brasileira. Privilégios sempre houve. Mas Bolsonaro conseguiu inovar. Ele levou os filhos para dentro do governo… E de coisas como essa não tem notícia desde que o Brasil é Brasil República. Desse modo de agir de Bolsonaro a vida política pode cobrar um preço e ele pode ser caro.
Pelo visto, o descaso do presidente não é com seus aliados mais próximos, mas também com os apoiadores. Em 27 de setembro, em mais uma dessas saídas do presidente do Palácio da Alvorada, mais um vídeo foi divulgado, dessa vez pela própria equipe do presidente. Nele, um grupo de apoiadores estava lá, como sempre, a gritar ‘mito’ ‘mito’. Um desses apoiadores se aproximou do presidente e disse que amava o presidente, que o turismo é o futuro do brasil, e pediu ajuda para colocar o turismo no topo.
Em determinado momento pediu para tirar uma foto ao lado do presidente. O homem aproveitou o momento para fazer o pedido de ajuda mais de perto: “Turismo, Bolsonaro, me ajuda, por favor”. Logo depois, ouve-se o presidente sussurrar no ouvido do segurança: “Só pelo bafo, não vai ter emprego”.
Diante dessa confusão, e desse vai e vem de divulgação de áudios que envolveu o presidente e o seu partido, o julgamento que trata da questão da prisão em segunda instância ficou quase em segundo plano.
O julgamento foi iniciado nesta quinta-feira (17), e será retomado na quarta-feira (23) e é de suma importância para o avanço no combate a corrupção caso a maioria dos ministros seja favorável à sua concretização. Caso decidam em contrário, será um grande retrocesso nesta luta.
Porém, com alguns ministros que por lá estão e que não estão nem aí para a luta contra a corrupção, é temeroso o resultado desse julgamento. Pois ser contra a prisão em segunda instância significa ser a favor dos intermináveis recursos, pois o réu só pode ir para a cadeia depois de esgotados todos os recursos. E isso será excelente para os corruptos e poderosos, pois a prisão para eles passa a ser uma possibilidade bem remota, por mais milhões que tenham roubado da nação.
Quanto a queda de braço entre o presidente e o seu partido, esta ninguém sabe ainda como isso vai terminar, uma vez que os ânimos ainda não serenaram.




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