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Onde há fumaça, há fogo
Posted by Cottidianos
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23:51
Sábado,
20 de abril
Alexandre de Moraes e Dias Toffoli |
Há
um velho ditado popular que diz: “Onde há fumaça há fogo” ... E, ao que parece,
e a julgar pela tentativa desesperada de membros do STF, em calar qualquer voz
que levante críticas aos ministros daquela instância superior de justiça, há
fumaça por lá, e, pelo visto não é pouca não.
Os
ministros do STF vêm tomando decisões que tem desagradado a juristas,
legisladores e a maioria da população em geral. É natural que recebam críticas
por parte de tais setores. Afinal, vivemos em uma democracia e o combustível da
democracia é o direito de manifestação aos contraditórios.
Quando
se impõem a mordaça do silêncio, e se proíbe que cessem as críticas a decisões
de qualquer instância do Poder Judiciário, ou a qualquer outro ramo da
sociedade, então é sinal de que a liberdade de expressão foi sequestrada para
algum porão, e, talvez, por lá esteja sofrendo tortura.
Nos
últimos meses tem havido muitas postagens ofensivas a membros do Supremo
acusando-os de serem coniventes com a impunidade, quando não, de estarem envolvidos,
de alguma forma, nessa rede de corrupção que assolou o país.
Diante
da chuvarada de críticas aos membros do máximo órgão julgador do país, o STF, o
presidente daquele colegiado, Dias Toffoli tomou uma decisão que ao mesmo tempo
em que surpreendeu a todos, também provocou reações negativas entre aqueles que
militam na área do direito e da justiça, bem como à sociedade de modo geral.
Isso foi no dia 14 março do mês passado.
O
presidente do Supremo Tribunal Federal abriu um inquérito para investigar
notícias fraudulentas, — as tais fake News — e ofensas e ameaças, que
atingissem a honra e a segurança dos próprios ministros, e também de seus
familiares. Imediatamente, Toffoli, nomeou o ministro Alexandre de Moraes, como
relator do processo. E não deu maiores detalhes da abertura do processo pois
também o havia colocado na condição de “segredo de justiça”, condição pela qual
mantém as informações relativas ao mesmo em total sigilo. O Ministério Público
e outros setores do meio jurídico, ficaram de cabelos em pé com ambas as
decisões.
No
dia seguinte, surge em cena, a procuradora-geral da República, Raquel Dodge.
Ela queria saber, exatamente, o que que Toffoli e Moraes tentaram colocar sob
sigilo: maiores informações sobre o caso. Ela indagou à Corte, dentre outras
coisas, quais seriam os objetos da investigação e quais argumentos jurídicos a
fundamentavam. Pontos estes que estavam obscuros na abertura da investigação
determinada por Toffoli. Dodge defendeu ainda que o ato de investigar caberia
ao Ministério Público e à Polícia Federal.
“Os
fatos ilícitos, por mais graves que sejam, devem ser processados segundo a
Constituição. Os delitos que atingem vítimas importantes também devem ser
investigados segundo as regras constitucionais para a validade das provas e
para isenção do julgamento”, disse Dodge.
Outros
ministros do STF também se posicionaram contra a abertura da investigação.
Marco Aurélio do Melo foi um deles. O ministro disse que o Supremo deveria
manter distância das investigações que envolvessem apuração de crimes praticados
contra os membros da Corte.
Enquanto
isso, Alexandre de Moraes, como fiel guardião, defendia a investigação, dizendo
que o presidente do STF, abriu a investigação com base no artigo 43 do
regimento interno do STF, que diz: “Ocorrendo infração à lei penal na sede ou
dependência do tribunal, o presidente instaurará inquérito, se envolver
autoridade ou pessoa sujeita à sua jurisdição, ou delegará esta atribuição a
outro ministro”. O problema, e que foi ignorado por Toffoli, é que os fatos não
ocorreram nas dependências do STF.
Outro
fato que torna a decisão de Toffoli ainda mais autoritária é que o relator do
caso foi “escolhido” por ele, e não por sorteio, como é de praxe nos trabalhos
do STF.
No
dia 21 de março, o ministro Alexandre de Moraes expediu mandato de busca e
apreensão em São Paulo e em Alagoas, na investigação aberta na semana anterior
por Dias Toffoli. A operação destinava a recolher celulares, tablets, e quaisquer
outros dispositivos eletrônicos e materiais relacionados a disseminação de
notícias falsas contra membros do Supremo.
Era
também objetivo dos investigadores tirar do ar contas nas redes sociais de dois
autores identificados como suspeitos. Os policiais rastrearam endereço de
pessoas que fizeram postagens ameaçadoras a membros do STF, através do IP
(Internet Protocol) dos aparelhos usados para estas postagens.
Os
suspeitos identificados na ocasião foram o advogado alagoano, Adriano Argolo, e
um guarda civil metropolitano da cidade de Indaiatuba, SP. Segundo a PF, o
guarda utilizava uma conta com nome falso e localização indicada no Piauí.
Os
dias foram correndo, a investigação, apesar de irregular e fora dos parâmetros
constitucionais também não parou, apesar de protestos do MP e de outros setores
do judiciário. Uma investigação, diga-se de passagem, sem um foco direcionado e
baseado em generalidades. Nela, todos podiam estar na condição de investigados,
inclusive, membros do próprio Ministério Público. E eis que surge mais uma
trapalhada da dupla Toffoli e Moraes.
Na
quinta-feira, 11 deste mês, a revista, Crusoé, publicou uma reportagem que
resgatava um e-mail enviado a força tarefa da Lava Jato em Curitiba, em 13
julho de 2007, pelo empresário Marcelo Odebrecht — Marcelo, atualmente, cumpre
prisão domiciliar, mas pelo acordo de delação premiada se compromete com a
força tarefa a revelar fatos ligados a Lava Jato, e que forem sendo encontrados
em seus e-mails pessoais. Em 2007, o hoje ministro do STF, Dias Toffoli,
ocupava o cargo de Advogado Geral da União (AGU).
O
e-mail em questão tratava de negociações ilícitas, e foi enviado pelo
empresário a dois executivos da empreiteira, Adriano Maia e Irineu Meireles. No
e-mail, Marcelo, pergunta: “Afinal, vocês fecharam com o amigo do amigo de meu
pai?”
Segundo
explicou Marcelo à PF, a mensagem se referia a negócios envolvendo tratativas
entre Adriano Maia, então diretor jurídico da Odebrecht, e a Advocacia Geral da
União. As tratativas de negócios se referiam a assuntos referentes as
hidrelétricas do rio Madeira, em Rondônia. Ainda segundo o empresário, o “amigo
do amigo do amigo de meu pai”, era Dias Toffoli. Sendo que o amigo de Emílio
Odebrecht, pai de Marcelo, era o ex-presidente Lula, hoje preso em Curitiba.
Marcelo,
Odebrecht, que cumpre acordo de delação premiada, e não seria louco de fazer
graça com um assunto tão sério, botou a lenha na fogueira e a Crusoé fez fumaça
com a publicação da reportagem. Posteriormente, o site, O Antagonista
reproduziu a matéria.
O
fiel guardião, o relator do caso, Alexandre Moraes, então virou uma arara, a
fumaça estava subindo demais. Era preciso abafá-la antes que alguém ligasse a
fumaça ao fogo.
Ele
então determinou que a revista Crusoé e o site O antagonista, retirassem do ar,
a publicação que tratava do amigo do amigo de meu pai, e que, segundo Marcelo
Odebrecht, referia-se ao ministro do Supremo, Dias Toffoli. Moraes determinava
ainda que ambos, revista e site, pagassem multa de R$ 100 mil diários caso
descumprissem a ordem judicial.
“Determino que o site O Antagonista e a
revista Crusoé retirem, imediatamente, dos respectivos ambientes virtuais a
matéria intitulada ‘O amigo do amigo de meu pai’ e todas as postagens
subsequentes que tratem sobre o assunto, sob pena de multa diária de R$ 100
mil, cujo prazo será contado a partir da intimação dos responsáveis. A Polícia
Federal deverá intimar os responsáveis pelo site O Antagonista e pela Revista
Crusoé para que prestem depoimentos no prazo de 72 horas”, ordenava
Alexandre de Moraes em sua decisão.
Mais
uma vez a decisão foi amplamente criticada pelo Ministério Público, pela
imprensa e por diversos setores da esfera judicial. Alexandre de Moraes e Dias
Toffoli foram acusados de censura aos dois veículos de comunicação.
Na
quinta-feira, 18, o ministro Alexandre de Moraes, diante da repercussão do
caso, resolveu revogar a própria decisão que obrigava os sites a retirar do ar
a reportagem. Em nome da liberdade de expressão era necessário que Dias Toffoli
sofresse essa derrota.
O
juiz federal Luiz Antonio Bonat, que é responsável pelos processos da Lava
Jato, na 13a Vara Federal, em Curitiba, retirou do inquérito
que envolve o empresário Marcelo Odebrecht, o tal e-mail que causou tanta
repercussão, e que cita Dias Toffoli. O juiz atendeu a um pedido do Ministério
Público Federal, que informa que o documento não tem relação com a apuração das
irregularidades na Usina de Belo Monte, no Pará.
Ainda
nesta semana movimentada no meio judiciário, mais precisamente, na terça-feira,
16, a procuradora da República, Raquel Dodge, enviou ao Supremo um ofício no
qual mandava arquivar o inquérito aberto para apurar ofensas contra a Corte e
os seus ministros. Dodge alegou que não havia no inquérito a delimitação do
alvo da investigação, nem muito menos os alvos da operação. Cabia ao ministro
relator do caso, Alexandre de Moraes, determinar o arquivamento, mas ele não
fez isso.
Ao
contrário, o ministro ignorou a determinação da procuradora sobre o
arquivamento do inquérito. Com isso, as investigações continuam abertas. O
presidente, Dias Toffoli, concedeu mais 90 dias para que as investigações sejam
concluídas. Pelo visto essa queda de braço vai longe. Quem abrirá os olhos dos
ministros Dias Toffoli e Alexandre de Moraes pelo ridículo da situação pela
qual estão passando e fazendo o STF passar?
Ainda
no dia 16, o STF entrou em ação novamente. Ainda no inquérito que apura as
ofensas contra integrantes do Supremo, a PF, cumpriu oito mandatos de busca e
apreensão em São Paulo, Goiás, e Distrito Federal, com o intuito de aprofundar
a suspeitas de injurias e difamação contra membros da Corte.
Alexandre
de Moraes autorizou a operação. Ele é relator no inquérito que apura o caso. Os
mandatos se basearam em opiniões negativas de pessoas sobre o STF e a Corte que
o Supremo entende, como ameaça. Mais uma vez foram apreendidos celulares,
tablets, computadores. Mais uma vez foram bloqueadas contas dos suspeitos nas
redes sociais.
No despacho. Alexandre de Moraes diz: “"foi
verificada a postagem reiterada em redes sociais de mensagens contendo graves
ofensas a esta Corte e seus integrantes, com conteúdos de ódio e de subversão
da ordem”.
Quem
também entrou com dois pedidos de suspensão desse inquérito que extrapola os
limites constitucionais foi a Associação Nacional dos Procuradores da República.
A instituição entrou com duas ações no Supremo: um mandado de segurança e um
habeas corpus.
Em
entrevista à rádio CBN, em conversa com os jornalistas da emissora, Milton
Jung, Gerson Camarotti, e Cássia Godoi, o diretor jurídico da Associação Nacional
dos Procuradores da República, Rodrigo Tenório, disse que a primeira delas
nasceu do equivoco da abertura da investigação pelo Judiciário. No modelo
brasileiro, não cabe ao Poder Judiciário a função e investigar, nem de produzir
provas. Um é o papel do juiz e outro o papel do acusador. Há uma separação
entre os dois.
Referindo-se
às decisões tomadas recentemente por Toffoli e Moraes, Rodrigo Tenório diz: “A
gente retorna a época da inquisição, de Torquemada (Tomás de Torquemada), de
1435, que permite que o juiz prenda, que o juiz acuse, e o juiz julgue
simultaneamente”. Disse Tenório à CBN.
Outro
grande erro, foi, o de depois de instaurar o inquérito, o ministro Dias Toffoli
escolher quem iria conduzi-lo, escolhendo para relator o ministro Alexandre de
Moraes. E aí foi ofendido o princípio do juiz natural. O juiz não pode ser
escolhido, a distribuição deve ser aleatória, no caso, sorteado.
A
Associação Nacional dos Procuradores da República também concorda com a
Procuradoria Geral da República, no sentido de que não há um objeto especifico
na investigação. É como se fosse uma novela passada nos tempos da inquisição,
na qual, a cada semana, são inseridos novos capítulos de acordo com a vontade
dos inquisidores.
Outro
fato ilegal nesse inquérito é que há membros do MP investigados. O fato é que,
segundo diz Tenório ainda durante a entrevista à CBN “Membro do Ministério
Público, por disposição expressa da Lei Complementar 75, artigo 18, só podem
ser investigados pela procuradora geral da República. então teria que ser
enviado, seja lá o que houvesse nesse inquérito, para a Procuradoria Geral da
República, e o Supremo não poderia por vontade própria, com a exclusividade,
investigar esses membros”.
Quando
perguntado pelo jornalista Gerson Camarotti, sobre qual a solução possível para
esse episódio, Tenório respondeu que “solução possível é o Supremo proteger-se
do Supremo. “O habeas corpus e os mandados de segurança que nós manejamos,
tiram a decisão da mão do ministro Alexandre de Moraes, tiram a decisão da mão
do dois que instauraram essa investigação. Então o pleno pode ser chamado a se
manifestar e acabar com essa investigação, e aí sim, que é o único destino que
ela merece”, disse ele.
Engraçado
é que, quando Jair Bolsonaro foi eleito o temor era de que ele desse às costas
para a democracia, e, já que elogia tanto o período ditatorial, fizesse ele
andar de braço dado com o país.
Mas,
eis que para nossa surpresa, quem vestiu a camisa da ditadura foi aquele que
deveria ser o guardião da liberdade de expressão e dos princípios constitucionais,
ou seja, o presidente do Supremo Tribunal Federal, Dias Toffoli, e seu fiel
escudeiro, Alexandre de Moraes. Criticar é proibido. Não se pode falar das
decisões esdruxulas que o STF toma. Trazer à tona fatos com seu fundo de
verdade, e que venham a atingir algum dos eminentes ministros deve ser imediatamente
coagido.
O
bom é que, apesar disso, as intuições no Brasil, quando querem, funcionam e
muito bem. Há o olho da imprensa. Há o olho da justiça. E há a voz da opinião
pública. E, se o olho da imprensa e da justiça são poderosos, a voz da opinião pública
também o é.
É
por isso que o ministro Alexandre de Moraes voltou atrás na própria decisão de
censurar a revista Crusoé, e o site, o Antagonista. E, se o bom senso
prevalecer, ainda será arquivado esse processo ilegal, esquisito, e sem sentido
aberto por Dias Toffoli para investigar ofensas contra membros do Supremo.
Ninguém,
em sã consciência, quer que terceiros andem por aí, mentindo e difamando quem
quer que seja, principalmente, os magistrados da mais alta Corte judicial do
país. Mas, que haja fundamentos plausíveis nas denúncias, que haja denunciados
a quem se possa nomear, e que em tudo isso seja obedecido para as
investigações, inquéritos e processos instaurados, que
tudo esteja sob as bênçãos, ritos e proteções da Carta Magna da nação, a
Constituição Federal.
Mas
parece que, no Brasil, há a clara intenção de desviar o foco quando se trata de
desvios praticados por autoridades federais. Os acusados, em vez de provarem
sua inocência, parecem jogar gasolina na fogueira, para que, todos, preocupados
em apagar o fogo, esqueçam-se de quem o provocou.