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O preço da impunidade

Posted by Cottidianos on 01:10
Sábado, 02 de fevereiro


E assim vamos vivendo nós neste plano de expiação...
Expiação essa palavra muito usada, principalmente, pela doutrina espírita para significar a Terra como um lugar aonde os seres vem para remir, reparar suas faltas ou crimes, por meio de penitência, e dessa forma, obterem das forças superiores que regem o universo o perdão para tais atos e, assim, subirem mais um degrau na escada da evolução espiritual.
Os seres evoluídos do mundo espiritual devem se alegrar muito com o nosso progresso, mas também devem se rir muito de nossas trapalhadas. Devem se inquietar com nossas tentativas de erro e acerto, e, por certo, também se irritam com nossas mesquinharias e egoísmos.
É bem verdade que nem todos os habitantes dos planos espirituais são seres evoluídos. Há seres trevosos também. Da mesma forma que os seres de luz irradiam positividade em direção a Terra, os seres trevosos também conseguem irradiar negatividade em direção ao planeta. Dado o grau de firmeza de nossas consciências e as qualidades do campo magnético de cada um, podemos ser influenciados por uma ou outra dessas duas forças, e, nem percebemos que estamos recebendo tais irradiações.
A vida é fartamente comparada a uma escola em várias línguas e literaturas e, se assim o é, é porque com certeza um grande fundo de verdade deve existir nessa metáfora.
A metáfora da vida seria então uma alegoria de nós mesmos e de nossas limitações humanas. As escolas são por excelência centros de aprendizagem. Há uma estrutura física, e uma divisão entre aqueles que ainda não sabem coisa alguma do mundo das letras, daqueles que já sabem formar as primeiras palavras. Há séries mais avançadas para aqueles que já conseguem formar frases e escrever textos, porém, ainda sem muita reflexão.
O destino de todos os que entram na alfabetização são os centros avançados de ensino nos quais se conseguem formar o pensamento crítico, e produzir conhecimento e tecnologia. Mas para se chegar a tais centros é preciso muito esforço e persistência. É preciso queimar muitos neurônios, afinal, aqui vale uma máxima muito conhecida: na vida, nada vem de graça, mas a custa de muito esforço.
Infelizmente, muitos desistem pelo caminho, e passam sua existência no senso comum: um lugar apropriado para aqueles que não gostam de muito esforço, e se contentam com a mesmice e a mediocridade como prêmios.
Um dia, porém, descobrirão que o infinito é como um imã que nos chama a plenitude, e, querendo, ou não, mais cedo ou mais tarde, nesta ou em outras vidas, seremos chamados a viver aquela que é a essência de cada um de nós: o ser total.
Portanto, quanto mais esforço fizer neste sentido, melhor será para nós. Não precisa fazer malabarismo, apenas o desejo de que queremos que assim seja, aliado a algum esforço diário de nossa parte, já nos treinam como um atleta para provas e conquistas cada vez maiores.
Quando consideramos a escola da vida a partir da perspectiva do espiritual, veremos que ela foge as regras e padrões estabelecidos entre os homens. Pois há homens altamente alfabetizados, capazes de formar pensamento crítico e com capacidade de liderança que agem tais quais analfabetos que nem ao menos sabem fazer as operações mais elementares do tipo 2 + 2 = 4.
O que os faz agir assim? Ah, tantos são os motivos... Ambições desmedidas, falsidades, o querer se colocar na condição de deuses quando na verdade não passam de palha seca levada facilmente pelo vento...
Assim, esses homens, ao invés de avançarem, retrocedem. O mesmo é verdade para os investimentos que fazem e para os empreendimentos que gerenciam. Aqueles que, além de saber usar com inteligência as técnicas administrativas e de gestão que aprenderam nos centros avançados de ensino, usam da sabedoria para se conduzirem, tanto no nível pessoal quanto gerencial avançam e os negócios prosperam. Produzem lucros e cuidam da vida e do bem-estar dos seres que os cercam.
Há outros gestores porém que, desprezando todas as regras de segurança tanto das estruturas físicas, quanto das vidas humanas que estão sob seu comando, pensam estar avançando em direção ao lucro certo, ao ouro por excelência. Esses são como as estatuas de ferro com os pés de barro: os pés não aguentam o peso do resto do corpo e o conjunto completo vem abaixo. E o que era lucro vira prejuízo, pois, decorrentes de tamanha irresponsabilidade há perdas de vidas humanas e prejuízo dos recursos naturais, e com isso, as suas empresas são obrigadas a pagar multas milionárias, indenizar famílias, e toda uma série de reivindicações decorrentes do ato irresponsável.


Esta foi uma semana difícil e de forte comoção para os brasileiros que ainda choram e lamentam a tragédia ocorrida em Brumadinho, Minas Gerais, resultado do descaso e do desprezo de uma mineradora, a Vale do Rio Doce, para com o meio ambiente, para com os seus próprios funcionários, e para com as populações que viviam no entorno da Barragem do Feijão, que rompeu-se na sexta-feira, 25, causando uma tragédia sem precedentes na história da mineração no Brasil.
Chegamos neste sábado, 02, ao nono dia de buscas e já são 115 o número de mortes confirmadas e 248 pessoas desaparecidas. O heróico trabalho dos bombeiros continua, dia após dia, incansável na busca pelos corpos das vítimas.
A barragem do Córrego do Feijão que se rompeu em Brumadinho não recebia rejeitos de mineração há pelo menos três anos. Estava desativada, ou para usar o termo técnico, estava descomissionada.
Entretanto, a Vale usava um método barato, e, segundo os especialistas, o menos seguro. O método conhecido como “alteamento a montante” vai recebendo camadas do próprio rejeito da mineração.
“É a forma mais comum porque é mais barata para se construir e mais rápida de se licenciar porque ocupa menos espaço da bacia hidrográfica. Mas é também a mais perigosa e com maior risco. Por isso países com características similares ao do Brasil não usam ou estão proibindo", diz o geólogo Eduardo Marques, professor da Universidade Federal de Viçosa (UFV).
A questão é saber por que a Vale usa um método antigo e superado para construir suas barragens quando há opções bem mais modernas. Certamente, isso é facilmente explicado se pensarmos que a Vale levou em conta o investimento econômico, deixando de colocar no outro lado da balança o custo das vidas humanas que poderiam se perder numa tragédia e os custos ao meio ambiente.
Há outras opções possíveis de serem usadas para evitar problemas; são a barragem a jusante; barragem de linha de centro; e o depósito de rejeitos à seco. Entretanto, mesmo esses métodos sendo os mais seguros, ainda assim eles não oferecem risco zero.
As empresas mineradoras parecem não estar muito preocupadas com esse tipo de questão de se a barragem é mais barata ou mais cara, mais segura ou não, o que parece importar de verdade para elas é apenas e tão somente uma única coisa: o lucro, e dane-se o risco ambiental e humano. Pensando assim, não contratam mão de obra especializada para analisar essas questões tão importantes.
Obviamente, o objetivo de toda empresa é o lucro, mas as empresas modernas e sensatas sabem que é preciso uma ação integrada para que todas as estruturas funcionem a contento uma em beneficio da outra, e não uma em prejuízo da outra.
O poder público também, na maioria das vezes, é omisso em relação à questão do rigor na fiscalização a essas empresas mineradoras, e não só as mineradoras, mas também há omissão do estado brasileiro na fiscalização de empresas de diversos outros ramos. O poder público também é leniente no rigor e na punição a quem destrói a natureza e ceifa vidas humanas.
Tanto isso é verdade, que, três anos e dois meses depois da tragédia ocorrida em Mariana, decorrente do rompimento da Barragem de Fundão, os responsáveis ainda não foram punidos. 40 milhões de metros cúbicos de rejeitos de minérios devastaram uma região muito rica em recursos naturais. O “acidente”, que deixou 19 mortos, foi de tamanha gravidade que mudou a vida de mais de 40 cidades mineiras e do Espírito Santo, além de prejudicar grandemente a vida de 500 mil habitantes da região.
A mineradora Samarco, junto com suas controladoras Vale e a BHP Billiton sempre trataram a questão como acidente, quando na verdade trata-se de um crime. Até hoje, o processo anda a passos de tartaruga na justiça. Os responsáveis pela tragédia continuam impunes. Quem foi preso? Até agora, ninguém. A Samarco vive sempre a recorrer das multas que lhe foram aplicadas e tudo vai se cozinhando em banho Maria. 68 multas foram aplicadas à empresa por órgãos ambientais, mas apenas uma está sendo paga, e ainda assim, dividida em 59 parcelas.
Diante da magnitude dos prejuízos que foram causados ao meio ambiente as ações desenvolvidas pela empresa para tentar sanar o prejuízo se assemelham a uma gota em meio ao oceano.
Aí vem, tristemente, Brumadinho para nos jogar na cara que, de Mariana pra cá, nada mudou: não houve uma lei proibindo a construção de barragens pelo método de alteamento a montante - a Barragem do Fundão também tinha a mesma estrutura que a de Brumadinho – ninguém se mexeu para que as fiscalizações às empresas fossem endurecidas - ao contrário, antes da recente tragédia, o novo governo falava em flexibilizar as concessões de licenciamentos ambientais, – os termos de licenciamento ambiental ainda são precários.
Hoje, o Brasil sabe por que não se levantam vozes no Congresso contra todos esses erros: corrupção. Mais uma vez as raízes desse mal brotam no lamaçal de rejeitos de minérios que engole vidas humanas e recursos naturais. Sempre há por aí algum abutre abocanhando gordas propinas para satisfazer a ganância de si próprios e de empresas irresponsáveis que não estão nem aí para essa coisa toda.
Essas vistas grossas para o que acontece de errado vai do maior para o menor, desde figuras da política e poderosos empresários, passando pelos fiscais que fazem vistas grossas aos erros encontrados em vistorias, e chegando até engenheiros que assinam laudos atestando segurança naquilo que não tem segurança nenhuma e está prestes a arrebentar.
Nessa nevoa de impunidade ainda é recente na mente dos brasileiros, a tragédia na Boate Kiss, em Santa Maria, Rio Grande do Sul, quando mais de 200 pessoas, na grande maioria, jovens, morreram sufocadas por ingerir fumaça tóxica, presas dentro da boate.
No último dia 27 de janeiro, quando o Brasil se chocava com Brumadinho, a tragédia em Santa Maria completava exatos 6 anos. Era 27 de janeiro de 2013 e a moçada gaúcha celebrava a alegria numa festa universitária ao som da banda Gurizada Fandangueira, quando a banda resolveu, de forma irresponsável, usar, dentro da boate, no palco, um tipo de fogo de artifício, que, ao entrar em contato com o revestimento das paredes e do teto, formado por uma espuma altamente inflamável e tóxica, provocou o terrível incêndio.
Dois sócios da boate e dois integrantes da banda foram presos na ocasião e liberados em março do mesmo ano. Mas nem só de sócios da boate e de integrantes da banda vive a tragédia de Santa Maria. Há também os órgãos do poder publico responsável pela fiscalização, há os bombeiros que assinaram os laudos atestando a segurança da boate, que, na verdade, era, internamente, em sua estrutura física, uma armadilha. Eles também não foram punidos.
Enfim, também nesse caso, a história é a mesma de Mariana: os responsáveis continuam impunes. Há um processo que também se arrasta a passos de tartaruga nos tribunais, ainda sem data para julgamento, e familiares que gritam em vão por justiça.
Até quando o Brasil aceitará conviver com a impunidade, dando margem para que outros de seus filhos pereçam em acidentes Brasil afora, e que poderiam, com fiscalização e rigor, ser evitados? Quantas Barragem do Feijão, Barragem do Fundão, e Boates Kiss precisarão se repetir para que uma punição severa seja aplicada aos responsáveis e para que o poder público adote leis mais severas quando se trata da segurança das vidas humanas e do meio ambiente? Será que três tragédias de grandes proporções não são suficientes para que se faça com eficiência o dever de casa?

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