A passos de caranguejo
Domingo, 23 de maio
Caranguejos.
Eles podem ser encontrados em qualquer região litorânea do planeta. São
crustáceos que proporcionam pratos exóticos. Esses pequenos animais andam de
modo peculiar. Eles andam para trás ou de lado. Até conseguem andar para frente,
mas quando conseguem essa proeza a fazem com grande dificuldade, e meio
desajeitados. O caranguejo é, portanto, o mascote perfeito para o Brasil sob o
governo Bolsonaro. É assim que o país tem caminhado: para trás, de lado. Até consegue
dar um passinho para frente, mas é de modo desastrado.
Isso
nos remete a uma matéria publicada no jornal Folha de São Paulo deste domingo,
23. Diz o título da matéria: “Mais miserável, Brasil sob Bolsonaro prepara
'herança maldita”. A matéria destaca três fatores que estão travando o crescimento
de nosso país: subemprego, baixa produtividade, e rombos.
Desde
a última década o país vinha mostrando de crescimento da informalidade entre os
trabalhadores de baixa renda, e para os especialistas essa será um dos principais
impedimentos à aceleração do crescimento e ao resgate daqueles brasileiros que,
com a pandemia, foram empurrados para a miserabilidade. Isso se deve ao fato de
que a economia informal paga, produz, e cresce menos.
A
matéria da Folha continua ainda chamando a atenção para o fato de que, até
mesmo o trabalho informal ficou prejudicado pela paralisia do setor de
serviços, que é responsável por 70% do PIB, e dos empregos, “metade deles, fora
da informalidade”.
De
acordo com consultoria Tendências, citada na matéria, a crise provocada pela
pandemia, empurrou mais gente para as classes D e E, o que travará a recuperação
econômica via consumo das famílias, que, até o início da pandemia, vinha desempenhando
papel preponderante.
Haveria
ainda uma saída para a situação se houvesse movimentação das taxas de
investimento e poupança, mas essas, diz a Folha “estão nos menores patamares
desde os anos de 1980”.
Nos
anos de 1980 e 1990, o Brasil também passou por momentos difíceis, nos quais
muitas pessoas foram empurradas para a pobreza extrema, mas naquela época a
carga tributária e a dívida pública não estavam tão altas em relação a hoje. Isso
impede que se o resgate dos pobres através de programas sociais de transferência
de renda como os criados no governo FHC e no governo Lula.
Ouvido
pela Folha, Marcelo Neri, diretor da FGV Social, diz que vivemos por aqui uma
espécie de “Esgana”, ou seja, o Brasil tem uma carga tributária da Espanha, mas
serviços públicos com padrões de Gana. Ele diz que é um paradoxo que o país
tenha taxas de pobreza tão elevadas, e serviços públicos de má qualidade, tendo,
ao mesmo tempo, carga tributária e dívida pública tão elevadas. Neri, diz ainda
que Bolsonaro conseguiu aliar o baixo crescimento e alta desigualdade a um
enorme grau de instabilidade socioeconômica. E como a corda sempre arrebenta do
lado mais fraco, que sai perdendo nessa história são os mais pobres.
O
economista mais otimista ouvido pela Folha, Samuel Pessôa, diz que o Brasil
pode reagir positivamente através de um boom nos preços das comodities
exportadas pelo Brasil. Ele diz que no
começo dos anos 2.000 foi isso que salvou o país e o ajudou a consertar as
contas externas, em um momento em que o real estava bastante desvalorizado.
Mas,
nem mesmo as palavras do otimista Samuel Pessôa, economista da FGV-Ibre e colunista
da Folha, são tão animadoras assim. “No final, as coisas devem ir se
arrumando, mas dentro de nossa mediocridade. O sonho de que o Brasil poderia se
tornar algo grande, porém, parece ter desaparecido”. Diz ele, fechando a
reportagem.
Diante
de tudo isso vemos cair por terra, por completo, o discurso e os argumentos do
presidente, Jair Bolsonaro, de que o fundamental em meio à crise do coronavírus
é salvar a economia. Se ele tivesse invertido a ordem de prioridades a situação
poderia ser outra hoje em dia.
Não
há economia saudável que se sustente e se fortaleça quando há uma ameaça real
de um vírus mortal, que até agora, nem mesmo os cientistas sabem bem como lidar
com ele. Não existe economia que se sustente com uma doença para qual, quase um
ano e meio depois do surgimento dela, tudo ainda parece ser novidade, e que já
matou quase meio milhão de brasileiros. Vacinas já estão circulando por aí, nos
braços das pessoas, em alguns países mais, em outros menos, porém, até mesmo as
vacinas são experimentos.
Em
um cenário desses não tem jeito: a prioridade é a vida. A prioridade são as
pessoas. Entretanto, depois de um ano e meio, o presidente, Jair Bolsonaro,
ainda não entendeu a dinâmica da coisa, e continua alardeando o uso da
cloroquina como tratamento contra a Covid, e também continua a chamar de
ditadores os governadores que adotam as medidas de distanciamento social como
forma de conter o vírus. Entretanto, querer que surja algum pensamento evoluído
da cabeça do presidente é como querer fazer surgir leite de pedras.
Por
aqui, seguimos com os depoimentos na Comissão Parlamentar de Inquérito
(CPI) da Covid, que investiga se houve
omissão por parte do governo federal no combate à Covid, e possíveis desvios de
recursos federais enviados aos governos estaduais. E o que se tem visto naquela
CPI, por parte dos depoentes, é um tremendo festival de mentiras. Acho que nem
o famoso filho de Gepeto, o Pinóquio conseguiu tal façanha.
Eu,
particularmente, quando vejo aqueles depoimentos, fico pensando: se eles mentem
tanto assim, abertamente, em público, para todo o Brasil, imagina então o que
esses homens públicos não fazem às escondidas.
Na
terça-feira, foi a vez do ex-ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo. O
ex-ministro protagonizou vários incidentes diplomáticos que causaram constrangimento
com a China, um dos principais parceiros comerciais do Brasil. Ernesto chegou a
afirmar, em artigo publicado no blog dele, e de autoria própria, intitulado, “Chegou
o Comunavírus” insinuações de que o coronavírus teria sido fabricado pelos
chineses.
Outro
episódio constrangedor aconteceu no ano passado. O filho do presidente, Eduardo
Bolsonaro, escreveu em redes que a China era culpada pelo coronavírus. “Quem
assistiu Chernobyl vai entender o que ocorreu. Substitua a usina nuclear pelo
coronavírus e a ditadura soviética pela chinesa. [...] +1 vez uma ditadura
preferiu esconder algo grave a expor tendo desgaste, mas que salvaria inúmeras
vidas. [...] A culpa é da China e liberdade seria a solução”.
O
episódio causou uma crise diplomática entre os dois países. Para a postagem de
Eduardo Bolsonaro, a resposta chinesa veio na mesma velocidade com que o filho
do presidente fez as acusações irresponsáveis. “A parte chinesa repudia
veementemente as palavras do deputado, e exige que as retire imediatamente e
peça uma desculpa ao povo chinês”, escreveu Yang Wanming. Ele marcou os
nomes de Rodrigo Maia, presidente da Câmara dos Deputados à época, e Ernesto
Araújo, ministro das Relações Exteriores, para que eles também lessem a
mensagem. Além disso, ele compartilhou com seguidores, postagens de pessoas que
criticavam a família Bolsonaro.
Por
aquela época, Eduardo Bolsonaro havia feito parte de uma comitiva que foi aos
Estados Unidos em viagem diplomática. Então, não contente com a resposta que
deu ao governo brasileiro, o embaixador chinês ainda respondeu diretamente ao
deputado, na própria postagem ofensiva contra os chineses. “As suas palavras
são extremamente irresponsáveis e nos soam familiares. Não deixam de ser uma
imitação dos seus queridos amigos. Ao voltar de Miami, contraiu, infelizmente,
vírus mental, que está infectando as amizades entre os nossos povos”.
O
ministro das Relações Exteriores, na época Ernesto Araújo, em vez de agir de
uma forma pacificadora, tentando amenizar a burrada que o filho do presidente
havia feito, agiu no sentido de colocar ainda mais lenha na fogueira. “É
inaceitável que o embaixador da China endosse ou compartilhe postagem ofensiva
ao chefe de Estado do Brasil e aos seus eleitores. As críticas do deputado
Eduardo Bolsonaro à China, feitas em postagens ontem à noite, não refletem a
posição do governo brasileiro. Temos expectativa de uma retratação por sua reportagem
ofensiva ao chefe de Estado. O Brasil quer manter as melhores relações com o governo
e o povo chinês, promover negócios e cooperação em benefício recíproco, sem
jamais deixar de lado o respeito mútuo”. Escreveu ele em resposta ao
embaixador da China.
Entretanto,
em seu depoimento à CPI, Ernesto negou todos esses episódios, e disse que não
causou nenhum constrangimento com a China, nem antes, nem depois da pandemia. Essas
burradas atrapalharam muito na questão das vacinas, pois a China é nosso
parceiro também nos insumos para a fabricação dela. Dependemos deles para isso.
O
depoimento mais aguardado da CPI, o do general Eduardo Pazuello foi outro show
de mentiras. Como pode um general do Exército mentir tanto e tão descaradamente?
Pazuello dispunha de um habeas corpus que o permitia ficar calado para não produzir
contra si mesmo, entretanto, o general resolveu usar o instrumento judicial para
mentir e mentir.
Uma
coisa não se pode negar: Pazuello defendeu Bolsonaro como um cão fiel.
Todos
sabemos pelos fatos amplamente demonstrados através da reportagens de imprensa
e da própria atitude de Pazuello à frente do ministério da Saúde, que ele
entrou lá, para obedecer ordens diretas de Bolsonaro para fazer aquilo que os
outros ministros da Saúde, médicos, não quiseram fazer: liberar o uso
indiscriminado da cloroquina, que, como todos sabem, não tem nenhuma eficácia
comprovada contra a Covid-19.
Mas
em seu depoimento, o ex-ministro disse que tudo isso era mentira. Quando questionado
a respeito desse assunto, Pazuello, simplesmente, respondeu: “Em hipótese
alguma. O presidente nunca me deu ordens diretas”.
Também
sabemos que o general não tem nenhum conhecimento sobre a doença, e que,
portanto, era a pessoa menos indicada para comandar a pasta. Quando inquirido
sobre isso, Pazuello lembrou sua trajetória durante a carreira militar, destacando
o comando dos hospitais de campanha na operação Acolhida, na fronteira com a
Venezuela. “Sobre gestão e liderança, acho que nem preciso responder. É como
responder se a chuva molha. Todo militar tem isso”.
A
questão, general, não é só sobre gestão e liderança. É sobre salvar vidas. É sobre
como lidar com uma doença que até os médicos não conhecem por completo.
O
relator da CPI, Renan Calheiros, elaborou 15 mentiras de Pazuello na CPI que
podem ser lidas pelo leitor no site do Poder 360.
O
ministério da Saúde criou, muito tardiamente, uma Secretaria Extraordinária de
Enfrentamento à Covid-19. O órgão foi criado no 10 de maio deste ano. Um ano e
cinco meses depois do início da pandemia. Para o cargo de secretária foi
convidada a médica infectologista Luana Araújo.
Mesmo
sem ter sido nomeada oficialmente, a médica ainda chegou a trabalhar por 10 dias
na função. Porém, neste sábado, 22, ela anunciou que não assumirá a função. O
motivo da saída da médica não foi revelado. Mas na nota em que anuncia sua
saída do cargo, ela nos dá pistas: “Fiz questão de evidenciar minha postura
técnica, baseada em evidências, pautada pelo juramento médico que fiz e que
norteia todas as minhas atitudes. Vejo a ciência como ferramenta de produção de
conhecimento e de educação para a priorização da vida, sempre, como objetivo
maior. Saio desta experiência como entrei: pela porta da frente, com a
consciência e o coração tranquilos, ciente de que neste curto período entreguei
o melhor da minha capacidade de acordo com os princípios que tenho como
profissional especialista na área: ética, cientificidade, agilidade,
eficiência, empatia e assistência. Protejam-se, vacinem-se e sigamos em frente”,
escreveu ela.
Provavelmente,
mais uma profissional séria que não quis jogar seu diploma e sua carreira no
lixo para servir a um governo negacionista.
Em
outro cenário, enquanto e variante indiana já foi detectada no Maranhão, em seis tripulantes de um navio com bandeira
chinesa, e os demais tripulantes do navio colocados em quarentena, depois de a
nossa vizinha, Argentina, também detectar a variante indiana e africana em três
viajantes que entraram no país, mesmo com o perigo rondando nossas cabeças, o
irresponsável, e quando digo irresponsável refiro-me ao excelentíssimo senhor
presidente da República, Jair Bolsonaro, voltou a provocar aglomeração nas ruas
do Rio, em um passeio moto ciclístico.
Segundo
a prefeitura da cidade, o número de pessoas que participaram do evento foi de
10 a 15 mil pessoas. Entre eles estava o ex-ministro da Saúde, Eduardo
Pazuello. Não apenas ele, mas o presidente e todos que estão em cima do carro
de som aparecem sem máscaras. Os participantes também, a grande maioria,
dispensou o acessório fundamental no combate à transmissão do vírus.
Obviamente,
o presidente voltou a atacar os governadores por eles decretarem lookdowns,
que, segundo Bolsonaro, não tem comprovação cientifica de que são eficazes
contra o espalhamento do vírus, sendo que o assunto foi amplamente estudado
pelos comitês científicos e estudos.
Ele
faz política, faz campanha, enquanto no Brasil milhares são empurrados para a
pobreza extrema, e em um país no qual o controle do vírus está bem longe de
acabar, e que ainda sofre com as terríveis consequências de uma segunda onda
que também está longe de acabar.
O
Brasil tem, desde o início da pandemia até agora, 16.046.501 casos confirmados
da doença, e 448.291 óbitos.
Ignorar
toda essa situação para quem é líder da nação é um ato de extrema
irresponsabilidade e egoísmo.