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Conversa para boi dormir

Posted by Cottidianos on 00:23

 Quinta-feira, 17 de setembro

                                          Cerimônia de posse do ministro da Saúde, Eduardo Pazuelo

Enfim, depois de quatro meses com um ministro interino da saúde: o general Eduardo Pauzelo, agora, finalmente o Ministério da Saúde ganhou um ministro de fato e de direito: o general Eduardo Pazuelo.

Bolsonaro oficializou o ato em cerimônia realizada nesta quarta, 16. Com a oficialização do ato já são três os ministros que ocupam a pasta no governo Bolsonaro.

O general do Exército, Eduardo Pazuelo é o homem certo para ocupar o cargo de ministro da Saúde? E porque Bolsonaro o escolheu?

O general não é especialista em saúde. Mas outros ministros que ocuparam a pasta em outros governos também não eram médicos, poderia argumentar você. É verdade. Se bem que a grande maioria dos ministros que chefiaram a pasta eram formados em Medicina. À exceção de alguns poucos como Gilberto Magalhães Occhi (02/04/2018 a 02/01/2019), advogado; Ricardo José Magalhães Barros (13/05/2016 a 02/04/2018), Engenheiro Civil; Barjas Negri (21/02/02 a 31/12/02), economista, e mais alguns poucos. O próprio senador José Serra, que já concorreu à cadeira presidencial, sem sucesso, foi ministro da Saúde, mas sua formação acadêmica é Engenharia Civil.

Mas note que nenhum dos outros ministros, mesmo não tendo formação acadêmica na área da saúde, nenhum deles enfrentou uma turbulência tão grande como a pandemia do coronavírus, o vírus que sacudiu o planeta e o pegou de sobressalto.

Portanto, para esse momento, era de se esperar que qualquer governo prudente, escolhesse, em meio a essa crise, um médico para chefiar a pasta.

E aí, chegamos a segunda pergunta feita acima: Porque Bolsonaro o escolheu?

Simplesmente porque Pazuelo, é um homem da carreira militar. E os militares, como todos sabemos, são educados para cumprir ordens, sejam elas boas ou não. Ou seja, o general é o homem certo para o governo, é o homem certo para o presidente, mas não é para o país, pelos menos não no momento em que atravessamos, em que um vírus vem como um tsunami violento e mata tantas pessoas.

Apenas para refrescar a memória do leitor, da leitora que lê este artigo. Os dois ministros da saúde que ocuparam a pasta antes do atual ocupante dela, Luiz Henrique Mandetta, e Nelson Teich, porque um foi demitido, e o outro, por pura pressão, se demitiu?

Por dois motivos básicos, totalmente orientados pela ciência. Eles defendiam o isolamento social, e a não prescrição da cloroquina, remédio de eficácia não comprovada contra o coronavírus, e que se tornou alvo de ampla propaganda pelo governo. Tanto é que, um dos primeiros atos do general como interino, foi mudar o protocolo da cloroquina. Protocolo esse que ampliou o uso do medicamento por pacientes com coronavírus, mesmo contra todas a evidências de que o remédio não possui nenhuma eficácia científica comprovada para estes casos.

O site Catraca Livre, elenca seis fatos que atestam que Pazuelo não é homem certo para o cargo certo, no momento certo. Motivos esses que esse blog elenca abaixo.

1. Não é da área da saúde

Com a saída de Teich, Pazuello assumiu interinamente, Ele já era secretário-executivo da pasta desde 22 de abril, quando João Gabbardo, que somava 39 anos de trabalho na pasta, deixou o Ministério da Saúde.

Pazuello nasceu no Rio de Janeiro e é formado na Academia Militar das Agulhas Negras, mesma instituição onde Bolsonaro estudou.

No Exército, Pazuello comandou o 20° Batalhão Logístico Paraquedista e foi Diretor do Depósito Central de Munição, ambos no Rio de Janeiro. Em 2014, foi promovido a General-de-Brigada e, em 2018, a General de Divisão. Antes de ir para o Ministério da Saúde, exercia o comando da 12ª Região Militar, em Manaus.

Como Oficial General, foi coordenador logístico das tropas do Exército Brasileiro empregadas nos Jogos Olímpicos e Paralímpicos do Rio de Janeiro, em 2016. Em 2018, coordenou a Operação Acolhida, força-tarefa que atou em Roraima, recebendo imigrantes venezuelanos

Como podemos ver, nenhuma experiência na área da Saúde. A nomeação de Pazuello como ministro da Saúde é ainda mais contraditória, justamente, por acontecer durante o governo do presidente Jair Bolsonaro, que se elegeu dizendo que não tornaria os cargos públicos em moeda de troca para disputas políticas, os deixando exclusivamente para técnicos e especialistas das áreas. É, não é isso que acontece na prática. Enfim, a hipocrisia.

2. Avanço desenfreado da covid-19

No dia em que Pazuello assumiu interinamente o Brasil registrou 14.817 mortos e 218.223 casos de covid-19. Um dia antes de sua efetivação como chefe da pasta, o país atingiu a marca de 132.006 mortos e 4.345.610 casos registrados do novo coronavírus, de acordo com dados do Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass).

Os números representam quase 10 vezes mais óbitos e 20 vezes mais infecções. Aceleração como essa não aconteceu em nenhum país do mundo, mostrando o quanto a administração de Pazuello foi ineficaz durante esses meses de pandemia.

3. Diminuição do orçamento

O Ministério da Saúde, já sob a gestão de Pazuello, deixou de executar boa parte dos recursos autorizados pelo Congresso Nacional para a aplicação do enfrentamento à covid-19. De R$ 38,9 bilhões, apenas R$ 11,4 bilhões saíram dos cofres federais até 25 de junho, segundo uma auditoria do Tribunal de Contas da União (TCU). Os recursos gastos representam somente 29% da verba emergencial prevista para combater o novo coronavírus.

4. Desmonte do corpo técnico do Ministério da Saúde

O Ministério da Saúde sempre teve uma estrutura formada por quadros especializados na área sanitária, pessoas com alto grau de qualificação profissional e Pazuello, assim que chegou, demitiu nove desses funcionários para nomear militares que não têm qualquer vínculo com a área da saúde, para os cargos.

Pazuello nomeou advogado de milicianos como assessor especial. Zoser Plata Bondim Hardman de Araújo, que assumiu o cargo na quarta-feira, 20, é conhecido por ter defendido milicianos cariocas e o ex-PM  Ricardo Teixeira Cru, condenado pelo assassinato da juíza Patrícia Acioli em 2011.

5. Cloroquina

Com apenas dez dias no cargo de ministro – e em caráter interino -, Eduardo Pazuello já havia mudado o protocolo do Ministério para permitir a prescrição de cloroquina até para pacientes com sintomas leves da covid-19, como queria o presidente Jair Bolsonaro, ainda que o medicamento não apresente nenhuma comprovação científica de combate à doença. Pelo contrário, há reações adversas, como problemas cardíacos.

A ausência de comprovação científica também não impediu Pazuello de fazer o Ministério da Saúde distribuir 100.500 comprimidos de cloroquina para indígenas, segundo informou o próprio ministro interino, durante uma coletiva de imprensa, no dia 24 de julho.

Além disso, sob o comando do general do Exército, o Ministério decidiu comprar, com dinheiro público, três toneladas de insumo farmacêutico para fabricação de cloroquina, mesmo com os técnicos alertando que: “Devido à atual situação, não é aconselhável trazer uma quantidade muito grande, pois, caso o protocolo venha a mudar, podemos ficar com um número em estoque parado para prestar contas”.

A essa altura, a OMS já havia anunciado que a cloroquina não tinha eficácia comprovada e podia provocar efeitos colaterais. Cientistas de várias organizações de renome também já haviam chegado à mesma conclusão. E países como França, Bélgica, Itália, Portugal e Reino Unido suspenderam, proibiram ou deixaram de recomendar o remédio.

6. Falta de outros medicamentos

Enquanto toneladas de cloroquina chegaram ao Brasil, os remédios realmente essenciais para o tratamento de pacientes com covid-19 estão em falta. Desde o fim de maio, os técnicos do Comitê de Operações de Emergência alertavam o governo sobre os baixos estoques de medicamentos, como os usados para entubar pacientes em UTI – analgésicos e sedativos. O documento registrava que: “267 insumos estavam com risco de desabastecimentos”.

Um funcionário de um hospital de campanha, no Rio de Janeiro, relatou ao Jornal Nacional, da TV Globo, em 24 de julho, que a situação não melhorou. “À medida que a médica ia pedindo os medicamentos para fazer a sedação e a curarização, não tinha. Vai ter que misturar com outros medicamentos, porque não tem. Ele simplesmente parou, na minha cara. Uma pessoa que estava conversando comigo há uns 40 minutos atrás, morreu. E isso é muito duro”, relatou o profissional que não quis se identificar.

Claro, o general Pazuelo, atua muito bem na área de logística. É tanto que, grande parte dos Secretários de Saúde, aprovam o trabalho dele. A sua atuação na logística do problema, não impediu, entretanto, que, em alguns estados brasileiros, houvesse superlotação nos hospitais provocados pela Covid-19. Muitas brasileiros perderam a vida à espera de um leito de hospital de UTI onde dispusessem de respiradores.

Falamos já bastante dessa nomeação de Pazuelo. Falemos agora da negação. Do negacionismo.

No Brasil, segundo dados das últimas vinte e quatro horas, divulgados pelo consórcio formado pelos veículos de comunicação, já são 4.421.686 casos diagnosticados de Covid-19, e 134.174 óbitos. Uma quantidade absurda de vidas perdidas pela doença. Mortes que poderiam ter sido evitadas, pelo menos grande parte delas, se o governo tivesse se dedicado com mais afinco à defesa da único remédio que pode salvar as vidas neste momento: o isolamento social, e os demais orientações relacionadas a higiene, orientadas pela OMS.

Mas o que vimos no Brasil foi a negação total da doença por parte do presidente. Negação que continua ainda. Acho que o exagerado número de mortes ainda não é suficiente para um presidente que parece ter uma única preocupação em mente: a reeleição. Todos os atos e atitudes do presidente parecem girar em torno dessa mor.

Ainda na quarta-feira, durante a cerimônia de posse de Pazuelo, o presidente disse: “Não tínhamos por que fechar as escolas, mas as medidas restritivas não estavam mais nas mãos da Presidência da República. Por decisão judicial, elas competiam exclusivamente aos governadores e prefeitos. Lamento. Somos o país com o maior número de dias em lockdown nas escolas. Isso é um absurdo”.

Absurdo, a última palavra do presidente nesse trecho do seu discurso, é, ironicamente, a que melhor traduz sua fala.

Ainda bem, que o Supremo Tribunal Federal tirou das mãos do presidente a decisão sobre a implantação das medidas restritivas, e as colocou nas mãos dos governadores e prefeitos. Não fosse isso, o morticínio provocado pelo vírus aqui no país seria ainda maior.

E ainda, Bolsonaro diz lamentar sermos o país com maior número de dias de lookdown nas escolas. Quanto a sermos o segundo país com maior número de mortes pela doença, ficando atrás apenas dos Estados Unidos, isso não parece absurdo para Jair Bolsonaro, a julgar pelo pouco caso que ele faz quando o assunto se refere aos mortos pela Covid-19.

O presidente apoia seus argumentos no fato de que, segundo ele, estudos realizados em diferentes países, revelar que a chance de pessoas com menos de 40 anos morrerem por causa da doença é quase zero. Sem citar que estudos e que pesquisas são essas. Aliás, os argumentos defendidos pelo presidente são bem caraterísticas de algo em que ele, e também os filhos, são especialistas: Espalhar fake news.  

E qual a linguagem das fake news? Ela geralmente vem envolvida em uma roupagem hipotética do tipo, tal médico disse, em algum lugar, que tal medicamento é bom para tal doença. Ou seja, as notícias falsas sempre vão carecer de objetividade. Sempre serão informações vagas e genéricas.

Ainda em seu discurso, ele, como sempre tem feito desde o início da pandemia, criticou os governadores, e também a mídia. “Eu entendo que alguns governadores foram tomados pelo pânico, proporcionado por essa mídia catastrófica que nós temos no Brasil. Não é uma crítica à imprensa, é uma constatação. Me desculpem”.

Como não poderia faltar, também houve espaço para exaltar a cloroquina. “Nós tínhamos que fazer alguma coisa sobre as mortes vitimadas pelo vírus. A primeira coisa foi a hidroxicloroquina. A decisão não foi da minha cabeça, como uma aposta de um jogador. O chanceler Ernesto Araújo conversou com diversos embaixadores”.

Ora, caros leitores e leitoras, para se obter um parecer sobre a eficácia de um remédio a quem se deveria recorrer: a médicos ou a embaixadores? No governo Bolsonaro, o certo é se recorrer a pessoas fora do círculo científico. Isso é por demais estranho, não acham?

Ou seja, as conversas do presidente são conversas para “boi dormir”, como diz um ditado popular. E o impressionante é ver como tem muito boi dormindo.


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