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Um inferno chamado Venezuela
Posted by Cottidianos
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01:11
Quarta-feira,
27 de fevereiro
Na
década de 80, um programa humorísitico da Globo apresentou em um de seus
quadros uma anedota debochando do sorriso mais famoso do mundo: o belo e
enigmático sorriso da Monalisa de Leonardo da Vinci.
O
humorista chegava a um museu, e diante da pintura do famoso pintor, começava a elencar
fatos e tragédias que marcaram a humanidade.
Não
dá para lembrar exatamente do texto na íntegra, mas era mais ou menos assim:
“Veio
a primeira Guerra Mundial... e ela sorrindo. Veio a Segunda Guerra Mundial... e
ela sorrindo. Veio o naufrágio do Titanic... e ela sorrindo. Em seguida o ator
concluia: só pode ser uma idiota”.
O
mesmo se pode dizer do ditador venezuelano Nicolás Maduro. Enquanto a venezuela
mergulhava no caos, com metade das crianças abaixo de cinco anos desnutridas,
Maduro aparecia en vídeos dançando salsa em eventos de seu partido e em em
programas de TV em seu país, e jantando em restaurante de luxo em Istambul,
Túrquia.
Também
nesse caso, a conclusão é óbvia: só pode ser um idiota.
Não
foi à toa que um bombeiro, compatriota de Maduro, postou, em setembro do ano
passado, nas redes sociais, um vídeo no qual aparece um burro a quem o homem
chama de presidente Maduro.
O
burro é conduzido para dentro do quartel por um homem com uniforme de bombeiro,
enquanto o que filma a cena vai narrando como se o burro estivesse fazendo uma
inspeção na unidade, e estivesse sendo conduzido por quem narra a cena. No
vídeo o burro para e começa a comer grama, enquanto o homem diz rindo: “…“Como
podem ver, ele próprio está verificando as condições da grama (…), é a única
boa que temos aqui”.
Os
bombeiros Ricardo Pietro, 41 anos, e Carlos Váron, 45, foram presos após a
divulgação do vídeo. O fato aconteceu no estado de Mérida, região dos Andes
venezuelanos.
Brincadeiras
à parte, o fato é que o mundo está preocupado com o que acontece na Venezuela.
A verdade é que a situação por lá está caótica faz tempo. Mas foi de uns meses
para cá que as coisas se agravaram e muito.
Principalmente
depois que Juan Guaidó, presidente da Assembléia Nacional da Venezuela e lider
da oposição, se declarou presidente interino da Venezuela, no dia 23 de janeiro
deste ano.
De
lá pra cá a situação política na Venezuela que já era um balaio de gatos, teve
os gatos em seu balaio triplicados.
O
mundo se dividiu entre aqueles que reconhecem e os que não reconhecem Guaidó
como presidente. Sendo os primeiros a grande maioria.
O
pior é que além do sadismo de Maduro, ele ainda tenta tapar o sol com a
peneira, ou empurrar a sujeira para debaixo do tapete a fim de dar a impressão
de casa limpa.
Da última vez que vez isso aconteceu acabou sobrando foi para um dos maiores expoentes do
jornalismo mexicano: Jorge Ramos, do canal hispâncio norte-americano Univision.
A entrevista foi agendada previamente, tudo como manda o figurino.
O
hábil Jorge Ramos foi conduzindo a entrevista para as águas sujas que o líder
venezuelano tenta fingir que são águas claras e límpidas: tortura, presos
políticos, falta de democracia na Venezuela. Maduro então já começou a dar
sinais de que não estava gostando nenhum pouco daquela entrevista.
O
repórter foi mais fundo ainda: mostrou a ele um vídeo no qual aparecia um grupo
de jovens comendo restos de comida tirados de um caminhão de lixo.
Essa
cena lembra um clássico da poesia brasileira, chamada, O Bicho, de autoria de
Manuel Bandeira. Permitam os leitores inserí-la aqui, pois o contexto é
propício, e não atrapalha a leitura, ao contrário, acrescenta:
O bicho
Vi ontem um bicho
Na imundice do
pátio
Catando comida
entre os detritos.
Quando achava
alguma coisa,
Não examinava nem
cheirava:
Engolia com voracidade.
O bicho não era um
cão,
Não era um gato,
Não era um rato.
O bicho, meu Deus,
era um homem
Manuel Bandeira
Voltando
ao texto.
Já
havia decorrido uns dezessete minutos da entrevista, e, se a entrevista
conduzida pelo jornalista que mostrava a realidade aspera do atual quadro
político da Venezuela já era demais para Maduro, a apresentação do vídeo então
foi a gota d’água. O presidente, abruptamente, levantou-se e foi embora.
Imediatamente,
Jorge Rodriguez, ministro das Comunicações da Venezuela, dirigiu-se à equipe de
reportagem e disse que a entrevista havia acabado e que a Univision não tinha
autorização para exibi-la. Os seguranças então apreenderam a câmera e as
gravações que haviam sido realizadas pela equipe, e retiveram também os
celulares. Além disso, a equipe teve que ficar no Palácio Miraflores por cerca
de duas horas.
Quanto
a Jorge Ramos e a produtora, María Guzmán, foram tirados deles, os celulares, a
mochila com objetos pessoais, e o colocaram os dois em separado, em uma sala da
segurança, com as luzes apagadas. Nesta terça-feira, 26, a equipe de
jornalistas da Univision foi deportada para os Estados Unidos pelo crime de ter
feito perguntas incomodas a Nicolás Maduro.
O
bom jornalista não perde a oportunidade de registrar um fato, mesmo em momentos
delicados como esse. Foi o que aconteceu com um jornalista da Telemundo
Notícias que estava no hotel onde a equipe vigiada pelos seguranças do governo
também estava. Ele resolveu filmar a movimentação que ocorria no hotel. Resultado:
também foi preso e passou cerca de 7 horas detido e incomunicável.
No
último fim de semana a situação ficou bastante tensa nas fronteiras da
Venezuela com o Brasil e com a Colômbia. Tudo isso porque é sabido que a
Venezuela vive sob um tripé de madeira podre: grave crise econômica com índices
econômicos rasteiros, grande instabilidade política, e altíssimos índices de
violência.
Esse
conjunto de fatores jogou o país numa crise humanitária sem precedentes. Faltam
produtos de primeira necessidade e medicamentos. Isso, aliado ao desemprego e a
própria dureza do regime tem feito com que milhões de venezuelanos deixem sua
pátria e procurem abrigo e melhores condições de vida em outros países.
Segundo
a Agência da ONU para Refugiados (ACNUR) e a Organização Internacional para as
Migrações (OIM) já são 3,4 milhões o número de refugiados e migrantes
venezuelanos em todo o mundo.
Ainda
segundo esses dois órgãos internacionais quem abriga o maior número de
venezuelanos que deixaram o país é a Colômbia por cujas fronteiras já
atravessaram mais de 1,1 milhões de compatriotas de Maduro. Em segundo lugar
vem o Peru com 506 mil. Completando a lista vem a seguir; Chile, 288 mil;
Equador, 221 mil; Argentina, 130 mil; e Brasil, 96 mil.
Os
refugiados e migrantes da Venezuela também procuram países como México e países
da América Central e do Caribe que também receberam um número significativo de
pessoas que fugiram do regime opressor imposto por Nicolás Maduro.
Os
caminhões com ajuda humanitária que tentaram chegar à Venezuela tinha uma dupla
finalidade: atingir a população venezuelana carente de comida e remédios, e, ao
mesmo tempo desmoralizar o governo de Maduro, mas este não cedeu. As forças
militares do governo fecharam as fronteiras, usaram de muita violência, e a
ajuda humanitária não pode chegar atingir o seu alvo.
Caminhões
com mantimentos foram incendiados na fronteira com a Colômbia, e os que saíram
do Brasil também foram impedidos de entrar no país vizinho. Houve confrontos
entre manifestantes pró e contra maduro que resultou em mortes e centenas de
feridos. Em meio à confusão, mais de 60 militares da Venezuela fugiram para a
Colômbia. O lado brasileiro também recebeu desertores.
O
que todo mundo quer evitar é uma intervenção militar na Venezuela, até porque
não se sabe como isso poderia terminar. Certamente, não terminaria nada bem.
Poderia até haver derramamento de sangue e mais vidas inocentes seriam
tombadas.
A
quem amam os ditadores? Ao povo? A pátria? Os ditadores não amam nem ao povo,
nem a pátria, eles amam apenas a si mesmos e aos seus interesses mesquinhos e
sua sede imensurável de poder e grandeza. O poder que eles almejam possuir não
é para servir, mas para serem servidos. Governam matando, massacrando,
humilhando, e quem governa assim não governa, presta um desserviço, não apenas
ao território que governam, mas a humanidade inteira.
Se
a Venezuela vive hoje um inferno, lembremos que também no reino das trevas há
um demônio que domina, e esses seres são difíceis de derrubar. Tarefa difícil,
porém, não impossível.