Nas asas da demagogia
Quarta-feira,
25 de maio
Confesso
que algumas coisas que leio, vejo, ouço, me deixam por vezes perplexo, por
vezes incrédulo, por vezes preocupado, como por exemplo o que ouvi, ou melhor
que li, em uma entrevista de Sérgio Reis ao jornal Folha de São Paulo,
publicada hoje. Reis é bolsonarista de carteirinha.
E
os bolsonaristas de carteirinha parecem que foram todos fabricados no mesmo
molde, não importa se são ricos, ou pobres, letrados ou ignorantes. Acho que
esse exemplifica bem o que chamamos de lavagem cerebral.
E
para eles, a Globo, a Rede Globo é a grande inimiga. A culpada de todos os
males pelos quais o país atravessa. É risível, mas é verdade.
E
Sérgio Reis, saindo, desse mesmo molde, não seria diferente. O jornalista Gustavo
Alonso que é o entrevistador, entra no assunto da novela Pantanal, novela de
grande sucesso, exibida pela extinta TV Manchete, em 1990. A Globo exibe
atualmente um remake da novela também com grande sucesso, em horário nobre.
Na
versão antiga, Sérgio Reis, interpretava o peão Tibério, vivido na nova versão
por Guito, ator revelação da novela. Então Sérgio Reis assiste a novela pela
questão do saudosismo, e também porque dois grandes amigos dele atuam na
novela: os cantores Almir Sater e Renato Teixeira. Teixeira fez participação
especial apenas na primeira fase da novela. Entretanto, a filha dele interpreta
a personagem Maria Bruaca, que, na novela vive uma personagem enganada e
maltratada psicologicamente pelo marido, e após descobrir a traição dele, muda
de atitude, assume as rédeas da própria vida.
Então
Sérgio tem essa ligação afetiva e sentimental com a novela apesar de não atuar
no remake de Pantanal exibido pela Globo. Em meio aos seus comentários sobre a
novela ele dá um jeito de destilar suas críticas a emissora.
O
cantor fala também que respeita pessoas de esquerda, e que algumas delas são
seus amigos. Que, inclusive o candidato a presidente, Lula, é fã dele, que tem
todos os seus discos. Também diz que é amigo de Bolsonaro, e que foram colegas
na Câmara dos Deputados na época em que Reis também era deputado, e que torcem
pelo mesmo time e essas coisas. O cantor segue falando de vários assuntos,
inclusive da confusão em que se meteu por ocasião dos atos antidemocráticos em
meados do ano passado.
Porém,
o que mais me chamou a atenção nessa entrevista foi apenas uma frase. A certa
altura da entrevista o repórter questiona o cantor: “E se Bolsonaro não for para o segundo turno? ”. Sérgio Reis
responde então: “Ele ganha no primeiro.
Não tem como! De cara. Só [não ganha] se roubarem”.
Isso,
caros leitores e leitoras, é o que me preocupa. Pois é Sérgio Reis falando, mas
não é apenas ele. Na frase dita pelo cantor com tanta ênfase, está contido o
pensamento de milhões de pessoas que ainda apoiam Bolsonaro. É esse tipo de
raciocínio que está por trás das demandas de Bolsonaro na questão das urnas
eletrônicas, e na desconfiança que tenta, a todo custo, lançar sobre elas, e
sobre o processo eleitoral de forma geral. Daí os embates com o STF, com
Alexandre de Moraes, e tudo o mais.
É
uma narrativa que se tenta construir. E sabemos que, para as mentes mais
fracas, uma mentira contada centenas de vezes toma corpo de verdade.
E qual a narrativa que o bolsonarismo almeja seja dominante na sociedade brasileira: a de que apenas e tão somente Bolsonaro pode ganhar a eleição. Se algum outro candidato ganhar, principalmente se for o Lula, as eleições brasileiras terão sido uma imensa fraude. Esse raciocínio torto também revela um flagrante desrespeito à maioria da população brasileira, se essa maioria assim decidir que não quer mais Jair Bolsonaro como presidente.
Nesse
evento, em um discurso pra lá de demagógico, Bolsonaro disse que só Deus o tira
da cadeira da presidência. “A oração é
individual de cada um, pertencemos a nação mais cristã do mundo, o Brasil é uma
referência para o globo todo, um país que tem vocação para o futuro sem se
descuidar do presente. Juntos, com fé, atingiremos os nossos objetivos. É uma
missão que tenho e só Deus me tira daquela cadeira. Somos democratas,
respeitamos nossa Constituição. É um dever meu como chefe do Executivo fazer
com que todo aquele que esteja fora das quatro linhas da Constituição venham
para dentro da mesma. É a maneira que temos de viver em paz e em harmonia e
sonhar com um futuro promissor para todos”.
Percebem
que em todos os seus discursos, Bolsonaro, veste uma roupa ideológica que não é
dele. De onde é que ele tirou essa de que é democrata se está a todo o tempo
tumultuando o processo democrático, subvertendo-o. Além do que, que joga fora das
quatro linhas da Constituição é ele próprio.
Ele
também falou acerca de liberdade: “Sabemos
o quão importante é a liberdade de religião e a de expressão no Brasil. Tenho
certeza, assim como entrei como praça [no Exército] há mais de 40 anos, quando
jurei dar minha vida pela pátria, que hoje daremos nossa vida pela liberdade.
Esse é o bem maior em um país que se diz democrático. Essa é a razão maior de
lutarmos pelo nosso objetivo, a liberdade é mais importante que a própria vida,
a história nos mostra isso”.
A
mim, me parece um raciocínio meio torto esse de dizer que a liberdade é mais
importante que a própria vida. A vida é o bem maior. Se vida não liberdade, não
há nação, não educação, enfim, não há coisa alguma.
Há
quem diga que todo esse apego de Bolsonaro à cadeira presidencial não tem nada
de nobre por trás disso, mas, sim, o medo de ser preso, ele e seus filhos que
estão envolvidos em escândalos de corrupção.
Talvez
isso explique o desespero do presidente em lançar sombras de desconfiança em um
processo eleitoral que é respeitado em todo o mundo por sua eficiência e
agilidade.
É
preciso então vociferar de todos os lados, e interferir onde puder interferir,
a fim de ser reeleito. E a Petrobrás tem sido uma vítima da sanha eleitoreira
do presidente. No afã de conter a alta dos combustíveis e, por tabela, a dos
preços também, o governo decidiu, mais uma vez, trocar o presidente da estatal.
Na noite da segunda-feira, 24, o presidente resolveu fazer, mais uma vez, a dança das cadeiras na presidência da Petrobrás, e demitiu José Mauro Coelho, que estava no cargo há apenas 40 dias. Ele havia sido nomeado presidente da empresa no mês de abril. Antes dele, já haviam assumido a presidência da estatal Roberto Castello Branco e Joaquim Silva e Luna.
Caio Paes de Andrade
Para
o lugar de José Mauro Coelho foi indicado o nome de Caio Paes de Andrade, que é
homem de confiança de Paulo Guedes. Caio atuava no ministério da Economia. Ele
tem um bom currículo. É formado em Comunicação Social pela Universidade
Paulista, pós-graduado em Administração e Gestão pela Harvard University e
mestre em Administração de Empresas pela Duke University.
Apesar
disso, seus requisitos profissionais não preenchem o estabelecido pelas Lei das
Estatais, aprovada no governo de Michel Temer, e adotadas pela Petrobrás em seu
estatuto social.
Segundo
essa lei o postulante a cargos de direção deve ter experiência de 10 anos
atuando na mesma área de atuação da empresa pública que pretende gerir, ou
quatro anos chefiando empresa de porte equivalente, ou ainda, cargo de docente
ou pesquisador em áreas de atuação da estatal para a qual foi nomeado.
Mas
para o presidente, nada disso importa. Ele quer apenas mais uma marionete. Alguém
que sente na cadeira da presidência da Petrobras e faça tudo o que ele quer,
assim como fez com o ministério da Saúde, do Meio Ambiente, da Justiça e
Segurança Pública com Sérgio Moro, apenas para citar esses exemplos.
Mas
a Petrobrás é diferente de um ministério do governo. É uma empresa de capital
aberto. Tem sócios, tem acionistas. É regida pelas leis do mercado
internacional. O sócio majoritário da empresa é a União, mas a União não é dona
da Petrobras.
Então
o que o governo quer fazer é segurar os preços dos combustíveis. O que ele
tenta fazer é o mesmo que eu tentava fazer quando criança, em época de chuva.
Eu morava em área rural, no interior do Rio Grande do Norte. Quando chovia, a
meninada fazia festa. Era tanta água escorrendo por aquelas terras...
Então
o que fazia a meninada, inclusive eu? A gente brincava de represar a água que
corria veloz. A gente até conseguia. E ficava feliz com isso. Mas apenas por
alguns minutos. Depois a água ia se acumulando, se acumulando, e, obviamente, conseguia
romper as frágeis barreiras que construíamos, e seguia novamente seu curso em
direção ao rio, seu destino.
Não
adianta querer segurar o preço dos combustíveis. Depois a água rompe a barreira
e o preço vem mais alto e em dobro para todos nós. A ex-presidente Dilma
Rousseff fez isso também, e o resultado foi desastroso. E será também com
Bolsonaro. É uma atitude puramente eleitoreira da qual a população brasileira,
principalmente os mais vulneráveis pagarão a conta. Mais cedo ou mais tarde. Ou
melhor, depois das eleições.
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