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Farra na Corte

Posted by Cottidianos on 00:15

Segunda-feira, 13 de maio



Caro leitor, cara leitora, responda rápido: Quantos Brasis existem dentro dessa imensa pátria em que vivemos?
Se você respondeu que não existem vários Brasis dentro de um só, acertou, afinal, apesar de todas as diferenças culturais somos todos filhos da mesma pátria. Sendo assim, não existe um Brasil do Norte, ou do Sul ou do Sudeste, e assim por diante. Afinal, estamos todos sob a egíde das mesmas leis e sob o signo dos mesmos direitos.
Se respondeu que temos cinco, por causa, justamente das diversidades culturais, economicas e de meio ambiente que caraterizam as nossas cinco regiões, também acertou. Afinal, se analisarmos bem a divisão geográfica de nosso país, veremos que cada uma possui um quê de especial, de diferente, apesar de partilharem da mesma lingua, estamos dentro do mesmo sistema jurídico.
E se — pensando nos privilégios que algumas classes desfrutam em relação a maioria — você respondeu que existem dois Brasis dentro de nosso imenso Brasil, também acertou, e, quem sabe, tenha chegado mais próximo da verdade.
Afinal, nem precisamos nos debruçar sobre dados e números estatisticos para saber que há um Brasil para os brasileiros, que trabalham de sol a sol nos seus empregos formais e informais. E, nessa categoria estão inclusos desde a empregada doméstica, seguranças, auxiliares de escritório, e as mais diversas categorias de profissionais, até os patrões, aqueles que comandam pequenas, médias e grandes empresas.
Para os brasileiros deste primeiro Brasil recaem mais obrigações que direitos, inclusive o peso de altas cargas tributárias.
Apenas uma análise superficial, ou um olhar para o lado que vemos essa realidade.
O outro lado da moeda, e que vemos estampadas constantemente nas manchetes de jornais, revistas impressos e onlines, é o Brasil dos homens públicos. É como a imensa maioria da população brasileira estivesse atravessando um deserto — regiões de clima predominante seco e quase sem preciptações chuvosas ao longo do ano — enquanto outros poucos, muito poucos em relação a essa grande maioria que atravessa o deserto, estão desfrutando de um oasis.
Os oásis são regiões milenares assim como os próprios desertos que, mesmo estando em meio a estes, condições impostas pela própria natureza, permitem que neles se encontre água, e se desenvolvam plantas e animais, proporcionando assim uma melhor condição de vida para que os nele habitam. Uma verdadeira dadiva que contrasta com o calor e o clima secos das regiões deserticas.
 Nesse segundo grupo de um Brasil que não é o Brasil real estão os membros dos poderes: Executivo, Legislativo, e Judiciário.
É comum e rotinieiro nestes oásis da vida pública os salários astronômicos. No oásis do legislativo, por exemplo, os trabalhadores não tem que se preocupar com quase absolutamente nada. O tanque do carro vive sempre cheio, pode-se falar ao celular à vontade que as contas estarão sempre pagas e em dia. Quando se quer viajar, tirar uns dias para aquelas férias dos sonhos, para qualquer lugar que se queira, basta escolher o destino. Planos de saúde dos melhores e com reembolso integral de gastos com despesas médicas. A jornada de trabalho resume-se a três dias por semana. Além do auxílio moradia, que por si só também já é uma agressão ao bolso do contribuinte, os congressistas ainda dispõem de ajuda de custo para mudanças. Traduzindo isso em míudos, cada um deles recebe dois salários a mais no início e no fim do mandato.
Isso apenas citar bem de passagem, os privilégios da classe política. Usando uma expressão francesa bem conhecida: uma coisa bem “"en passant” para falar disso. O interessante, é que a moralidade da coisa pública foi promessa de campanha da quase totalidade dos candidatos.
Essa questão, porém, caro leitor, merece um capítulo à parte.
 Aos que habitam o oasis do executivo e do judiciário também eles desfrutam de mordomais e mimos.
Hoje, entretanto, nos detenhamos, mais uma vez, no Supremo Tribunal Federal.
Em fins do mês passado, o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) divulgou dados que mostram que no trimestre encerrado em março o número de desempregados subiu para 12, 7%, o que representa uma quantia de 13, 4 milhões de pessoas desempregadas.
Outro levantamento feito pela Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC) indica que a crise economica fez com que 226,5 mil lojas fechassem às portas no Brasil.
Enfim, o país ainda atravessa uma situação econômica complicada. As autoridades brasileiras deveriam ser as primeiras a usar de bom senso e darem exemplos de que estão se esforçando para darem a sua parcela de contribuição para que o país se estabilize economicamente, afinal em tempos de crise, cada um deve dar sua parcela de contribuições e sacrifícios até que a situação volte ao normal. Mas, como temos visto, não é bem isso que acontece.
Na sexta-feira, 26 de abril, o Supremo Tribunal Federal (STF), divulgou informações sobre um pregão eletrônico, para “serviços de fornecimento de refeições institucionais”. Até aí, tudo bem. Normal fazer isso. O que assustou a todos foi o preço dessas tais “refeições institucionais”. R$ 1.134 milhão a serem pagos ao fornecedor dos produtos.
No meu são oferecidos: café da manhã. “brunch”, almoço, jantar, e coquetel. Os pratos? Finíssimos. Bobó de camarão. Camarão à baiana. Medalhões de lagosta com molho de manteiga queimada. Bacalhau à Gomes de Sá.
Achou pouco? Ainda tem mais.
Frigideira de Siri. Moquecas capixaba e baiana. Arroz de pato. Vitela assada; codornas assadas. Carré de cordeiro. Medalhões de filé. Tournedos de filé. Molho mostarda, pimenta, castanha de caju com gengibre.
Todo bom cardápio tem que ter uma boa bebida para acompanhar. Aqui, principalmente aqui, isso não poderia faltar. O vinho merece um cuidado especial na escolha.
Os tinto fino seco, tem que ser de Tannat ou Assemblage, que contenha esse tipo de uva, e tem que ser de safra igual ou posterior a 2010. Esses devem ser envelhecido em barris de carvalho francês, americano, ou ambos, de primeiro uso, por um período mínimo de 12 meses.
Já os do tipo Merlot, é exigido que seja de safra igual ou posterior a 2011, envelhecido em barris de carvalho, de primeiro uso, por um período mínimo de 8 meses.
Já os vinhos brancos, feitos de uva Chardonnay, devem ser de safra igual ou posterior a 2013.
Detalhe: Para todos os vinhos é exigido que tenham, no mínimo, quatro premiações internacionais.
Caipirinha também não pode faltar, e a exigência para elas é que sejam feitas com cachaça de alta qualidade, envelhecidas em barris de madeira nobre por 1 a três anos.
O edital acabou provocando um certo desconforto entre alguns ministros da corte e também por parte dos servidores daquele órgão.
Na segunda-feira 06 de maio, a juíza federal, Solange Salgado, do Distrito Federal, decidiu suspender o edital do STF com a compra de comida e bebidas finas. A decisão da juíza fundamentou-se em uma ação popular movida pela deputada federal Carla Zambelli (PSL-SP). Na ação, a deputada considerava o valor do pregão, R$ 1,13 milhões, como sendo aviltantes. Ela também citou como desnecessária a compra dos produtos.
A juíza considerou que a compra dos itens citados no edital não era necessária ao bom funcionamento do Supremo Tribunal Federal, além de destoar gritantemente da atual realidade brasileira.  Uma falta de consideração para com o cidadão que paga uma sobrecarga de impostos.
Retaliação. Foi assim que alguns integrantes do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), do qual o ministro Dias Toffoli é presidente, analisaram a atitude da juíza Solange Salgado ao proferir a decisão. Segundo eles, a juíza já havia sido punida pelo CNJ por ter praticado supostas irregularidades na Associação de Magistrados Federais da 1a Região.
Logo na terça-feira, 7, o Tribunal Regional da 1a Região, cassou a decisão da juíza da primeira instância da Justiça Federal do Distrito Federal, que determinava a suspensão da licitação da compra de itens alimentares de luxo para o STF. A decisão foi tomada pelo desembargador federal Kassio Marques, que é vice-presidente do TRF1.
Em sua decisão o desembargador sustenta que a compra de tais itens não é “lesiva a moralidade administrativa”, pois a Corte também desempenha o papel de “relacionamento e representação institucionais”.
Em seu despacho, a juíza considerou a realidade social do país, e o fato de que o Brasil vem enfrentando grave crise econômica e deficiências orçamentarias. Kassio Marques, entretanto, considerou que a Solange Salgado possui uma “visão distorcida dos fatos, nutrida por interpretações superficiais açodadas”.
Em meio a toda essa discussão, vale trazer a lembrança de que, em outubro de 2018, por decisão do ministro Dias Toffoli, o gabinete da presidência passou por uma reforma milionária, que incluía a substituição de carpetes por piso-frio, e até a instalação de um chuveiro.
A obra tinha conclusão prevista para o mês de janeiro e custou, pelo menos, R$ 443 mil aos cofres públicos.
Em tudo isso, fica uma dúvida: Será que os ministros do Supremo pensam que estão vivendo nos Emirados Árabes, ou em algum outro país, onde o dinheiro “corre solto”?  Pois a impressão que dá é que eles estão fora da realidade brasileira.
É certo que eles atendem diversas autoridades nacionais e internacionais. Porém, acredita-se que qualquer um deles entenderia se lhes fosse servido um cardápio de comidas e bebidas mais modesto, considerando a situação econômica do país.
Discute-se muito a reforma da previdência, e ela não deixa de ter sua importância. Mas enquanto não forem discutidos e extinguidos esses privilégios absurdos que desfrutam membros do poder Legislativo, Executivo e Judiciário, será muito difícil que as contas públicas deixem de operar no vermelho.
Quem, na Câmara, no Senado, ou no Palácio do Planalto, terá coragem de levantar essa bandeira do fim dos privilégios? Pense o caro leitor, e tire suas conclusões.

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