Quarta-feira,
06 de dezembro
“Meu caminho
pelo mundo eu mesmo traço
A Bahia já me
deu régua e compasso
Quem sabe de mim
sou eu - aquele abraço!
Pra você que me
esqueceu - aquele abraço!
Alô, Rio de
Janeiro - aquele abraço!
Todo o povo
brasileiro - aquele abraço!”
(Aquele
Abraço – Gilberto Gil)
Cidade
Maravilhosa, purgatório da beleza e do caos
Cidade
maravilhosa
Cheia
de encantos mil
Cidade
maravilhosa
Coração
do meu Brasil
Berço
do samba e das lindas canções
Que
vivem n'alma da gente
És
o altar dos nossos corações
Que
cantam alegremente
(Cidade Maravilhosa – Marchinha de
carnaval)
Rio
40 graus
Cidade
maravilha
Purgatório
da beleza e do caos
Capital
do sangue quente do Brasil
Capital
do sangue quente
Do
melhor e do pior do Brasil
...
Comando
de comando submundo oficial
Comando
de comando submundo bandidaço
Comando
de comando submundo classe média
Comando
de comando submundo camelô
Comando
de comando submáfia manicure
Comando
de comando submáfia de boate
Comando
de comando submundo de madame
Comando
de comando submundo da TV
Submundo
deputado - submáfia aposentado
(Rio
40 graus – Fernanda Abreu)
Duas
canções. Dois retratos do Rio de Janeiro. Retratos, diga-se de passagem, diametralmente
opostos. Dois momentos absolutamente
distintos da história da cidade carioca.
Quando
a marchinha de carnaval, de autoria de André Filho, foi gravada pela primeira
vez em 1934, o Rio deveria ser, realmente, uma cidade maravilhosa e
encantadora.
De
lá pra cá... Isso é outra história. A violência que começou discreta nos morros
cariocas, e que não teve o pulso firme das autoridades em colocar a cidade nos
eixos logo no início, se alastrou, desceu dos morros para o asfalto, para
angústia dos cariocas.
De
Cidade Maravilhosa virou Rio 40 graus, cidade purgatório da beleza e do caos,
composta por Fernanda Abreu, e lançada por ela mesma, em 1992.
Da
violência advinda do trafico de drogas e suas ramificações já se sabia. Talvez o
que não se sabia era que havia outro tipo de bandidagem no submundo carioca, quiçá,
tão ou mais perigosa e mais devastadora que a violência policial tão estudada,
debatida, e temida: a corrupção que sugava os recursos financeiros do estado. O
que não se sabia também eram que existiam outros bandidos tão ou mais perigosos
que os bandidos que empunhavam fuzis e metralhadoras nos morros cariocas: os
bandidos de terno, gravata, e caneta na mão, e que governavam e davam as cartas
no submundo político do estado.
O
Rio de Janeiro continua tendo suas belezas naturais que encantam brasileiros e
estrangeiros, mas hoje já se sabe que o cartão postal do Brasil anda um pouco
desbotado.
O
Cristo Redentor continua de braços abertos abençoando o povo carioca. Do alto,
vê a assiste a tudo. Para os bons ele sorri e abençoa... Para os maus diz, no
silencio do seu coração: um dia o acerto de contas chegará, e nesse dia haverá
choro e ranger de dentes...
Do palácio para
a cadeia
A
Lava Jato, em mais uma operação denominada Boca de Lobo, abocanhou mais um
bandido de alto gabarito e de baixa moral que comandava o Rio de Janeiro.
Na
quinta-feira, 29 de novembro, a Polícia Federal prendeu o governador do estado
do Rio de Janeiro, Luiz Fernando Pezão. Ele tornou-se o primeiro governador
carioca a ser preso no exercício do mandato. A Polícia Federal deu voz de
prisão a Pezão no alvorecer do dia. Eram seis horas quando os policiais
chegaram ao Palácio das Laranjeiras, residencial oficial do governador. Ainda lhe
deram uma colher de chá e permitiram que ele tomasse o café da manhã. Depois,
gentilmente, o conduziram a uma residência nada luxuosa: a cadeia. Além do
governador, foram presas mais sete pessoas nessa operação policial. 31 mandatos
de busca e apreensão foram expedidos.
A
operação Boca de Lobo foi baseada na delação premiada de Carlos Miranda, que
havia sido operador financeiro do ex-governador Sérgio Cabral, também ele, atrás
das grades. Com a prisão de Pezão, assumiu o governo o vice, Francisco
Dornelles, 83 anos.
Segundo
o delator Carlos Miranda, na época em que Pezão era vice governador de Sérgio
Cabral, era pago a ele, Pezão, uma mesada de R$ 150 mil. Esse dinheiro tinha
como fonte de origem as empreiteiras e fornecedoras que tinham contrato com o
governo do estado. Ainda segundo Miranda, entre 2007 e 2014, além das mesadas,
Pezão, também recebeu um décimo terceiro salário, e dois gordos bônus de R$ 1
milhão cada um.
Sérgio
Cabral foi preso em 2016, porém, mesmo depois disso, os esquemas criminosos
continuaram de vento em popa no governo do Rio. Além desse esquema com as
empreteiras, Pezão também é acusado de receber dinheiro de esquemas criminosos
no Tribunal de Contas do Estado União do Estado do
Rio de Janeiro, e de receber propina da Fetranspor. Segundo a
delação premiada de Miranda também era Pezão o operador do esquema de corrupção
montado pelo ex-governador, Sérgio Cabral.
O
governador preso começou a carreira no governo de Rosinha Garotinho. Na época ele
ocupava o cargo de subsecretário de governo e coordenação. Em 2006, formou
chapa com Sergio Cabral. A dupla foi eleita, conseguindo se reeleger para o mandato
subseqüente. Em 2014, Sérgio Cabral renunciou ao governo do Estado em meio à denúncias
de corrupção, e Pezão assumiu o governo.
Ascensão e queda
de uma promessa da política nacional
Sergio
Cabral, ex-governador do Rio, preso no complexo de Gericinó, na capital
carioca, foi mais uma vez condenado em um processo que tramita na 7a Vara
Federal Criminal do Rio de Janeiro. Foram mais 14 anos e meio de reclusão em
regime fechado. A sentença foi dada na segunda-feira (03). Com a pena
aplicada nessa sentença pelo juiz Marcelo Bretas já somam 197 anos e 11 meses
de prisão. É caros leitores, o ex-governador já acumula quase 200 anos de
prisão por ter saqueado o Rio de Janeiro, e ter enriquecido ilicitamente à
custa do contribuinte.
Nesse
mesmo processo, além de Sérgio Cabral, também foram condenados Susana Neves
Cabral, ex-mulher do ex-governador, e o irmão dele, Maurício Cabral. Também foram
condenados Alberto Silveira Conde, contador da FW Engenharia, e Flávio Werneck,
dono da FW Engenharia.
O
homem que acumula tantas penas e tantas condenações por corrupção poderia, hoje
ser presidente do Brasil, mas a ambição desmedida jogou na lama sua fama e
reputação. Preferiu o dinheiro ao poder. Como diz o personagem Frank, na série
americana, House of Cards: “O dinheiro
compra a mansão enorme em Sarasota que começa a ruir em dez anos. O poder é a
antiga construção de pedras que permanece por séculos”. O que Sérgio Cabral tem descoberto
ultimamente é que também as grades da prisão são construções de pedra que podem
durar por séculos.
Filho
do escritor, jornalista, compositor, e pesquisador brasileiro, Sérgio Cabral
Santos — um dos fundadores de O Pasquim — Sérgio Cabral Filho, começou a vislumbrar
as glórias da vida pública quando ingressou na carreira política nos anos 80. Naquela
época, Cabral, um jovem de 19 anos, carioca do Engenho Novo, entrou para a ala
jovem do PMDB. Em 1982, foi um dos principais articuladores na vitoriosa campanha
do pai a vereador.
Seu
passaporte para o ingresso real na vida pública veio quando, em março de 1987, assumiu
a Diretoria de Operações da Turisrio, Companhia de Turismo do Estado do Rio de
Janeiro, no governo Moreira Franco.
Em
1990, elegeu-se deputado estadual, tendo sido reeleito em 1994, e 1998. Nesses
primeiros anos, era um político que levantava bandeiras bastante discretas, e
que não provocavam — e ainda hoje não provocam — muita polêmica, como por
exemplo, os direitos da juventude, a questão dos albergues, a defesa dos
direitos dos idosos. Ao que parece, ele tinha medo de brincar com fogo e
desviava de temas controversos.
Em
1992, havia se candidatado a prefeitura do Rio. Trocara o PMDB pelo PSDB, mas
mesmo com o apoio de grandes nomes da política como Fernando Henrique Cardoso e
José Serra, não obteve sucesso na empreitada.
Em
1995, o jovem que, antes de se filiar ao PMDB levava uma vida despretensiosa,
junto à família e os amigos, assumiu a presidência da Alerj (Assembléia
Legislativa do Rio de Janeiro), e começou a experimentar o poder de uma forma
mais concreta.
Se
a cena política é um teatro onde o fingir bem é a arte do negócio, Sérgio
Cabral assumiu na Alerj um papel moralizador, um exemplo de ética e zelo pela
coisa pública. Para começar dispensou o uso do carro oficial, e cortou outros privilégios
a que tinha direito. Implantou um projeto de moralizar a Assembléia. Naquela época
havia naquela casa um auxílio alimentação de R$ 800 mil a que os deputados
tinham direito. Cabral resolveu cortar esse benefício.
Em
seu novo papel, chamou para si os temas polêmicos, como o do combate aos altos
salários, aos ditos salários de marajás. Demitiu 316 servidores e pensionistas
que ganhavam um salário de R$ 4.700 por mês. Isso lhe rendeu uma ameaça de
morte aos filhos.
Com
o discurso moralizador, vieram os holofotes, os amigos e,claro, os inimigos...
Ah, também veio o dinheiro, e com ele a primeira suspeita de corrupção
atribuída a Cabral: a compra de uma casa em Mangaratiba, no sul do estado, em
1998.
Marcello
Alencar (PSDB) era governador do Rio e entrou com pedido de improbidade
administrativa contra Cabral. Porém, a popularidade e o poder de Sérgio Cabral
estavam em alta. Ele havia saído das urnas nas eleições de 98 como o deputado
estadual mais votado do Brasil. Tudo isso contribuiu para que as investigações
sobre a casa em Mangaratiba — casa é um modo de dizer, pois o imóvel é uma
luxuosa mansão de veraneio — fossem colocadas embaixo do tapete.
A
desavença com Alencar, seu companheiro de partido fez com que ele deixasse o
PSDB e voltasse ao PMBD. Em 2002, se candidatou ao senado e venceu as eleições.
Depois de uma atuação discreta no senado, renunciou ao cargo pois havia sido
eleito governador do Rio. Voltava para casa em grande estilo.
E
voltou com os discursos e ações moralizadoras ainda mais forte, principalmente,
nas áreas da segurança e da saúde. Entretanto, mais uma vez era tudo uma
máscara, uma farsa. Logo se aliou aos poderosos e desonestos em seu projeto de
enriquecimento fácil e rápido. Era o todo poderoso do Rio, porém o dinheiro o
fascinava ainda mais que o poder.
Mas,
como toda Roma tem seu apogeu e o seu declínio, o declínio de Cabral começou
quando ele começou a amizade com o empresário Fernando Cavendish. No Rio de
Janeiro, em face de seus compatriotas usava máscara de bom moço, empenhando na
luta contra a corrupção, mordomias, e privilégios.
Longe
da terra natal, nos luxuosíssimos restaurantes de Paris, era hora e momento de
torrar o dinheiro ganho com os contratos ilícitos firmado com as empreiteiras. Foi
num desses jantares nababescos que Fernando Cavendish presenteou Adriana
Ancelmo, mulher de Sérgio Cabral, com um anel no valor de R$ 800 mil. Era um
pequeno mimo para agradecer os grandes favores que o governo de Cabral concedia
ao empresário. Afinal, Cavendish havia ganhado quase R$ 1,5 milhões em contratos
firmados entre a Delta e o governo do Rio.
Era
assim que funcionava: Cabral cobrava mesada das empreiteiras para que elas
ganhassem os contratos com o estado. Esse esquema durou de 2007 a 2014.
Hoje
o todo poderoso amarga as celas e a solidão da prisão.
Além
de Sergio Cabral e Pezão, também outros dois governadores do Rio já
experimentaram a solidão da prisão: Antonio Garotinho e sua mulher, Rosinha
Garotinho.
Mas
não para por aí. No Rio também já foram presos conselheiros do Tribunal de
Contas do Estado. Recentemente foram presos 10 deputados, um deles recém-eleito
nas últimas eleições. Também no Rio já foram presos também quadrilhas de
policiais que, ao invés de defender a lei e a ordem, se aliavam aos bandidos
para adquirir vantagens em dinheiro.
Por
tudo isso, o Rio de Janeiro é, ao mesmo tempo cartão postal, retrato e pulmão do Brasil.
Um pulmão manchado pelo vício da corrupção que há tempos saqueia o estado e
deixa o povo no abandono quando se trata de questão importantes como educação,
saúde e segurança.
É
impossível não fazer comparações. Fernando Collor assumiu um discurso
moralizador e deu no que deu... Sérgio Cabral fez a mesma coisa no Rio de
Janeiro... Agora chega Jair Messias Bolsonaro com um discurso idêntico. Queira
Deus que, mais uma vez, não nos decepcionemos.
Cristo
Redentor, Rogai por nós.