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O Porsche de Jesus
Posted by Cottidianos
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00:31
Segunda-feira,
19 de outubro
“Um certo dia um homem esteve aqui
Tinha
o olhar mais belo que já existiu
Tinha
no cantar uma oração.
E
no falar a mais linda canção que já se ouviu.
Sua
voz falava só de amor
Todo
gesto seu era de amor
E
paz, Ele trazia no coração”.
(O Homem – Roberto Carlos)
Caro
leitor, em um sentido histórico, e disso excluo qualquer profissão de fé sua no
cristianismo, quando ouvimos a palavra, Jesus,
que sentido forma-se em nossa mente? A de um homem rico, abastado, opulento e
desonesto? Certamente que não. Seja você católico, judeu, praticante das
religiões afro-brasileiras, ou de qualquer outra denominação religiosa, quando
ouve a palavra Jesus, você logo forma na mente a ideia oposta a questão acima
apresentada, ou seja, a de um homem humilde, simples, pronto e disposto a
amparar, socorrer e ajudar os mais necessitados, ou se preferirem uma linha
marxista, ou Teologia da Libertação, aos excluídos da sociedade.
Pelo
menos é essa a imagem de Jesus que nos é relatada na Bíblia, livro sagrado dos
cristãos. Ora, se essa é imagem de Cristo no livro santo, não deveriam os seus
seguidores adotarem-na como regra e conduta de vida? Claro, não quero aqui
generalizar, há cristãos dignos e honestos, há evangélicos dignos e honestos,
sem dúvida, senão fosse assim, este mundo já teria virado um inferno. Falo aqui
das exceções, que fique bem claro. Falo daqueles que vão à Igreja, e de Bíblia
em punho, batem no peito, e dizem “Eu amo a Jesus”, e que pronunciam outras
frases e discursos bonitos, mas quando saem dali, esquecem por completo suas
louvações e frases de efeito, guardam seus livros santos na gaveta, ou o deixam
em cima da mesa, ou em uma estante de livros, apenas como forma de adorno, e
fazem tudo completamente o oposto do que foi pregado, ardentemente, pelo
pastor, ou pelo padre, no caso dos católicos.
E quando
esse fiel seguidor do evangelho é um homem público, um político influente, por
acaso não aumenta sua responsabilidade de cristão perante a igreja e perante a
sociedade? Sem dúvida que sim, a responsabilidade de colocar em pratica os
preceitos evangélicos aumenta, e muito, pelo simples fato de que ele, o homem
público, ou político, está colocado em uma posição de destaque que o transforma
num baluarte, num lugar seguro no qual os mais fracos podem se apoiar. Se ele
não corresponde a essa expectativa, faz com que muitos daquele que, realmente
tem fé, a percam. E isso uma questão séria, pois se a fé pode ser comparada a
uma fortaleza, e se essa fortaleza vier a ruir por causa dos atos dos homens, é
temeroso o que se pode erguer em seu lugar, pois tanto pode ser construída uma
fortaleza ainda mais forte, quanto pode ser erguida uma casa frágil, que qualquer
vento é capaz de derrubar.
Eduardo Cunha |
E aqui,
abordo um personagem que há alguns dias vem sendo centro de escândalo de
corrupção. Trata-se de Eduardo Cunha, deputado federal, pelo PMDB, do Rio de
Janeiro. Cunha é o atual presidente da Câmara dos Deputados, e tem sido acusado
pelo Ministério Público Federal por lavagem de dinheiro e corrupção. Ele é
suspeito de ter recebido propina sobre contratos da Petrobrás. Apesar de todas
as evidências, o deputado continua negando todas as acusações, aliás, essa é a
estratégia adotada por todos os corruptos que são pegos com a “boca na botija”.
Porque
comecei o texto falando de Jesus? Porque Eduardo Cunha faz questão de destacar
em sua biografia que é evangélico, conservador, e também por outro fato
noticiado na semana passada, que chega a ser hilário, e para os religiosos,
blasfemo. O fato que chamou a atenção de todos, é que o deputado federal,
Eduardo Cunha, evangélico, conservador, possui uma frota de 8 carros de luxos, carrões
mesmo, desses que só milionários possuem, com o nome de Jesus.com. Dentre essas
joias automobilísticas, estão um Porsche Cayenne (R$ 429.478 mil), um Ford Edge
V6 (R$ 120.165 mil), e um Ford Fusion NA WDGTDI, no valor de R$ 92.693 mil. Apenas
em carros de luxo, o patrimônio do deputado soma 940.00 mil reais.
Talvez,
em algum momento da história, a religião tenha servido de parâmetro para julgar
as pessoas. Se fosse evangélico, ou bom católico era considerada uma pessoa
acima de qualquer suspeita. Hoje em dia, quem julga pela religião ou pela
aparência, pode se dar mal, pois a hipocrisia corre solta em todos os setores
da sociedade, e é preciso estar de olhos bem abertos para ver não com os olhos
da aparência, mas sim com os olhos do coração. Por exemplo, quem ouvia o
programa evangélico, do qual Cunha participa, diariamente, em uma rádio
carioca, aqueles que visitavam suas páginas religiosas na Internet, e aqueles
que liam suas mensagens bíblicas em redes virtuais, eram capazes de jurar que
ele era um exemplo de como se deve viver o evangelho.
Abaixo,
compartilho um texto escrito pelo jornalista Juan Arias, e publicado na página
do site do El País Brasil, fazendo uma reflexão sobre este assunto.
***
A
blasfêmia do Porsche de Jesus.com
O
carro de luxo de Cunha me fez pensar nos milhares de evangélicos que sacrificam
parte de seus recursos para alimentar uma igreja
JUAN
ARIAS
Como
qualificar, desde um ponto de vista de sensibilidade religiosa, a união do nome
de Jesus a um Porsche de luxo proporcionada pelo presidente da Câmara, Eduardo
Cunha (PMDB-RJ), membro da Igreja Evangélica? E a situação é ainda pior se
existe a suspeita de que a frota de carros, cotados em mais de um milhão de
reais, que Cunha possui poderia ser um fruto maldito da corrupção política.
Para muitos cristãos deve ter parecido blasfêmia, um vocábulo que, em sua
acepção original, significa um “insulto a Deus” e, em seu sentido mais amplo,
representa uma irreverência em relação a algo considerado sagrado.
Cunha
é, segundo sua biografia, cristão evangélico, de uma igreja que considera Jesus
como o filho de Deus. E esse filho de Deus, segundo os textos sagrados, que os
evangélicos conhecem e sobre os quais meditam todos os dias, “não tinha onde
repousar a cabeça”, era mais um pobre entre os pobres, amigo e defensor de
todos os desamparados.
Talvez
o político e evangélico Cunha não seja o maior responsável por esse circo de
corrupção que suja a vida pública do Brasil e deixa atônitos, com seus números
milionários, os trabalhadores honrados que suam para ganhar um salário que
quase não é suficiente para cobrir suas necessidades. Cunha pertence, no
entanto, a uma igreja, que se inspira nos princípios cristãos, mas que não
esconde suas pretensões de conquista do poder político no Brasil, chegando a
sonhar com um presidente da República evangélico que se baseie mais na Bíblia
do que na Constituição.
Isso
faz com que os supostos escândalos de corrupção de Cunha, que poderiam ter
circulado através de firmas que levam o nome sagrado de Jesus.com, adquiram um
simbolismo negativo que não deixa de chocar e escandalizar duplamente.
Lendo
a notícia sobre o Porsche Cayenne registrado em nome da empresa Jesus.com,
propriedade da família Cunha, não pude deixar de me perguntar o que pensam
essas centenas de milhares de evangélicos sinceros, que, fiéis a seus princípios
religiosos, sacrificam, cada mês, de boa fé, uma parte de seus pequenos
recursos para alimentar uma Igreja cujos membros mais responsáveis se revelam
milionários e, o que é pior, acusados de enriquecimento ilícito.
O
fato me trouxe à memória a história de um trabalhador que perfurava poços com
uma ferramenta rudimentar e grandes esforços físicos. Levava ao trabalho um
pedaço de pão com salsicha para não perder tempo tendo que voltar a casa. Ouvi
quando ele comentou, enquanto secava as gotas de suor que escorriam por seu
rosto, que aquele mês estava em apuros porque não sabia se ia a poder pagar sua
parcela à Igreja evangélica à qual pertencia.
Temia
a reprovação do pastor e até o castigo do bom Deus. São dois mundos, que se
cruzam e que usam o nome de Jesus, para a esperança e a fé verdadeira, e também
para blasfemá-lo. “Raça de víboras”, assim o manso e pobre Jesus dos Evangelhos
caracterizava aqueles que, segundo sua própria expressão, “jogavam sobre os
ombros dos outros pesos que eles não podiam suportar”.
Dois
mil anos depois, aquelas palavras continuam a nos interrogar, enquanto seguem
vivos os novos Pilatos que lavam suas mãos ostentando inocência e que ainda se
perguntam: “O que é a verdade?”.
Uma
questão para a qual os brasileiros honrados, que amam e sofrem seu país,
gostariam de poder ter uma resposta nesses momentos difíceis, nos quais as
palavras perdem seu valor, ou são degradadas como a de Jesus, com o rótulo
blasfemo desse Porsche Cayenne S de luxo.
Até
onde e até quando se manterá contida a ira dos mansos que contemplam,
incrédulos, cada manhã, a novela de novas supostas e comprovadas
desmoralizações por parte daqueles que deveriam servir de guias e exemplos da
vida pública?
Jesus,
não o do Porsche de Cunha, mas o dos Evangelhos, afirmou que a verdade está
sempre nas mãos dos puros de coração e dos semeadores da paz. O ódio tem sempre
um sabor diabólico.
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