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Alvoroço em Marte
Posted by Cottidianos
on
15:57
Sábado,
10 de outubro
O
texto a seguir não é uma crítica à ciência e ao progresso, mas ao comportamento
do homem, que põe em risco a própria existência, e da casa em que vive.
***
“Alô, alô, marciano
Aqui
quem fala é da Terra
Pra
variar estamos em guerra
Você
não imagina a loucura
O
ser humano ta na maior fissura porque
Tá
cada vez mais down o high society”
(Alô, alô,
marciano – Rita Lee e Roberto de Carvalho)
Um robô motorizado foi visto na tarde
de ontem vagando pelo solo vermelho de Marte. O robô, trazido até o solo
marciano pela Sonda Curiosity, recolhia amostras de filetes de água salgada do
planeta. De acordo com interceptações nas comunicações, os dados colhidos pelo
robô estão sendo enviados ao planeta Terra. Há rumores de que, muito em breve,
esteja desembarcando no planeta vermelho, missões tripuladas por seres humanos.
A
matéria acima foi ao ar, em horário nobre, em uma dos principais telejornais de
Marte, e apesar de sucinta, logo causou grande alvoroço entre os marcianos. Durante
todo o restante da semana, este foi um dos assuntos mais comentados nas redes
sociais, TVs e jornais do planeta. Os habitantes do inóspito planeta não viam
com bons olhos essa aproximação dos terráqueos. Afinal de contas, há milhões de
anos eles acompanham, através de seus sofisticados sistemas de comunicação, os
passos dados pelos habitantes do planeta Terra.
Os
mais renomados pesquisadores foram chamados aos Centros de Conhecimento
Aplicado — o que na Terra equivale às universidades e circuitos universitários
— para discutir o assunto. “Ninguém, em sã consciência, poderia ver com bons
olhos essa aproximação”, afirmava um dos cientistas marcianos em debate em um
famoso Centro de Conhecimento.
Segundo
análise desse pesquisador, o homem já previa que a Terra estava agonizando, e
estava simplesmente buscando um novo lar para quando o seu lar habitual,
finalmente, chegasse ao fim. No ultramoderno auditório, lotado de estudantes
ávidos por conhecerem as razões dessa invasão terráquea, o professor mostrava
uma profusão de gráficos e imagens do enorme desequilíbrio do clima no planeta
água, que, segundo ele, estaria fadado a perder esse título em mais algumas dezenas
de anos.
Os
modernos aparelhos eletrônicos levavam os espectadores para uma viagem, quase
que, em tempo real, sobre a superfície terrestre. As cenas mostravam fatos
bastante desagradáveis, como por exemplo, florestas sendo queimadas, ou
derrubadas para darem lugar à pastagem para gado de corte, lixos sendo jogado
dentro dois rios e córregos, tornando absolutamente impróprios, tanto para
humanos, como para animais. Os passageiros virtuais também passeavam pelas
guerras e conflitos que assolam o planeta.
Os
gráficos do estudioso mostravam situações em que a falta d’água já se faz
sentir, como por exemplo, em São Paulo, Brasil, e na Califórnia, Estados
Unidos. “Se continuar assim, em breve, a água será um bem tão cobiçado quanto o
petróleo”, afirmava ele.
Ele
também apresentou outros estudos sobre o aumento de temperatura na Terra, que
estaria destruindo, em ritmo bastante acelerado, as camadas de gelos do Ártico
e da Antártida. Segundo ele, em consequência, disso, haverá, dentro de pouco
tempo, uma elevação no nível dos mares, inclusive com o desaparecimento de
muitas cidades litorâneas, e uma elevação ainda maior do clima no planeta. O
professor apresentou dados mostrando que, mesmo que o homem, freasse,
bruscamente, a emissão de poluentes na atmosfera, as geleiras continuariam a
derreter ainda por muito tempo. “Porém,
como não há intenção de reduzir os poluentes, veremos, como num trágico filme
de terror, em um futuro não muito distante, a última geleira ruir, e o nível
dos oceanos subir cada vez mais.”, acrescentou ele em tom irônico.
Nas
rodas de conhecimento ligadas ao pensamento, a preocupação era outra. Os filósofos
de Marte preocupavam-se com a possibilidade de perca total da paz, se os
humanos viessem a habitar o planeta. Afinal, nesses séculos de existência os
homens haviam inventado armas para destruírem a si próprios e aos seus pares. As
repetidas guerras em todo o planeta ceifaram, muitas vezes, a vida de inocentes
que nem ao menos compreendiam o motivo pelo qual estavam morrendo. Sendo iguais
e habitantes do mesmo planeta, os homens se olhavam como selvagens, e não como
irmãos, como de fato são. Isso foi no passado e continua a ser no presente. Com
medo da guerra, os homens fogem de sua terra natal, com suas mulheres e
crianças, e atravessam fronteiras, sujeitos a ser engolidos pelo mar, e a ser
humilhado por outros povos, além de
ser agredidos pelas forças policiais.
O
jornal de maior circulação de Marte, no dia seguinte à chegada do robô, trazia a
seguinte manchete: “Os humanos ainda nem
destruíram a própria casa, e já estão procurando novas vítimas. O planeta
vermelho é o próximo alvo”. Colocando ainda pólvora na discussão.
Existia
entre os marcianos aqueles que viam as boas ações que eram praticadas na Terra em favor do
clima no planeta. Esses conseguiam ver os homens e mulheres de boa vontade que
se envolviam em negociações em prol da paz e da democracia, e até, ganhavam
prêmio Nobel da Paz por se dedicar a essa nobre causa. Mas esses eram minoria
entre os marcianos. Esses
bons extraterrestres acreditavam que podiam doutrinar os homens se, por acaso,
eles por lá aportassem com suas ultrapassadas naves e rudes hábitos.
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