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Maestro Urban: O adeus a um guerreiro

Posted by Cottidianos on 00:22
Quinta-feira, 06 de setembro


E o pó volte à terra, como o era,

e o espírito volte a Deus, que o deu

(Eclesiastes 12:7)





Ganhar presentes?!! Quem não gosta?
Crianças, moços, velhos, todos regozijam de alegria quando recebem um deles. Se for criança e recebe uma bola, já se põe a brincar e a correr pelo quintal, ou pelo jardim, ou por qualquer lugar que seja propício a que uma bola role. Se for menina e recebe uma boneca já se põe a enfeitá-la, e dar-lhe conselhos, e beijá-la, e abraçá-la, como se fosse uma zelosa mãe. E assim, todos têm o seu modo e o seu prazer de usar o que foi ganho.
Há brinquedos individuais e brinquedos coletivos. Há aqueles que se recebe e é possível trancar-se em quarto e brincar horas a fio, sem necessitar da presença de outro ser humano. Isso é mais do que verdade, principalmente, nesse nosso tempo cheio de parafernálias eletrônicas. Nesse mundo atual, o individualismo torna-se mais forte e mais evidente.
Há também aqueles passatempos que fica meio sem graça se os desfrutamos sozinhos, apenas nós e o folguedo. Para esses passatempos, o ideal é que tenhamos a companhia de outro — ou outros — de nosso semelhante para que possamos trocar experiências, darmos risadas, superarmos os desafios, se for o caso de um jogo, por exemplo.
A arte de viver é semelhante a um presente que nos é dado pelo Deus Altíssimo. Quando viemos ao mundo, melhor ainda, quando fomos gerados, ou talvez mesmo antes disso, fomos agraciados com esse dom, esse folguedo, esse passatempo chamado vida. E ao nascermos, nos tornamos, nós mesmos, um presente, primeiro para a família que nos acolheu, e depois, gradativamente, para os grupos sociais, aos quais, por afinidades, nos aproximamos, e deles passamos a fazer parte.
Porém, diferentemente de qualquer outro brinquedo que possa ser trocado entre um ser humano e outro, que tem caráter duradouro, e que não se exige devolução, nem que seja pedido de volta o que foi dado — seria até mesmo uma grande indelicadeza, tais atitudes — a vida que nos é dada como presente pelo Altíssimo tem caráter de empréstimo.
E qual a característica principal de um empréstimo? A devolução daquilo que foi ofertado, de preferência, estando a coisa ou objeto, em estado ainda melhor do que quando foi oferecido.  Quem empresta algo, de modo subliminar, está dizendo: “É meu. Não é seu. Estou te fazendo dono deste bem por algum tempo, após o que, pedirei de volta aquilo que me pertence. Portanto, faze tu, bom uso e zela por este tesouro que agora te oferto”.
E a vida é um daqueles tipos de presente que para ser bem usado, precisa ser compartilhado. Quem se tranca no quarto do tempo e passa a brincar de viver sozinho, isolado do mundo, e daqueles que o cercam, acaba descobrindo que não aproveitou o dom que lhe foi ofertado. E disso resulta tanta coisa indesejável... Depressão é apenas um exemplo.
Ao contrário, quanto mais compartilhamos vida e distribuímos alegria, tanto mais ela se renova, e tanto mais felizes seremos. Passamos a ser, nós mesmos, o presente para nossos pais, nossos filhos, nossos amigos, e para aqueles que nos rodeiam e que tem contato conosco, de uma forma ou de outra.
Infelizmente, há pessoas que esquecem, ou que abandonam a idéia, a graça de ser presente, e passam a ser uma pedra no caminho da família, dos amigos, dos funcionários, ou de quem quer que se aproxime dele ou dela. Esse tipo de indivíduo torna-se como uma espécie de bola de ferro atada à perna do outro.
Nesse caso, o avanço na caminhada torna-se lento. Não se vai à frente com um sorriso no rosto quando se tem uma bola de ferro atada ao pé, nem quando se é a bola de ferro no pé de alguém. Resultado disso é que o caminho da evolução torna-se mais árduo, mais espinhoso.

Porém, chega um dia, em que, tendo sido cumprida nossa missão aqui neste pedaço de chão, o criador pede a sua criatura a devolução do presente... E lhe dá outro maior e mais belo que o primeiro: a vida eterna.
E nós, em nossa limitação, choramos e lamentamos, e muitas vezes, até nos revoltamos contra o criador por ele ter tirado aquele ou aquela que era como um presente divino no meio de nós. Esquecemos de lembrar que, talvez, quem deixou esta vida e retornou aos braços daquele que permitiu sua vinda a este plano material, pode ter lhe revestido de bênçãos ainda maiores do outro lado do caminho.
Na terça-feira (4), foi a vez de o Deus altíssimo chamar de volta a si, o presente chamado Oswaldo Antonio Urban, mais conhecido como Maestro Urban, um homem que dedicou sua vida à música, e dela fez uma missão. O maestro Urban — por sua vez, grande admirador do gênio das Américas, o maestro Carlos Gomes — estava bem próximo de completar 99 anos. 26 de outubro era a data de seu aniversário.
Este blog dedicou algumas matérias a esse guerreiro: A força de um guerreiro – 1ª parte; A força de um guerreiro – 2ª parte; Harmonia dos Salmos: Gotas de música e poesia no deserto da vida; Uma fortaleza chamada maestro Urban; Salmos: Um divino legado do Rei David para a humanidade.
Na abertura da entrevista, A força de um guerreiro 1a parte, este blog escrevia: “Maestro Urban é uma dessas pessoas que sabem aproveitar bem a vida. Gente, que na sabedoria de seu coração, sabe que a vida é para ser vivida em toda a sua intensidade, que diante das dificuldades não se senta em algum lugar e chora. Ao contrário, quanto mais dificuldades apareçam, maior é a vontade de lutar. Pelo que eu conheço do Maestro, penso que o segredo dele seja ocupar sempre a mente com coisas boas. Do alto de seus 93 anos, ele está sempre em atividade: rege dois corais, compões músicas para os corais cantarem, lê bons livros, cultiva o amor familiar”. Depois disso, Urban não mudou muita coisa nas características descritas acima. Sempre lutando, fazendo projetos, acreditando na vida, mesmo quando as limitações impostas pela idade se fizeram sentir de modo mais notório.
Nascido na cidade de Leme, São Paulo, aos 26 de outubro de 1919, ele adotou Campinas como cidade do coração, quando para cá se mudou ainda na adolescência. Foi maestro, compositor, professor. Era também advogado, sendo um dos fundadores do curso de Direito da Pontifícia Universidade Católica de Campinas, e também aluno daquela primeira turma, cuja formatura se deu em 18 de março de 1957.
O maestro foi regente de diversos corais durante sua vida. Atualmente regia dois corais: O Coral Pio XI — formado por vozes masculinas, e o Coral Vozes amigas — formado por vozes mistas. A última apresentação que reuniu os dois corais aconteceu no dia 26 de agosto, na Paróquia São Paulo Apóstolo, no bairro Vila Itapura, em Campinas, São Paulo.
No fim da tarde desta quarta-feira (5), parentes e amigos se reuniram para o último momento com o maestro Urban, cujo corpo foi velado, no cemitério Flamboyant. A beira da sepultura daquele triste fim de tarde, o corpo que é pó desceu à sepultura para encontrar as suas origens, enquanto o espírito alçava voos mais altos em direção ao Deus criador, que havia chamado de volta o seu presente.

O corpo de Urban desceu à sepultura ouvindo algo que lhe foi muito peculiar em toda a sua vida: aplausos. Ainda à beira da sepultura, a cerimonialista da equipe do cemitério proclamou uma bela mensagem de Santo Agostinho, que fala deste momento de passagem do plano material para o plano espiritual, e que este blog reproduz abaixo:

***
A morte não é nada (Santo Agostinho)

“A morte não é nada.
Eu somente passei
para o outro lado do Caminho.

Eu sou eu, vocês são vocês.
O que eu era para vocês,
eu continuarei sendo.

Me dêem o nome
que vocês sempre me deram,
falem comigo
como vocês sempre fizeram.

Vocês continuam vivendo
no mundo das criaturas,
eu estou vivendo
no mundo do Criador.

Não utilizem um tom solene
ou triste, continuem a rir
daquilo que nos fazia rir juntos.

Rezem, sorriam, pensem em mim.
Rezem por mim.

Que meu nome seja pronunciado
como sempre foi,
sem ênfase de nenhum tipo.
Sem nenhum traço de sombra
ou tristeza.

A vida significa tudo
o que ela sempre significou,
o fio não foi cortado.
Porque eu estaria fora
de seus pensamentos,
agora que estou apenas fora
de suas vistas?

Eu não estou longe,
apenas estou
do outro lado do Caminho…

Você que aí ficou, siga em frente,
a vida continua, linda e bela
como sempre foi.”

Santo Agostinho


***


Urban Conductor: Farewell to a Warrior
Posted by Cottidianos on 00:22
Thursday, September 6

"And the dust return to the earth as it was,
and the spirit returns to God who gave it"
(Ecclesiastes 12: 7)


Receive gifts?!! Who doesn't like it?
Children, young men, old men, all rejoice in joy when they receive one of them. If you are a child and receive a ball, you are already playing and running around in the yard, or the garden, or anywhere that is likely to cause a ball to roll. If you are a girl and you receive a doll, you will start to decorate her, give her advice, and kiss her, and hug her like a jealous mother. And so, everyone has their way and their pleasure in using what has been gained.
There are individual toys and collective toys. There are those who receive and it is possible to lock yourself in a room and play for hours without the presence of another human being. This is more than true, especially in our time full of electronic paraphernalia. In this present world, individualism becomes stronger and more evident.
There are also those hobbies that get kind of bland if we enjoy them alone, just us and the fun. For these hobbies, the ideal is that we have the company of another - or others - of our fellow so that we can exchange experiences, laugh, overcome challenges, if it is the case of a game, for example.
The art of living is similar to a gift given to us by the Most High God. When we came into the world, even better, when we were raised, or perhaps even before that, we were bestowed with this gift, this fun, this pastime called life. And as we were born, we became ourselves a gift, first to the family who welcomed us, and then, gradually, to the social groups to which we, by affinities, approached and became part of them.
However, unlike any other toy that can be exchanged between a human being and another that has a lasting character, and that no return is required, nor is it asked to return what was given - it would even be a great unkindness, such attitudes. - the life given to us by the Most High is on loan.
And what is the main feature of a loan? The return of what was offered, preferably with the thing or object, in an even better state than when it was offered. The subliminal lender is saying, “It's mine. It's not yours. I am making you master of this good for some time, after which I will ask back what belongs to me. Therefore do thou good use, and watch over this treasure which I now offer unto thee. ”
And life is one of those kinds of gifts that to be used well, need to be shared. Those who lock themselves in the room of time and start playing alone, isolated from the world, and those around them, find that they have not taken advantage of the gift offered to them. And that results in so much undesirable ... Depression is just an example.
On the contrary, the more we share life and distribute joy, the more it renews itself, and the happier we will be. We become ourselves the gift to our parents, our children, our friends, and those around us who have contact with us in one way or another.
Unfortunately, there are people who forget, or abandon the idea, the grace of being present, and become a stumbling block in the path of family, friends, employees, or anyone who approaches him or her. This type of individual becomes like a kind of iron ball tied to the other's leg.
In this case, the advance in walking becomes slow. You don't go ahead with a smile on your face when you have an iron ball tied to your foot, or when you are the iron ball in someone's foot. As a result, the path of evolution becomes harder, thornier.
However, there comes a day when, having fulfilled our mission here on this piece of ground, the creator asks his creature for the return of the present ... And gives him another greater and more beautiful than the first: eternal life.
And we, in our limitation, weep and mourn, and often even rebel against the Creator for taking away one or the other as a divine gift among us. We forget to remember that perhaps those who have left this life and returned to the arms of the one who allowed their coming to this material plane may have clothed them with even greater blessings across the way.
On Tuesday (4), it was the turn of the Most High God to call back to him, the gift called Oswaldo Antonio Urban, better known as Maestro Urban, a man who dedicated his life to music, and made it a mission. The conductor Urban - in turn, great admirer of the genius of the Americas, conductor Carlos Gomes - was very close to complete 99 years. October 26 was the date of his birthday.
This blog devoted a few articles to this warrior: The Strength of a Warrior - Part 1; The strength of a warrior - Part 2; Harmony of Psalms: Drops of music and poetry in the desert of life; A fortress called maestro Urban; Psalms: A divine legacy of King David to humanity.
At the opening of the interview, The Strength of a Warrior Part 1, this blog wrote: “Maestro Urban is one of those people who know how to enjoy life well. People, who in the wisdom of their hearts, know that life is to be lived in all its intensity, that in the face of difficulties does not sit somewhere and weeps. On the contrary, the more difficulties appear, the greater the will to fight. From what I know of the Maestro, I think his secret is to always occupy the mind with good things. From the height of his 93 years, he is always active: conducting two choirs, composing songs for choirs to sing, reading good books, cultivating family love. ” After that, Urban didn't change much in the features described above. Always struggling, doing projects, believing in life, even when the limitations imposed by age were most noticeably felt.
orn in the city of Leme, São Paulo, on October 26, 1919, he adopted Campinas as a city of the heart, when he moved here as a teenager. He was conductor, composer, teacher. He was also a lawyer, one of the founders of the Law School of the Pontifical Catholic University of Campinas, and also a student of that first class, whose graduation took place on March 18, 1957.
The conductor was conductor of several corals during his life. Currently conducting two choirs: The Pio XI Coral - formed by male voices, and the Friendly Voices Coral - formed by mixed voices. The last performance that brought together the two choirs took place on August 26, at the São Paulo Apostle Parish, in the Vila Itapura neighborhood, in Campinas, São Paulo.
In the late afternoon of Wednesday (5), relatives and friends met for the last moment with maestro Urban, whose body was veiled, in the Flamboyant cemetery. At the grave's edge of that sad evening, the dust body descended to the grave to find its origins, while the spirit soared higher toward the creator God, who had called back his gift.
Urban's body descended to the grave hearing something very peculiar to him all his life: applause. Still on the brink of the grave, the cemetery staff ceremonialist proclaimed a beautiful message from St. Augustine, who speaks of this moment of transition from the material to the spiritual plan, and which this blog reproduces below:
 ***
 
Death is nothing (St. Augustine)
 
“Death is nothing.
I just passed
to the other side of the Path.
 
I am me, you are you.
What I was to you,
I will still be.
 
Give me the name
that you always gave me,
talk to me
as you always did.
 
You keep on living
in the world of creatures,
Im living
in the world of the Creator.
 
Do not use a solemn tone
or sad, keep laughing
what made us laugh together.
 
Pray, smile, think about me.
Pray for me.
 
May my name be pronounced
as always was,
no emphasis of any kind.
No trace of shadow
or sadness.
 
Life means everything
what she always meant,
the wire was not cut.
Because I would be out
of your thoughts,
now that i'm just out
from your sights?
 
I'm not far away
I'm just
across the way…
 
You who stayed there, move on,
life goes on, beautiful and beautiful
as always was."
 
St. Augustine

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