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Ameaças golpistas e delírios de fanáticos

Posted by Cottidianos on 00:46

 Terça-feira, 22 de novembro

Oh! Oh! Seu Moço!

Do Disco Voador

Me leve com você

Pra onde você for

Oh! Oh! Seu moço!

Mas não me deixe aqui

Enquanto eu sei que tem

Tanta estrela por aí

(S.O.S – Raul Seixas)


Muitas aconteceram desde a última postagem que fiz. Como diz o ditado popular: Muita água rolou debaixo da ponte.

Chegou e passou a COP-27. Lula foi. Bolsonaro ficou. Não foi porque não quis. Lula foi a grande estrela do evento. Muito fotografado. Muito aplaudido. Enfim, o Brasil voltando ao cenário internacional, e voltando num evento que trata das questões mais importantes para o futuro do planeta: A questão climática.

Após duas semanas de longas negociações, a Cop-27 chegou ao fim neste domingo (20), Sharm el-Sheikh, no Egito. A guerra travada entre Rússia e Ucrânia, e a crescente tensão entre Estados Unidos e China tornaram o chão da COP-27 mais árido. Aliado a isso, as enchentes que aconteceram na Nigéria e no Paquistão fizeram aumentar pedidos de ajuda. É o planeta dando sinais, e ainda assim os cegos não veem, e os surdos não ouvem.

Verões mais quentes em uns lugares, invernos mais rigorosos em outros, derretimento das geleiras, avanço do mar, enfim são muitos os sinais emitidos pelo planeta. Lembremos que o planeta Terra não passará, quem passará somos nós. O homem se considera grande, inteligente, e superpoderoso com suas invenções, mas lembremos que os dinossauros também eram grandes e poderosos, mesmo assim, eles se foram, não se sabe exatamente porque, foram varridos da face da Terra, e hoje, só restam seus fósseis debaixo do solo, ou expostos em algum museu famoso.

Como diz o ditado: A corda sempre arrebenta para o lado mais fraco. E quem tem pago a conta dos efeitos climáticos primeiro são, ironicamente, os países que menos contribuem para a emissão de gases que causam o efeito estufa.

Na esteira das propostas, surgiu um fundo chamado de “fundo de perdas e danos”, através do qual os maiores poluidores, os países mais ricos, ajudem os países menos desenvolvidos nos prejuízos causados pelos efeitos climáticos.

Obviamente, os países mais ricos se opõem a criação desse fundo, mesmo assim, a União Europeia deu o pontapé inicial, e um acordo foi fechado. Os detalhes ainda precisam ser melhor definidos, mas já é um começo. Os países que seriam doadores desse dinheiro exigem que as doações estejam alinhadas com o acordo de Paris. Os países que receberão as doações temem que essa nova discussão distraia os países doadores das doações que prometeram e até agora e não entregaram. O nó da questão não está fechado e precisará esperar por mais uma COP, em Dubai. De qualquer modo,  uma luz no fim do túnel foi acendida para aqueles que tem sobre suas cabeças a ira da natureza. Não nos esqueçamos de que essa nuvem de ira paira sobre a cabeça de todos nós.

Pensemos no universo como uma grande e complexa engrenagem na qual todas as partes funcionam com exatidão. O nosso pequeno planeta faz parte dessa engrenagem, também ele cheio de outras pequenas engrenagens que semelhante ao Todo, funciona com precisão.

Porém, o homem pode interferir no funcionamento dessas peças e engrenagens, e a máquina que funcionava com perfeição passa a apresentar problemas, defeitos. Ainda dá tempo de consertar se algo for feito agora para sanar o perigo. Mas se o homem continuar destruindo, destruindo, e destruindo, um dia a máquina dá pane geral, e corremos o risco enquanto espécie humana de também desaparecermos, à exemplo dos dinossauros grandalhões.

Alarmismo, pensará o caro leitor, leitora. Retornemos em milhões de anos, e imaginemos uma situação hipotética na qual os dinossauros pudessem falar, e alguém chegasse para eles e dissesse: “Se não fizerem isso ou aquilo, vocês desaparecerão da face da Terra”. Provavelmente, eles olhariam para seu grande porte deles mesmos e para a natureza ao redor, depois dariam risadas da piada, e também diriam: “Chega de alarmismos!”, e seguiriam a vida indiferente ao alerta dado a eles.

No acordo de Paris de 2015 foi feito um acordo para limitar o aquecimento global a 1,5 graus Celsius. Acordo não foi cumprido, e as emissões de gases estão aumentando, ao invés de diminuir. Mas um pequeno consolo nisso tudo é que, antes do acordo de Paris citado acima, o mundo caminhava para um nível de aquecimento do planeta estimado em 4,5 graus Celsius até o fim de século.

Essa previsão foi atualizada para um aquecimento de 2,6oC, graças ao trabalho já feito até aqui. Mas isso não basta, é preciso reduzir ainda mais. A questão é que o mundo precisa caminhar na direção de energia limpa, redução do uso de metano. A redução de gases poluentes e a busca de energia limpa e renovável é uma necessidade. Ao invés de buscar soluções urgentes, os líderes das potências mundiais vão postergando o assunto, fazendo o mínimo necessário. Enquanto isso, os efeitos das mudanças climáticas vão sendo sentidas a cada ano e cada vez mais intensas por pessoas de todo o mundo.

Voltando ao Brasil, uma coisa que tem chamado a atenção é o silêncio dos Bolsonaro após a vitória de Lula. O site da Veja traz uma reportagem publicada nesta segunda-feira, 21, na qual aborda o assunto. Segundo a revista, os finais de semana eram sempre de muita animação. Os Bolsonaro eram os anfitriões e reuniam familiares e amigos mais próximos, e faziam festa até tarde. Agora, segundo relatos de vizinhos, o silêncio é tamanho que chega até a assustar.

A jornalista Andrea Sadi em sua coluna publicada no site do G1, também destaca o silêncio do presidente. Segundo a jornalista, o presidente só deu a breve declaração reconhecendo a derrota para Lula, por pressão dos aliados.

As eleições foram dia 02 de novembro e, até o dia 18, Bolsonaro só havia aparecido publicamente para o brevíssimo pronunciamento em que reconheceu a derrota, e também quando apareceu para pedir, tardiamente, que os manifestantes desocupassem as rodovias. Ele também participou de um encontro com os ministros do Supremo Tribunal Federal. Depois disso, o presidente pouco apareceu para trabalhar. Está recluso.

Os Bolsonaros também eram muito barulhentos nas redes sociais. Depois do resultado das eleições eles não chegaram a silenciar, mas diminuíram bastante as postagens. Os discursos conspiratórios também parecem ter perdido força entre eles. Eles estavam certos de que venceriam as eleições. Fizeram um esforço enorme para isso à custa do dinheiro público, à custa da máquina pública.

Na madrugada do dia 30 de setembro, Bolsonaro postou nas redes sociais dizendo que nunca havia perdido uma eleição: “Sabemos do tamanho da nossa responsabilidade e dos desafios que vamos enfrentar. Mas sabemos aonde queremos chegar e como chegaremos lá. Pela graça de Deus, nunca perdi uma eleição e sei que não será agora, quando a liberdade do Brasil inteiro depende de nós, que iremos perder”. Depois eu o ouvir dizer a mesma coisa em entrevista à TV. E ele parecia convicto do que dizia.

E agora, o que passa na cabeça de Bolsonaro e dos filhos? Medo de ir preso. Os filhos têm foro privilegiado, mas após o fim do mandato ele não terá. E há muitos processos contra ele que agora podem ir parar na Justiça comum uma vez que a partir de 1o de janeiro ele perde o foro privilegiado.

Enquanto isso, o governo Lula já trabalha a todo vapor no processo de transição. Nenhum ministro foi anunciado oficialmente. O que se tem até agora são especulações. Lula já estressou com os mercados, os mercados já se estressaram com Lula, e assim, vida que segue. Depois tudo se ajeita. É sempre assim. O mercado fica nervoso, mas também precisa de dinheiro. Então não vai ficar nervosinho o tempo todo.

Tudo por causa do teto de gastos. Como sabemos, Bolsonaro derrubou a porteira do teto de gastos, Lula seguiu na esteira. Enfim, prometeu muito em campanha, promessas que vão na direção de dar ao povo brasileiro, principalmente aquela parcela da população que passa fome, uma vida melhor. Então há muito que negociar as PECs da vida.

Verdade, que Lula também não pode chutar o balde e abandonar de vez a responsabilidade fiscal, pois isso não é bom para ninguém, nem para os ricos, e nem para os pobres, pois a conta vem alta depois, principalmente para os pobres.

Também continuam os delírios dos bolsonaristas. Alguns deles são hilários, como um vídeo publicado nas redes sociais na noite deste domingo, 20, que mostra bolsonaristas golpistas pedindo ajuda aos extraterrestres. Não, você não leu errado, nem escrevi por engano. Eles estavam pedindo ajuda interplanetária para combater o grande inimigo que, segundo eles, é a instalação do comunismo no Brasil.

O vídeo foi gravado por um homem de Porto Alegre. Na postagem ele diz: “Pessoal, fui dar um rolê de bike como faço sempre. Filmei essa pérola dos golpista pedindo ajuda extraterrestre com celular na cabeça, fazendo sinais de luz e pedindo ajuda do 'general”.

Os bolsonaristas botam os celulares da cabeça e ficam fazendo gestos como se fosse um ritual. Uma mulher no vídeo diz “SOS”, e outra pessoas diz: “Olha para nós, general”. Isso já é uma questão de sanidade mental. Há outros comportamentos dessa turma de bolsonaristas que são mais preocupantes porque violentos, como o bloqueio de estradas, por exemplo, e a ameaça de paralização dos caminhoneiros em plena época de Natal. Há também atentados terroristas contra bases da Polícia Rodoviária Federal.

        Augusto Nardes

                                    

Há outros comportamentos ainda mais perigosos porque vindos de altas autoridades golpistas do governo. É o caso do ministro do Tribunal de Contas da União (TCU), Augusto Nardes.

O ministro publicou um áudio de oito minutos de duração em um grupo de WhatsApp, que depois vazou para a imprensa e para o público em geral. No áudio, o ministro do TCU faz uma fala altamente golpista, insinua que nas casernas — caserna é um termo usado entre os militares para se referir as Forças Armadas — está se articulando um golpe, elogia os participantes dos atos antidemocráticos, e termina dizendo: “Os próximos dias serão nebulosos e o que vai acontecer de desdobramento não se sabe, mas certamente teremos desdobramentos muito fortes nos próximos dias. Um abraço”.

Segue abaixo a transcrição do áudio na integra publicado pela revista Veja.

Estimado Sartori, como eu sou magistrado e julgo muitas coisas que estão acontecendo no Brasil, praticamente muita coisa passa pelo Tribunal de Contas da União, somos nove lá, e a situação é bem complexa, muito complexa. É o pior momento que a nação vai viver, mas talvez seja importante para poder recuperar… até pelo depoimento desse caminhoneiro que mostra a visão que todo mundo está tendo, não há mais… Os intelectuais da nação hoje você consegue escutar o que a gente vem pensando há muito tempo das pessoas mais humildes da nação e que têm uma visão clara do conjunto do país. Que nós somos hoje sociedade conservadora, que não aceita as mudanças que estão sendo impostas e que despertou. Isso é muito importante.

Lá nos anos 80, quando eu voltei da Europa eu tentei criar um movimento com um grupo de especialistas e um professor de direito constitucional, César Saldanha Júnior, que hoje já está um pouco fora de combate aí em Porto Alegre, para contrapor toda essa transformação que acabou acontecendo no Brasil. Criamos um instituto, enfim, fazíamos aulas pra defender a economia de mercado, capital, mas fomos superados pela incompetência de todos nós, claro que lutamos muito, eu estive na época conversando com Ernesto Geisel, com os líderes da época, João Figueiredo, que não tiveram uma visão de que tínhamos que fazer uma transição com um parlamentarismo, e escolher um primeiro-ministro e fortalecer a economia de mercado com princípios que pudessem nortear a nação.

Agora veio o Bolsonaro que despertou a sociedade conservadora e hoje todo mundo está nas ruas aí fazendo a sua defesa desses princípios. Demoramos, mas felizmente acordamos. Demoramos, mas felizmente acordamos.

O que vai acontecer agora? Está acontecendo um movimento muito forte nas casernas. Eu acho que é questão de horas, dias, no máximo uma semana, duas, talvez menos que isso, que vai acontecer um desenlace bastante forte na nação. Imprevisíveis, imprevisíveis. Portanto a fala desse cidadão é pra despertar o produtor rural também porque não adianta só caminhoneiro trabalhar.

Vamos perder? Sim, vamos perder alguma coisa, mas a situação para o futuro da nação poderá se desencadear de forma positiva, apesar desse principal conflito que deveremos ter nos próximos dias ou nas próximas horas.

Falei longamente com o time do Bolsonaro essa semana, ele não tá bem, tá com a ferimento na perna, uma doença de pele bastante significativa, mas tem esperança ainda, né? Tem esperança de pode ser recuperar e melhorar a sua situação física, e certamente terá condições de enfrentar o que vai acontecer no país. Se vai haver alguma mudança em relação a isso? Só que haja uma capitulação por parte de alguns integrantes importantes e dirigentes que tudo se sente que vai pra um conflito social na nação brasileira.

Eu não posso falar muito até porque, sim, tenho muitas informações, mas queria passar pra ti, Sartori, e para o teu time aí do agro que eu conheço todos os líderes e sei da importância do agro.

Até quando lá atrás negociamos a ciclo de sessão eu era o líder da bancada ruralista, articulei a união em 17 estados pra colocar 20.000 pessoas em Brasília em [19]99. Queimamos máquinas, tratores, fizemos um escarcéu. Fizemos até carreteiro aqui pra mais de 2 mil pessoas junto com meu estimado amigo Sperotto e tantos líderes que aí acompanham junto com você esse time do agro Brasil. Então conheço todos os passos que temos que fazer.

Fiz a minha parte. Em [20]14, eu era presidente [do TCU], alertei a presidente [Dilma Rousseff] em [20]12, [20]13 o que ia acontecer no país, infelizmente não conseguimos diálogo na época. Porque eles nunca aceitaram o diálogo, eles foram pro confronto e agora é um confronto decisivo, eles vão vir para um confronto que nós todos sabemos quais são as consequências, mas nós tomamos uma decisão importantíssima em [20]15, quando eu tive a coragem em 130 anos, pela primeira vez, de tomar de tomar uma atitude de reprovar as contas porque encontramos 340 bilhões em [20]15 e [20]16 de irregularidades na nação. E tudo se mostra que vai acontecer novamente.

Ou seja, princípios de estabilidade fiscal não vão ser postos, a não ser que a sociedade faça muita pressão e que haja mudança, mas tudo está muito nebuloso em relação ao futuro do país.

Não vou me alongar mais, tenho muitas informações especialmente para o grupo do agro, mas eu acho que é o grande momento, baseado no que falou esse caminhoneiro lá de Sinop, de que é necessário acordar todo o Brasil. Acordar, despertar, ter fé e crença, como nós tivemos lá em [20]15 apresentando pela primeira vez um processo que desmontou, de certa forma, essas estruturas que eles conseguiram remontar agora, baseado na estrutura que tinha já ficado, que foi muito longa. Imagina eles com mais quatro anos de governo o que vai acontecer na nação. Não sei.  Vai depender da sociedade se reerguer, retomar a sua força, saber da sua força, saber da sua força. A sociedade sabe da sua força, mas não tinha despertado. Hoje nós estamos despertos, esperamos poder avaliar melhor a nação.

E eu fico aqui, como magistrado, procurando olhar a árvore e a floresta. A floresta, se não for tomado medidas bastante fortes, ela está indo pra um processo de ser incendiada aos poucos.

Um grande abraço pra vocês e estamos juntos, esperando aí a visita de vocês. Quando for ao Rio Grande eu vou lá matar a saudade e ver especialmente o meu amigo Sartori e tantos outros que estão aí junto, Francisco Turra, meu colega, homem de fé, de criança, tantos que eu poderia falar aqui, vários políticos, várias pessoas que têm capacidade de auxiliar nesse momento tão dramático da nação. Grande dia.

Os próximos dias serão nebulosos e o que vai acontecer de desdobramento não se sabe, mas certamente teremos desdobramentos muito fortes nos próximos dias. Um abraço.”

A repercussão da fala golpista do ministro do TCU Augusto Nardes foi intensa. Por meio de nota divulgada pela assessoria de imprensa do órgão Nardes se desculpou pela fala, e disse que ela foi mal interpretada e o áudio, despretensioso. Para quem leu e quem ouviu as coisas ali estão colocadas de forma bem clara. Há uma intenção golpista e um desprezo pela democracia, sim. Querer dizer que o áudio é despretensioso é chamar a sociedade brasileira de idiota.

Após a divulgação do áudio com falas criminosas, o ministro pediu afastamento do cargo por motivos de saúde. Autoridades do meio judiciário de meio político reagiram fortemente às falas de Nardes.

Mas não é por ter se afastado do cargo que ficará impune. Esse senhor deve explicações ao Congresso, ao Judiciário e a toda sociedade brasileira, que não tolera golpismos.


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O adeus a Gal Costa e Rolando Boldrin

Posted by Cottidianos on 20:28

Quarta-feira, 09 de novembro

Tem pessoas que tem o dom de nos surpreender. Nos surpreendem em vida com seus dons, talento, generosidade, e nos surpreendem também quando vão se embora para sempre, pois pegam a todos de surpresa.

Foi o caso de Gal Costa. Esta manhã, ela partiu como se tivesse pegado carona na cauda de um cometa brilhante que a levou para as esplendidas moradas eternas, seu lar na eternidade.

Hoje de manhã, ouvia uma estação de rádio local quando o apresentador anunciou a morte de Gal Costa. Parei por um momento. Gal Costa morreu? Não é possível, pensei. Nenhum veículo de imprensa havia noticiado que ela estivesse com alguma complicação de saúde. Liguei imediatamente a TV para ver se ela também anunciava a triste notícia. Alguns minutos depois, entrou uma chamada do telejornal confirmando o fato.

Mais tarde, passeando pela página do Facebook de um amigo, vi uma postagem dele, dizendo, de forma surpresa que Gal havia morrido. Alguém nos comentários postou carinhas dando risadas, achando que se tratava de piada. Não, não era piada. Era a mais pura realidade.

Só restou a todos nós lamentar. Mais uma estrela de primeira grandeza foi tirada de nosso céu da música brasileira. Nós nos alegrávamos com o brilho dela, e com a alegria que nos trazia através da música. Temos que compreender e aceitar que a estrela não era nossa, foi nos dada pelo criador por empréstimo, e chegou a hora de chama-la de volta.

Gal representa o que de melhor a fábrica de nossa rica Música Popular Brasileira produziu. Uma das mais talentosas divas de nossa música, ela morreu na manhã desta quarta-feira, aos 77 anos, em São Paulo, a causa da morte, pelo menos até o momento em que escrevo este texto, é desconhecida.

Segundo comunicado de sua assessoria de imprensa, ela estava em recuperação após ser submetida a um procedimento cirúrgico para a retirada de um nódulo na fossa nasal direita. A cirurgia foi realizada há três semanas.

A cantora era uma das atrações do Primavera Sound, festival de música que aconteceu final de semana passado, em São Paulo, mas havia cancelado sua participação. Além disso, estava em turnê com o show As Várias Pontas de uma Estrela. Neste espetáculo, ela cantava grandes sucesso da década de 80.  A agenda de shows dela estava suspensa até final de novembro.

Gal Costa deixa um filho que adotou há 15 anos. O sonho da cantora era engravidar, mas esse sonho não se tornou possível porque ela tinha as trompas obstruídas. Por esse motivo, decidiu adotar uma criança. Foi quando, visitando um abrigo para crianças no Rio de Janeiro, foi cativada pelo sorriso de Gabriel, com apenas dois anos de idade na época, e resolveu adotá-lo. A cantora amava o filho e dizia que ele havia transformado a vida dela.

Gal Costa faz parte de uma geração de ouro da MPB da qual também fazem parte grande nomes como Caetano Veloso e Maria Bethânia, Gilberto Gil, Chico Buarque, Toquinho, Milton Nascimento, Roberto Carlos dentre outros.

Chorando, em vídeo, Bethânia, grande amiga da cantora assim se expressou ao G1: “Em choque, triste demais, difícil demais. Nunca pensei um dia chegar a vocês para falar sobre a dor de perder Gal. O Brasil que ela sempre encantou com sua voz única, magistral hoje inteiro chora, como eu. Uma amiga que mesmo longe sempre lhe mantive admiração e respeito. Deus a receba na sua mais pura luz. Muito duro”.

Não apenas Bethânia chorou, mas choraram também Chico, Caetano, Gil, Toquinho, Milton. Na verdade, o Brasil inteiro chora a morte dessa grande, imensa, esplendorosa artista que a todo encantou com sua doce voz.

No domingo, 6, Chico Buarque havia testado positivo para Covid 19, e cancelou os shows que tinha neste fim de semana, em Salvador. Após a saber da morte da amiga, Chico declarou que, mesmo que se recupere e seja liberado pelo médico para apresentações, ainda assim os shows continuarão cancelados.

Ainda que se recuperasse a tempo de realizar os shows, o impacto da notícia da morte de Gal Costa, esta manhã, deixou o cantor e compositor sem condições emocionais de seguir com a agenda”, informou a assessoria de imprensa do cantor através do Instagram.

Aos 26 de setembro de 1945, nascia na cidade de Salvador, Bahia, Maria das Graças Penna Burgos, filha de Mariah Costa Penna e Arnaldo Burgos. Aquela menina conquistaria o Brasil e o mundo e se tornaria conhecida, simplesmente, como Gal Costa.

Arnaldo, pai de Maria das Graça, morreu quando ela tinha 14 anos. Nunca foi um pai dedicado à filha, não era um pai presente. Se o pai era desse jeito, a mãe era totalmente o inverso, era um universo de amor na vida da filha.

Ela estimulou o dom de Gal para a música mesmo antes da menina nascer. Ainda gestante, ela costumava ouvir música clássica, e se concentrava nessa tarefa como se quisesse compartilhar aquele universo de sons com a filha.

Na mocidade, Maria das Graças trabalhou como atendente em lojas de disco de Salvador. A estreia de Gal Costa como cantora aconteceu na inauguração do Teatro Vila Velha, em Salvador, no dia 22 de agosto de 1964. Na ocasião ela participou do show Nós, Por Exemplo... juntamente com Caetano Veloso, Gilberto Gil, Maria Bethânia, Tom Zé, e outros.

Em 1965, a cantora se mudou para o Rio de Janeiro. Ainda em 1965 grava seu primeiro disco, ainda assinando como Maria das Graças. Daí por diante, a carreira daquela menina que fora predestina e escolhida pela música ainda no ventre materno, ou quem sabe, antes mesmo de ser gerada, foi, de sucesso em sucesso, como uma estrela em ascensão.

Não apenas Gal Costa foi iluminar os céus da pátria celeste com sua voz. Nesta quarta-feira, o céu também chamou o ator, cantor e compositor, Rolando Boldrin. Ele também morreu em São Paulo, aos 86 anos. Boldrin estava internado no Hospital Albert Einstein havia dois meses. A causa da morte não foi informada.

Por 17 anos ele apresentou na TV Cultura, o programa Senhor Brasil, que a cada programa trazia para o palco o melhor da música regional brasileira. Era um programa cheio de brasilidade em todos os sentidos nos convidados que trazia, no cenário, nas obras dos artesãos que decoravam o ambiente, nas poesias recitava, e nos ‘causos’ que contava.

Boldrin também atuou em novelas de grande sucesso, dentre as quais; O Direito de Nascer, As Pupilas do Senhor Reitor, Mulheres de Areia, A Viagem, e Roda de Fogo.

Na TV Globo, ele apresentou o programa Som Brasil, na Bandeirantes, Empório Brasileiro, e no SBT, apresentou Empório Brasil. Todos com caraterísticas semelhantes.

Filho de uma família de 12 irmãos, Rolando Boldrin nasceu em São Joaquim da Barra, São Paulo, no ano de 1936. Aprendeu a toca viola muito cedo, e aos 12 anos, já se aventurava a formar, junto com um irmão, a dupla Boy e Formiga, que obteve relativo sucesso ao se apresentar na rádio da cidade.

Aos 16 anos mudou-se para a cidade de São Paulo. Antes de fazer na carreira na música na capital paulista trabalhou como sapateiro, frentista de posto de gasolina, carregador, garçom, e ajudante de farmácia.

Com sua inteligência e talento, Boldrin ajudou a divulgar a música sertaneja sempre com paixão e muito bom gosto.


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Sementes do ódio

Posted by Cottidianos on 12:44

Domingo, 06 de novembro

Exatamente há oito dias, os brasileiros, em clima de grande apreensão, iam às urnas. Era a eleição mais importante para o Brasil desde o início da redemocratização. E mais importante porque poderíamos retroceder de vez, e tornar novamente reais os fantasmas da ditadura. E risco de se estabelecer no Brasil um estado fundamentalista religioso.

Aliás, como temos visto, principalmente, neste primeiro e segundo turnos das eleições deste ano, e mesmo após ela, as sementes para isso já estão plantadas, basta uma chuva de produtos tóxicos, lançadas por pessoas igualmente tóxicas para que elas floresçam.

As eleições deste segundo turno foram tranquilas para a maioria dos brasileiros. Para outra parte elas não foram tão tranquilas assim. Para muitos eleitores houve transtornos e estresse, gerados pela Polícia Rodoviária Federal. Ironicamente, órgão estatal que deveria ter o papel de fazer com que o processo eleitoral se desenrolasse de forma tranquila.

A operação feita pela PRF neste segundo turno nas estradas federais, principalmente nas estradas do Nordeste, foram bem seletivas. O senador Oto Alencar, do PSD, da Bahia, foi parado numa dessas blitzs, na cidade de Feira de Santana, Bahia. Ele publicou um vídeo em suas redes sociais relatando que eram parados apenas os carros com adesivo de Lula. Os apoiadores de Bolsonaro, passavam livremente.

Também circularam vídeos nas redes sociais de eleitores relatando, com indignação, os mesmos fatos. No sábado, 29, um dia antes das eleições, o presidente do Tribunal Superior Eleitoral, Alexandre de Moraes, havia emitido uma ordem de que não fossem feitas operações policiais nas estradas no dia da eleição relativas ao transporte de eleitores. Portanto, além de ser uma afronta aos eleitores, os policiais também descumpriram ordem de um tribunal superior.   

Um levantamento feito pela TV Globo mostrava claramente o lado eleitoreiro da operação. Esse levamento mostra que a maior quantidade dessas operações foi no Nordeste, região em que Lula venceu Bolsonaro com folga no primeiro turno da eleição. 

- 272 operações no Nordeste (49,5% do total);

- 122 no Centro-Oeste (22,22%);

- 59 no Norte (10,7%);

- 48 no Sudeste (8,74%), e

- 48 no Sul (8,74%).

Apesar desses fatos, a eleição decorreu de forma tranquila em todo o Brasil. As eleições foram finalizadas com sucesso. O resultado foi anunciado. Lula foi o grande vencedor dela. O resultado foi bastante apertado. A diferença de votos foi muito pequena. Lula obteve 60.345.999 (50,90%) dos votos, e Jair Bolsonaro, 58.206.354 (49,10%). Uma diferença de 2.139,645 (1,8%) de votos. O resultado foi comemorado com bastante alegria em praças e avenidas de todo o país.

A diferença de votos entre Lula e Bolsonaro é pequena, mas se analisarmos o contexto veremos que vitória de Lula foi gigantesca. O candidato venceu quem tinha a máquina estatal na mão, e com ela feriu a lei, e derramou milhões na eleição tentando comprar votos do Congresso e de eleitores. Venceu a guerra das fake-news que espalhavam as mais absurdas mentiras, venceu os três filhos de Bolsonaro, que são hábeis espalhadores de notícias falsas e destruidores de reputações nas redes sociais.

Enfim, terminada a eleição, ainda tínhamos a tensão de como seria o comportamento de Bolsonaro. E ele se calou. Fechou-se em si mesmo e no Palácio do Planalto, maquinando não se sabe lá o que, ou tentando ruminar a derrota.

Enquanto Bolsonaro se calava, ainda no domingo à noite, começaram os protestos nas rodovias de todo o país do gado desvairado que ele comanda. Rodovias federais foram fechadas. E mais uma vez, a PRF, estranhamente, silenciou. Omitiu-se quando era seu papel agir com rapidez para desobstruir o fluxo nas rodovias. Ao contrário disso, o que se viu foi a conivência de muitos agentes da PRF com os protestos e com os manifestantes. Vídeos que circulam nas redes sociais mostram agentes batendo continência para os manifestantes.

A PRF só veio agir efetivamente quando o ministro presidente do TSE, Alexandre de Moraes emitiu ordens para que a PRF aumentasse o efetivo e agisse, imediatamente, para normalizar a situação. Hoje, domingo, 06 de novembro, mas já não há mais rodovias federais bloqueadas.

O gado desvairado de Bolsonaro ainda não sossegou. Eles estão se mobilizando nas redes sociais para uma greve geral nesta segunda-feira, provavelmente não terão êxito, mas vão tentar. Nos vídeos eles dizem que serão fechadas, empresas, escolas, universidades e indústrias.

Eu mesmo cheguei a ver um desses folders de convocação que circulam nas redes. O motivo da greve? Eles protestam contra a instalação do comunismo no Brasil. É coisa para dar risadas, eu sei, mas para eles, que estão com a alma sequestrada pelas fake-news, é coisa séria. Assim são os bolsonaristas: criaram uma realidade paralela e nela estão mergulhados. Perdida e enganadoramente mergulhados nela. Nadando no pântano podre e fétido da mentira eles protestam contra a instalação do comunismo no Brasil, pedem a volta da ditadura. São perigosos e violentos como mostraram os fatos que se sucederam nestas eleições. Citarei apenas alguns deles, para que os leitores tenham um pouco da dimensão do que esse povo é capaz.

Domingo, dia 30, em Divinópolis, Minas Gerais, um policial aposentado, 55 anos, tentou sufocar uma criança de 7 anos. O pai tinha ido com filho ao açougue. La estavam um grupo de pessoas conversando sobre política. O menino passou perto deles. O policial passou a mão na cabeça do menino de disse que ele tinha cara de quem vota em Bolsonaro, ao que o menino respondeu: “Eu sou Lula lá”.

O policial se enfureceu e agarrou o pescoço do menino, tentando sufocá-lo. O menino foi ficando sem ar, foi quando o pai que estava no balcão comprando a carne percebeu a violência contra o filho, foi até lá e pediu para o policial parar. O homem largou o menino, que caindo ao chão, machucou-se. “Meu filho está com trauma, não dorme e, quando dorme, acorda gritando, pedindo ajuda, dizendo que está sem ar”, disse a mãe da criança.

Na quinta-feira, 03, em uma rodovia em Jundiaí, interior de São Paulo, um ônibus cheio de estudantes trafegava cheio de estudantes. Manifestantes bolsonaristas que faziam protestos apedrejaram o ônibus e depois o invadiram.

Os estudantes passavam pelo ato golpista quando resolveram colocar adereços vermelhos nas janelas, alusivos ao candidato eleito. Os selvagens passaram então a jogar pedras no ônibus, estilhaçando janelas e ferindo um aluno de 18 anos. Em seguida, eles começaram a bater na lataria do veículo e na porta do ônibus, pedido que o motorista abrisse a porta.

Aterrorizado, o motorista acabou abrindo a porta, e eles entraram. Dentro do ônibus, seguiram-se momentos de terror para os estudantes. Os golpistas começaram a xingar e ameaçar os alunos. Pegaram no braço de um deles e ameaçaram tirá-lo do ônibus para que sofresse uma sessão de espancamento. Uma mulher, que estava dentro do ônibus, e que também era apoiadora do presidente, pediu que eles parassem, e que o que tinha acontecido até ali, já era suficiente.

Os golpistas só pararam realmente quando perceberam que o estudante que havia sido ferido pelos estilhaços da janela sangrava muito. Detalhe grave: Um grupo de policiais estava próximo ao local onde os golpistas invadiram o ônibus, mas não fizeram nada para impedir o ato de agres idade dos bolsonaristas.

No domingo, 30, na cidade de Belo Horizonte, Minas Gerais, depois das eleições, uma família comemorava a vitória do Lula. Passou um apoiador de Bolsonaro, viu a comemoração, e de forma insana começou a atirar. Pedro Henrique Dias, 28 anos, foi baleado chegou a ser levado a um hospital, mas não resistiu aos ferimentos. Os tiros atingiram ainda outras três vítimas que foram levadas ao hospital.

Uma das vítimas que tinha ficado internada no hospital era Luana Rafaela Oliveira Barcelos, 12 anos. Luana morreu na quinta-feira, 03. Luana e Rodrigo, vítimas da barbárie.

As escolas também protagonizaram cenas de violência praticadas pelos próprios estudantes.

Na sexta-feira, 4, oito alunos foram expulsos de um colégio de elite, em Valinhos, São Paulo. A explosão veio depois da denúncia de um aluno negro de 15 anos. Ele conta que o grupo de estudantes publicou mensagens machistas, homofóbicas, gordofóbicas, e xenofóbicas, além de exaltar figuras como Hitler e Mussolini. O aluno que fez a denúncia, ao não concordar com as mensagens publicadas pelos colegas, também foi alvo de ataques racistas. O caso está sendo investigado pela Polícia Civil.

Alunos de colégio de elite em Curitiba, Paraná, e que apoiam o Jair Bolsonaro, também protagonizaram cenas de barbárie, espelhando o que veem e ouvem dentro de casa. Eles agrediram alunos que votaram em Lula, e ainda fizeram ameaças de morte ao candidato. Em conversas de WhatsApp, um deles diz: “Quem vai ser o herói que vai matar o Lula?” “A 12 do meu pai chegou sexta-feira, kkkk”, diz outro.

Na quinta-feira, 3, o Ministério Público Federal, em Brasília, fez um pedido à Polícia Federal que abra um inquérito para investigar a conduta do ex-campeão do Fórmula 1, Nelson Piquet, por ele ter sugerido a morte de Lula. Piquet participou de atos golpistas contestadores do resultado das eleições. Nos vídeos que circulam nas redes sociais, ao dizer a frase lema de Jair Bolsonaro “Brasil acima de tudo, Deus acima de todos”, o ex-campeão completa com outra: “Lula no cemitério”.

Trouxe apenas estes casos de barbárie para ilustrar o texto, mas outros semelhantes aconteceram por todo o país. Como veem os caros leitores, Lula, certamente, precisará de muita proteção das leis humanas e da lei divina.

O Brasil não deu um segundo governo para Bolsonaro, mas as sementes do mal que ele plantou durante esses quatro anos estão bem vivas. Para o país não basta se livrar de Bolsonaro, é preciso e necessário impedir que essas sementes cresçam. E por que elas crescem? Muito se tem que estudar para se chegar a essa conclusão, mas uma vez se faz urgente: combater as fake news. Os devotos de Bolsonaro, estudados ou não, apenas tem uma fonte de informação: O WhatsApp e a Jovem Pan. A JP era um ninho bolsonaristas. E no WhatsApp correm as histórias mais inverossímeis, as quais os bolsonaristas tomam por verdade.


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Explode coração

Posted by Cottidianos on 22:56

 


Terça-feira, 01 de novembro

Explode coração

Na maior felicidade

É lindo meu Salgueiro

Contagiando e sacudindo esta cidade

(Peguei um Ita no Norte - Samba-enredo Salgueiro, 1993)



O domingo, 30 outubro de 2022, não foi um domingo como outro qualquer, nem para mim, nem para qualquer outro brasileiro. Havia uma nuvem de preocupação no ar, impedindo que o sol da esperança brilhasse em toda sua plenitude. Neste dia especial fomos às urnas escolher para escolher o presidente do nosso país, porém, muito mais que isso, tínhamos que escolher entre dois modelos de sociedade: uma sociedade que respira democracia, e uma que exala autoritarismo e preconceito. 

Por volta do meio, peguei minha bicicleta e sai em direção a seção eleitoral na qual voto, distante de onde moro cerca de 7 km, os quais levo cerca de 40 minutos para percorrer. Há seções eleitorais bem mais perto, há menos de 1 km de onde moro, porém, não quis transferir o título. Motivo: Nunca enfrentei fila na minha seção eleitoral, e ainda faço um pouco de exercício.

Na metade da subida de uma ladeira, parei para tomar um pouco d’água. Fazia um dia agradável. Olhei para os carros que subiam a avenida, mas meus olhos não estavam no momento presente, eles pareciam viajar no tempo e nas vezes em que saí às ruas por causa de Luís Inácio Lula da Silva.

Em 1989, e em 1994, fui às ruas com o coração de cheio de esperança de um Brasil melhor com Lula. Em 1989, o petista foi vencido Collor de Mello, e em 1994, por Fernando Henrique Cardoso.

Enfim, chegou a vez de se alegrar com uma vitória de Lula. Em 2002 foi a primeira vez. A segunda em 2006. Em 2002 Lula deixou para trás José Serra, e em 2006, Geraldo Alckmin.

Depois veio as eleições de Dilma Rousseff em 2010. Contra José Serra, Dilma foi eleita a primeira presidente do Brasil. Em 2014, ela foi reeleita em disputa contra Aécio Neves.

Nessa minha história com Lula e com o PT não houve apenas alegrias, mas também tristezas, decepções, e sentimento de traição causados pelos escândalos de corrupção que explodiram nos governos petistas. E eu fui às ruas gritar “Fora Lula!”, “Fora Dilma!”, “Fora PT!”.

Comemorei quando a Dilma sofreu processo de impeachment. Hoje, depois das águas que rolaram por debaixo da ponte, entendo que ela sofreu um golpe. Também comemorei quando o Lula foi preso. Também em mim, havia um sentimento antipetista.

Em 2018, com Lula na cadeia, surgiu um homem que se considerava contrário à velha política, e que se colocou como baluarte na luta contra a corrupção. Aquela conversa mole não me convenceu. Me chamou a atenção que o voto daquele homem no Congresso por ocasião do impeachment da Dilma foi em homenagem a um dos mais cruéis torturadores da ditadura brasileira: o coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra. Muitas outras coisas ditas por ele, logo acenderam alerta vermelho em minha mente. Aquele não era o homem que o Brasil precisava, pensava eu. E não estava errado.

Mesmo assim, não me animei a votar no candidato do PT, Fernando Haddad que disputou a eleição com Jair Bolsonaro. Entretanto, o sentimento anti-petista que crescia em mim, me levou a votar nulo naquelas eleições. Posteriormente, me arrependi de minha postura de neutralidade.

Passaram-se os anos seguintes e Jair Bolsonaro se mostrou um homem cheio de rancores e mentiras. Sepultou a Lava Jato. Destruiu florestas. Agrediu as mulheres. Atacou a imprensa, a cultura, e as artes. Andou de braços dados com os poderosos e desprezou os humildes.

Veio a pandemia, e Bolsonaro mostrou sua face mais cruel. Desprezou o poder matador do vírus, zombou das pessoas que sofriam da doença, desprezou as vacinas e atrasou a compra delas. A política econômica do governo também carecia de clareza. Ultrapassou o teto de gastos, e criou o orçamento secreto.

Mesmo assim, nenhum nome no meio da política se mostrava capaz de derrotar Bolsonaro numa eleição. Tudo parecia perdido. Foi então, que numa dessas reviravoltas espetaculares da vida, Lula saiu da cadeia, livrou-se dos processos que respondia na Justiça, e voltou a cena eleitoral em condições de disputar a presidência com Jair Bolsonaro.

E Lula não apenas voltou, mas também ganhou as eleições. E isso foi para a maioria dos brasileiros, amantes da democracia, um imenso alívio. Neste domingo 30, eu estava tão nervoso, que nem consegui acompanhar a apuração das eleições. Fiquei o dia todo ligado no noticiário. Cabeça a mil. Quando se aproximou do horário de encerramento das eleições. Fui deitar. Acordei por volta das 18h30min.

Liguei o rádio. O noticiário dizia que as apurações das urnas estavam em cerca de 50%. Bolsonaro na frente. A ansiedade tomava conta do meu peito. Difícil ficar acompanhando. É assim também em final de campeonato quando meu time vai para disputa de pênaltis na final. Fico muito ansioso.

Peguei a bicicleta e sai, novamente, pelas ruas da cidade. Movimento tranquilo na rua. Todo mundo em casa, grudado no rádio ou na televisão, acompanhado a apuração dos votos. Dirigi-me para os bairros de classe média. Lá é mais tranquilo, menos trânsito. Dá para pedalar e ouvir música sossegado. Também tem mais bolsonaristas, e os bolsonaristas estariam mais calados, pelo menos torcia para que isso acontecesse.

De fato, isso e confirmou. Ao pedalar pelas ruas daquele bairro, ouvia apenas o som do silêncio. Depois de cerca de 40 minutos resolvi voltar ao Centro. Por onde andava, tudo continuava no mais absoluto silêncio. Foi quando recebi uma ligação do meu sobrinho, Juan, de 8 anos, do Rio Grande do Norte. Foi ele quem me deu o primeiro sinal de que a esperança estava nascendo novamente. “Tio, o senhor está escutando os fogos? Muitos fogos estourando”, disse ele. Ele se referia aos fogos que estouravam na cidade onde ele estava. Depois conversei com o pai dele, e ele me explicou que a apuração estava caminhando para o final, com Lula na frente.

Quando entrei em casa a apuração dos votos estava quase no final. Mais alguns minutos e William Bonner anunciou. “TSE acaba de declarar que Luís Inácio Lula da Silva é o novo presidente do Brasil”. Meu Deus! Quase que meu peito explodiu de felicidade. Sai para à rua para comemorar.

Estava numa movimentada avenida da cidade. Carros a todo momento passavam buzinando. Pessoas gritando. Também o coração delas explodia de felicidade. Eu parei junto ao meio fio. Ao meu lado parou um carro branco com um jovem ao volante. Lele parecia eufórico. Olhou nos meus olhos e perguntou. “É Lula ou não é”. Tentei falar, mas a voz, não saia. Compreendi então o que é que povo chama de “voz embargada”.

E o rapaz olhando para mim. Eu olhando para ele sem consegui falar. Ele continuou, como se esperasse uma resposta. Enfim, com muito custo, e após alguns instantes tudo o que consegui dizer foi: “Não consigo nem falar”.

Fiquei por mais algum tempo, vendo aquela multidão eufórica, a pé ou de carro transitando pelo Centro da cidade, parando nos bares para tomar uma merecida cerveja, talvez a cerveja mais gostosa que eles já tomaram na vida. Também eu tomei um Chopp, depois fui para casa, ver, através da TV, a festa que acontecia em todo o país. A avenida Paulista, em especial, onde Lula fez o primeiro discurso como presidente parecia um mar de gente.

Depois fui dormir, e dormi o sono dos justos. Acordei na segunda pela manhã com meu coração cheio de felicidade. Mas, como todo brasileiro, estava curioso para ver como o presidente Jair Bolsonaro, reagiria à vitória de Lula. É de praxe em eleições, em campeonatos, em disputas, que o perdedor cumprimente e parabenize o vencedor. É do jogo, é ato de civilidade, de nobreza. Mas, esperar atos de dignidade e nobreza de Jair Bolsonaro, é pedir demais. Ele não tem essas coisas. Talvez precise nascer de novo para tê-las.

De fato, até agora, momento em que escrevo esse texto, ele ainda não se pronunciou. E nisso o silêncio dele também pode querer dizer muito.

Na segunda-feira, pela manhã, o Brasil foi surpreendido pelo movimento dos caminhoneiros que obstruíam as estradas do país. São apoiadores do presidente Jair Bolsonaro que, revoltados com a derrota dele, causam estragos e tumultos para o restante da população brasileira. Querem intervenção militar. Querem o exército nas ruas. Depois, segundo eles mesmo, o bandido é o Lula, e os baderneiros são os petistas. Como diria um senador governista durante a CPI da Covid: “Vai vendo, Brasil”.

                                         Festa da vitória na Avenida Paulista                                          

No domingo, dia da eleição, a Polícia Rodoviária Federal fez uma blitz em todas as estradas do país, principalmente, no Nordeste que é a região onde o presidente Lula, recebeu mais votos. A operação do domingo foi feita, claramente, com a finalidade de tumultuar a eleição. Já o movimento dos caminhoneiros que causam prejuízos aos negócios e às pessoas, a PRF tratou com complacência. Vídeos que circulam pelas redes sociais mostram policias rodoviários federais apoiando os manifestantes, ao invés de coibi-los.

E mesmo com esse caos todo que se instalou pelas estradas do país, nem assim, o governo emitiu nenhuma palavra. É como diz ditado: “Calado estava, calado ficou”. E, nesse caso, ficar calado, também é uma forma de dizer alguma coisa.

Foi preciso que, mais uma vez, entrasse em cena o presidente do TSE, Alexandre de Moraes. Moraes determinou que as rodovias fossem liberadas em 24 horas, sob pena de serem aplicadas multas de 100 mil reais por hora ao diretor-geral da PRF, o bolsonarista Silvinei Vasques, a partir da 0h00 de 1 de novembro. Se não cumpridas as decisões o diretor, além de ser multado, pode ser afastado do cargo, ou até mesmo preso.

Houve julgamento no STF para decidir sobre o caso, e os ministros do STF acompanharam a decisão de Alexandre de Moraes. A Polícia Rodoviária Federal foi obrigada a realizar a desobstrução das rodovias. Moraes também autorizou que as policias estaduais participem da operação.

O momento é de tensão elevada nas estradas com as tropas de choque chegando nas rodovias e obrigando os caminhoneiros a saírem das rodovias, usando, inclusive, gás de pimenta nos apoiadores de Bolsonaro. Com certeza, esse foi um movimento orquestrado e planejado com antecedência. Cabe agora uma investigação para saber quem organizou e financiou esse movimento criminoso.

No sábado, anterior ao da eleição, ainda tivemos que presenciar o episódio lamentável da deputada bolsonarista Carla Zambelli, armada, nas ruas de São Paulo, perseguindo um homem negro, eleitor do presidente Lula. Por pouco também o Brasil não presenciou mais um assassinato.

Enfim, depois de uma espera de 45 horas após as eleições, eis que Bolsonaro, finalmente, resolve se pronunciar. Na tarde deste dia 1 de novembro, Bolsonaro se dirigiu a nação em um discurso que durou cerca de dois minutos. Um discurso relâmpago. Cuja íntegra reproduzo abaixo:

Quero começar agradecendo os 58 milhões de brasileiros que votaram em mim no último dia 30 de outubro. Os atuais movimentos populares são fruto de indignação e sentimento de injustiça de como se deu o processo eleitoral.

As manifestações pacíficas sempre serão bem-vindas, mas os nossos métodos não podem ser os da esquerda, que sempre prejudicaram a população, como invasão de propriedades, destruição de patrimônio e cerceamento do direito de ir e vir.

A direita surgiu de verdade em nosso país. Nossa robusta representação no Congresso mostra a força dos nossos valores: Deus, pátria, família e liberdade.

Formamos diversas lideranças pelo Brasil. Nossos sonhos seguem mais vivos do que nunca. Somos pela ordem e pelo progresso. Mesmo enfrentando todo o sistema, superamos uma pandemia e as consequências de uma guerra.

Sempre fui rotulado como antidemocrático e, ao contrário dos meus acusadores, sempre joguei dentro das quatro linhas da Constituição. Nunca falei em controlar ou censurar a mídia e as redes sociais.

Enquanto presidente da República e cidadão, continuarei cumprindo todos os mandamentos da nossa Constituição.

É uma honra ser o líder de milhões de brasileiros que, como eu, defendem a liberdade econômica, a liberdade religiosa, a liberdade de opinião, a honestidade e as cores verde-amarela da nossa bandeira.

Muito obrigado.

Como leram os caros leitores e leitoras, em nenhum momento, Bolsonaro parabeniza o Lula pela vitória. Se diz democrata. Condena sem condenar o movimento dos caminhoneiros, e, se prestarmos atenção, também legitima o movimento e critica o processo eleitoral ao dizer: “Os atuais movimentos populares são fruto de indignação e sentimento de injustiça de como se deu o processo eleitoral”. Ora, todos fomos testemunhas de que o processo eleitoral se deu dentro da mais absoluta lisura, rapidez e eficiência. Não poderia faltar no discurso dele a fixação, a obsessão em atacar a esquerda. Enfim, o discurso de Bolsonaro foi tão pequeno quanto ele.

Finalizado o discurso, Bolsonaro sai e deixa a palavra com Ciro Nogueira, que, visivelmente constrangido, diz ter sido autorizado por Bolsonaro iniciar o processo de transição. “O presidente Jair Bolsonaro me autorizou, quando for provocado, com base na lei, nós iniciaremos o processo de transição. A presidente do PT, segundo ela em nome do presidente Lula, disse que na quinta-feira será formalizado o nome do vice-presidente Geraldo Alckmin. Aguardaremos que isso seja formalizado para cumprir a lei do nosso país”.

É por ver todos os absurdos que vi na campanha eleitoral, principalmente nestes últimos dias, e por tudo o mais que presenciei durante esses 4 anos do governo, é que afirmo, sem peso na consciência, que o presidente Lula, reconquistou meu coração, e o de milhões de brasileiros. Também muita gente, que não tem nenhuma afinidade com o PT, mas votou no Lula em defesa da democracia.

É por isso tudo isso que metade do Brasil explode de felicidade, enquanto a outra metade, doente — pois o bolsonarismo é doença. — chora e lamenta a derrota do “mito”. Não basta apenas o Brasil se livrar de Bolsonaro, é preciso, com tempo, calma e paciência, se livrar do bolsonarismo. Tudo isso é um processo, e vai depender da forma como o presidente Lula vai conduzir o Brasil nos próximos 4 anos. 


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