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Parabéns, Professor!
Posted by Cottidianos
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00:36
Quarta-feira,
15 de outubro
“Sou eu que vou seguir você
Do primeiro rabisco até o bê-a-bá
Em todos os desenhos
Coloridos vou estar
A casa, a montanha, duas nuvens no céu
E um sol a sorrir no papel
Sou eu que vou ser seu colega
Seus problemas ajudar a resolver
Te acompanhar nas provas bimestrais
Você vai ver
Serei de você confidente fiel
Se seu pranto molhar meu papel”.
(O caderno – Chico Buarque , Toquinho – Mutinho
Interpretação: Toquinho)
Hoje,
15 de outubro, é dia dedicado àqueles que tem por missão, ensinar. Nas escolas,
nas faculdades, nas aulas particulares, eles se desdobram por transmitir a
outrem aquilo que aprenderam.
Quem
não se lembra da primeira escolinha, da primeira professora? Essas lembranças ficam gravadas na memória e são tão fortes que nem precisamos fazer
muito esforço para que elas venham à tona.
Quando
falo desses tempos iniciais me lembro, com nitidez, da escolinha, lá na pequena
comunidade de Capela, em Ceará-Mirim, no Rio Grande do Norte. Severina dos
Anjos e Maria da Conceição, minhas primeiras mestras, devem ter tido muito
trabalho para me ensinar as primeiras letras… E muita paciência também.
Lembro
que, no meu primeiro ano nos bancos escolares, chorava algumas vezes, digo, muitas vezes, embaralhado com aquelas letrinhas que iam se formando, se aglomeravam
em palavras que depois formavam frases, que se tornavam códigos que se faziam imperativos
e necessários decifrar. Nem sempre eu conseguia… Era tudo muito complicado… E eu
chorava. Haja paciência por parte daqueles dois anjos que se esforçaram para me
apresentar, me ensinar e me conduzir pelo maravilhoso mundo das palavras.
Depois
vieram no ensino médio e no segundo grau; Ana Vilma, Alexandre, Dona Vilma,
Paulinho, Betão, Virginia, todos em Ceará-Mirim. Aqui em Campinas, na
Faculdade; Celso Budstein, Celso Celso Falaschi, Saviani Rey, Marcel Cheida, Cíça
Toledo, Márcia, Maria José. Não dá para citar o nome de todos os mestres que
passaram pela minha vida, mesmo assim, sou grato a todos.
Ofereço, a todos os professores, este belo texto de Rubem Alves (1933 – 2014), teólogo, educador,
psicanalista e escritor campineiro, de grande sensibilidade para com o mundo
das palavras. O texto, Ensinar a Alegria, faz parte do livro, A Alegria de
Ensinar, publicado em 1994, pela Editora Ars Poetica.
Junto
com o texto ofereço-lhes também flores. Ainda não possam segurá-las
fisicamente, o perfume exalado por elas invadirá os seus corações.
A
vocês todos, o meu muito obrigado.
Não nos esqueçamos de que na grande escola que é a
vida, somos todos aprendizes, e o que o Mestre do Universo também tem enorme
paciência conosco.
FELIZ
DIA DOS PROFESSORES!
***
Ensinar
a alegria
Muito
se tem falado sobre o sofrimento dos professores.
Eu,
que ando sempre na direção oposta, e acredito que a verdade se encontra no
avesso das coisas, quero falar sobre o contrário: a alegria de ser professor,
pois o sofrimento de se ser um professor é semelhante ao sofrimento das dores
de parto: a mãe o aceita e logo dele se esquece, pela alegria de dar à luz um
filho.
Reli,
faz poucos dias, o livro de Hermann Hesse, O Jogo das Contas de Vidro. Bem ao
final, à guisa de conclusão e resumo da estória, está este poeminha de Rückert:
Nossos dias são
preciosos
mas com alegria
os vemos passando
se no seu lugar
encontramos
uma coisa mais
preciosa crescendo:
uma planta rara
e exótica,
deleite de um
coração jardineiro,
uma criança que
estamos ensinando,
um livrinho que
estamos escrevendo.
Este
poema fala de uma estranha alegria, a alegria que se tem diante da coisa triste
que é ver os preciosos dias passando... A alegria está no jardim que se planta,
na criança que se ensina, no livrinho que se escreve. Senti que eu mesmo
poderia ter escrito essas palavras, pois sou jardineiro, sou professor e
escrevo livrinhos. Imagino que o poeta jamais pensaria em se aposentar. Pois
quem deseja se aposentar daquilo que lhe traz alegria? Da alegria não se aposenta...
Algumas páginas antes o herói da estória havia declarado que, ao final de sua longa
caminhada pelas coisas mais altas do espírito, dentre as quais se destacava a familiaridade
com a sublime beleza da música e da literatura, descobria que ensinar era algo
que lhe dava prazer igual, e que o prazer era tanto maior quanto mais jovens e
mais livres das deformações da deseducação fossem os estudantes.
Ao
ler o texto de Hesse tive a impressão de que ele estava simplesmente repetindo
um tema que se encontra em Nietzsche. O que é bem provável. Fui procurar e
encontrei o lugar onde o filósofo (escrevo esta palavra com um pedido de perdão
aos filósofos acadêmicos, que nunca o considerariam como tal, porque ele é poeta
demais, “tolo” demais...) diz que “a felicidade mais alta é a felicidade da
razão, que encontra sua expressão suprema na obra do artista. Pois que coisa
mais deliciosa haverá que tornar sensível a beleza? Mas “esta felicidade suprema,”
ele acrescenta, “é ultrapassada na felicidade de gerar um filho ou de educar
uma pessoa.”
Passei
então ao prólogo de Zaratustra.
Quando
Zaratustra tinha 30 anos de idade deixou a sua casa e o lago de sua casa e
subiu para as montanhas. Ali ele gozou do seu espírito e da sua solidão, e por
dez anos não se cansou. Mas, por fim, uma mudança veio ao seu coração e, numa
manhã, levantou-se de madrugada, colocou-se diante do sol, e assim lhe falou:
Tu, grande estrela, que seria de tua felicidade se não houvesse aqueles para
quem brilhas? Por dez anos tu vieste à minha caverna: tu te terias cansado de
tua luz e de tua jornada, se eu, minha águia e minha serpente não estivéssemos
à tua espera. Mas a cada manhã te esperávamos e tomávamos de ti o teu transbordamento,
e te bendizíamos por isso.
Eis que estou
cansado na minha sabedoria, como a abelha que ajuntou muito mel; tenho
necessidade de mãos estendidas que a recebam. Mas, para isso, eu tenho de
descer às profundezas, como tu o fazes na noite e mergulhas no mar... Como tu,
eu também devo descer... Abençoa, pois, a taça que deseja esvaziar-se de
novo...
Assim
se inicia a saga de Zaratustra, com uma meditação sobre a felicidade. A
felicidade começa na solidão: uma taça que se deixa encher com a alegria que
transborda do sol. Mas vem o tempo quando a taça se enche. Ela não mais pode
conter aquilo que recebe. Deseja transbordar. Acontece assim com a abelha que não
mais consegue segurar em si o mel que ajuntou; acontece com o seio, turgido de
leite, que precisa da boca da criança que o esvazie. A felicidade solitária é
dolorosa. Zaratustra percebe então que sua alma passa por uma metamorfose.
Chegou a hora de uma alegria maior: a de compartilhar com os homens a felicidade
que nele mora. Seus olhos procuram mãos estendidas que possam receber a sua riqueza.
Zaratustra, o sábio, se transforma em mestre. Pois ser mestre e isso: ensinar a
felicidade.
“Ah!”,
retrucarão os professores, “a felicidade não é a disciplina que ensino. Ensino ciências,
ensino literatura, ensino história, ensino matemática...” Mas será que vocês
não percebem que essas coisas que se chamam “disciplinam’’, e que vocês devem
ensinar, nada mais são que taças multiformes coloridas, que devem estar cheias
de alegria?
Pois
o que vocês ensinam não e um deleite para a alma? Se não fosse, vocês não
deveriam ensinar. E se é, então é preciso que aqueles que recebem, os seus
alunos, sintam prazer igual ao que vocês sentem. Se isso não acontecer, vocês terão
fracassado na sua missão, como a cozinheira que queria oferecer prazer, mas a comida
saiu salgada e queimada...
O
mestre nasce da exuberância da felicidade. E, por isso mesmo, quando perguntados
sobre a sua profissão, os professores deveriam ter coragem para dar a absurda
resposta: “Sou um pastor da alegria...” Mas, e claro, somente os seus alunos
poderão atestar da verdade da sua declaração...
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