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Gira Girou
Posted by Cottidianos
on
20:00
Sábado, 01 de fevereiro
“Meu canto esconde-se como um bando de Ianomâmis na
floresta
Na minha testa caem, vêm colocar-se plumas de um
velho cocar
Estou de pé em cima do monte de imundo lixo baiano
Cuspo chicletes do ódio no esgoto exposto do Leblon
Mas retribuo a piscadela do garoto de frete do
Trianon
Eu sei o que é bom
Eu não espero pelo dia em que todos os homens
concordem
Apenas sei de diversas harmonias bonitas possíveis
sem juízo final
Alguma coisa está fora da ordem
Fora da nova ordem mundial...”
(Trecho da música, Fora da Ordem – Caetano Veloso)
O
texto a seguir é uma “salada” originada a partir da música Mundo Bom, da autoria de Agepê e Canário, interpretada pelo próprio
Agepê. Ainda foram usadas na "receita" as músicas Roda Viva, de Chico Buarque, Fora
de Ordem, de Caetano Veloso, e Êta
Mundo Grande, de Martinho da Vila. Chico, Caetano e Matinho, creio,
dispensam apresentações. Quanto a Agepê, algumas palavras são necessárias.
Antonio Gilson Porfírio, mais conhecido como Agepê, nasceu no Rio de Janeiro, em
10 de agosto de 1942, e faleceu em 30 de agosto de 1995. Sambista de primeira
categoria, dono de um repertório eclético e bem escolhido, teve em Canário seu
grande parceiro nas composições. Entre seus grandes sucessos estão: Menina dos Cabelos Longos, Deixa Eu Te Amar e Moro Onde Não Mora Ninguém. Um artista digno dos aplausos que
recebeu.
As
frases em destaque são trechos literais extraídos das músicas citadas.
Vamos
ao texto e boa leitura. Espero que saboreiem o prato.
Imagem: http://astronomy-universo.blogspot.com.br/2013/05/galeria-de-imagens-fotos-da-terra-vista.html |
É
noite. Ando pelas ruas de uma Campinas fria e nua. As mãos não ousam sair dos
bolsos do agasalho. Imagens desconexas surgem em minha mente, algumas côncavas
outras convexas. No caos organizado de minhas idéias ouço a voz suave e macia
de Caetano.. Finjo não
ouvir. Prossigo meu caminho.Não dou bola. Prossigo. Ele insiste:
_ Ei, alguma coisa está fora da ordem, fora da
nova ordem mundial. A situação parece
que se tornou mais grave. Mais que fora da nova ordem mundial, alguma coisa
está fora da ordem emocional.
_
Cara, e eu com isso? – Pergunto.
_
Acorda! Sai do reino da fantasia. Você faz parte disso tudo. Eu faço parte
disso tudo. Nós fazemos parte disso tudo.
_
Ah, me deixa em paz. Só quero curtir o frio da noite numa cidade nua. Não
me venha com comidas indigestas!
De
repente, não sei como, surge por entre as árvores da praça, Chico Buarque
montado num cavalo alado, com sua fala suave, porém, firme:
_
A gente quer ter voz ativa. No nosso destino mandar, mas eis que chega a roda
viva e carrega o destino pra lá.
Num
passe de mágica o tempo roda, num instante, nas voltas do meu coração. Rodou o
mundo, rodou o moinho, rodou o pião, na palma da minha mão. A cortina fechou e
abriu rapidamente. O cenário mudou e eu estava à beira de um rio onde corre
leite e mel. Ao meu lado, vestido de branco, estava um Agepê tranquilo e
sereno. Cantava com a autoridade de um
profeta a clamar no deserto. A mensagem em forma de música se misturava às
minhas próprias reflexões.
Eta,
mundo velho e bom, bonito, colorido, boa praça.
O
mundo nasceu assim. Um paraíso feito para o homem. Se o Brasil é belo hoje, imagine então quando foi descoberto! Que cenários paradisíacos!
Milhares de quilômetros de Mata Atlântica! Puro verde. Verde-mar! Fartura de
alimentos puros e saudáveis, sem agrotóxicos. Sem trans qualquer coisa. Coisa
de Adão Eva. Vieram às maças envenenadas da ambição desmedida, da
corrupção desenfreada, do lucro a qualquer custo... E o que era paraíso está
virando inferno. Que pena! Mas ainda há tempo de salvar este santuário chamado
terra. É hora de uma tomada de consciência e, normalmente, sem querer dar uma
de super-herói, a gente consegue. Ah, se consegue!
Atrás
do lado feio da vida há coisas lindas pra se ver. Quero ver.
Enxergar
o sol no meio da tempestade. Não deixar a peteca do otimismo cair. Bola pra
frente. É uma atitude a ser adotada por
todos nós. Afinal, como diz Martinho da Vila, na música Êta Mundo Grande “Eta
mundo grande, cheio de beleza,com esta imensa natureza, que o Bom Deus criou,
esse mundão foi feito pra se vadiar, mas o que vale nesta vida, é o que se faz,
o que se sonha, e o que se ama”.
Gira
mundo, vai girando, roda mundo vai rodando, roda gira, gira roda, me leva pra
qualquer lugar. No eixo do meu dia-a-dia te deixo me fazer cantar.
Pois
é, às vezes da vontade de pegar a roda vida e fugir nela para bem longe. Sabe
aquela estória tipo ilha deserta? Porém, realidade rima com gravidade, prende
os pés da gente no chão. Que chato! O jeito é fugir para o universo da música e
apreciar a constelação dos sons.
Tem
gente que não entende que a vida é feita de açúcar e sal, de chuva e sol. Quem sabe arrancar o veneno do peito e sair
satisfeito por aí, faz da vida um carnaval.
É
amigo, pensa que a vida é só leite , ramalhete de flores, etc e tal? Que nada!
Também tem espinhos, pedra no caminho, tem bofetada na cara, tem as tais das
decepções, tem lagrima chorada. Não é mole não! Mas não precisa fazer estoque
de veneno no peito por causa disso. Você será vítima dele se assim fizer. Ao
contrário: bota uma roupa bonita, um perfume cheiroso, levanta a auto-estima e
vem pra roda de samba, ou vai pra Maracangalha. Você decide. O importante é
estar bem!
Agepê
subiu. E eu voltei às ruas de Campinas. Corri atrás de Caetano e, enquanto ele
desaparecia em uma esquina, ainda foi possível ouvi-lo dizer:
Eu não espero pelo dia em que todos os
homens concordem. Apenas sei de diversas harmonias bonitas, possíveis, sem
juízo final...
Fiquei
ali, parado naquela esquina, pensando: realmente, alguma coisa deve estar fora
da ordem...
(Texto
de minha autoria, publicado originalmente no blog rec2010.blogspot.com, em 08 de junho de 2011 )
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