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Carta aberta ao povo do Brasil, de Edward Snowden
Posted by Cottidianos
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21:12
Terça-feira,
17 de dezembro
Imagem: http://www1.folha.uol.com.br/mundo/ |
O
governo brasileiro foi pego de surpresa com a divulgação, pelo jornal Folha de São Paulo, de uma carta aberta
ao povo brasileiro, da autoria de Edward Snowden. A carta foi entregue ao jornal por David Miranda namorado brasileiro de Gleen Greenwald, que por sua vez, responsável por divulgar as revelações de Snowden.
Venho
acompanhando o caso de Snowden, ex-agente da agência de inteligência norte
americana. Já publiquei alguns artigos tratando desse assunto neste blog.
O
ex-agente revelou ao mundo, segredos guardados à sete chaves pela NSA (Agência
de Segurança Nacional) americana. As revelações feitas por Snowden a Gleen
Grenwald, jornalista americano, residente no Brasil, e publicadas,
inicialmente, no britânico The Guardian e
no americano The Washington Post, tiveram sobre a comunidade
internacional e, principalmente, sobre o governo norte-americano, o efeito de
uma bomba de grande potência. As consequências da explosão de tal bomba
repercutiram no mundo inteiro, em alguns países com mais intensidade, em outros
com menos intensidade. Snowden, como todo bom agente, conseguiu fugir do país,
antes que a polícia americana conseguisse colocar as mãos nele. Desde então,
ele tem visto sua vida mudar de forma radical. Vive, atualmente, como um homem
sem pátria. Primeiro passou por Hong Kong, não conseguindo asilo do governo
daquele país, rumou para Moscou, onde após passar cerca de um mês, em algum lugar no aeroporto daquela capital, conseguiu do governo russo, um asilo temporário. Já pediu
asilo político à diversos países e nenhum foi aceito.
Nos Estados Unidos, essa carta de Snowden chegou em momento apropriado. O governo americano estava realizando uma reunião com empresas de Internet, na qual discutia, dentre outros assuntos, a questão da espionagem. Obviamente, a Casa Branca não recebeu essa notícia com alegria. Se voltar aos Estados Unidos, Snowden pode ser preso e condenado pelos crimes de roubo de propriedade do governo, comunicação intencional de informações secretas de inteligência e comunicação não autorizada sobre informação de defesa nacional. Cada um dos crimes prevê uma pena máxima de 10 anos. Em entrevista exclusiva ao Jornal Nacional, David Miranda disse que carta escrita por Snowden, não era um pedido de asilo e troca de informação, mas que Snowden ficaria feliz se o Brasil lhe concedesse asilo. David disse também que, ao fazer as revelações, Snowden queria, na verdade chamar a sociedade ao debate: "O objetivo dele não é machucar os Estados Unidos. O objetivo dele é criar um debate onde exista uma liberdade na Internet. Se as pessoas de um país decidirem ser espionadas pelo seu governo, que se deixe as pessoas decidirem isso e não que os seus governos decidam por ela", afirmou David ao Jornal Nacional.
Agora
Snowden envia uma carta aberta ao povo do Brasil. Nela, o americano, nascido na
Carolina do Norte, se diz satisfeito com a reação do Brasil às denuncias de
espionagem feitas pelas NSA e que isso o motiva a continuar fazendo novas
revelações. Snowden faz promessa de colaborar com mais revelações sobre o
assunto se o governo brasileiro lhe conceder asilo. Essa carta ainda não
chegou, oficialmente, nas mãos das autoridades brasileiras.
Ainda
de acordo com o jornal Folha de São Paulo,
não há, por parte do governo brasileiro, a intenção de investigar a NSA, nem
conceder asilo a Snowden, em troca de asilo político, em troca de informações.
Ferir a soberania de outro país é algo que as autoridades brasileiras querem
evitar. O Ministro das Relações Exteriores, entretanto, é favorável a
mobilização em defesa da privacidade dos cidadãos.
A
seguir, apresento a integra da carta de Snowden, publicado pela Folha de São Paulo.
***
CARTA ABERTA AO POVO DO BRASIL
From EDWARD SNOWDEN
Seis
meses atrás, emergi das sombras da Agência Nacional de Segurança (NSA) dos EUA
para me posicionar diante da câmera de um jornalista. Compartilhei com o mundo
provas de que alguns governos estão montando um sistema de vigilância mundial
para rastrear secretamente como vivemos, com quem conversamos e o que dizemos.
Fui
para diante daquela câmera de olhos abertos, com a consciência de que a decisão
custaria minha família e meu lar e colocaria minha vida em risco. O que me
motivava era a ideia de que os cidadãos do mundo merecem entender o sistema
dentro do qual vivem.
Meu
maior medo era que ninguém desse ouvidos ao meu aviso. Nunca antes fiquei tão
feliz por ter estado tão equivocado. A reação em certos países vem sendo
especialmente inspiradora para mim, e o Brasil é um deles, sem dúvida.
Na
NSA, testemunhei com preocupação crescente a vigilância de populações inteiras
sem que houvesse qualquer suspeita de ato criminoso, e essa vigilância ameaça
tornar-se o maior desafio aos direitos humanos de nossos tempos.
A
NSA e outras agências de espionagem nos dizem que, pelo bem de nossa própria
"segurança" --em nome da "segurança" de Dilma, em nome da
"segurança" da Petrobras--, revogaram nosso direito de privacidade e
invadiram nossas vidas. E o fizeram sem pedir a permissão da população de
qualquer país, nem mesmo do delas.
Hoje,
se você carrega um celular em São Paulo, a NSA pode rastrear onde você se
encontra, e o faz: ela faz isso 5 bilhões de vezes por dia com pessoas no mundo
inteiro.
Quando
uma pessoa em Florianópolis visita um site na internet, a NSA mantém um
registro de quando isso aconteceu e do que você fez naquele site. Se uma mãe em
Porto Alegre telefona a seu filho para lhe desejar sorte no vestibular, a NSA
pode guardar o registro da ligação por cinco anos ou mais tempo.
A
agência chega a guardar registros de quem tem um caso extraconjugal ou visita
sites de pornografia, para o caso de precisarem sujar a reputação de seus
alvos.
Senadores
dos EUA nos dizem que o Brasil não deveria se preocupar, porque isso não é
"vigilância", é "coleta de dados". Dizem que isso é feito
para manter as pessoas em segurança. Estão enganados.
Existe
uma diferença enorme entre programas legais, espionagem legítima, atuação
policial legítima --em que indivíduos são vigiados com base em suspeitas
razoáveis, individualizadas-- e esses programas de vigilância em massa para a
formação de uma rede de informações, que colocam populações inteiras sob
vigilância onipresente e salvam cópias de tudo para sempre.
Esses
programas nunca foram motivados pela luta contra o terrorismo: são motivados
por espionagem econômica, controle social e manipulação diplomática. Pela busca
de poder.
Muitos
senadores brasileiros concordam e pediram minha ajuda com suas investigações
sobre a suspeita de crimes cometidos contra cidadãos brasileiros.
Expressei
minha disposição de auxiliar quando isso for apropriado e legal, mas,
infelizmente, o governo dos EUA vem trabalhando arduamente para limitar minha
capacidade de fazê-lo, chegando ao ponto de obrigar o avião presidencial de Evo
Morales a pousar para me impedir de viajar à América Latina!
Até
que um país conceda asilo político permanente, o governo dos EUA vai continuar
a interferir com minha capacidade de falar.
Seis
meses atrás, revelei que a NSA queria ouvir o mundo inteiro. Agora o mundo
inteiro está ouvindo de volta e também falando. E a NSA não gosta do que está
ouvindo.
A
cultura de vigilância mundial indiscriminada, que foi exposta a debates
públicos e investigações reais em todos os continentes, está desabando.
Apenas
três semanas atrás, o Brasil liderou o Comitê de Direitos Humanos das Nações
Unidas para reconhecer, pela primeira vez na história, que a privacidade não
para onde a rede digital começa e que a vigilância em massa de inocentes é uma
violação dos direitos humanos.
A
maré virou, e finalmente podemos visualizar um futuro em que possamos desfrutar
de segurança sem sacrificar nossa privacidade.
Nossos
direitos não podem ser limitados por uma organização secreta, e autoridades
americanas nunca deveriam decidir sobre as liberdades de cidadãos brasileiros.
Mesmo
os defensores da vigilância de massa, aqueles que talvez não estejam
convencidos de que tecnologias de vigilância ultrapassaram perigosamente
controles democráticos, hoje concordem que, em democracias, a vigilância do
público tem de ser debatida pelo público.
Meu
ato de consciência começou com uma declaração: "Não quero viver em um
mundo em que tudo o que digo, tudo o que faço, todos com quem falo, cada
expressão de criatividade, de amor ou amizade seja registrado. Não é algo que
estou disposto a apoiar, não é algo que estou disposto a construir e não é algo
sob o qual estou disposto a viver."
Dias
mais tarde, fui informado que meu governo me tinha convertido em apátrida e
queria me encarcerar. O preço do meu discurso foi meu passaporte, mas eu o
pagaria novamente: não serei eu que ignorarei a criminalidade em nome do
conforto político. Prefiro virar apátrida a perder minha voz.
Se
o Brasil ouvir apenas uma coisa de mim, que seja o seguinte: quando todos nos
unirmos contra as injustiças e em defesa da privacidade e dos direitos humanos
básicos, poderemos nos defender até dos mais poderosos dos sistemas.
(Tradução
de CLARA ALLAIN)
***
Abaixo, relaciono os artigos publicados neste
blog, e que tratam do tema da espionagem internacional.
Ciberespaço
espaço Vigiado – partes 1 e 2
Na
casa dos espiões
Ouro
negro vigiado
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