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Paixão, morte e ressurreição do Brasil
Posted by Cottidianos
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Sexta-feira, 25 de março
“Veja!
Não
diga que a canção
Está
perdida / Tenha fé em Deus
Tenha
fé na vida / Tente outra vez!
Beba!
Pois
a água viva / Ainda tá na fonte
(Tente
outra vez!)
Você
tem dois pés / Para cruzar a ponte
Nada
acabou!”
(Tente outra vez – Raul Seixas)
O
tempo parece estar correndo na velocidade do ano luz. Já nos aproximamos do fim
de março. Chegamos a mais uma semana de grande importância no mundo cristão,
que é a Semana Santa. Semana que, segundo relatos bíblicos, aconteceu o injusto
julgamento de Jesus Cristo. Julgamento esse que resultou na sua paixão e morte.
O Deus-homem foi castigado, humilhado e ferido. Os líderes políticos e
religiosos romanos da época, jogaram Jesus nas mãos dos soldados que o
castigaram, humilharam e maltrataram impiedosamente. Esses mesmos líderes que
queriam a morte de Jesus, fizeram do povo massa de manobra, a ponto de eles
preferirem à libertação de um criminoso, a salvar um inocente da cruz. Mas,
sendo Deus feito homem, Jesus venceu todas essas demandas e ressuscitou ao
terceiro dia. Provando que a fé vence qualquer barreira, inclusive a barreira
da morte.
Nós
brasileiros, chegamos a essa Semana Santa assistindo ao Calvário do nosso país.
Por aqui também, os líderes políticos — e porque não dizer, religiosos, uma vez
que o presidente da Câmara, e sua bancada evangélica, já assumiram esse papel
dentro do âmbito institucional, confundido estado e religião — jogaram nosso
país nas mãos de empresários e governos corruptos. Os soldados, aliados desses
governos, humilham, roubam e castigam esse país impiedosamente. Roubam seus
recursos para abastecer suas campanhas presidenciais e saciar sua sede de
poder, enquanto nas ruas o povo pede pão; nos hospitais públicos, imploram pelo
remédio que lhes falta; e, na área educacional, o povo pede a dignidade que
lhes é negada.
Ah,
Deus! Como estamos precisando vencer todas essas demandas e ressuscitar. Olha,
Deus, nem precisa ser no terceiro dia, se nos concederes um ano para que
ressuscitemos esse país, já tá de bom tamanho.
Assim,
como perdoastes aqueles que batiam nas faces, furavam tuas mãos com pregos, e
zombavam da mensagem salvadora pregada por teu filho, perdoa também a essas
aves de rapina que destroem a nossa querida nação, porém, como imploraste na
cruz, eu imploro a ti: “Afasta de nós esse cálice”... E faz com que aqueles que
acabam com o sonho de um país mais justo e mais próspero, sejam devidamente
responsabilizados pelos maus atos que praticaram.
Após
esse orante e suplicante introito, digo a vocês caros leitores, que sempre fico
muito curioso para saber o que a imprensa estrangeira diz a respeito da atual
crise política brasileira. Mas os jornais e telejornais só nos dão as manchetes
de jornais estrangeiros falando do Brasil, tais manchetes são bem afinadas com
o que ocorre no país, mas dão apenas uma ideia do que circula a respeito de
toda essa lama lá fora.
Resolvi
então traduzir um artigo publicado na revista britânica, The Economist, cujo título é, Hora
de ir (Time to go). O artigo fornece uma panorâmica da atual crise
política brasileira, falando, inclusive, de fatos bem recentes como as
manifestações nas ruas, a nomeação de Lula como ministro, a delação do senador
Delcídio do Amaral, e o posicionamento de Sérgio ao liberar gravações
sigilosas. O artigo diz ainda aquilo que costumamos dizer ou pensar, ou seja,
estamos no meio de um fogo cruzado, como diz o ditado, “se correr o bicho pega,
se ficar o bicho come”. O texto cita a corrupção generalizada que tomou conta
do nosso país, e questiona aquilo que, de fato, acontece: se Dilma sofrer
impeachment, quem vai assumir o lugar dela, se o vice-presidente do Brasil,
Michel Temer, o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, e o presidente do Senado,
Renan Calheiros, também são citados nos escândalos de corrupção, e junto com
eles metade da Câmara e do Senado?
Só
discordo quando o jornal afirma que não há provas de que Dilma tenha cometido
as tão faladas pedaladas fiscais para maquiar a verdadeira dimensão do déficit
fiscal do ano de 2015. Ora, se o próprio Tribunal de Contas da União, em abril
do ano passado, declarou que não havia mais dúvidas de que a presidente havia
cometido crime de responsabilidade fiscal, ao utilizar recursos de bancos
públicos para inflar os resultados orçamentários e, com isso, melhorar as
contas da União, como dizer que não há provas de crime de responsabilidade
fiscal? Junte-se a isso, as tentativas, na quais a própria Dilma se envolveu
para obstruir a justiça para salvar a pele do ex-presidente Lula, acho que
temos motivos de sobra — e eu me incluo nesse grupo de eleitores sem partido
que são a favor do impeachment — para ver a presidente fora de seu posto.
E,
em seus delírios, a presidente, o ex-presidente, chamam um processo democrático
de golpe. Os petistas fanáticos acreditam, realmente, que está em curso um
processo golpista no país. Não nos
deixemos envolver pela conversa dos lobos, eles querem apenas abocanhar mais
ovelhas, ou mais dinheiro, quem sabe?
O
Brasil está envolvido em uma grave crise política e econômica, mas o país busca
soluções, recursos que estão dentro da lei, para solucioná-las, e o impeachment
é uma delas.
Obviamente
que, como cita a The Economist, o
Brasil, com uma classe política desacreditada, e tendo a seguinte situação no
Congresso: “de 594 membros do Congresso,
352 enfrentam acusações de corrupção” dá certo medo do que viria depois de
um governo Dilma, mas acho que, às vezes, a situação é tão dramática, que vale
a pena um mergulho no escuro, quem sabe não haverá uma luz no fim do túnel. É
uma esperança que nos resta, e nela devemos apostar.
Aproveito
para desejar um bom feriado religioso a todos, e porque não fazermos nossas
orações, nossos pedidos, para que consigamos atravessar, em paz, a tempestade,
e pedir que a justiça impere?
Abaixo,
compartilho com vocês, a tradução livre que fiz do artigo da The Economist.
***
Crise
política brasileira
Hora
de ir
Com
reputação manchada, presidente deveria renunciar
As
dificuldades de Dilma Rousseff têm se aprofundado há meses. Os enormes
escândalos envolvendo a Petrobrás, a gigante estatal do petróleo, da qual ela
já foi presidente, envolvem algumas pessoas muito próximas a ela. Ela governa
uma economia que sofre a pior recessão desde a década de 30, em grande parte, devido
a erros que ela cometeu durante seu primeiro mandato. Sua fraqueza política
tornou seu governo quase impotente diante do aumento do desemprego e queda nos
padrões de qualidade de vida. Seus
índices de aprovação estão na casa de dois dígitos e milhões de brasileiros
foram às ruas para gritar: Fora Dilma!
E,
no entanto, até agora, ela afirma, categoricamente, que a legitimidade de
conferida a ela na reeleição de 2014 não foi abalada, e que nenhuma das
acusações feitas contra ela, justificam seu impeachment. Aos juízes e policiais
que investigam algumas das figuras mais importantes do Partido dos
Trabalhadores (PT), ao qual ela pertence, ela declara, com fisionomia séria, o
seu desejo de que a justiça seja feita.
Agora,
ela jogou fora o que lhe restava de credibilidade. No dia 16 de março, ela
tomou a extraordinária decisão de nomear seu antecessor, Luiz Inácio Lula da
Silva, como seu chefe da Casa Civil. Ela descreveu isso como uma manobra
perspicaz. Lula, como é conhecido por todos, é um articulador político astuto:
ele poderia ajudar a presidente a sobreviver às tentativas do impeachment no
Congresso, e até mesmo estabilizar a economia. Porém, alguns dias antes, Lula
havia sido levado para interrogatório por ordem de Sérgio Moro, juiz federal
encarregado das investigações na Petrobrás (apelidada de Lava Jato), que
suspeita que o ex-presidente tenha se beneficiado do esquema de corrupção.
Promotores do Estado de São Paulo acusam Lula de ocultar um Triplex, em um condomínio
em frente à praia. Ele nega essas acusações. Ao se tornar ministro, Lula teria
foro privilegiado: somente a corte suprema do país poderia julgá-lo. Neste
caso, um juiz do Supremo suspendeu sua nomeação.
Este
jornal tem argumentado que tanto o sistema judicial, quanto eleitores — sem
ligação com partidos políticos, que querem o impeachment da presidente,
deveriam decidir o destino dela. Porém, a nomeação de Lula parece ser uma
tentativa grosseira de impedir o curso da justiça. Mesmo se essa não fosse a
intenção, teria o mesmo efeito. Este foi o momento no qual a presidente
escolheu os mesquinhos interesses de seu grupo político, em detrimento do
Estado de Direito. Dessa forma, ela mostrou-se incapaz de permanecer na
presidência.
Três maneiras de deixar o Planalto
A
forma como ela deixará o Planalto importa muito. Nós continuamos a acreditar
que, na ausência de provas de criminalidade, o impeachment de Dilma Rousseff
não é justificável. O processo contra ela no Congresso se justifica em denuncias
não comprovadas de que ela usou truques contábeis para esconder a verdadeira dimensão
do déficit orçamentário de 2015. Isso parece apenas um pretexto para expulsar
uma presidente impopular. A ideia
defendida pelo chefe do comitê de impeachment de decidir o destino de Dilma
ouvindo “as ruas” criaria um precedente preocupante. Democracias
representativas não devem ser governadas por protestos e pesquisas de opinião.
Há
três modos de tirar Dilma do poder apoiados em bases legais. A primeira seria a
de que ela obstruiu a investigação na Petrobrás. Declarações de um senador
petista de que ela fez isso, pode formar a base para uma segunda proposta de
impeachment. Mas até agora essas acusações não foram comprovadas, e ela nega-as;
a tentativa de proteger Lula da investigação pode fornecer mais motivos. Uma
segunda opção seria uma decisão do Supremo Tribunal Federal de convocar nova
eleição presidencial. Isso pode ser feito, se for comprovado que a campanha à
reeleição de 2014, foi financiada com dinheiro desviado da Petrobrás. Mas essa
investigação seria demorada. O modo mais rápido e melhor de Dilma deixar o
Palácio do Planalto seria ela renunciar, antes que seja posta para fora.
Sua
saída ofereceria ao Brasil a chance de um novo começo. Mas a renúncia da
presidente, por si só, não resolveria os problemas do Brasil. O lugar dela
seria, a princípio, ocupado pelo vice-presidente, Michel Temer, líder do
Partido do Movimento Democrático Brasileiro. Temer poderia condizer um governo
de unidade nacional, incluindo os partidos de oposição, que, em teoria, pode
ser capaz de promover as reformas fiscais necessárias para estabilizar a
economia e corrigir um déficit orçamentário que está perto dos 11% do PIB.
Infelizmente,
o partido de Temer está profundamente envolvido no escândalo da Petrobrás,
assim como o PT. Muitos políticos que participariam de um governo de unidade
são vistos como representantes de uma classe política desacreditada. De 594
membros do Congresso, 352 enfrentam acusações de corrupção. Uma nova eleição
presidencial daria aos eleitores a oportunidade de confiar as reformas a um
novo líder. Porém, se correia o risco de deixar outro governante corrupto no
cargo até 2019.
O
judiciário também tem perguntas para responder. Os juízes merecem grande
crédito por prenderem poderosos políticos e empresários brasileiros, mas eles
tem se enfraquecido porque desrespeitam as normas legais. O exemplo mais
recente foi a decisão de Sérgio Moro de liberar gravações de conversas
telefônicas entre Lula e seus aliados, incluindo Dilma Rousseff. A maioria dos juristas defende que somente o
Supremo Tribunal pode divulgar conversas em que umas das partes têm foro
privilegiado, como a presidente, por exemplo. Isso não justifica as acusações
de partidários do governo de que o judiciário está encenando um ”golpe”. Assim
fica fácil aos acusados na Operação Lava Jato desviarem a atenção de seus erros
para os erros de seus acusadores.
A
guerra de partidos e personalidades do Brasil obscurece algumas das mais
importantes lições que se pode tirar da crise. Tanto o escândalo na Petrobrás,
quanto a crise econômica, tem suas origens em práticas e leis erradas que são
praticadas no Brasil há décadas. Para o Brasil sair dessa bagunça são
necessárias mudanças profundas: incluindo a questão previdenciária; reforma das
leis fiscais e trabalhistas que atravancam o crescimento; e a reforma de um
sistema político que estimula a corrupção e enfraquece os partidos políticos.
Estas
coisas não podem mais ser adiadas. Aqueles que gritam “Fora Dilma” nas ruas
irão reivindicar a vitória se ela sofrer o impeachment. Mas para o Brasil sair
ganhando, isso é apenas o primeiro passo.
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