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Um novo espaço para a Escola de Capoeira Angola Resistência
Posted by Cottidianos
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00:43
—
Olá! Como vai?
—
Eu vou indo. E você, tudo bem?
—
Tudo bem! Eu vou indo, correndo pegar meu lugar no futuro… E você?
—
Tudo bem! Eu vou indo, em busca de um sono tranquilo… Quem sabe?
—
Quanto tempo!
—
Pois é, quanto tempo!
—
Me perdoe a pressa, é a alma dos nossos negócios!
—
Qual, não tem de quê! Eu também só ando a cem!
***
Acho
perfeita essa música, Sinal Fechado,
do Chico Buarque. Ela ilustra muito bem a alma do homem moderno toda feita de
pressa e correria. Mas é bom quando a gente encontra, mesmo em meio à correria
da vida, pessoas que a gente gosta e admira.
Chico
é um gênio. Na letra dessa música ele relata o encontro de duas pessoas que se encontra
em uma rua ou avenida de uma cidade qualquer. Enquanto esperam o sinal abrir,
dando passagem aos pedestres, os dois personagens travam um breve diálogo. Depois
o sinal fecha para os carros, abre para eles e cada um segue seu caminho.
Foi
mais ou menos o que aconteceu comigo e o mestre Topete. Estava eu na terça-feira
(02), por volta do meio dia e meia, no cruzamento entre as movimentadas
avenidas Francisco Glicério e Moraes Salles, quando se o mestre Topete se aproximou
de mim.
—
Sábado (06), vamos inaugurar um novo espaço, aparece por lá, disse ele.
—
Ok. Vou aparecer, sim, respondi.
O
sinal abriu e fomos cada qual para o seu lado. Enquanto íamos a direções
opostas ainda tivemos tempo de altear a voz para finalizar o dialogo:
— À
que horas começa? Perguntei.
—
Começa as dez e termina ao meio dia, respondeu ele, já quase chegando ao outro
lado da rua.
Mestre
Topete é um mestre capoeirista aqui na cidade de Campinas e região. O novo
espaço a ser inaugurado fica no Terminal Central de Campinas.
.
Sábado
pela manhã as artificiais luzes dos postes de iluminação das vias públicas
começavam a se apagar... Os raios do sol chegavam, timidamente por sobre a
cidade... As ruas da cidade começavam novamente a encher-se de gente... Os
ônibus que fazem o transporte público foram chegando ao Terminal Central de
Campinas... Os automóveis começaram a transitar pelo viaduto Miguel Vicente
Cury... E tudo enfim, voltou à velha e nova rotina de todos os dias.
Fazia
frio, mas aos poucos ele foi sendo expulso pelo calor do sol, que foi chegando
devagarzinho. Os ponteiros do relógio avançaram e o dia se fez pleno de luz e
alegria.
As
pessoas acorreram às bancas da feira livre de frutas e verduras que funciona no
embaixo do viaduto. Os capoeiristas também foram chegando aos poucos. Afinal,
era ali a roda de Capoeira. Aquele era o lugar onde o Mestre Topete receberia
seus amigos e convidados para a inauguração do novo espaço da Escola de Capoeira
Angola Resistência. A expectativa era grande. Aos poucos foram chegando mestres
de capoeira de outras escolas, juntamente com seus discípulos. Eram aguardados
também para o evento, Mário Dino Gadioli, diretor presidente do CEASA, Gabriel
Rapazzi, diretor cultural de Campinas, Maria Cecília Campos e o Coletivo
Salvaguarda da Capoeira de Campinas.
Era
a realização de um sonho. Após dez anos de trabalho no Terminal Central de
Campinas a Escola de Capoeira Angola Resistência, de mestre Topete, ganhava um
espaço maior e melhor, ao lado de sua antiga escola, que foi transformada em
uma loja onde se vendem produtos relacionados à arte da capoeira.
Tive
que atender a outros compromissos e cheguei um pouco tarde ao local: por voltas
das onze e meia da manhã. Encontrei a roda já formada e fiquei observando e absorvendo
todo o Axé que dela emanava. Achei o lugar perfeito para uma roda de capoeira,
em meio ao coração da agitação da cidade, a roda possuía a paz de um templo em
oração.
Um olhar atento à fisionomia dos presentes me trouxe a sensação de que a capoeira é uma arte que traz felicidade, luta que traz segurança e uma dança que deixa livre o espírito.
Um olhar atento à fisionomia dos presentes me trouxe a sensação de que a capoeira é uma arte que traz felicidade, luta que traz segurança e uma dança que deixa livre o espírito.
Ajoelhados
aos pés do berimbau mestre, os capoeiristas parecem filhos a pedir a benção do
pai para mais uma luta, e se entregam a ela com concentração e devoção,
misturando, à alma do guerreiro, à malícia e a ginga do malandro. É um jogo
fascinante. O capoeira é um guerreiro diferente. Ele luta, não para agredir,
mas para defender-se. Essa é a sua arma principal: a defesa. O escudo usado por
eles: o autocontrole. Um capoeirista descontrolado é qualquer outro lutador,
menos um capoeirista. Para compreender a alma da capoeira é preciso mergulhar
na tradição, debruçar-se nas águas do rio do passado, e nele saciar-se como um
viajante sedento no deserto à procura de um gole d’água.
Um
capoeira que se preze tem sempre os olhos no futuro, sem deixar de olhar para o
passado. Passado esse que se faz presente nas ladainhas, corridos e chulas,
músicas que dão harmonia e ritmo ao jogo. Nesses cânticos, sempre há
reverências aos mestres, e à tradição. Enquanto isso, o berimbau, soberano, faz
a ponte entre passado e presente, traduzindo de forma perfeita a alma da
capoeira: um toque forte, porém, sereno e harmonioso.
Terminada
a apresentação da roda de capoeira, por volta de 1h30min da tarde, isso não
representou, necessariamente, o fim da festa, mas, talvez, o início dela. O
público presente caminhou mais alguns metros e chegou às novas instalações da
Escola de Capoeira Angola Resistência. O clima era de confraternização, de
irmandade, de camaradagem. Fiquei pensando: “Quem dera que a sociedade fosse
uma roda de capoeira. com certeza o mundo seria bem mais alegre e mais humano”.
Não
pude ficar muito mais tempo, participando da festa, pois ainda tinha que ir
para o ensaio do Coral PIO XI. Despedi-me de um mestre Topete feliz, não apenas
pelo o novo espaço, mas pela felicidade de um homem que encontrou seu caminho
na vida e consegue dividir essa alegria com os amigos.
Fui
embora, mas deixei para trás os capoeiristas em festa. No decorrer da tarde
ainda seria servido um coquetel comemorativo, apresentação do Afoxé Ibaô e mais
Roda de Capoeira Angola.
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