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Sonhos, águias e bandeiras
Posted by Cottidianos
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01:33
Sábado, 28 de
agosto
A cidade de
Campinas, no Estado de São Paulo, dedica o mês de setembro a Carlos Gomes, o
maior compositor de ópera brasileiro. Um gênio da música. O texto abaixo é uma
homenagem a esse ilustre campineiro. Escrevi esse texto há exatos três anos e
ele foi publicado originalmente no blog http://www.rec2010.blogspot.com.br/,
reescrevi
a segunda parte do texto onde falo de Carlos Gomes. Na primeira parte do texto expresso
algumas impressões da cidade de Campinas, onde moro, e na qual nasceu Carlos
Gomes.
Catedral de Campinas
Imagem: http://www.rac.com.br/_conteudo/2013/06/especiais/campinas/74117-arquitetura-que-deslumbra-e-favorece-a-fe.html |
O centro da cidade
está nervoso e agitado, como são agitados e nervosos todos os centros de todas
as grandes cidades.
Apressadas,
milhares de pessoas circulam pelas ruas. É o ritmo frenético da vida moderna.
Que me desculpem os que criticam o progresso, mas há certo charme em tudo isso.
Os motoristas mais nervosos buzinam ao volante. Contagiados por tamanha
correria, não há mais paciência de esperar o sinal abrir. Ainda bem que existem
os sinais de trânsito para colocar um pouco de ordem em toda essa desordem.
Fala-se muito da
violência e das desigualdades que, iguais a ervas - daninhas, foram,
discretamente, invadindo o jardim florido. Ganharam espaço e tornaram-se calo
nas mãos de quem administra e de quem usufrui desse jardim. Por causa dessas ervas
- daninhas, os grandes centros perderam um pouco da poesia.
Deixemos de lado
as ervas - daninhas. Não desejo tratar delas nessa crônica.
Trato dos sinais
de vida que despontam em meio a toda a agitação envolvente do centro da cidade.
Há um sabor de intensidade em tudo isto. E, quando penso nisso, não pretendo me
referir aos planos mirabolantes, à adrenalina que pulsa nas veias daqueles que
se entregam aos esportes radicais, fazendo bem ao corpo e à mente. Nem falo da
intensidade da emoção de entrar na jaula de um leão sem ser domador. Isso nem
seria emoção intensa, seria estupidez mesmo.
Falo de gestos
simples captados pelos meus olhos; em meio à multidão que sobe a Avenida
Francisco Glicério, um casal de mãos dadas a sorrir: a evidente inocência da
criança que, alheia ao movimento, saboreia um delicioso sorvete, enquanto
alguns pingos do creme escorrem pela sua camiseta: a centenária Catedral de
Campinas, rodeada pelas casas de comércio, me lembra que nem só de pão vive o
homem.
Sinto vida nas
pessoas caminhando ao meu lado. Da mesma forma que eu, elas têm sonhos e a esperança
de realizá-los.
Centro de Campinas
Imagem: http://www.skyscrapercity.com/showthread.php?t=924590 |
Olho para o alto
de um edifício, e meus olhos divisam a imagem de uma flâmula verde, amarela,
azul e branca que baila altiva ao sabor do vento. A simbologia manifestada naquela
bandeira do Brasil, dançando ao sabor do vento, traduz bem o que penso. Quatro
cores que retratam os anseios de paz, esperança e prosperidade, não apenas da
gente de Campinas, mas de todo o povo brasileiro. Lindo pendão de esperança que
se ergue soberano acima de nossas cabeças, como uma mãe gentil estendendo seu
manto por sobre os filhos amados.
Olhando a bandeira
que se eleva sobre a multidão apressada, lembro-me dos filhos desta pátria que
se sublimaram ao cotidiano e alçaram vôo em direção aos céus da fama. Como
grandes águias, voaram alto, muitas vezes pairando em terras estrangeiras,
erguendo o nome do nosso Brasil. Brasileiros tão grandes quanto a saudade de
sua pátria que os consume e devora dia e noite.
Uma emoção me
invade o peito ao lembrar que, nessas ruas por onde, caminho no momento,
abarrotadas de gente e de automóveis andou, em passado distante, um adolescente
assobiando melodias e marcando compassos. Campinas era conhecida, então, como
Vila de São Carlos. O jovem a que me refiro era Antonio Carlos Gomes, ou
simplesmente, Carlos Gomes. O jovem talento bebia nas fontes dos grandes
mestres. Pensava em tornar-se um excelente músico e conseguiu. Tonico, como era
carinhosamente chamado pelos amigos e familiares, não nasceu em berço de ouro;
ao contrário, veio ao mundo em um lar simples e humilde, em 18 de Julho de
1836.
O mistério da
música envolveu Tonico desde cedo. Os primeiros acordes musicais foram ouvidos
por ele ainda no berço, quando seu pai tocava as peças musicais que
apresentaria em concertos, missas e saraus pela cidade. A aptidão para a música
manifestou-se desde menino quando fazia partituras de missas, modinhas e
marchas para ajudar o pai.
Quando moço, vez
em quando, ia a, àquela época tranqüila, cidade de São de Paulo, na companhia
do irmão Santana Gomes. Naquele tempo não existiam as facilidades das rodovias
bem asfaltadas e os viajantes tinha que enfrentar uma dura jornada. Quem quisesse
chegar a São Paulo, tinha que percorrer estradas de terra no meio da mata,
montado em lombo de cavalo.
Os encantos da Província
de São Paulo faziam os dois irmãos esquecerem rapidamente a dureza da viagem. Já
na Província, realizavam concertos de violino e piano. Eram noites nas quais a
lua prateada se derramava por sobre a cidade. Noites de folguedos e de poesia e
de muita alegria produzidas pelos moços e moças no frescor da juventude.
Carlos Gomes era
muito amado pela mocidade que não hesitava em lhe demonstrar afeto e simpatia. Para
essa juventude cheia de sonhos, Carlos Gomes escreveu o Hino à Mocidade Acadêmica. Os companheiros sentiam seu enorme dom para
a música e aconselhavam: “Vai para a Corte e, depois, para Europa. Teu destino
é ser um grande músico”. Carlos Gomes ouviu o conselho e partiu em direção ao
seu destino.
Foi para o Rio de
Janeiro. Lá encontrou uma calorosa acolhida por parte do Imperador, D. Pedro
II. Entrou para o Conservatório de Música do Rio de Janeiro e teve a sorte de ter
como professor, o conceituadíssimo Francisco Manoel, autor do Hino Nacional. Durante
seus estudos no Conservatório, escreveu as óperas nacionais A Noite do Castelo (1861) e Joana de Flandres (1863).
As óperas eram de
uma qualidade tão refinada que o jovem compositor conquistou definitivamente a
simpatia de D. Pedro. O imperado tratou de providenciar a sua ida para Itália,
a fim de aperfeiçoar o seu dom para a música, com tudo pago pela Corte. Na Itália,
o músico trilhou um caminho glorioso. A consagração definitiva deu-se quando,
na noite de 19 de março de 1870, no magnífico Teatro Scala de Milão, foi apresentada,
em quatro atos, a ópera O Guarani , baseada
na obra homônima do escritor brasileiro, José de Alencar.
O famoso
compositor Giuseppe Verdi, autor de obras consagradas, estava na platéia que
lotava o Scala de Milão naquela noite. Ao fim do terceiro ato, Verdi não
conseguiu conter a emoção: subiu ao palco e deu forte abraço em Carlos Gomes. "Questo giovane comincia da dove finisco io" (Este
jovem começa onde eu termino), disse ele ao público que assistia a bela ópera.
Houve outros
grandes sucessos também: Fosca (1873) Salvator Rosa (1874) e Maria Tudor (1879),
Lo Schiavo (1889) e Condor(1891). Em 1892 compôs sua última obra: o belo poema
vocal sinfônico Colombo.
No fim de sua vida
não teve o reconhecimento que merecia em sua própria pátria. De volta ao Brasil
foi meio que deixado de lado. Por que? Coisas de política... Carlos Gomes tinha
afeição e amizade para com o imperador D. Pedro II e a recíproca era
verdadeira. Agora D. Pedro fora deposto e os republicanos estavam no poder. “Esse
cara é amigo do imperador. Melhor deixar ele de lado”. Que pena! Deixaram de
lado um gênio da música clássica. Um regente de primeira linha. Não encontrando
apoio em Campinas, sua terra natal, foi acolhido em Belém do Pará aonde veio a
falecer em 16 de setembro de 1886. Após a morte seu corpo foi trazido para
Campinas, sua cidade natal, onde se encontra sepultado em um monumento-túmulo
na Praça Bento Quirino, no centro da cidade.
Monumento-túmulo de Carlos Gomes
Imagem: http://www.campinas.sp.gov.br/noticias-integra.php?id=20303 |
Poder-se-ia dizer
que a vida de Carlos Gomes foi um drama tendo como pano de fundo a Monarquia.
Foi entre escravos e senhores, nobres e plebeus que Carlos Gomes deu vazão a
seu talento para composições.
Hoje, em algum
lugar deste país, deste solo verde-amarelo, sob este céu azul e branco, devem
estar nascendo outras águias. Que elas ajudem a difundir, com tinta de ouro e
prata, a cultura, esse elo que contribui para unir povos e nações num só
objetivo: a busca do belo e o respeito às diferenças.
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