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Jogos Olímpicos em um país em crise
Posted by Cottidianos
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23:30
Sábado, 09 de
abril
Quando, em 2009, o Rio de Janeiro foi oficializado como cidade
sede dos Jogos Olímpicos de 2016, o Brasil vivia uma aparente tranqüilidade política
e econômica. Digo tranqüilidade política e econômica aparente, pois, com
certeza, os fatos que nos jogaram no olho do furacão das turbulências econômicas
e políticas, já, estavam, sub-repticiamente, sendo arquitetados e postos em
prática.
O
fato é que há poucos meses da realização do grande evento olímpico o país
deveria estar em festa e orgulhoso por sediar um evento de tal porte na área
esportiva. As manchetes de jornais, as reportagens dos telejornais, e mídias
digitais deveriam estar dando grande cobertura ao evento. E nos todos que
formamos este grande país deveríamos estar à espera da conquista de medalhas
pelos nossos atletas.
Mas,
o que vemos é que a cobertura da Rio 2016, que deveria estar intensa, ficou
para, quando muito, segundo plano. O que temos visto nos noticiários de todos
os veículos de comunicação, no Brasil, e no mundo, é aquilo que não queríamos
ver: Uma enxurrada de escândalos de corrupção que envolve governo, base aliada
e partidos de oposição. Não bastasse tudo isso, ainda enfrentamos uma grave
crise econômica, para a qual não há perspectiva de fim.
Some
a tudo isso, o fato de que não saberemos que será o presidente da nação por
ocasião do evento, tendo em vista o andamento do processo de impeachment de
Dilma Rousseff, que há grande possibilidades de que tenha êxito, mas também
pode ser que não, uma vez que, na política brasileira atual, e com o nível dos
políticos que temos, tudo são possibilidades em aberto.
Abaixo,
compartilho, matéria publicada no site do jornal El País Brasil.
***
O
‘annus horribilis’ para organizar uma Olimpíada
Crise
política ameaça com poluir um evento que orgulha-se de ser estritamente
esportivo
María
Martín
Gustavo
Moniz
Rio
de Janeiro / São Paulo 8 ABR 2016
O
Brasil ainda não sabe quem será o presidente que fará o discurso de abertura da
Olimpíada do Rio de Janeiro, em 5 de agosto. Em 21 de abril, a tocha olímpica
partirá da cidade grega de Olímpia rumo a Brasília, e terá início uma contagem
regressiva de 100 dias, com um percurso da chama por 300 cidades brasileiras,
seguindo uma minuciosa organização que contrasta com a imprevisibilidade de um
país que pode perder seu Governo em menos de um mês e meio.
A
presidenta Dilma Rousseff, convidada pelo premiê grego para o embarque da
tocha, descartou nesta sexta-feira sua presença. Rousseff enfrenta um processo
de impeachment que ameaça interromper seu mandato antes do mês de junho.
Rousseff cambaleia politicamente e não tem muito tempo para a Olimpíada, assim
como seus ministros, que em várias ocasiões também suspenderam sua agenda de
eventos olímpicos para apagar incêndios internos na capital federal. O Comitê
Olímpico Internacional (COI) diz confiar no sucesso dos Jogos, mas seu
presidente, Thomas Bach, admitiu em março que acompanha de perto a frenética
crise política do Brasil, pois teme que o ideal do COI de separação entre as
esferas política e esportiva vá por água abaixo.
A
quatro meses do maior evento esportivo do mundo, o Brasil não tem nem sequer um
ministro do Esporte. George Hilton, um pastor evangélico completamente alheio à
temática do cargo, para o qual foi escolhido a dedo em meio a manobras
políticas para contentar aliados, acaba de deixar a pasta, porque seu partido,
o PRB, rompeu relações com o Governo Rousseff. Hilton chegou até a trocar de
partido para se manter no cargo, mas a presidenta decidiu-se afinal por um
comando técnico, que coube a um aliado. Hilton foi interinamente substituído
por Ricardo Leyser, que, para tranquilidade do COI, já executou a política do
Governo nos Jogos Pan-Americanos de 2007 e está envolvido na organização dos
Jogos Olímpicos desde que o Rio assumiu o desafio em 2009.
O
clima na cidade-sede está longe de ser festivo, e os Jogos Olímpicos ocupam
pouco espaço num noticiário carregado de intrigas parlamentares e escândalos de
corrupção. Os tentáculos da trama corrupta da empresa petroleira estatal
Petrobras, a fagulha que detonou a crise, também alcançaram as obras olímpicas:
pelo menos sete construtoras suspeitas de pagarem subornos a políticos e
executivos da Petrobras estão envolvidas em 11 projetos olímpicos, da Vila
Olímpica à expansão do metrô carioca.
O
próprio prefeito do Rio, Eduardo Paes, queixava-se ao ex-presidente Luiz Inácio
Lula da Silva sobre a sombra de suspeita que se abate sobre qualquer obra
depois dos escândalos. “Eu tô cheio de obra aqui. Odebrecht da vida, OAS, de
todas as empreiteiras. Eu fico com medo. O cara pede pra eu receber, eu fico
com medo de receber. Eu vou me trancar em casa, porra. Eu não converso mais com
ninguém”, relatava Paes numa conversa telefónica privada que foi vazada pelo
juiz Sérgio Moro para a imprensa.
Soma-se
ao delicado panorama nacional a situação financeira do Estado do Rio, que até
recentemente prosperava graças aos royalties do petróleo, mas cuja economia se
deteriorou dramaticamente no último ano, acompanhando o ritmo de queda do
produto no mercado internacional. Os números vermelhos se refletem nas salas de
espera dos hospitais, nos salários atrasados de todos os funcionários públicos
– de professores a policiais – e numa limitadíssima margem de manobra
financeira diante de qualquer imprevisto. O ambiente de crispação que reina
hoje no Brasil, seja pela crise econômica ou pela polarização política, não é o
melhor cenário para um evento de 39,1 bilhões de reais. Não se descarta que
haja protestos durante o percurso da tocha ou às vésperas dos Jogos, como já
ocorreu durante a Copa do Mundo de 2014.
As
pesquisas que o prefeito Paes sempre menciona para ilustrar o apoio da
população aos Jogos Olímpicos mostram que quase 60% dos brasileiros defendiam a
realização da Olimpíada no Rio. Mas isso foi em 2013, quando o vento ainda
soprava a favor. O próprio chefe de gabinete de Rousseff, Jaques Wagner, já
lamentou à imprensa estrangeira que o clima não seja o mais desejável para um
evento como este. “É claro que eu preferiria a festa em outro ambiente”, afirmou.
A
boa notícia é que o caos político que reina em Brasília só se intensificou
quando a maioria das obras olímpicas já estava pronta e as linhas de
financiamento que dependiam do Governo Federal já haviam sido quase todas
repassadas e gastas. Cerca de 98% das obras do Parque Olímpico estão
concluídas, e o velódromo, o estádio de tênis e o centro de hipismo, os
projetos mais atrasados, abrirão suas portas para eventos pré-olímpicos antes
do mês de junho. “Tudo está bastante encaminhado, e não há grandes decisões que
tenhamos que tomar, não há obras fora do cronograma. Saímos dos grandes
problemas e começamos a entrar numa fase de milhares de pequenos problemas. É o
ajuste dos Jogos, não é nada essencial”, disse Leyser, o ministro interino, ao
EL PAÍS. “Outro fator importante é que os Jogos se caracterizam por serem
suprapartidários, vários Governos tentaram conquistar esse direito para o país,
então o Brasil está muito orgulhoso de ser sede dos Jogos”, afirma Leyser.
O
avanço das obras, entretanto, não alivia outras dores de cabeça. A maior delas
vem de uma das mais caras promessas olímpicas, a construção da linha de metrô
que liguará Ipanema à Barra da Tijuca, cenário das principais competições e de
congestionamentos monumentais. O Governo estadual, responsável pelas obras,
garante que os trens começarão a funcionar em julho, mas o prefeito Paes já
avisou às autoridades olímpicas que há um plano B. Ele será necessário. O Rio
tem um grave problema de tráfego e, sem o metrô, chegar ao Parque Olímpico
dependerá de uma frota de ônibus que, apesar de metade dos ingressos ainda não
estarem vendidos, já se esperam superlotados
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