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O machado de ferro de Sérgio Moro
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Domingo,
05 de julho
“Eu vejo a vida melhor no futuro
Eu
vejo isso por cima de um muro de hipocrisia
Que
insiste em nos rodear
Eu
vejo a vida mais clara e farta
Repleta
de toda satisfação
Que
se tem direito
Do
firmamento ao chão”
(Tempos Modernos – Lulu Santos)
O
Posto Torres, localizado em área nobre de Brasília, é um dos mais movimentados
da cidade. Mais que um posto de gasolina, o empreendimento é um complexo
comercial que oferece serviços que vão de alimentação à lavanderia. O local
fica a 3 km do início da Esplanada dos Ministérios. 85 funcionários, divididos
em turnos, cuidam dos serviços de lanchonete, restaurante, loja de
conveniência, além de cuidar das 16 bombas de abastecimento. Estima-se que cerca de 3.000 a 3.500 veículos
passem pelo local todos os dias, com isso o posto vende 50 mil litros de
combustíveis diariamente.
O
dono do Posto Torres, Carlos Habib Chater, é um empresário desonesto, e há vinte
anos tem problemas com a lei. A especialidade dele é lavagem de dinheiro e
remessa de dinheiro para o exterior. O Posto de Gasolina era, para ele, apenas
fachada, trampolim para negócios fraudulentos.
Ah,
ia esquecendo-me de informar um detalhe importante. O Posto Torres seria um
posto de abastecimento tão comum quanto qualquer outro, não fosse por uma casa
de câmbio, chamada ValorTur, que funcionava no local. A polícia já vinha
investigando, secretamente, movimentações financeiras suspeitas que ocorridas
no local.
No
dia 17 de março de 2014, a Polícia Federal, resolveu que era hora de agir. A
operação comandada pela PF teve início às 6 da manhã daquele dia, e envolveu
400 policiais. Na capital federal foi preso, o doleiro, Carlos Habib Chater,
apontado pela polícia como um dos chefes de uma organização criminosa, cuja
especialidade era a lavagem de dinheiro em todo o país. No mesmo dia, ocorreram
ações paralelas nos estados do Paraná, São Paulo, Rio Grande do Sul, Santa
Catarina, Rio de Janeiro e Mato Grosso, cumprindo, ao todo, 81 mandatos de
busca e apreensão.
Era
o início da Operação Lava-Jato. Ninguém sabia ainda, mas aquela operação revelaria
ao mundo, um dos maiores escândalos de corrupção jamais vistos no Brasil, e
abalaria a credibilidade de uma das maiores empresas do mundo: A Petrobrás.
Lavanderia,
lava-jato, posto de gasolina, evasão de divisas, campos semânticos tão
diferentes, mas tão dentro um mesmo contexto, que a polícia resolveu batizar a
operação de Operação Lava-Jato. Curiosamente, no Posto Torres, havia de tudo,
até lavanderia de roupas, menos lava-jato de automóveis.
Com
o desenrolar das investigações ficou-se sabendo que o Posto Torres funcionava
como uma espécie de “caixa eletrônico” da propina em Brasília, e que muitos
políticos frequentavam o local, não apenas para abastecer seus carros, mas
também, e principalmente, para encher de dinheiro seus bolsos e maletas.
Segundo informações da polícia, o esquema movimentou mais de 10 milhões entre
2007 e 2014, e que esse dinheiro transitou por várias contas diferentes.
Também
na operação deflagrada naquele 17 de março de 2014, foram presos, além do dono
do Posto Torres, Alberto Yousseff, em São Luís do Maranhão, e Enivaldo
Quadrado, em Assis, interior de São Paulo.
Carlos
Habib Chater e Alberto Yousseff, já eram velhos conhecidos da polícia. O
primeiro já havia sido preso em uma operação policial, em 1991, juntamente com
o pai, Habib Salim El Chater. Os dois ficaram apenas dois dias presos, pagaram
fiança e foram liberados. Eles também já haviam sido investigados por suspeita
de estarem envolvidos em esquemas de contrabando de pedras preciosas e uso de
moeda falsa.
Já
Youssef, havia sido protagonista em outro famoso escândalo de corrupção,
denominado, Banestado. Na época, o doleiro afirmou que pagava propinas a
diretores do Banco Paraná. O doleiro fez acordo de delação premiada e respondia
em liberdade. Em vez do tomar o Banestado como lição para uma mudança de rumo
na vida, Yousseff fez dele uma escola do crime, e acabou se envolvendo em uma
encrenca ainda maior.
Desde
aquela manhã, 17 de março do ano passado, a Polícia Federal já deflagrou 15
fases da Operação Lava Jato. A última fase de um processo em andamento, foi
deflagrada na manhã do último dia 02 de julho, tendo sido denominada Operação Mônaco.
Nela a polícia investiga o recebimento de vantagens ilícitas no âmbito da
Diretoria Internacional da Petrobrás.
Em
todas essas fases a Operação Lava Jato já mandou para a cadeia, executivos de
empresas poderosas, como a Camargo Correa, OAS, Mendes Junior, UTC, Engevix,
Iesa, Galvão Engenharia, Queiroz Galvão, além de executivos da Petrobrás e
doleiros. A operação também tem mostrado o descomprometimento de políticos, e dos
partidos aos quais pertencem, bem como empresas do setor público e privado, com
o futuro da nação.
Desde quando foi deflagrada a Lava Jato, um
nome tem tido destaque em todas as manchetes que se referem a ela:
Juiz
Sérgio Moro manda prender presidente da Queiroz Galvão em nova fase da Lava
Jato
Sérgio
Moro nega liberdade a quatro presos na Operação Lava Jato
Sérgio
Moro determina bloqueio de R$ 78 milhões de empresário preso
Juiz
Sérgio Moro determina prisão de Vaccari com base nas delações
Quem
é esse homem que conduz com mão de ferro, uma empreitada tão grande e de tão
grande alcance? Quem é esse juiz que resolveu mexer em casa de abelha?
Ano
passado, ele foi eleito o brasileiro do ano pela revista IstoÉ. “Eleito por IstoÉ o “Brasileiro do Ano”, Moro
não mostra sedução pelo poder da toga. De hábitos simples, ele faz parte de uma
rara safra de juízes que encaram a magistratura como profissão de fé”, diz
a reportagem. Ainda segundo a revista, o juiz Sérgio Moro, além de simples, é
discreto e reservado: “Não dá
entrevistas, nem posa para fotos. Dispensa privilégios. Vai para o trabalho todos
os dias a bordo de um velho Fiat Idea 2005, prata, bastante sujo e repleto de
livros jurídicos empilhados no banco de trás. Antes chegou a ir de bicicleta, ‘quando
eu chego nos lugares, ninguém imagina que é o Sérgio Moro’, conta sorrindo. Apesar
de ter se tornado o inimigo número 1 de poderosos, prefere andar sem guarda-costas.
Quem sempre reclama é a esposa, a advogada Rosângela Wolff de Quadros Moro,
procuradora jurídica da Federação Nacional das Apaes, instituição dedicada à
inclusão social de pessoas com deficiência. A ‘Sra. Moro’ teme pela segurança
do marido, e dela mesma, afinal o magistrado se mostrou implacável com a corrupção ao encurralar integrantes do
governo e do PT e levar, numa ação inédita, executivos das maiores empreiteiras
do País à cadeia”.
Nascido
em Ponta Grossa, no Paraná, em 1973, Sergio Fernando Moro é filho de do
professor de Geografia, Dalton Aureo Moro (já falecido), e da professora de
Língua Portuguesa, Odete Starke Moro.
Antes
de enveredar pelos caminhos do Direito, o juiz seguiu os passos do pai na
atividade docente, tendo também integrado o departamento de Geografia da
Universidade Estadual de Maringá. Mesmo assim, resolveu fazer o curso de
Direito. Porém, ainda tinha dúvidas se era a isso que queria dedicar sua vida. Até
o terceiro ou quarto ano do curso, essa era uma dúvida que ainda insistia em
acompanhá-lo pelo campus da universidade. Outra dúvida o incomodava: “Que ramo
do Direito escolher?” Naquela época, crimes de lavagem de dinheiro existiam,
mas não eram investigados como hoje o são. As duas áreas mais chamativas eram
Direito de Família e Direito Tributário. Moro chegou a pensar em ir para a área
tributária, mas a vida se encarregou de lavá-lo para a área na qual tem se
destacado de forma eficiente: Direito Penal.
Em
1995, aos 22 anos, formou-se em Direito pela Universidade Estadual de Maringá.
Um ano e meio após a graduação, passou em um concurso federal e tornou-se juiz.
Sempre em busca de conhecimentos que o ajudassem a exercer melhor sua
profissão, em 1998, foi para os Estados Unidos, onde participou de um programa
para instrução de advogados na Harvard Law School. Em 2007, após concluir o mestrado
e o doutorado, pela Universidade Federal do Paraná, ele foi convidado a voltar
aos Estados Unidos, dessa vez, para visitar agências americanas de combate à
lavagem de dinheiro.
Atualmente, o juiz que comanda os processos da
operação que revelou ao Brasil e ao mundo, os esquemas de lavagem de dinheiro e
corrupção, envolvendo, a Petrobrás, empresas privadas, políticos, partidos
políticos, e altos funcionários executivos da estatal e de empresas privadas, exerce
suas funções na 13a Vara Federal de Curitiba. Por não medir esforços
para que se cumpra a lei, Moro é criticado por uns e aplaudido por outros.
A
Operação Lava Jato é um doutorado na vida de Moro, e ninguém chega ao doutorado
sem passar pelo mestrado. Nesse sentido, Sérgio Moro, cuja especialidade é
crimes financeiros, cursou o mestrado no caso do Banestado, em que também atuou
como juiz. Esse caso de corrupção ocorreu entre 2003 e 2007, e consistiu na
remessa ilegal de divisas para os Estados Unidos, através do sistema financeiro
público brasileiro, na segunda metade dos anos 90. Após uma investigação, foi
instaurada uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI), que apurou terem sido
enviados para o exterior, pelo Banestado, a quantia de 19 bilhões de dólares. Posteriormente,
o governo dos Estados Unidos, conseguiu recuperar 17 milhões, que foram
devolvidos ao Brasil. O processo comandado por Sérgio Moro, levou a condenação
de 97 pessoas. Um dos condenados, e peça central desse processo, foi o doleiro
Alberto Youssef, que fez um acordo de delação premiada, e passou a responder
pelo crime em liberdade.
As
delações de Youssef, à época, serviram de base para a Operação Farol da Colina
— Uma megaoperação deflagrada pela polícia em sete estados brasileiros contra
doleiros e pessoas ligadas a eles. Os envolvidos eram acusados de sonegação
fiscal, evasão de divisas, formação de quadrilha, e lavagem de dinheiro.
Outro
caso de grande repercussão, e que foi uma prova de fogo para Sérgio Moro, foi a
Operação Fênix, em 2007, que resultou na prisão de 14 pessoas ligadas ao
traficante Fernandinho Beira-Mar. Além dos comparsas do traficante, Moro
decretou a prisão do próprio Beira-Mar, que foi condenado a 29 anos de prisão,
pela 2a Vara Federal de Curitiba. A mulher do traficante também foi
condenada nesse processo a 20 anos e cinco meses de prisão. A Operação Fênix
resultou na apreensão de drogas, armas, carros de luxo, e também uma fazenda no
Paraguai. Além disso, desarticulou empresas de fachada usadas para lavagem de
dinheiro advindo do tráfico de drogas.
Autor
do livro, Crimes de Lavagem de Dinheiro, que é referência no assunto, Sérgio
Moro, pai de dois filhos, segue comando mais um caso de grande repercussão,
talvez o maior de sua carreira. E tem mandado para a cadeia gente muito poderosa,
coisa impensável na história recente do país.
Penso
que o que falta na legislação de nosso país é uma pequena palavra, chamada,
punição. Por muito tempo, políticos, funcionários do serviço público, e empresários
do setor privado, têm agido da forma como bem querem e entendem, lesando os
cofres públicos, com suas negociações espúrias, e nada acontece. Bandidos são encarcerados e
continuam comandando seus “negócios” de dentro das prisões, isso aconteceu no
passado, e continua acontecendo ainda hoje, e nada acontece que os impeça de
tais atos. Esperamos que Sérgio Moro tenha inaugurado uma nova era na qual haja
punição para os culpados, sejam eles poderosos executivos ou não. Acho que é
isso é um dar um passo importante para um Brasil mais justo.
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