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O machado de ferro de Sérgio Moro

Posted by Cottidianos on 00:27
Domingo, 05 de julho
Eu vejo a vida melhor no futuro
Eu vejo isso por cima de um muro de hipocrisia
Que insiste em nos rodear
Eu vejo a vida mais clara e farta
Repleta de toda satisfação
Que se tem direito
Do firmamento ao chão
(Tempos Modernos – Lulu Santos)


O Posto Torres, localizado em área nobre de Brasília, é um dos mais movimentados da cidade. Mais que um posto de gasolina, o empreendimento é um complexo comercial que oferece serviços que vão de alimentação à lavanderia. O local fica a 3 km do início da Esplanada dos Ministérios. 85 funcionários, divididos em turnos, cuidam dos serviços de lanchonete, restaurante, loja de conveniência, além de cuidar das 16 bombas de abastecimento.  Estima-se que cerca de 3.000 a 3.500 veículos passem pelo local todos os dias, com isso o posto vende 50 mil litros de combustíveis diariamente.

O dono do Posto Torres, Carlos Habib Chater, é um empresário desonesto, e há vinte anos tem problemas com a lei. A especialidade dele é lavagem de dinheiro e remessa de dinheiro para o exterior. O Posto de Gasolina era, para ele, apenas fachada, trampolim para negócios fraudulentos.

Ah, ia esquecendo-me de informar um detalhe importante. O Posto Torres seria um posto de abastecimento tão comum quanto qualquer outro, não fosse por uma casa de câmbio, chamada ValorTur, que funcionava no local. A polícia já vinha investigando, secretamente, movimentações financeiras suspeitas que ocorridas no local.

No dia 17 de março de 2014, a Polícia Federal, resolveu que era hora de agir. A operação comandada pela PF teve início às 6 da manhã daquele dia, e envolveu 400 policiais. Na capital federal foi preso, o doleiro, Carlos Habib Chater, apontado pela polícia como um dos chefes de uma organização criminosa, cuja especialidade era a lavagem de dinheiro em todo o país. No mesmo dia, ocorreram ações paralelas nos estados do Paraná, São Paulo, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Rio de Janeiro e Mato Grosso, cumprindo, ao todo, 81 mandatos de busca e apreensão.

Era o início da Operação Lava-Jato. Ninguém sabia ainda, mas aquela operação revelaria ao mundo, um dos maiores escândalos de corrupção jamais vistos no Brasil, e abalaria a credibilidade de uma das maiores empresas do mundo: A Petrobrás.

Lavanderia, lava-jato, posto de gasolina, evasão de divisas, campos semânticos tão diferentes, mas tão dentro um mesmo contexto, que a polícia resolveu batizar a operação de Operação Lava-Jato. Curiosamente, no Posto Torres, havia de tudo, até lavanderia de roupas, menos lava-jato de automóveis.

Com o desenrolar das investigações ficou-se sabendo que o Posto Torres funcionava como uma espécie de “caixa eletrônico” da propina em Brasília, e que muitos políticos frequentavam o local, não apenas para abastecer seus carros, mas também, e principalmente, para encher de dinheiro seus bolsos e maletas. Segundo informações da polícia, o esquema movimentou mais de 10 milhões entre 2007 e 2014, e que esse dinheiro transitou por várias contas diferentes.

Também na operação deflagrada naquele 17 de março de 2014, foram presos, além do dono do Posto Torres, Alberto Yousseff, em São Luís do Maranhão, e Enivaldo Quadrado, em Assis, interior de São Paulo.

Carlos Habib Chater e Alberto Yousseff, já eram velhos conhecidos da polícia. O primeiro já havia sido preso em uma operação policial, em 1991, juntamente com o pai, Habib Salim El Chater. Os dois ficaram apenas dois dias presos, pagaram fiança e foram liberados. Eles também já haviam sido investigados por suspeita de estarem envolvidos em esquemas de contrabando de pedras preciosas e uso de moeda falsa.

Já Youssef, havia sido protagonista em outro famoso escândalo de corrupção, denominado, Banestado. Na época, o doleiro afirmou que pagava propinas a diretores do Banco Paraná. O doleiro fez acordo de delação premiada e respondia em liberdade. Em vez do tomar o Banestado como lição para uma mudança de rumo na vida, Yousseff fez dele uma escola do crime, e acabou se envolvendo em uma encrenca ainda maior.

Desde aquela manhã, 17 de março do ano passado, a Polícia Federal já deflagrou 15 fases da Operação Lava Jato. A última fase de um processo em andamento, foi deflagrada na manhã do último dia 02 de julho, tendo sido denominada Operação Mônaco. Nela a polícia investiga o recebimento de vantagens ilícitas no âmbito da Diretoria Internacional da Petrobrás.

Em todas essas fases a Operação Lava Jato já mandou para a cadeia, executivos de empresas poderosas, como a Camargo Correa, OAS, Mendes Junior, UTC, Engevix, Iesa, Galvão Engenharia, Queiroz Galvão, além de executivos da Petrobrás e doleiros. A operação também tem mostrado o descomprometimento de políticos, e dos partidos aos quais pertencem, bem como empresas do setor público e privado, com o futuro da nação.


 Desde quando foi deflagrada a Lava Jato, um nome tem tido destaque em todas as manchetes que se referem a ela:

Juiz Sérgio Moro manda prender presidente da Queiroz Galvão em nova fase da Lava Jato

Sérgio Moro nega liberdade a quatro presos na Operação Lava Jato

Sérgio Moro determina bloqueio de R$ 78 milhões de empresário preso

Juiz Sérgio Moro determina prisão de Vaccari com base nas delações

Quem é esse homem que conduz com mão de ferro, uma empreitada tão grande e de tão grande alcance? Quem é esse juiz que resolveu mexer em casa de abelha?

Ano passado, ele foi eleito o brasileiro do ano pela revista IstoÉ. “Eleito por IstoÉ o “Brasileiro do Ano”, Moro não mostra sedução pelo poder da toga. De hábitos simples, ele faz parte de uma rara safra de juízes que encaram a magistratura como profissão de fé”, diz a reportagem. Ainda segundo a revista, o juiz Sérgio Moro, além de simples, é discreto e reservado: “Não dá entrevistas, nem posa para fotos. Dispensa privilégios. Vai para o trabalho todos os dias a bordo de um velho Fiat Idea 2005, prata, bastante sujo e repleto de livros jurídicos empilhados no banco de trás. Antes chegou a ir de bicicleta, ‘quando eu chego nos lugares, ninguém imagina que é o Sérgio Moro’, conta sorrindo. Apesar de ter se tornado o inimigo número 1 de poderosos, prefere andar sem guarda-costas. Quem sempre reclama é a esposa, a advogada Rosângela Wolff de Quadros Moro, procuradora jurídica da Federação Nacional das Apaes, instituição dedicada à inclusão social de pessoas com deficiência. A ‘Sra. Moro’ teme pela segurança do marido, e dela mesma, afinal o magistrado se mostrou implacável com  a corrupção ao encurralar integrantes do governo e do PT e levar, numa ação inédita, executivos das maiores empreiteiras do País à cadeia”.

Nascido em Ponta Grossa, no Paraná, em 1973, Sergio Fernando Moro é filho de do professor de Geografia, Dalton Aureo Moro (já falecido), e da professora de Língua Portuguesa, Odete Starke Moro.

Antes de enveredar pelos caminhos do Direito, o juiz seguiu os passos do pai na atividade docente, tendo também integrado o departamento de Geografia da Universidade Estadual de Maringá. Mesmo assim, resolveu fazer o curso de Direito. Porém, ainda tinha dúvidas se era a isso que queria dedicar sua vida. Até o terceiro ou quarto ano do curso, essa era uma dúvida que ainda insistia em acompanhá-lo pelo campus da universidade. Outra dúvida o incomodava: “Que ramo do Direito escolher?” Naquela época, crimes de lavagem de dinheiro existiam, mas não eram investigados como hoje o são. As duas áreas mais chamativas eram Direito de Família e Direito Tributário. Moro chegou a pensar em ir para a área tributária, mas a vida se encarregou de lavá-lo para a área na qual tem se destacado de forma eficiente: Direito Penal.

Em 1995, aos 22 anos, formou-se em Direito pela Universidade Estadual de Maringá. Um ano e meio após a graduação, passou em um concurso federal e tornou-se juiz. Sempre em busca de conhecimentos que o ajudassem a exercer melhor sua profissão, em 1998, foi para os Estados Unidos, onde participou de um programa para instrução de advogados na Harvard Law School. Em 2007, após concluir o mestrado e o doutorado, pela Universidade Federal do Paraná, ele foi convidado a voltar aos Estados Unidos, dessa vez, para visitar agências americanas de combate à lavagem de dinheiro.

 Atualmente, o juiz que comanda os processos da operação que revelou ao Brasil e ao mundo, os esquemas de lavagem de dinheiro e corrupção, envolvendo, a Petrobrás, empresas privadas, políticos, partidos políticos, e altos funcionários executivos da estatal e de empresas privadas, exerce suas funções na 13a Vara Federal de Curitiba. Por não medir esforços para que se cumpra a lei, Moro é criticado por uns e aplaudido por outros.

A Operação Lava Jato é um doutorado na vida de Moro, e ninguém chega ao doutorado sem passar pelo mestrado. Nesse sentido, Sérgio Moro, cuja especialidade é crimes financeiros, cursou o mestrado no caso do Banestado, em que também atuou como juiz. Esse caso de corrupção ocorreu entre 2003 e 2007, e consistiu na remessa ilegal de divisas para os Estados Unidos, através do sistema financeiro público brasileiro, na segunda metade dos anos 90. Após uma investigação, foi instaurada uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI), que apurou terem sido enviados para o exterior, pelo Banestado, a quantia de 19 bilhões de dólares. Posteriormente, o governo dos Estados Unidos, conseguiu recuperar 17 milhões, que foram devolvidos ao Brasil. O processo comandado por Sérgio Moro, levou a condenação de 97 pessoas. Um dos condenados, e peça central desse processo, foi o doleiro Alberto Youssef, que fez um acordo de delação premiada, e passou a responder pelo crime em liberdade.

As delações de Youssef, à época, serviram de base para a Operação Farol da Colina — Uma megaoperação deflagrada pela polícia em sete estados brasileiros contra doleiros e pessoas ligadas a eles. Os envolvidos eram acusados de sonegação fiscal, evasão de divisas, formação de quadrilha, e lavagem de dinheiro.

Outro caso de grande repercussão, e que foi uma prova de fogo para Sérgio Moro, foi a Operação Fênix, em 2007, que resultou na prisão de 14 pessoas ligadas ao traficante Fernandinho Beira-Mar. Além dos comparsas do traficante, Moro decretou a prisão do próprio Beira-Mar, que foi condenado a 29 anos de prisão, pela 2a Vara Federal de Curitiba. A mulher do traficante também foi condenada nesse processo a 20 anos e cinco meses de prisão. A Operação Fênix resultou na apreensão de drogas, armas, carros de luxo, e também uma fazenda no Paraguai. Além disso, desarticulou empresas de fachada usadas para lavagem de dinheiro advindo do tráfico de drogas.

Autor do livro, Crimes de Lavagem de Dinheiro, que é referência no assunto, Sérgio Moro, pai de dois filhos, segue comando mais um caso de grande repercussão, talvez o maior de sua carreira. E tem mandado para a cadeia gente muito poderosa, coisa impensável na história recente do país.

Penso que o que falta na legislação de nosso país é uma pequena palavra, chamada, punição. Por muito tempo, políticos, funcionários do serviço público, e empresários do setor privado, têm agido da forma como bem querem e entendem, lesando os cofres públicos, com suas negociações espúrias, e  nada acontece. Bandidos são encarcerados e continuam comandando seus “negócios” de dentro das prisões, isso aconteceu no passado, e continua acontecendo ainda hoje, e nada acontece que os impeça de tais atos. Esperamos que Sérgio Moro tenha inaugurado uma nova era na qual haja punição para os culpados, sejam eles poderosos executivos ou não. Acho que é isso é um dar um passo importante para um Brasil mais justo.

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