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Flagrantes do bem
Posted by Cottidianos
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03:20
Quarta-feira,
27 de novembro
Imagem: http://www.portaisgoverno.pe.gov.br/web/sds/exibir_noticia?groupId=124015&articleId=763107&templateId=176917 |
Solidariedade:
O que significa essa palavra que tem sido alvo de tantos debates, de tantas
discussões? Será que ela que tem sido
pratica na mesma proporção em que é discutida? Há espaço para ela no mundo
consumista e capitalista, no qual não se pode perder um segundo de tempo? Vamos
começar nossa conversa visitando o Aurélio,
Novo Dicionário da Língua Portuguesa.
O que nos diz ele? “Sentido moral que vincula
o indivíduo à vida, aos interesses e às responsabilidades dum grupo social,
duma nação, ou da própria humanidade/ Relação de responsabilidade entre pessoas
unidas por interesses comuns, de maneira que cada elemento do grupo se sinta na
obrigação moral de apoiar o (os) outro (os)”.
O dicionário nos dá outros significados, entretanto, no momento, só nos
interessa esses dois.
Definições
bonitas essas que o Aurélio nos apresenta, não? Muito lindas mesmo! Porém, como
essas palavras se traduzem na prática, no dia-a-dia? Olhamos o dicionário e definimos
a teoria. Vamos olhar agora as câmeras instaladas pela Secretaria de Defesa
Social, da cidade de Recife, Estado de Pernambuco, no Nordeste brasileiro. Talvez
elas nos deem uma definição mais prática.
Segundo
definição do próprio site da secretaria, o órgão tem como missão institucional “Promover
a defesa dos direitos do cidadão e da normalidade social, através dos órgãos de
segurança pública, integrando ações do governo”. Dentre as medidas adotadas
pela SDS (Secretaria de Defesa Social), está a instalação de câmeras no centro
do Recife, com o objetivo de flagrar a ação de delinquentes. Os profissionais
da secretaria tiveram uma grande surpresa. As câmeras, realmente, flagraram a
ação de bandidos, mas também surpreenderam ao mostra o flagrante do bem. As imagens foram mostradas numa TV local,
sendo a repórter, Beatriz Castro, a autora da matéria.
Uma
das cenas acontece em dia de chuva, quando um pedestre é atropelado e permanece
caído na avenida. Alguns pedestres logo se juntam e forma uma barreira humana,
todos com guarda-chuva, protegendo-o da chuva e, ao mesmo tempo, de sofrer
outro acidente.
Em
outra, o deficiente visual caminha pela calçada quando se depara com faixas e
cavaletes no meio do caminho. A calçada estava interditada devido a obras que
estavam sendo realizadas no local. Um transeunte que passava por ali na ocasião
oferece ajuda e o deficiente visual consegue prosseguir seu caminho sem maiores
impecilhos. Outros indivíduos com a
mesma dificuldade surgem pelas ruas do centro e a atitude dos passantes é a
mesma: prestarem ajuda. Está difícil subir
à calçada quando se está em uma cadeira de rodas? Não é preciso se desesperar,
logo aparecem uma, duas, três pessoas prontas a ajudar. Um homem, aparentemente
embriagado, está deitado na escadaria de uma igreja. Uma mulher que por ali passava se dirige até
ele. Tenta acordá-lo por várias vezes, o homem não acorda. A carteira que ele
segurava nas mãos era um alvo fácil para os ladrões. Ela retira a carteira das
mãos dele e a esconde debaixo das costas do homem. Assim ficaria mais difícil
para um passante mal intencionado pegar a carteira. Sport Clube
do Recife e Santa Cruz Futebol Clube do Recife são dois times rivais da cidade.
Pois bem, durante um passeio de bicicleta, um torcedor vestido com camisa do
Sport leva um tombo. Ia passando na
ocasião outro torcedor vestindo a camisa do time adversário que, sem pensar
duas vezes o homem corre para ajudar àquele que precisava ser ajudado. Está
certo ele: adversários em campo, quando a bola está rolando. Na rua dois seres
humanos, sujeitos às mesmas intempéries da vida. Esses casos são apenas uma gota d’água em meio
ao oceano de solidariedade mostrada pelo povo do Recife.
Os
aparelhos de segurança que serviriam para capturar imagens de furtos, roubos e
acidentes acabaram mostrando uma faceta que não era esperada por quem cuida da
segurança pública e que está acostumado
a presenciar a violência dos grandes centros.
Em apenas dois meses, as equipes de observação, registraram cerca de 600
flagrantes do bem.
Se
fosse matemática, a solidariedade social seria uma conta de multiplicar. Ela cria
uma reação em cadeia. Quando recebemos ajuda de alguém nos sentimos estimulados
a devolver a boa ação. Sejamos, portanto, cada um de nós, um agente
multiplicador da solidariedade nos pequenos gestos, nas pequenas ações, pois se
não conseguirmos mudar o mundo, pelo conseguiremos modificar uma parte da
realidade que nos cerca. E cada um fazendo um pouco, todos juntos terão feito
muito. É como um feixe de varas. Junta não se pode quebra-las, enquanto que
separadas qualquer um, e com pouco esforço, as quebra facilmente.
Para
terminar, deixo para vossa reflexão uma fábula de Jean De La Fontaine:
***
O
Velho e seus três filhos
A
união faz a força. Quem diz não sou, mas sim o escravo frígio, que outrora escreveu
o que abaixo transcrevo, e se alguma inserção acrescentei, não foi por querer
tornar meu o que é dele somente. Essa vã pretensão teve Fedro, não eu, que só
quis adaptar nossos costumes de hoje ao texto original. Vejamos o que fez um
pai quis mostrar, aos filhos, que a união é um bem mesmo essencial.
Sentindo,
a morte próxima, um velho chamou seus filhos: _ “Meus queridos meninos” _
Falou _ “vede o feixe de varas que tenho na mão? Tentai quebra-lo e haveis de
ver que é esforço vão.”
O mais
velho o tomou, tentou e desistiu.
_ “Outro
mais forte que o tente.” _ O segundo sorriu, tomou do feixe, fez muita força, mas
nada.
O caçula,
por fim, também vê fracassada a sua tentativa. O feixe resistiu e nenhuma das
varas rachou ou partiu.
_ “Vou
mostra-vos, agora” _ diz o velho pai _ “como é fácil rachar estas varas. Olhai.”
Seria
troça? Não, pois o pai os encara, depois põe-se a rachar o feixe, vara a vara,
enquanto diz: _ “Se fordes juntos como um feixe, resistireis a tudo, depois que
eu vos deixe.”
Enquanto
o mal durou, ele nada disse; mas faltando bem pouco para que partisse,
chamou-os e falou: _ “Chegou, enfim, o meu dia. Meu pedido atendei: vivei em
harmonia. Dai-me a vossa palavra, é só que que me interessa.”
A chorar,
os três filhos fazem-lhe a promessa. O pai os abençoa e morre nos seus braços. A
herança que lhes deixa é cheia de embaraços: um credor os penhora, aparece um
processo; tudo isso os três irmãos enfrentam com sucesso. Pena que durou pouco
essa união tão rara. O que o sangue juntou, o interesse separa. Muita inveja e
ambição os desunem de vez. Recorre-se a partilha e, contra todos três, se
levantam protestos e contestações; sucedem-se querelas e condenações; as terras
são perdidas para os confrontantes, os bens para os credores, e a riqueza de
antes aos poucos se desfaz, até nada sobrar. Unidos pelo infortúnio, os três a
lembrar da palavra que ao velho pai haviam dado outrora e de um feixe de varas
que jogaram fora...
***
À
quem interessar assistir a reportagem completa, tratada neste artigo, segue
link para o site do Youtube:
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