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O que o Brasil pode fazer para não seguir o exemplo do Rio em declarar calamidade pública?

Posted by Cottidianos on 00:23
Terça-feira, 12 de julho


Essa é uma semana decisiva em Brasília e que terá reflexos nos destinos do país. Na noite de quarta-feira, está prevista a eleição do novo presidente da Câmara dos Deputados, que ficará no cargo até fevereiro, quando então será convocada uma nova eleição. Frequentemente nosso realismo tem se confundido com pessimismo. Mas há que se observar a realidade e falar dela. Por exemplo, os candidatos que se apresentam para um cargo de tamanha relevância para os destinos da nação, o que eles são? Corruptos. Hoje, Rogério Rosso, líder do PSD-DF, confirmou sua candidatura. Rosso é um dos favoritos, e é indiciado por corrupção e investigado pelo crime de peculato. Os demais candidatos não fogem muito a esse padrão.

Também na Câmara, espera-se a decisão sobre o prazo para o desfecho do caso Eduardo Cunha. Caso, que, diga-se de passagem, anda menos veloz que uma tartaruga. Não duvido nada de que a definição desse caso só venha a acontecer em agosto. Eu fico me perguntando o porquê de tanto empenho dos deputados aliados de Cunha, em salvar um político, que nem merece esse nome, e que apesar de todas as evidências e provas contra ele, diz de nada saber a respeito de contas no exterior das quais ele é proprietário, e de outras falcatruas. Porque governo e aliados se esmeram tanto em tentar salvar o mandato de um inimigo da nação?

No Senado, os autores da denúncia contra Dilma Rousseff entregam as alegações finais dessa que é a fase intermediária do processo. Também essa semana, começa a correr o prazo de quinze dias para as alegações da defesa da presidente afastada.    
     
Porém, deixemos de lado essas questões por enquanto, e falemos de assuntos que enveredam mais para o campo econômico do que do político.

Para fazer essa competente análise de a quantas anda as nossas perspectivas de melhora, e de como fazê-las, apresento a vocês uma entrevista com o economista, Marcos Lisboa. Marcos é presidente do INSPER — instituição de ensino superior nas áreas de economia e negócios, direito e engenharia.  A entrevista foi publicada nesta segunda (11), pelo jornal Folha de São Paulo, e é de autoria de Fernando Canzian.

A propósito, a pergunta que serve de título para esta postagem será respondida pelo brilhante economista nas linhas abaixo.

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Marcos Lisboa

Brasil pode virar um grande Rio de Janeiro, diz presidente do Insper


FERNANDO CANZIAN

Sem reformas estruturais para conter a trajetória explosiva de sua dívida, o Brasil corre o risco de se transformar em "um grande Rio de Janeiro", afirma o economista e presidente do Insper, Marcos Lisboa, para quem o governo Michel Temer tem se mostrado "fraco" e suscetível a "pressões de grupos". "Isso é ir contra o ajuste."

O economista diz que cumprir a regra do teto para os gastos será "relativamente simples" porque a taxa de inflação (que corrigirá a despesa) está em queda. Como a inflação de 2017 deve ser menor que a deste ano, o gasto poderá ter aumento real.

Lisboa afirma que a "grande pergunta" é saber se medidas como o reajuste do funcionalismo (ao custo de R$ 67,7 bilhões até 2018) seriam só consequência do fato de Dilma Rousseff ainda não ter sido afastada definitivamente. "Espero que a interinidade não tenha sido um mau prelúdio", diz. Leia trechos da entrevista à Folha.

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Folha - O governo federal acaba de projetar seu deficit de 2017 em R$ 139 bilhões e promete um esforço fiscal de R$ 55,4 bilhões a ser obtido com privatizações, concessões e aumento da receita com a melhora da atividade. Qual a sua avaliação?

Marcos Lisboa - O número que interessa para a sustentabilidade das contas públicas são os R$ 194,4 bilhões (soma do deficit e das receitas adicionais previstas). Esse é o número que continuará crescendo de forma estrutural. O que o governo está fazendo é um esforço adicional, com a venda de ativos e receitas extraordinárias, para reduzir esse número para R$ 139 bilhões. São receitas extraordinárias, e bem-vindas.

Elas atenuam a trajetória de crescimento da dívida e dão um pouco mais de fôlego para enfrentar o problema, que seria ainda maior se o número fosse R$ 194,4 bilhões.

Há uma melhora nas expectativas. Na prática, porém, nada de fundamental mudou. Como o sr. vê o atual quadro?

Temos uma janela de oportunidade para enfrentar um problema estrutural muito grave. Há um cenário externo mais favorável aos preços de commodities no Brasil, as coisas pararam de piorar em termos de atividade e talvez exista a oportunidade de uma pequena recuperação no ano que vem.

Agora, o problema fiscal no Brasil é estrutural. Se nada for feito, mesmo com o teto para os gastos, os números vão piorar. Uma série de fatores estruturais faz com que a despesa pública cresça acima da receita.

Sem reformas estruturais profundas, essa janela de oportunidade será perdida e daqui a um ano teremos o retorno da crise, com o agravamento das condições do país.

Como avalia o início do governo Michel Temer?

Ele demonstra uma relativa dubiedade. Se por um lado tem falado em sacrifícios, em fazer reformas como a da Previdência, em propor o teto para os gastos e enfrentar uma série de problemas essenciais para superar o problema fiscal, por outro, no varejo, tem cedido aos grupos de pressão. Este parece ser um governo fraco, que cede a grupos de pressão. E ceder é ir na contramão do ajuste.

Isso não seria consequência da interinidade? Ceder para fazer passar o impeachment?

Essa é a grande pergunta. Mas fico surpreso quando vejo autoridades dizerem que o reajuste dado aos funcionários públicos não atrapalha o ajuste fiscal. Atrapalha.

O Brasil não tem onde cortar. Não tem onde. Cumprir o teto no ano que vem será relativamente simples, porque temos a inflação em queda. Mesmo que se cumpra o teto em 2017, podemos ter um crescimento real do gasto de 3%.

O grande problema do Brasil não é cumprir o teto. É garantir a estabilidade da evolução da dívida em relação ao PIB. Hoje temos metade das despesas engessadas em Previdência e assistência social. São gastos que crescem em termos reais 4% ao ano.

Mesmo assim, o mercado está mais otimista.

Seria difícil imaginar uma gestão mais incompetente em termos de política econômica do que a que vimos entre 2009 e 2014. Mesmo no segundo governo Dilma, com a equipe que entrou, continuávamos com um governo que tinha uma dissonância cognitiva. Nomeava um ministro numa direção e fazia o discurso na outra.

Hoje, vivemos algo parecido, mas um pouco melhor. Há um cenário externo favorável e um benefício da dúvida, no processo político, de que as reformas vão caminhar. E a gente espera que andem.

Mas o que preocupa é que o conjunto da obra, até agora, não tem sido bom. O governo não tem um discurso claro e consistente e, no varejo, vai cedendo aos grupos de pressão. Pode ser que isso seja mesmo fruto da interinidade, mas isso vai ter consequências mais à frente.

O teto, por exemplo, ajuda a não dar reajuste para as despesas sobre as quais se tem controle. Mas ele não significará necessariamente o fim do crescimento real do gasto, já que a inflação está em queda.

O mais importante é que a agenda fiscal avance, porque além dela há a agenda para retomar o crescimento. As agendas de ganho de produtividade, concessões, melhoria do ambiente de negócios, que ficou muito degradado nos últimos seis anos.

O Brasil vive um momento de muitas crises simultâneas. A fiscal é a mais urgente, mas tem muitas outras que precisam ser enfrentadas.

Muitos parecem dar um voto de confiança e imaginar que, passado o impeachment, virão medidas estruturais.

A maioria das pessoas concordaria com isso. Mas sou um pouco mais pessimista. A substituição da gestão de Dilma gera algum ânimo. Mas o processo foi confuso e acabou carregado não tanto pelos graves problemas cometidos pelo governo anterior, mas por um certo oportunismo na dinâmica da política.

Portanto, este é um governo que começa com fragilidade e com uma agenda muito difícil de reformas que são necessárias para garantir que a gente consiga chegar a 2018 com uma economia ao menos sem continuar piorando, com alguma retomada da produção e do emprego.

Garantir que essa janela de oportunidade seja aproveitada requer enfrentar o problema fiscal no próximo ano e que não se criem compromissos agora que depois inviabilizem o crescimento.

A saída do fundo do poço não trará aumento da arrecadação que favorecerá o ajuste fiscal? Ou isso é a janela de oportunidade que pode se fechar?

É isso. Isso é o que abre a janela de oportunidade. O problema é que, sem reformas, a despesa pública no Brasil vai continuar crescendo acima da receita nos próximos anos, mesmo que a receita cresça com a melhora na atividade econômica.

A menos que sejam feitas reformas adicionais, isso significará um endividamento crescente. Não dá para cumprir o teto sem reformas estruturais. O teto é só um passo para explicitar a restrição orçamentária e evitar reajustes de uma parte das contas.

O que preocupa é que os governos, tanto federal quanto os locais, em vez de enfrentar as causas do problema, ficam buscando artifícios para adiar suas consequências para o futuro. E este adiamento agravará o quadro.

São os casos do Rio e do Rio Grande do Sul, que hoje se utilizam de depósitos judiciais para financiar as contas públicas.

O Brasil está deixando os problemas para depois, e o problema está crescendo.

O que fazer até o fim do processo de impeachment de Dilma?

Parar de piorar. Parar de ceder a grupos de pressão. E assumir os problemas com transparência. Temos uma janela de oportunidade. Podemos aproveitar isso ou não.

Espero que o que vimos até aqui, durante a interinidade, não tenha sido o prelúdio do que vamos viver depois de agosto. Pois o Brasil pode virar um grande Rio de Janeiro [que decretou estado de calamidade pública em junho].


A diferença entre o risco do Brasil e a situação do governo do Rio é que o governo federal pode recorrer ao aumento da inflação. Seria a retomada da inflação crônica. Não a melhor das escolhas.

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