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A novela dos atletas russos

Posted by Cottidianos on 00:11
Terça-feira, 26 de julho


Rio. Cidade Maravilha purgatório da beleza e do caos, como diz o verso da canção de Fernanda Abreu, que tão bem te define. Estás há poucos dias do maior evento esportivo do planeta, e um dos mais antigos, e, ao invés de cantares as glórias de um serviço bem feito, escancaras constrangimentos em cima de constrangimentos.  Tens o Cristo Redentor, é verdade. Tens o Pão de Açúcar, é verdade. Tens a bela baía de Guanabara, e a Lagoa Rodrigo de Freitas, belas de longe e tão mal cuidadas quando se chega perto. Ah, Rio, se fosses tu uma cidade bem cuidada, serias o paraíso dos paraísos. Serias um céu então, se em tuas favelas e morros se ouvissem o canto dos pássaros em vez dos tiros dos fuzis.

Nosso Rio, brasileiro, de Janeiro, se já és cartão postal, apesar de todos os problemas que os cidadãos e governantes criaram para ti, imagine o que serias sem esses problemas?

Preparas-te, como podes para os Jogos Olímpicos e Paraolímpicos que já batem às tuas portas. Já começas a receber as delegações estrangeiras e os turistas que vem prestigiar o evento. Na tão falada Vila Olímpica, já se hospedam 115 delegações estrangeiras. Porém, ò vila, tu que poderias imitar-te a cidade no cognome, também és passível de constrangimentos. Não por causa de ti mesma, mas devido ao porco serviço que fizeram os construtores. Como sempre, e como tudo por aqui, tudo foi deixado para ser feito em cima da hora. A Vila Olímpica do jeito como foi apresentada aos atletas parece-se com um sepulcro caiado: bonito por fora, e um horror por dentro.

O avião da equipe australiana pousou no Galeão, a delegação pisou em solo brasileiro, e... Dirigiu-se contente para a Vila Olímpica. Chegando lá, alegria virou decepção. Fiação exposta, vazamentos, falta de iluminação, banheiros bloqueados, e uma sujeira enorme. Os australianos bateram pé, se recusaram a entrar naquelas péssimas acomodações enquanto os problemas não fossem solucionados, e a chefe da delegação resolveu levar seus atletas para um hotel, até que tudo esteja resolvido. Outras dezenas de delegações também reclamaram das péssimas acomodações.

Os problemas dos quais os atletas reclamaram, já haviam sido reportados antes pelos 3.500 homens das Força Nacional de Segurança que chegaram à vila em meados deste mês. Os agentes reclamaram de alojamentos sem água, sem colchões, banheiros e cozinhas mal acabados, além do atraso no pagamento dos salários. Porque então, as autoridades não resolveram esses problemas antes? Pelo menos não teriam que passar vergonha perante as delegações estrangeiras? Até o início dos jogos deverá estar tudo normalizado, mas o constrangimento inicial, a má impressão essa não será apagada.

Apesar de tudo, e tirando os problemas, as delegações estão tranquilas em relação aos seus desempenhos naquelas modalidades de esportes na qual são campeões. Tranquilas e ansiosas também, afinal, cada qual espera dar de si o melhor para conquistar a tão sonhada medalha de ouro, que seja de prata, ou bronze, tá valendo.


Entretanto, quem não está tão tranquilo assim, são os esportistas da Rússia. Ás vésperas dos jogos do Rio, aquele país está numa saia justa perante a Agência Mundial Antidopagem (WADA) e o Comitê Olímpico Internacional (COI). A delegação russa corria, inclusive, o risco de ser banida dos Jogos Olímpicos do Rio e de competições internacionais.

Na manhã de domingo (24), o COI, reunido em Lausanne, após longa polêmica, resolveu permitir a participação dos atletas russos na Rio 2016, com a condição de que eles demonstrem não ter nenhuma relação com o escândalo de doping em massa patrocinado pelo governo russo. Caberá a cada federação internacional de esportes, avaliar, caso a caso, os atletas russos. Os atletas que já tinham no currículo algum histórico de doping, mesmo tendo já cumprido as respectivas punições, a esses é negado o direito de participar das competições. Pelo visto, as federações internacionais, há poucos dias da Olimpíadas e Paraolimpíadas, terão muito trabalho em relação aos atletas russos.  

A WADA não gostou nenhum pouco da decisão do COI deste domingo, e a criticou duramente. O órgão responsável pelo controle das substâncias utilizadas pelos atletas queria punição mais dura, como a exclusão da Rússia da Rio 2016.

Toda essa confusão, na verdade, começou ainda em fins de 2014. Naquela época, o esquema foi denunciado por Grigory Rodchenkov, ex-diretor do laboratório nacional antidoping russo. Rodchenkov afirmou que havia um esquema de manipulação de amostras, e que esse esquema tinha total apoio das autoridades russas.

A partir dessas denúncias, a ARD, emissora de TV alemã, em pareceria com o britânico, The Sunday Times, produziu um documentário no qual revelava o esquema de doping institucionalizado na Arfa, Federação de Atletismo do país, esquema esse que era acobertado pela autoridades do esporte na Rússia. O documentário foi como colocar fogo num paiol, e o incêndio de grandes proporções se alastrou rapidamente, e ficou difícil para os russos controlá-lo.

A partir dessas denúncias, a Agência Internacional Antidoping (WADA), criou, ao final de 2015, uma comissão independente para apurar o caso. Essa comissão, formada por grandes nomes do esporte, tais como; Richard MacLaren, árbitro da Corte Arbitral de Esportes (CAS), e professor de Direito; Richard Pound, ex-presidente da WADA; e Gunter Younger, chefe do departamento de cibercrimes, da Baviera, apresentou um relatório de 325 páginas, no qual recomendava à Federação Internacional de Atletismo (IAAF), que suspendesse a participação dos atletas russos nas práticas de atletismo, incluindo as Olimpíadas do Rio.

No relatório, apresentado em Genebra, Suíça, a comissão também acusava o governo russo de ser cúmplice no esquema, praticando, inclusive, tentativas de omiti-lo. Também era pedido pela comissão que cinco treinadores e cinco atletas russos fossem banidos do esporte. A comissão também pedia no relatório o banimento do esporte de Maruya Sanivova. Sanivova foi campeã olímpica nos 800m, em Londres, 2012. A mesma punição também foi pedida para Ekaterina Poistogovam medalhista de bronze no mesmo ano, e na mesma prova.

As acusações eram graves e, segundo a comissão, agentes do FSB, serviço de inteligência russo, se infiltraram laboratórios dos trabalhos antidoping dos Jogos de Inverno de Sochi. Ainda segundo a comissão, isso comprometeu seriamente os trabalhos antidoping. O próprio Ministro dos esportes, Vitaly Mutko, teria emitido ordens para que amostragens de doping fossem manipuladas. O esquema criminoso funcionou entre 2011 e 2015, transformando resultados positivos em negócios e prejudicando o bom andamento do esporte.

De acordo com as investigações realizadas pela comissão independente da WADA, durante as madrugadas dos Jogos de Inverno de Sochi, sudoeste do país, em 2014, frascos com urina contaminada eram, deliberadamente, esvaziados, e sem seu lugar, era colada urina pura, colhida dos próprios atletas, que haviam sido colhidas alguns meses antes, e guardadas para a fraude. O objetivo do esquema era garantir a hegemonia dos atletas russos durante a competição, uma espécie de superatletas. Não se sabe se por causa deste esquema, mas naqueles jogos a Rússia, realmente, teve um desempenho excelente, conquistando 33 pódios, e 13 medalhas de ouro. Há alguns dias, a Rússia havia sido banida dos jogos do Rio, pelo Tribunal Arbitral do Esporte. O país havia entrado com recurso alegando que atletas que não tinham resultado positivo de doping estavam sendo punidos injustamente e perdeu.

Porém, o Comitê Olímpico Internacional resolveu dar uma colher de chá para os russos e liberar a participação dos atletas russos sob determinadas condições, o que irritou a Agência Internacional Antidoping.


É isso. Nas Olimpíadas e Paraolimpíadas do Rio, é cada um por si, e cada qual com seus problemas. Não havendo nenhum incidente desagradável, como ataques terroristas e zika, problemas de segurança pública, nem manipulação de resultado de doping, o resto vale a festa. 

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