0
Jalser Renier: O presidente-presidiário
Posted by Cottidianos
on
02:19
Terça-feira,
15 de novembro
“Vejo
tudo isso, por que razão?
Vejo
a política sem explicação
Eu
não sei por que essa exagerada inflação
E
uma ignorante exploração
Às
custas desta nação
Já
quase em desespero tentando resolver
Enquanto
os grandes só querem comer
Às
custas de muitos que lutam pra viver
Em
uma terra boa como esta aqui
Cheia
de recursos, recursos naturais
Enquanto
os gafanhotos só comem demais
Às
custas do povo, que são os demais
Que
por enquanto ainda nada faz...”
(Gafanhoto
– Cidade Negra)
O
Brasil parece ser terreno propício para o plantio, e o cultivo da corrupção. Em
solo nacional, as danosas sementes da corrupção transformam-se em brotos
vicejantes, e depois em árvores frondosas. Mas os frutos dessa árvore são
venenosos. Roubam aquilo que poderia ser um futuro esplendoroso para nosso
país. Imaginem vocês, caros leitores e leitoras, se não houvesse em nosso país
essa sangria desatada do desvio do dinheiro público que abastece o bolso dos
canalhas, corruptos e ladrões. Cuidado, são autoridades, não pode falar assim! E
qual a diferença entre o caráter de quem prática assaltos na rua, ou assalta
verdadeiras fortunas dos cofres públicos? Meus caros, analisemos a situação à
luz da razão. A diferença pode estar na quantia que é roubada, que no segundo
caso é infinitamente superior à primeira.
De resto, as duas naturezas se assemelham.
No
terreno da corrupção, ajudado pelas leis brandas que não pune quem prática o
crime de colarinho branco, há coisas que parecem acontecer apenas no Brasil.
Coisas que de tão esdrúxulas chegam a ser ridículas, e, além de ridículas,
revoltantes.
Por
exemplo, neste domingo (13), o Fantástico, trouxe uma reportagem, feita pelo
repórter Maurício Ferraz. Ferraz foi até a cidade de Boa Vista, capital do
Estado de Roraima, para mostrar um caso curioso. Mais uma das vergonhas
nacionais.
Em
que lugar do mundo, existe um presidente de Assembleia Legislativa, que é, ao
mesmo tempo, presidente e presidiário? Esse existe esse lugar? Pergunta você?
Existe. Em Boa Vista, Roraima.
Jelser
Renier, o presidente de uma casa legislativa que deveria ser espelho, modelo, e
exemplo, não apenas para o povo de Roraima, mas para toda a sociedade
brasileira, durante o dia, preside as sessões legislativas, dá expediente em
seu gabinete, e, à noite vai para aquele que deveria ser sua morada definitiva:
a cadeia. Ele é polêmico, além do que, gosta de cantar durante as sessões,
transformando um lugar sério num ambiente meio circo, meio balada.
E
porque ele dorme na cadeia? A resposta obvia é: cadeia é lugar de criminoso.
Além disso, o motivo que o leva a prisão é uma condenação em 2010. Naquele ano,
ele foi condenado a 6 anos e 8 meses de prisão. Aproveitando-se das brechas na
lei, que de tão maleáveis, acabam favorecendo criminosos da espécie de Jelser,
o deputado conseguiu liminar para recorreu da decisão, e conseguiu responder em
liberdade. Apesar da condenação, conseguiu uma liminar para concorrer nas
eleições de 2014 como deputado estadual. O impressionante é que ele conseguiu
se eleger, pela quinta vez seguida. E pasmem os senhores e senhoras, ele foi o
deputado mais votado em Roraima naquelas eleições.
Aqui
caberia outra discussão sobre os que o elegeram, mas esse texto iria fugir do
seu eixo de discussão, o que não é o caso. Mas apenas uma breve consideração se
pode tecer a respeito dessa questão, e aí entraríamos, na questão do feudo,
tratada na postagem passada deste blog. Não apenas o Maranhão é feudo, existem muitos
deles espalhados pelo Brasil, idem para os coronéis. Com a facilidade que os
coronéis têm de manipular o povo, de fazer do povo massa de manobra, fica fácil
entender a vitória de Jelser. Fica mais fácil entender ainda a situação quando
se pensa em de onde vem o dinheiro que compra votos.
No
ano passado, Jelser assumiu a presidência da Assembleia Legislativa de Roraima.
Entretanto, no dia 06 de outubro deste ano, atendendo a um pedido do Ministério
Público, o Superior Tribunal de Justiça determinou a prisão em regime
semiaberto do deputado, que começou a cumprir pena no fim do mês passado.
O
presidente da Assembleia Legislativa está preso no Comando de Policiamento de
Boa Vista. Durante o dia, saí para exercer suas funções de presidente na Assembleia
Legislativa, e à noite volta para o Comando.
A sala na qual ele está preso, nem de longe lembra as precárias cadeias
de nosso sistema prisional.
O
local onde Jelser está “preso” está mais para quarto de hotel que para prisão.
Ele fica sozinho na sala. Dispõe do conforto de uma TV de última geração, onde
pode, sentado, diante de um sofá confortável, assistir aos noticiários, ou
mesmo apreciar um bom filme. Se fizer calor, ele ainda acionar o controle e
ligar o ar condicionado. Ah, para o caso das necessidades físicas, o
deputado-presidiário ainda pode contar com um banheiro limpo e asseado.
Um
dia depois que o Fantástico começou a ir à Assembleia para fazer a reportagem,
o deputado pediu afastamento de quinze dias. É a tal coisa: esperar a poeira
baixar, depois ele retorna para suas atividades normais. Recebendo um gordo
salário de R$ 33.763,00 ele não está muito preocupado em pedir renuncia... E
nem quer isso.
Enquanto
isso, as portas para praticar o ilícito permanecem escancaradas. Dizia ainda a
reportagem do Fantástico, que em 03 de março último, três dos diretores que
ocupavam cargo na Assembleia foram presos, suspeitos de desviar R$ 8 milhões.
Segundo os investigadores, a Assembleia Legislativa pagava por serviços não
prestados. Alguns desses cheques com os quais foram feitos os pagamentos tinham
a assinatura de Jalser. O dinheiro desviado serviu ainda para pagar um
casamento luxuoso, no qual os noivos chegaram de helicóptero.
O
esquema pelo qual Jelser foi condenado em 2010, recebeu o nome de “Escândalo dos
Gafanhotos”.
No
período que compreendeu os anos de 1998 a 2002, imperou no governo de Roraima,
um enorme esquema de improbidade administrativa e corrupção. O esquema envolvia
integrantes do executivo e do legislativo e desviou dinheiro de verbas públicas
federias, em quantia estimada em mais de R$ 230 milhões.
O
chefe do esquema era o próprio governador de Estado, Neudo Ribeiro Campos. Na
administração de Neudo havia duas folhas de pagamento. Uma normal, onde eram
pagos os salários dos servidores de fato, e outra onde eram registrados os
pagamentos a funcionários fantasmas. Daí vem o nome da operação policial: o
gafanhoto é um inseto que devora as folhas da lavoura, e os fantasmas devoravam
a folha de pagamento.
O
funcionamento desse esquema é explicado de modo detalhado no artigo, As Estratégias de Apropriações Indevidas de
Verbas Públicas Federais no Governo de Roraima: Um Estudo do Escândalo dos
Gafanhotos, de autoria de Jaci Guilherme Vieira, e Paulo Sérgio Rodrigues
da Silva, cuja transcrição segue em parágrafo recuado:
“...
por determinação direta do ex-governador Neudo Ribeiro Campos, o dinheiro
originário de convênios federais era transferido para uma conta que se destinada
a pagar os servidores públicos estaduais, incluindo os ditos “gafanhotos”. O
pagamento desses servidores (gafanhotos) era realizado por uma empresa privada denominada
Norte Serviços de Arrecadação e Pagamento Ltda. – NSAP, a qual tinha senha para
movimentar as contas bancárias do Estado de Roraima. A empresa tinha a
autorização da Secretaria da Fazenda para movimentar as contas do governo e até
fazer compras em lojas locais com o dinheiro público (DUARTE, 2005).
Os
aliados políticos do ex-governador, deputados estaduais e conselheiros do Tribunal
de Contas do Estado, recebiam diretamente de Neudo Campos quotas com valores
específicos a que cada beneficiário tinha direito, segundo a lógica do esquema.
A partir de então, pessoas comuns do povo4 eram aliciadas com promessa de ajuda
financeira, e as relacionava como falsos servidores para serem incluídos na folha
de pagamento do DER/RR ou da SEAD, dentro de sua quota.
Uma
vez composta a lista com os nomes das pessoas e seus respectivos CPFs, era
entregue ao outro réu do processo, o senhor Carlos Eduardo Levischi, na época diretor
do DER/RR e também a lista era repassada a Diva da Silva Bríglia, Secretária de
Administração na época do escândalo. Ela era a responsável pelo “[...]
gerenciamento da fraude, a mando do governador, e encaminhavam o rol para que a
NSAP fizesse o pagamento” (Processo nº 2008.42.00.002233-5, fls. 1730).
O
pagamento era retirado por procuradores dos “gafanhotos”, que passavam procurações
com plenos poderes a pessoas de confiança do deputado ou conselheiro beneficiado,
que evitavam aparecer diretamente (fls. 1730). O dinheiro sacado era repassado
diretamente ao deputado ou conselheiro beneficiado. Consta no Processo nº
2008.42.00.002233-5 que: “O ‘gafanhoto’ não recebia nada e quando recebia, era uma
quantia irrisória” (fls. 1730)”.
Como
em todo o esquema de corrupção que se propõe sistêmico, havia toda uma
estrutura de funcionamento: o chefe era o governador – idealizador e realizador
do esquema; os executores, funcionários do primeiro e segundo escalões do
governo – obedeciam as ordens do governador para que os gafanhotos fossem inclusos
na folha de pagamento; os beneficiários, os deputados estaduais, e funcionários
públicos; os “testas de ferro” – que ligados diretamente aos beneficiários,
cuidavam do recrutamento dos gafanhotos; e, por último, os próprios gafanhotos
- pessoas sem instrução, e fáceis de enganar.
De
algum modo, todo mundo saia lucrando, nesse esquema criminoso. Quem quase não
tinha lucro nenhum eram os gafanhotos, que, às vezes, não chegavam a ganhar
coisa alguma, apenas tinham seus nomes usados no esquema.
Enquanto
predominarem no Brasil essa corrupção sistêmica, que tem o errado por norma, caminharemos
para o nada absoluto. Patinaremos no gelo num circular sem fim. Enquanto houver
eleitores que elegem políticos de baixo caráter, e imorais como Jalser Renier,
enquanto algumas autoridades, por medo ou conivência, permitirem que situações
como a que acontece no Estado de Roraima, e enquanto, inertes, assistirmos ao
banquete dos corruptos, e, passivamente, ver a corrupção roubar a educação de
qualidade que poderia ser dada nas escolas, minar o desenvolvimento econômico e
industrial de nossa nação, deteriorar as condições dos hospitais e a saúde de
nossa população, o Brasil será apenas um gigante com pés de barro.
Postar um comentário