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A delação do fim do mundo
Posted by Cottidianos
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Sexta-feira,
16 de dezembro
Marcelo Odebrecht |
Assim,
diz o grande poeta Vinícius de Moraes, na canção, Marcha da Quarta-feira de
cinzas:
Acabou nosso
carnaval
Ninguém ouve
cantar canções
Ninguém passa
mais
Brincando feliz
E nos corações
Saudades e
cinzas
Foi o que restou
Pelas ruas o que
se vê
É uma gente que
nem se vê
Que nem se sorri
Se beija e se
abraça
E sai caminhando
Dançando e
cantando
Cantigas de amor
E no entanto é
preciso cantar
Mais que nunca é
preciso cantar
É preciso cantar
e alegrar a cidade
Estamos
a poucos meses do carnaval, e já vemos as máscaras começarem a cair. E as
máscaras caem em todos os cordões, em todos os partidos. Isso se deve ao samba
enredo da Lava Jato. Samba este que promete ser um dos maiores campeões no combate
ao carnaval da corrupção. Pelas ruas do Brasil, a população desiludida e
enojada com tanto bicho-papão, não passa mais brincando feliz. No coração
apenas saudades e cinzas são o que restam.
As
canções silenciaram. Os surdos pandeiros e tamborins antes tão eufóricos,
ficaram quietos, a espera do que vai acontecer, e se vai acontecer alguma coisa
que os devolva a alegria característica.
E
enquanto a Lava Jato faz as máscaras caírem, o sentimento é de decepção. Pois
quem pensávamos ser pierrô, não é. Quem pensávamos ser colombina, não o é. Tudo
não passava de uma gente falsa, gananciosa e interesseira, se fazendo passar
por folião. E, misturados à multidão de foliões embriagados pelo vinho da
esperança, pouco a pouco, os falsos foliões, roubavam aos verdadeiros foliões a
esperança de novos e alegres carnavais, sem que os mesmo percebessem que
estavam sendo enganados.
Enquanto
o povo, entusiasmado, seguia nas ruas o bloco da democracia, eles se reuniam
nos salões da Odebrecht, Andrade Gutierrez, OAS, Engevix, Camargo Correa,
Queiroz Galvão, e outras empreiteiras. Nesses salões do baile da corrupção,
empresários como o príncipe Marcelo Odebrecht, seduziam a eles, políticos, e os
tornavam seus escravos, ávidos por rica propina.
O
namoro das empreiteiras com o poder é de longa data. Em 1950, por exemplo, a
Andrade Gutierrez já construía estradas durante o governo do Juscelino
Kubistheck. A rainha delas, a Odebrecht já começou a colocar a coroa na cabeça
quando flertou com o governo militar, e saiu de um décimo nono lugar para
terceiro no ranking das empreiteiras. Isso se deu entre os anos de 1969 e 1974.
Quando
o Partido dos Trabalhadores chegou ao poder em 2003 com o presidente Luís
Inácio Lula da Silva, a Odebrecht já era a número 1. Daí, como se diz no ditado
popular “juntou a fome com a vontade de comer”. O PT com sede de poder, e a
empreiteira com cacife para pagar uma gorda propina. Durante os governos
petistas de Lula e Dilma, a gigante do ramo das empreiteiras reinou absoluta. A
empresa viu multiplicar grandemente seu faturamento em números absolutos.
Segundo dados divulgados pela revista Época, em julho de 2016, o faturamento da
Odebrecht durante os governos petistas saltaram de R$ 17, 3 bilhões para 107,7
bilhões.
Porém,
tudo na vida tem seu preço, em troca dos contratos bilionários com as estatais,
a empreiteira tinha que subornar políticos e fazer doações ilegais para
abastecer campanhas eleitorais. Também se coloque nessa conta os favores em
nível pessoal trocados entre empreiteiras e governantes, como por exemplo,
sítios em Atibaia e reformas de luxuosos apartamentos na praia do Guarujá.
Hoje
sabemos que todo esse crescimento não passou de uma vergonhosa e ilegal troca
de favores entre governos e empreiteiras. A cereja desse bolo foi, sem dúvida,
a Petrobrás. Na estatal, a Odebrecht sempre abocanhou os melhores contratos,
chegando a somar esses contratos cerca de R$ 33 bilhões. A empresa também tem
participação expressiva quando se trata de obras no exterior. Quando se trata
de financiamentos por parte do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e
Social (BNDES), ela foi uma das mais agraciadas, e recebia a fatia maior do
bolo, sobrando para as outras empresas algumas migalhas. De um total de cerca
de R$ 12 bilhões em financiamento liberado pelo BNDES para obras no exterior, a
empreiteira abocanhou R$ 8,2 bilhões.
Obviamente
que negócios tão vultosos exigiam uma logística criminosa, sofisticada, e
fraudulenta.
Em
2010, a Odebrecht comprou 51% do controle acionário do Meinl Bank Antígua, no
Caribe, pela quantia de US$ 3,984 milhões. O restante das ações permaneceu com
o Meinl Bank Viena. Posteriormente, através de outras operações de compra o
grupo Odebrecht chegou a dominar 67% das ações. O Meinl Bank Antígua chegou a
movimentar US$ 1,6 bilhão, distribuídos em mais de 40 contas.
O
Meinl Bank não era um banco comum, com operações bancárias comuns. Era um banco
de fachada, e sua missão era administrar a propina que seria distribuída no
Brasil, e também no exterior.
As
contas eram abertas em nome de terceiros, e para justificar repasses de
dinheiro a essas contas foram firmados falsos contratos de prestação de
serviços. Depois que as offshores começaram a aparecer nas investigações da
Lava Jato, em 2015, elas foram fechadas. Quando estourou o escândalo os
executivos da Odebrecht pensaram em fugir do país, uma vez que as operações no
Caribe eram coordenadas aqui do Brasil. Outra alternativa era a compra do
restante das ações do banco, com finalidade de sumir com todas as documentações
e provas.
Grande
parte dos recursos do Meinl Bank Antígua, voltava ao Brasil, depois era
repassado a especialistas em lavagem de dinheiro, e em seguida aos seus
destinatários finais. Muitos de nossos senadores, deputados, e até presidentes
da Republica são muito gratos ao banco caribenho, coordenado do Brasil, pois
através do dinheiro advindo dele, conseguiram financiar suas campanhas. Talvez
esse seja o caminho para se entender porque nossos políticos insistem tanto em
legislar em causa própria, dando às costas para os reais interesses da nação.
Também talvez seja esse o motivo pelo qual querem amordaçar o judiciário, e
frear a Lava Jato, para que a verdade não venha à tona.
Esse
ciclo de corrupção sistemática não parava por aí. Os políticos tinha que pagar
de alguma forma, o dinheiro sujo recebido em suas campanhas eleitorais. O
compromisso deles passava a ser, não com aqueles milhões de brasileiros que os
elegeram, mas com os grandes grupos econômicos que financiaram suas campanhas.
Eles se tornavam uma espécie de reféns das empreiteiras. Conseguiam para elas
excelentes contratos e em troca recebiam gordas propinas, num girar sem fim do
moinho de vento do mal.
Todos
os grandes partidos e a elite política dirigente de nosso país estavam envolvidos
nesse ciclo vicioso de corrupção. Os diretores que geriam as áreas principais
da estatal brasileira do ramo petroleiro tinham que ser desonestos. Se fosse
honesto não servia para o posto. Por quê? Porque eles eram colocados nesses postos
chaves justamente para se coadunarem às empreiteiras, combinar os contratos,
discutir os preços das obras, e, obviamente, acertar o preço da propina. Na
Odebrecht, por exemplo, havia um setor que foi criado com a finalidade de distribuir
propina, que era o Setor de Operações Estruturadas, cuja lista de clientes não
devia ser pouca.
Vieram
as reveladoras investigações da Lava Jato, e Marcelo Odebrecht, finalmente, foi
preso, em 19 de junho de 2015. Naquela ocasião, nem ele acreditava que seria
preso. E se fosse, acreditava que não passaria mais que 24 horas na prisão.
Arrogância e prepotência eram os comportamentos predominantes dele no momento
da prisão, e durante os meses que se seguiram. Se recusava a responder as
perguntas do juiz Sérgio Moro, e a fazer delação premiada.
Entretanto,
para todo homem arrogante e prepotente chega o dia em que precisar ser humilde,
e reconhecer que seu castelo de cartas desabou. Isso aconteceu com Marcelo,
somente alguns meses depois de ser preso.
Marcelo
Odebrecht chegou a conclusão de que, para a Odebrecht continuar existindo, ele
teria que abrir a boca. Ele, Marcelo, e mais de setenta executivos da
empreiteira fecharam então acordo de delação premiada.
A preparação
para o fechamento de acordo de delação premiada foi uma mega operação, quase um
planejamento de guerra. Segundo informações divulgadas pela revista Veja, “as negociações envolveram um batalhão de 400
advogados de vinte dos mais renomados escritórios de advocacia do Brasil e do
exterior. É tanta gente implicada que a empreiteira reservou parte de um hotel
em Brasília apenas para organizar o trabalho na reta final”.
E o
que Marcelo e os executivos da Odebrecht têm a dizer ainda vai sacudir o
Brasil. Vão ser tiradas as máscaras de muitos políticos, dos mais variados
escalões do governo. Podendo atingir, inclusive, o próprio presidente da nação.
As
bombas, na verdade, já começaram a explodir. Pense o leitor, ou leitora, em
vários livros reveladores sobre corrupção. Assim será as delações que vem por
aí, cheias de casos de corrupção de arrepiar os cabelos. Na delação de Cláudio
Melo Filho, ex-diretor de relações institucionais, por exemplo, há um capítulo
inteiro dedicado ao presidente Michel Temer. É nesse capítulo que o nome de
Michel Temer está citado 43 vezes.
O ex-diretor
afirma que o papel de Temer dentro do esquema era discreto, não cabendo a ele
solicitar contribuições. Sendo que isso ocorreu uma vez de modo relevante. O caso
aconteceu, em um jantar no Palácio do Jaburu, então residencial do
vice-presidente da República. Na ocasião Michel Temer teria pedido a Marcelo
uma doação de R$ 10 milhões. As tratativas desse caixa dois foram feitos
diretamente com Temer, segundo o delator. Desse total R$ 4 milhões foram
entregues no escritório de José Yunes, que depois tornou-se assessor especial
da presidência da República.
Ao
ver seu nome citado na delação premiada de Cláudio de Melo, Yunes pediu
demissão do cargo.
Como
todos os citados em delações premiadas, tendo provas evidentes ou não contra
eles, todos dizem a mesma coisa, “repudio severamente as declarações”.
Na
verdade, nós brasileiros, é que repudiamos os comportamentos inadequados de
nossos políticos.
É por
isso que eles alegam soberania das nossas casas legislativas em suas decisões:
apenas porque legislam em causa própria. Querem apenas livrar a própria pele,
desconsiderando e desprezando os verdadeiros interesses e aspirações dos
brasileiros.
E assim,
politicamente, o ano de 2016 entregará ao ano de 2017 uma caixa cheia de
dinamite. Mas o ano ainda não terminou e muitas surpresas podem nos estar
reservadas.
Voltando
a segunda parte da Marcha da Quarta-feira de Cinzas, de Vinícius de Moraes para
terminar.
Ei
foliões e folias de todo o Brasil. Não fiqueis tristes. Lembrem-se vocês de que,
mais do que nunca é preciso cantar, mais que nunca é preciso cantar e alegrar a
cidade. Veste, tu, novamente a fantasia da alegria. Pois tudo é que ruim passa,
toda tempestade não dura eternamente, e um dia o sol volta a brilhar. Um dia
toda a sujeira será varrida, e o país, livre dela e de quem as provocou voltara
a sorrir e a cantar e a se abraçar. A banda tocará novamente e tudo voltará à
normalidade.
Assim
é o que diz a segunda parte da canção:
A tristeza que a
gente tem
Qualquer dia vai
se acabar
Todos vão sorrir
Voltou a
esperança
É o povo que
dança
Contente da vida
Feliz a cantar
Porque são
tantas coisas azuis
E há tão grandes
promessas de luz
Tanto amor para
amar de que a gente nem sabe
Quem me dera
viver pra ver
E brincar outros
carnavais
Com a beleza
Dos velhos
carnavais
Que marchas tão
lindas
E o povo
cantando
Seu canto de paz
Seu canto de paz
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