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Guerra suja na Internet

Posted by Cottidianos on 00:11

Quinta-feira, 22 de março


Já lá se vão bem longe os tempos que os recados e notícias eram levados em pergaminhos e demoravam dias ou meses para chegar aos seus destinatários. Nos dias atuais, não. Tudo anda e gira muito rápido. Bilhões de notícias circulam pelo mundo todos os dias através da Internet, e as redes sociais vieram intensificar ainda mais os fios dessa grande teia mundial, ao conectar pessoas do mundo inteiro.
Nos tempos que os mensageiros andavam com seus pergaminhos para cima e para baixo havia uma clara diferenciação entre a vida pública e a vida privada do povo daquelas remotas eras. Nos dias atuais, essa diferenciação é muito tênue. Já não somos mais tão donos de nossos dados pessoais quanto o éramos no passado. Eles estão por aí, nas nuvens, nas redes que interconectam nosso moderno mundo.
Ainda nesse jogo de ida e volta no tempo, podemos lembrar ainda da era das grandes navegações, e dos intrépidos navegantes que, constantemente eram atacados por piratas que lhes roubavam os tesouros e sumiam na vastidão do oceano. Transmutando isso para os tempos modernos temos que o vasto oceano é a Internet; os intrépidos navegantes são os internautas; e os piratas são aqueles que se aproveitam das ondas da Internet e das redes sociais para roubar dados pessoais, desviar dinheiro de contas bancárias, espalhar notícia falsas e tantas outras formas de prejudicar outrem.
Verdadeiras guerras virtuais entre o bem e o mal são travadas a cada instante na vastidão oceânica da rede mundial de computadores. Basta você digitar suas senhas em site mal-intencionados e o estrago está feito. Se você baixa um jogo inocente, ou até mesmo se você participar de um teste de personalidade online, seus dados já foram gravados, capturados, e colocados em poder de empresas que podem fazer deles bom ou mau uso.
O pior é que esses dados podem servir para manipular e influenciar não apenas você, mas também outros milhões de usuários. Este é um grande desafio do mundo moderno, pois essa manipulação de dados é capaz de influenciar os indivíduos e mudar os destinos, os rumos de uma nação, atingindo diretamente o coração daquela que deveria ser soberana: a democracia. Nesse sentido, essa guerra virtual acaba se transformando numa questão de estado.
Robôs. Fake News. Perfis falsos. Essas são as ameaças que podem estar rondando o internauta sem que este se dê conta disso.
No sábado 17, veio à tona aquele que é talvez, o maior escândalo político jamais visto na Internet, e foi revelado pelo britânico The Observer, e pelo americano The New York Times.
Vamos aos fatos.
Em 2013, foi criada a Cambridge Analytica com obtivo de atuar na política norte-americana. O patrono da empresa, o bilionário Robert Mercer, despejou 15 de milhões de dólares no investimento. Até bem pouco bem tempo essa empresa era comandada por Steve Bannon, ex-assessor do presidente norte-americano Donald Trump. Hoje, Bannon presta serviços de consultoria à extremista francesa Marine Le Pen. Foi Robert Mercer que apadrinhou Steve Bannon.
A Cambridge Analytica chegou ao mercado com propostas inovadoras e miraculosas a serem empregadas no campo de batalha das guerras eleitorais. Porém, de acordo com o delator Christopher Wylie, o objetivo da Cambridge era bem mais ambicioso. Segundo ele, a empresa foi criada para “manipular os demônios internos dos usuários do Facebook, e assim influenciar as eleições”.  Se olharmos para o resultado das eleições americanas, veremos que o objetivo da empresa foi atingido em 100%.
O método aplicado pela empresa era colher dados online e criar perfis dos eleitores. As fichas eram usadas como alvo para a publicidade eleitoral. Um método de pesquisa que, aliás, difere das pesquisas baseadas nos padrões tradicionais que conhecemos, quais sejam, idade, raça, sexo, e classe social. Por esse método o eleitor era analisado pela sua parte mais frágil, e que engloba todas as categorias acima citadas: as tendências emocionais. De uma só tacada a Cambridge ia direto à veia jugular de cada um deles, influenciando-os fortemente.
Em 2014, centenas de milhares de usuários do Facebook realizaram um teste de personalidade, com a promessa de que seus dados seriam usados para fins acadêmicos. O teste media se uma pessoa era aberta às experiências, se era meticulosa, amável, extrovertida, e todos esses itens das quais são compostos os testes de personalidade.
Segundo o The Observer, os dados foram coletados a partir de um aplicativo, denominado, “thisisyourdigitallife”. Ainda segundo o jornal britânico, o aplicativo foi criado pelo pesquisador da Universidade de Cambridge, Aleksander Kogan, à parte de seu trabalho na universidade.
O que os usuários não sabiam eram que os seus dados seriam usados para fins de manipulação no território da guerra eleitoral suja, e que, pior ainda, através deles, também estariam sendo coletados os dados de amigos da sua lista de contatos. O resultado foi que mais de 50 milhões de perfis do Facebook foram usados indevidamente, através da atuação da Cambridge, constituindo assim uma das maiores violações de dados da história do Facebook.
A empresa, além de comercializar dados sem autorização da rede social, ainda manteve a maior parte ou até mesmo a totalidade das informações coletadas, descumprindo ainda mais a política de privacidade do Face.
Depois da suspeita de que os russos ajudaram a eleger Donald Trump, o governo americano ainda tem mais essa batata quente nas mãos, pois a Cambridge Analytica foi contratada em 2016 para atuar na eleição do candidato Trump, serviço pela qual foi bem remunerada: mais de 6,2 milhões de dólares, de acordo com a Comissão Eleitoral Federal.
A verdade é que o Face vem tentando se desvincular dessas notícias de arrepiar os cabelos até dos mais céticos. Na sexta-feira (16), a empresa disse que Kogan, argumentou que o aplicativo seria usado por psicólogos para fins de pesquisas comportamentais.
Todo esse escândalo veio à tona após as denúncias de Christopher Wylie. Wylie, um jovem de 28 anos, à época trabalhava para a Cambridge e ajudou a coletar os dados dos usuários. “Exploramos o Facebook para colher perfis de milhões de pessoas. E construímos modelos para explorar o que sabíamos sobre eles e direcionamos seus demônios internos. Essa foi a base em que toda a empresa foi construída”, disse ele.
Porém a consciência pesou, e muito, e o jovem resolveu denunciar a manipulação eleitoral praticada pela Cambridge. O motivo? Wylie diz que se arrependeu de ter trabalhado para um candidato a quem ele considera um psicopata.
Segundo essa novas denúncias do The Obeserver e do The New York Times, podemos concluir que Trump teve bem mais que a ajuda dos russos para se eleger presidente. Em uma eleição democrática?
A Cambridge Analytica já estava estendendo seus braços também para oferecer seus serviços para as campanhas eleitorais brasileiras, mas sabendo de todo esse escândalo, a empresa do marqueteiro André Torreta, que havia contratado a empresa, já disse que não renovará o contrato com ela.
Há que se ter muito cuidado até com os cliques que se dá no Facebook, ou em outras redes sociais... Pois eles podem estar sugando seus dados, que por sua vez, servirão para manipular mentes e corações, inclusive a sua.

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